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O que é essencial para todos?

No documento ARTIGODEOPINIÃO-Pontos-de-Vista (páginas 92-97)

Gustavo Barreto

“O homem é essencialmente um ser de cultura”, argumenta o professor Denys Cuche, da Universidade Paris V. A cultura é um campo do conhecimento humano que nos permite pensar a diferença, o outro, é dar um fim às explica-

ções naturalizantes dos comportamentos humanos. As questões étnica, nacional e de gênero, por exemplo, não podem em hipótese alguma serem observadas em seu “estado bruto”. É o caso da relação homem-mulher, cujas implicações culturais são mais importantes do que as explicações biológicas.

E por que se faz importante fazer esta breve introdução, na questão da ideia do Vale-Cultura, lançada pelo Governo Federal e atualmente em discussão com os atores sociais da área? Porque urge que nossa legislação passe por uma transformação, dado que a principal lei do setor está defasada (é de 1991) e é insuficiente para os desafios atualmente expostos.

O conceito de “cultura” é tão reivindicado quanto controverso. Ouvimos esta palavra diariamente, para os mais diversos usos: cultura política, cultura religiosa, cultura empresarial. Também serve para complexificar e ampliar um debate sobre um tema difícil (“isso é cultural”), para finalizá-lo (“não tem jei- to, isso é cultural”) ou gerar preconceito contra um grupo social (“o povo não tem cultura”). São múltiplos os usos.

Está claro que incentivar as manifestações culturais de um povo é condi- ção indispensável para seu desenvolvimento. É certo que este instrumento deve atingir um de seus principais objetivos: a desconcentração regional e a

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democratização do acesso a produtos culturais. A simples injeção de R$ 600 milhões por mês no mercado cultural, podendo atingir até 12 milhões de brasileiros, já é um grande benefício.

O curioso na iniciativa do Governo, que já tramitava no Congresso desde 2006, é a questão tardiamente (e fatalmente) gerada para reflexão: o que é essencial para todos? Se o trabalhador possui o Vale-Transporte e o Vale-Alimentação, por que não o Vale-Cultura? Este debate – e o debate é justamente este – gera reações ainda mais curiosas.

A mais risível é a que ataca a proposta como “dirigista”, afirmando que o tempo do dirigismo cultural já acabou em todo o mundo. Uma sim-

plificação melancólica e uma inverdade: governos de países que alcança- ram bons índices de desenvolvimento humano investem muito mais na cultura do que o Brasil. Os ataques têm nome: são os mesmos que falam em “alta cultura” e compõem as velhas oligarquias deste setor, pois con- centraram por muito tempo a exclusividade dos “negócios” da cultura. Alguns chegam a duvidar da “qualidade estética” dos produtos culturais a serem consumidos.

Estão claros os inimigos deste discurso conservador: o trabalhador, que passa a ser progressivamente um crítico de cultura, e as manifestações da cultura popular – ora atacada, por exemplo, por meio da restrição à cultura do funk carioca.

A aprovação do Vale-Cultura será um passo importante, dentro de uma longa caminhada, para a inserção de milhões de brasileiros no universo privilegiado da cultura local, regional e nacional.

Jornal do Brasil, 18/7/2009; e Fazendo Média (www.fazendomedia.com/?p=268), 26/7/2009.

Gustavo Barreto é produtor cultural no Rio de Janeiro e mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura na UFRJ.

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A análise que apresentamos a seguir é dirigida a você, professor. Ela poderá ajudá-lo a mediar o estudo que será feito pelos alunos. As frases sublinhadas são as que melhor resumem o conteúdo do parágrafo em que aparecem.

Originalmente publicado no Jornal do Brasil, o artigo persegue um claro objetivo: opinar positivamente a respeito do Vale-Cultura. Como é próprio dos artigos de opinião, esse também foi escrito “no calor da hora”. O Vale-Cultura gera, portanto, não apenas notícia, mas também é objeto de debate, com questionamentos como: “Trata-se ou não de uma boa inicia- tiva? Por quê? Quais serão as consequências mais prováveis?”.

A estratégia argumentativa de Gustavo Barreto, por sua vez, pode ser descrita, resumidamente, nos seguintes termos:

• O articulista insere seu artigo numa questão polêmica mais ampla que a do debate já referido. Dado seu caráter republicano e universal, trata-se de uma questão de grande interesse público, indicada já no título: “O que é essencial para todos?”.

Sua resposta para essa questão está baseada numa verdade ampla-

mente reconhecida: a cultura é, sem sombra de dúvida, parte do que é essencial para todos, na medida em que o homem é um “ser de cultura”. Nos dois primeiros parágrafos, Barreto confirma essa verdade com a ajuda da citação do “professor Denys Cuche, da Universidade Paris V” – trata-se do chamado argumento de autori- dade, cujo conceito será apresentado na oficina seguinte. E justifica seu emprego pela “urgência” de transformar nossa legislação refe- rente à cultura.

No terceiro parágrafo, o autor do artigo aponta o caráter polêmico do

conceito de cultura, lembrando ao leitor os múltiplos usos que se fazem dessa palavra. Considerando-se os exemplos fornecidos, po- de-se dizer que o articulista Gustavo Barreto nos adverte da existência de bons e maus empregos do conceito e cria a expectativa de que ele fará um bom uso.

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Dando a verdade com que abre o artigo como já aceita pelo leitor

(parágrafo 4), o articulista se refere ao Vale-Cultura, num primeiro momento, como um programa que incentiva as manifestações culturais e, portanto, investe no que é essencial para todos, ou seja, investe na própria essência do ser humano. E, além disso, combate a concentração regional da cultura, democratiza o acesso ao que é oferecido nessa área e injeta recursos no mercado cultural.

Num segundo passo (parágrafos 5, 6 e 7), Barreto aponta o debate

provocado pelo Vale-Cultura, identificando as reações contrárias que provocou – qualificadas como “curiosas” – com o objetivo de refutá-las:

a) são defendidas por agentes das velhas oligarquias, acostumadas a lucrar com os negócios da cultura;

b) são posições conservadoras, elitistas, inimigas do trabalhador;

c) recorrem a simplificações “melancólicas” e a “inverdades”.

Assim, o autor do artigo desqualifica, num só golpe, tanto seus adver- sários (denunciando o que seriam seus verdadeiros interesses) quanto as posições que defendem.

Finalmente, o articulista reafirma sua posição: a aprovação do Vale-Cultura terá um valor estratégico nas políticas públicas do setor.

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Atividades

2ª - etapa

Contra-argumentação

Na atividade anterior foi trabalhada a argumentação. Agora, você irá ajudar seus alunos a exercitar a contra-argumentação.

Faça-os contestar a tese e os argumentos do artigo “O que é essencial para todos?”, assumindo pontos de vista semelhantes aos que são combatidos por Gustavo Barreto.

Em linhas gerais, deverão condenar o Vale-Cultura, questionan- do sua validade, por ser “dirigista” (o Estado dirige a cultura), não limitar o uso do Vale à alta cultura, ser “populista” etc. Chame a atenção dos alunos para a necessidade de estabelece- rem a tese e de elaborarem os argumentos que a defenderão, recomendando que leiam parte do material publicado a esse respeito, nos jornais e na internet, a fim de conhecerem a diver- sidade de opiniões sobre esse assunto.

Divida a turma em pequenos grupos. Peça-lhes que conversem sobre a(s) tese(s) e os possíveis argumentos que utilizariam. Os alunos devem registrá-los para, num momento posterior, apresen- tá-los à classe. Lance questões para ajudá-los nesse desafio:

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O acesso à cultura é mesmo tão essencial para o cidadão

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