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O PROGRAMA DE ATENDIMENTO E INTERNAÇÃO DOMICILIAR – PADI:

2 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: BREVES REFLEXÕES A PARTIR DA

4.2 O PROGRAMA DE ATENDIMENTO E INTERNAÇÃO DOMICILIAR – PADI:

Nesse momento, busca-se dar ênfase, “um olhar especial”, a assistência domiciliar. Para tanto, abordam-se conceitos como o de cuidado e de cuidador.

Na assistência domiciliar a humanização é um dos principais desafios, isso “[...] para que seja garantida a harmonia e equilíbrio nas relações interpessoais, refletindo na qualidade da assistência de todos os envolvidos”. (OLIVEIRA; LANG; LIMA, 2009).

Desta forma, importante destacar alguns aspectos sobre o cuidado, base do programa de atendimento e internação domiciliar – PADI.

Nesse sentido, Luiz Roberto Ramos (1996, p. 34) define cuidado como o “ato ou tarefa de zelar pelo bem estar de alguém, prestando-lhe assistência, assumindo a responsabilidade e os encargos inerentes a este ato”.

Leonardo Boff (1999, p. 34), na obra “Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra”, afirma que:

[...] o cuidado se encontra na raiz primeira do ser humano, antes que ele faça qualquer coisa. E, se fizer, ela sempre vem acompanhada de cuidado e imbuída de cuidado. Significa reconhecer o cuidado como um modo-de-ser essencial, sempre presente e irredutível à outra realidade anterior. É uma dimensão fontal, originária, ontológica, impossível de ser totalmente desvirtuada.

Para o mesmo autor (1999, p. 91), cuidado pode ser traduzido como “desvelo, solicitude, diligência, zelo, atenção, bom trato”.

Nesse viés, destaca-se que, “para que ocorra o cuidado, é preciso haver mais do que boas intenções e comunicação não distorcida. O ato de cuidar também tem que ser concretamente efetivado”. (ALBIERO, 2003, p. 35).

Leonardo Boff (1999, p. 34) sustenta que a pessoa, sem cuidado, deixa de ser humano. Ainda, segundo o autor, o indivíduo, se não receber cuidado, do momento do nascimento até a morte, acaba se desestruturando, perdendo o sentido da vida e, conseqüentemente, morrendo. “Se, ao largo da vida, não fizer com cuidado tudo o que empreender, acabará por prejudicar a si mesmo e por destruir o que estiver a sua volta”. Por essa razão, “o cuidado deve ser entendido na linha da essência humana”.

Sobre o tema, anota-se:

Os cuidados para a promoção da vida podem ser diferenciados em cuidados de reparação da vida (necessita ação de vigilância direta e contínua de profissional da saúde) e cuidados de manutenção da vida (poderão ser realizados pelo paciente ou pela família, seguindo orientações da equipe multiprofissional de saúde). Entendemos que esta diferenciação teórica indica a necessidade de objetivar focos distintos de organização do trabalho, sendo um direcionado a cuidados intensivos, e outro ao acompanhamento no contexto da família, comunidade, enfim no cuidado de atenção básica de saúde. (HECK, 2005, p. 53).

Nas palavras de Luiz Roberto Ramos (1996, p. 34), “o cuidado assistencial é continuo e, quando fornecido à pessoa irreversivelmente incapaz pra gerenciar sua vida, ele acaba por tornar-se uma ‘representação social’ do ‘incapacitado’, o que por sua vez implica em ética”. Ressalta-se que “esta tem participação essencial na dinâmica de prestação de cuidados, já que pode se tornar inteiramente invasiva”.

Por conseguinte, frisa-se que, na saúde, o cuidado encontra-se ligado “[...] à compreensão de que a doença não tem somente caráter físico-biológico”. Logo, “[...] cumpre pensar a doença a partir de uma pluralidade de interpretações, divergências e negociações que envolvem os episódios de sofrimento do sujeito, até se chegar a um diagnóstico entre os sistemas locais de saúde”. (HECK, Rita Maria et al, 2005, p. 53).

Com isso, verifica-se que o “ser humano é um ser de cuidado, mais ainda, sua essência se encontra no cuidado. Colocar cuidado em tudo o que projeta e faz, eis a característica singular do ser humano”. (BOFF, 1999, p. 35).

No contexto do cuidado, contudo, emerge a figura do cuidador. Segundo Cleci Elisa Albiero (2003, p. 40), “o cuidado somente surge quando a existência de alguém tem importância para outra pessoa, seja ela cuidador ou seja cuidado”.

Acerca de definição de cuidador, anota-se o seguinte conceito elaborado pelo Ministério da Saúde:

Cuidador é um ser humano de qualidades especiais, expressas pelo forte traço de amor à humanidade, de solidariedade e de doação. A ocupação de cuidador integra a Classificação Brasileira de Ocupações – CBO sob o código 5162, que define o cuidador como alguém que “cuida a partir dos objetivos estabelecidos por instituições especializadas ou responsáveis diretos, zelando pelo bem-estar, saúde, alimentação, higiene pessoal, educação, cultura, recreação e lazer da pessoa assistida”. É a pessoa, da família ou da comunidade, que presta cuidados à outra pessoa de qualquer idade, que esteja necessitando de cuidados por estar acamada, com limitações físicas ou mentais, com ou sem remuneração. (BRASIL, 2008, p. 8).

Cleci Elisa Albiero (2003, p. 35), citando Pires (2002), afirma que cuidar do outro significa conviver junto, “apesar e sobre as diferenças, passando da ‘tolerância à solidariedade’. É ser solidário, sem tutela, porque ‘[...] a minha liberdade traduz-se na liberdade do outro e dela dependo. É facilitar um processo de busca partilhada’. Além disso, “cuidar do outro é interagir dialeticamente com as partes, na construção coletiva do todo. Cuidar da vida do homem e da mulher é emancipá-la do próprio cuidado”.

Cumpre destacar, contudo, que o desempenho do cuidador está além da mera participação nas “[...] atividades diárias dos indivíduos, sejam eles saudáveis, enfermos e/ ou acamados, em situação de risco ou fragilidade, seja nos domicílios

e/ou em qualquer tipo de instituições na qual necessite de atenção ou cuidado diário”. (BRASIL, 2008, p. 8).

Na pesquisa de Cleci Elisa Albiero (2003, p. 40-41), encontra-se a seguinte diferença entre cuidador formal e informal:

O primeiro – cuidador formal – é representado por um profissional com formação na área da saúde; desempenha funções técnicas, bem como presta ajuda ao doente nas atividades de higiene e conforto, alimentação, movimentação, ingestão de medicamento, entre outras. Este profissional pode ser contratado ou ser um membro da família, designado para prestar este serviço.

O segundo – cuidador informal - é quando o profissional é familiar ou contratado, sem formação na área da saúde. Exerce funções como prestar ajuda ao doente nas atividades de higiene e conforto, alimentação, movimentação, ingestão de medicamento, entre outras, recebendo as orientações necessárias para o cuidado acontecer. As decisões para a pessoa assumir o cuidado ao doente no domicílio normalmente obedecem a certas regras refletidas nos seguintes fatores: parentesco, gênero, proximidade física e proximidade afetiva. Em relação ao parentesco, na maioria das vezes prevalecem os cônjuges; no gênero se destaca a presença da mulher; na proximidade física predomina como cuidador a pessoa que coabita o mesmo espaço físico do doente, e na proximidade afetiva, destacam-se a relação conjugal e a relação entre pais e filhos.

A função do cuidador, de acordo com o guia prático do cuidador, elaborada pelo Ministério da Saúde, consiste em “[...] acompanhar e auxiliar a pessoa a se cuidar, fazendo pela pessoa somente as atividades que ela não consiga fazer sozinha”. Evidenciando “[...] sempre que não fazem parte da rotina do cuidador técnicas e procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas, particularmente, na área de enfermagem” (BRASIL, 2008, p. 8).

Nesse passo, anotam-se algumas tarefas que fazem parte da rotina do cuidador, conforme o guia do Ministério da Saúde acima mencionada:

• Atuar como elo entre a pessoa cuidada, a família e a equipe de saúde. • Escutar, estar atento e ser solidário com a pessoa cuidada.

• Ajudar nos cuidados de higiene. • Estimular e ajudar na alimentação.

• Ajudar na locomoção e atividades físicas, tais como: andar, tomar sol e exercícios físicos.

• Estimular atividades de lazer e ocupacionais.

• Realizar mudanças de posição na cama e na cadeira, e massagens de conforto.

• Administrar as medicações, conforme a prescrição e orientação da equipe de saúde.

• Comunicar à equipe de saúde sobre mudanças no estado de saúde da pessoa cuidada.

• Outras situações que se fizerem necessárias para a melhoria da qualidade de vida e recuperação da saúde dessa pessoa. (BRASIL, 2008, p. 8).

Ressalta-se que, nem sempre, “[...] se pode escolher ser cuidador, principalmente quando a pessoa cuidada é um familiar ou amigo. É fundamental termos a compreensão de se tratar de tarefa nobre, porém complexa, permeada por sentimentos diversos e contraditórios”. (BRASIL, 2008, p. 8).

Desta forma, com base nesse entendimento, julga-se prudente tecer algumas observações sobre a família, considerando que, quando se fala em cuidado, logo se coloca em evidência o outro, “e neste caso ressaltamos a família, pois ela sempre se constituiu na história da humanidade como o núcleo central, organizada no espaço privado, como o lugar do cuidado e para o cuidado acontecer”. (ALBIERO, 2003, p. 33).

Nesse sentido, observa-se que o conceito de família, na noção contemporânea, “transfere-se totalmente para os princípios de mútua compreensão, [...]”. (AKEL, 2008, p. 5).

Para Tânia da Silva Pereira (2004, p. 622), a família pode ser definida:

[...] um núcleo em torno do qual as pessoas se unem por razões afetivas, dentro de um projeto de vida em comum em que compartilham um quotidiano e, no decorrer das trocas intersubjetivas, transmitem tradições, planejam seu futuro, acolhem-se, atendem os idosos, formam crianças e adolescente.

Segundo Rousseau (apud AKEL, 2008, p. 6), a “família pode ser considerada, então, o primeiro modelo das sociedades políticas: o chefe é a imagem do pai, o povo é a imagem dos filhos; e todos, nascidos iguais e livres, alienam sua liberdade apenas pela sua utilidade”. Frisa-se que “toda diferença reside em que, na família, o amor do pai por seus filhos é o pagamento dos cuidados que lhes presta; e que, no Estado, o prazer de comandar substitui este amor que o chefe não tem pelos seus povos”.

Nesse contexto, ressalta-se que, segundo Rita Maria Heck et al (2005, p. 54), “o equilíbrio familiar pode ser abalado em situações de doença de algum de seus componentes, principalmente quando se refere a uma doença grave ou de doença crônica. Novos papéis precisam ser definidos, o estresse ronda a família”.

Nesse sentido, frisa-se que:

A doença ou a limitação física em uma pessoa provoca mudanças na vida dos outros membros da família, que têm que fazer alterações nas funções ou no papel de cada um dentro da família, tais como: a filha que passa a

cuidar da mãe; a esposa que além de todas as tarefas agora cuida do marido acamado; o marido que tem que assumir as tarefas domésticas e o cuidado com os filhos, porque a esposa se encontra incapacitada; o irmão que precisa cuidar de outro irmão. (BRASIL, 2008, p. 11).

De acordo com o guia do Ministério da Saúde, “todas essas mudanças podem gerar insegurança e desentendimentos, por isso é importante que a família, o cuidador e a equipe de saúde conversem e planejem as ações do cuidador domiciliar”. (BRASIL, 2008, p. 11).

Sobre o tema, ressalta-se o seguinte conceito de família saudável:

É uma unidade de auto-estima positiva, onde os membros convivem e se percebem mutuamente como família. Tem estrutura e organização para definir objetivos e promover os meios para o crescimento, desenvolvimento, saúde e bem-estar de seus membros. A família saudável se une por laços de afetividade exteriorizados por amor e carinho, tem liberdade de expor sentimentos e dúvidas, compartilha crenças, valores e conhecimentos. Aceita a individualidade de seus membros, possui capacidade de conhecer e usufruir seus direitos, enfrenta crises, conflitos e contradições, pedindo e dando apoio a seus membros e às pessoas significativas. A família saudável atua conscientemente no ambiente em que vive, interagindo dinamicamente com outras pessoas e famílias em diversos níveis de aproximação, transformando e sendo transformada. Desenvolve-se com experiência construindo sua história de vida. (HECK, 2005, p. 54).

Entretanto, verifica-se que o ato de cuidar é bastante complexo. Logo, “o cuidador e a pessoa a ser cuidada podem apresentar sentimentos diversos e contraditórios, tais como: raiva, culpa, medo, angústia, confusão, cansaço, estresse, tristeza, nervosismo, irritação, choro, medo da morte e da invalidez”. Tais sentimentos, “podem aparecer juntos na mesma pessoa, o que é bastante normal nessa situação”. Por essa razão, essa pessoas “precisam ser compreendidos, pois fazem parte da relação do cuidador com a pessoa cuidada. É importante que o cuidador perceba as reações e os sentimentos que afloram, para que possa cuidar da pessoa da melhor maneira possível”. (BRASIL, 2008, p. 9).

Por isso, a família e o cuidador devem “compreender que a pessoa cuidada tem reações e comportamentos que podem dificultar o cuidado prestado, como quando o cuidador vai alimentar a pessoa e essa se nega a comer ou não quer tomar banho”. (BRASIL, 2008, p. 9).

É imperioso que se reconheça “[...] as dificuldades em prestar o cuidado quando a pessoa cuidada não se disponibiliza para o cuidado e trabalhe seus sentimentos de frustação sem culpar-se”. (BRASIL, 2008, p. 9).

Nesse sentido, registra-se:

É importante que o cuidador, a família e a pessoa a ser cuidada façam alguns acordos de modo a garantir uma certa independência tanto a quem cuida como para quem é cuidado. Por isso, o cuidador e a família devem reconhecer quais as atividades que a pessoa cuidada pode fazer e quais as decisões que ela pode tomar sem prejudicar os cuidados. Incentive-a a cuidar de si e de suas coisas. Negociar é a chave para se ter uma relação de qualidade entre o cuidador, a pessoa cuidada e sua família. (BRASIL, 2008, p. 9).

Com isso, transcrevem-se algumas dicas capazes de ajudar a preservar a saúde e aliviar a tarefa do cuidador, seja ele integrante da família ou não:

• O cuidador deve contar com a ajuda de outras pessoas, como a ajuda da família, amigos ou vizinhos, definir dias e horários para cada um assumir parte dos cuidados. Essa parceria permite ao cuidador ter um tempo livre para se cuidar, se distrair e recuperar as energias gastas no ato de cuidar do outro; peça ajuda sempre que algo não estiver bem.

• É fundamental que o cuidador reserve alguns momentos do seu dia para se cuidar, descansar, relaxar e praticar alguma atividade física e de lazer, tais como: caminhar, fazer ginástica, crochê, tricô, pinturas, desenhos, dançar, etc. (BRASIL, 2008, p. 11).

Pelo exposto, percebe-se que o cuidado no ambiente familiar abrange uma série de fatores e requer uma dedicação especial por parte da família, especialmente do cuidador. Por isso, pode-se dizer que, de fato, “cuidar é mais do que um ato; é uma atitude”. Assim, “abrange mais do que um momento de atenção, de zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro” (BOFF, 1999, p. 33).

Com isso, após essas breves reflexões acerca do cuidado, da família e da figura do cuidador, passa-se, no próximo e derradeiro tópico deste trabalho, ao estudo da intervenção do Serviço Social no Programa de Atendimento e Internação Domiciliar – PADI por meio do SUS.

4.3 A INTERVENÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO PROGRAMA DE ATENDIMENTO

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