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O que fazem os eurodeputados portugueses no plenário?

Centremo-nos agora no grau de coesão dos eurodeputados portugueses no que respeita ao sentido de voto. A VoteWatch.eu criou uma medida de coesão baseada em dados de votação nominal para as duas últimas legislaturas (2004- -2009 e 2009-2014). Estas classificações da coesão variam entre 0 e 1, e indicam o grau de coerência das delegações nacionais nas votações. Quanto mais alta a classificação, mais vezes a delegação nacional votou em bloco, independen- temente do grupo político europeu a que pertence.

A Figura 6.1 mostra que o grau de coesão dos eurodeputados portugueses é substancialmente mais baixo na actual legislatura (0,68) do que na anterior (2004-2009: 0,74). Na realidade, o grau de coesão de Portugal, que costumava situar-se ligeiramente acima da média da UE27, está agora abaixo dessa média. Além disso, não se verificaram alterações significativas nos Estados-membros da UE como um todo, nem em grupos específicos como o dos 15 Estados- -membros mais antigos, os 12 países da CEE ou o dos países PIIGS/GIPSI55. Isso sugere que as razões para a perda de coesão na delegação portuguesa podem ser internas. Contudo, há países onde a coesão diminuiu ainda mais de uma legislatura para a outra: Lituânia (0,11 pontos menos), Letónia (0,09 pontos menos) e Áustria (0,07 pontos menos).

Figura 6.1 Grau de coesão nos votos nominais no PE 2004-2009

2009-2014

2004-2009 2009-2014

Média UE27 Média UE15 Média NEM12 Média PIIGS/GIPSI Portugal 0,50 0,55 0,60 0,65 0,70 0,75 0,80

A coesão parece não estar fortemente relacionada com a dimensão das delegações nacionais. Na anterior legislatura, verificou-se uma fraca relação

55. Este grupo é composto por Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha, os países da UE que mais foram afectados pela crise internacional que teve início em 2009.

Fonte: Votewatch.eu. Cálculos efectuados pelos autores.

negativa entre a dimensão da delegação e coesão de voto (Pearson’s r= -0,40; p < 0,10), no sentido em que os grupos nacionais mais pequenos apresenta- vam graus mais elevados de coesão. Todavia, no actual PE esse padrão não existe (Pearson’s r= -0,17; p > 0,10). Uma vez que não existe uma relação entre a variação do número de lugares de cada Estado-membro e coesão de voto56 (Pearson’s r = -0,06; p > 0,10), é seguro assumir que a dimensão não é um factor de previsão fiável de concordância no seio das delegações nacionais, no que diz respeito a sentido de voto.

Comparando o grau de concordância interna da delegação portuguesa com outras delegações da mesma dimensão57, não se observa uma tendência clara do comportamento dos grupos nacionais de eurodeputados desta grandeza (i.e., com cerca de 20 lugares). De facto, embora a coesão tenha diminuído na República Checa, na Holanda, na Áustria, em Portugal e na Hungria, manteve- -se constante na Grécia e aumentou na Suécia e na Bélgica (Figura 6.2).

Figura 6.2 Grau de coesão nas votações nominais no PE em grupos nacionais seleccionados 2004-2009 2009-2014 2004-2009 2009-2014 CZ SE NL BE AT GR PT HU 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8

Fonte: Votewatch.eu. Cálculos efectuados pelos autores.

O grau de coesão no sentido de voto dos eurodeputados portugueses parece variar de acordo com as áreas políticas específicas em causa. A Figura 6.3 apresenta o grau de coesão na votação da delegação portuguesa e dos 27 grupos nacionais no PE como um todo numa amostra seleccionada de matérias políticas – aquelas em que se acredita que os interesses de Portugal são mais acentuados. Na legislatura de 2004-2009, a coesão dos eurodeputados portu- gueses está bastante acima da média em questões como as Pescas e o Controlo de Fronteiras, ao passo que nos Transportes, no Turismo e na Agricultura é de 0,74, ou seja, precisamente na média. Registos das votações de políticas económicas e monetárias apresentam um cenário de menor coesão entre os eurodeputados portugueses, em comparação com outras áreas políticas e com padrões gerais de sentido de voto. Na actual legislatura, a coesão em matérias relacionadas com as pescas, políticas orçamentais, agrícolas e económicas e monetárias diminuiu consideravelmente na delegação portuguesa, mas o 56. O número de assentos

no PE diminuiu na actual legislatura. Consequentemente, a maior parte dos países perdeu lugares no Parlamento, mas outros (por ex., a Alemanha ou a Bulgária) mantiveram o anterior número de deputados e ainda outros, como Espanha ou a Suécia, têm agora uma delegação ligeiramente maior no PE.

57. Em 2004 -2009, Portugal tinha 24 eurodeputados no PE; os outros países que vemos na Figura 4.5 tinham entre 18 (Áustria) e 27 (Holanda). Na actual legislatura, Portugal tem apenas 22 eurodeputados, enquanto a dimensão das outras delegações variam entre 19 (Áustria) e 26 (Holanda).

consenso em questões de desenvolvimento regional, transportes/turismo foi maior na actual legislatura do que entre 2004 e 2009.

Este cenário segue o padrão observado no PE em geral, que apresenta agora menor consenso nacional em relação ao controlo orçamental e uma coesão interna das delegações mais forte na votação de políticas relacionadas com transportes, turismo e desenvolvimento regional. Ainda assim, o menor consenso entre os eurodeputados portugueses no seu voto em questões rela- cionadas com políticas económicas e monetárias e com questões da agricultura não parece seguir a tendência geral do PE.

Figura 6.3 Grau de coesão nas votações nominais no PE por área política Transportes e Turismo Desenvolvimento Regional Pescas Assuntos Económicos e Monetários Controlo Orçamental Transportes e Turismo Pescas Controlo Orçamental Desenvolvimento Regional Assuntos Económicos e Monetários 2009-2014 2044-2009 2009-2014 2004-2009 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 , 0,74 , 0,76 , 0,84 , 0,64 , 0,64 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 , 0,74 Portuga l M éd ia UE27

Fonte: Votewatch.eu. Cálculos efectuados pelos autores.

No geral, o sentido de voto dos eurodeputados portugueses, tal como o dos restantes eurodeputados, encontra-se ligado a três factores: fidelidade ao grupo partidário europeu a que pertencem, ao seu próprio partido nacional e à delegação do seu país. A organização independente Votewatch.eu oferece diversas formas directas para avaliar de que maneira o sentido de voto dos euro- deputados representa fidelidade para com estas entidades, que constituem uma primeira resposta à questão das motivações por detrás do voto. Na Tabela 6.1 podemos ver que, em média, os eurodeputados votaram mais frequentemente de acordo com o seu partido nacional e, em menor grau, com os respectivos grupos partidários do PE. Isto aplica-se ao conjunto de votos em geral, mas também a cada área específica considerada neste relatório. Votos alinhados com a delegação portuguesa acontecem, em média, com menos frequência e foram mais comuns na anterior legislatura do que na actual.

Tabela 6.1 Fidelidade dos eurodeputados portugueses para com três grupos de referência no PE (proporção de votos em todas as áreas políticas)

Fidelidade para com o

grupo partidário do PE Fidelidade para com o partido nacional Fidelidade para com a delegação do país

Mean S.D Mean S.D. Mean S.D.

2009 -2014 0,93 0,05 0,98 0,02 0,78 0,14

2004 -2009 0,95 0,03 0,96 0,02 0,82 0,15

Fonte: Votewatch.eu. Cálculos efectuados pelos autores.

A tabela acima mostra que a dispersão das medidas de tendência central é muito mais elevada no caso de uma votação fiel ao grupo nacional – ou seja, a variação neste tipo de comportamento é maior do que nos outros dois tipos de fidelidade aqui considerados. Além disso, isto aplica-se quer à sexta legislatura quer à actual.

Analisemos então com maior pormenor a fidelidade para com o partido nacional. Como se pode ver claramente na Figura 6.4, a percentagem de votos em linha com o grupo nacional varia significativamente consoante os partidos nacionais, tanto nesta legislatura como na anterior. Em média, os eurodepu- tados de partidos de esquerda, sem experiência de governo (BE e PCP), votam com menos frequência em linha com o partido nacional do que os outros três partidos no PE. Isso sugere que a ideologia e as estratégias partidárias desem- penham um papel mais importante nas decisões de voto dos eurodeputados do que o conceito abstracto de “interesse nacional”, e que este fenómeno é mais frequente nos representantes dos pequenos partidos de esquerda.

Figura 6.4 Fidelidade dos eurodeputados portugueses para com o grupo nacional por partido nacional (% de votos)

2004-2009 2009-2014 2004-2009 2009-2014 57 59.6 70.7 73.7 95.2 51.4 61.7 84.8 85.3 87 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 CDU BE CDS-PP PSD PS

Em termos de tendências, os eurodeputados do PS e do PCP no actual parlamento votam menos em linha com o grupo português do que os seus pares na anterior legislatura. Curiosamente, os representantes dos partidos de direita (CDS-PP e PSD) votam actualmente muito mais em linha com a delegação nacional do que no sexto PE, ao passo que não se verifica nenhuma mudança significativa no padrão de voto dos representantes do BE no âmbito do grupo nacional.

Capítulo 7

Como entendem os eurodeputados