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O que as mulheres falam dos seus companheiros e agressores

4 RESULTADOS

4.2 As histórias de violência no cotidiano das mulheres

4.2.3 O que as mulheres falam dos seus companheiros e agressores

Quando perguntadas sobre a violência doméstica vivenciada, as mulheres logo no início, falavam dos seus companheiros ou ex-companheiros agressores, evidenciando que qualquer análise ou proposta de intervenção no fenômeno não pode se dirigir apenas a elas.

As mulheres apresentaram os homens que as agrediam como homens

tranqüilos, ótimos pais, um anjinho, uma benção que só ficavam agressivos em algumas situações. Em alguns depoimentos as mulheres demonstram não associar o comportamento de seus agressores com um padrão masculino de comportamento, no qual a agressividade se transforma em agressão, associando sempre o comportamento agressivo a circunstâncias externas. Em seus relatos, falaram de várias situações em que seus companheiros passaram a reagir agressivamente quando não tinham o controle da situação ou não foram atendidos em suas em suas exigências.

Era tudo tranqüilo, ele é ótima pessoa, não tenho nada a reclamar dele não, mas em certo ponto aí ele começou a destrambelhar. (Petúnia)

As mulheres também apresentam seus companheiros como ciumentos,

possessivos, nervosos, descontrolados, loucos, características que de alguma forma justificavam as agressões cometidas por eles, porque também levava a perda do controle da situação. Ao aceitarem tais elementos como justificativas, as mulheres não reconhecem o padrão masculino de reações violentas o que, de certa forma, retira ou diminui a responsabilidade do homem pelos atos cometidos. É como se ele não estivesse no seu juízo perfeito e não pudesse ser responsabilizado por seus atos.

Ele é meio assim... assim estúpido, até hoje ele... a primeira coisa que ele faz pra resolver a situação assim é...sentar, virar a mão. E num tem diálogo. Chama as meninas de qualquer coisa, de qualquer... até hoje é assim. (Madressilva)

Ele é muito ignorante, pras pessoas, acha que tudo é ele que sabe, ele é muito ignorante mesmo. Então... [Silêncio] (Violeta)

Ele falava que eu era safada, que mulher que namora não pode ficar saindo com as amigas. Ele achava que ele era meu dono... [...] ele era possessivo e ele achava que eu tinha de viver só pra ele. E eu num era casada, eu só namorava com ele. (Alamanda)

Em alguns casos, as mulheres associaram as agressões ao uso de álcool e drogas e ao desemprego. Petúnia, Açucena e Orquídea relatam que os episódios violentos ocorriam mais durante os finais de semana, quando os companheiros

estavam em casa e invariavelmente haviam consumido álcool ou drogas. Pelos relatos fica claro como as mulheres se sentiam quando se aproximava o final de semana.

...mas a gente via que ele tava estranho, que é por isso que eu falo que, às vezes, eu acho que é a droga mesmo que tava levando ele a isso. (Petúnia)

Só quando tava bêbado. Quando tava sem bebida ele era ... era uma benção.[...] Normal, aí era só chegá bêbado aí começava a falar aqueles palavrão, se eu saía pra trabaiá que eu tava transando com outra pessoa, ih, nossa...[...] Só quando ele bebia. Só mais no final de semana. [...] Mais era à noite, né, bêbado, aí chegava do serviço, aí se eu ... tudo era motivo, se tivesse faltando um sabonete no banheiro, era motivo dele falá, fazê aquela falazada, chutar os trem, começá a quebrar, tudo era motivo. Se tivesse faltando um sabonete no banheiro era motivo dele começá aquela falazada. (Açucena)

A minha vida era chegá ... era ficá em casa, ele bebe no fim de semana, que ele trabalha, é muito trabalhador, sempre foi, mas chegava fim de semana eu tinha medo, da sexta- feira, eu detestava a sexta-feira, ele já chegava com uma garrafa de pinga na mão, bebia, bebeno, bebia sexta e sábado; domingo ele não bebe, segunda ele tem que trabalhar. (Orquídea)

O ciúme foi o motivo mais citado para as agressões verbais, ameaças e calúnias. Trata-se de uma forma de manter o poder sobre a mulher, que aceita a situação como natural, até com certo orgulho porque se sente desejada. As mulheres consideraram o ciúme o grande responsável pelas ameaças feitas a elas pelos companheiros.

Ciúme , esses negócio assim. [Tosse] [...] Desde quando a

gente se casou, num melhora mas acho que é da idade, ele é muito mais velho que eu, tem quarenta e sete anos e eu tenho trinta e dois. Acho que é isso...[...] porque se ficá importano muito cê acaba endoidando também. É ciúme... (Violeta)

Ah, assim igual eu tô te falando, ele é ciumento, ele é ciumento, já deu pra ... pra notar, é um pouco impaciente

também, intolerante, sabe, tem um gênero meio difícil.

(Verbena)

Outras situações que feriram a imagem de masculinidade dos homens foram apontadas como causas das agressões provocadas pelo companheiro:

Nossas... (hesitante) ...relações eram muito poucas, era

pouquíssimo. Primeiro ele... ele tinha ejaculação precoce e não assumia. Então acho que o transtorno dele, a tristeza dele era essa. E por mais que o cara sabe que tem que procurar um tratamento e tal, ele falava que eu era fria, aí a culpa era toda minha. [...] Então nós transávamos assim, uma vez de vez em quando. [...] Aí depois era péssimo. Ele cuspia na minha cara, eu que num prestava. É a forma dele fugi... (Madressilva)

O fato do homem ter vivenciado a violência na infância também foi apresentado como uma explicação para o comportamento violento na idade adulta.

... porque meu pai toda vida foi assim, violento, batia, a minha mãe apanhava direto perto da gente. Então ele presenciou muito isso, ele também já bateu muito no meu pai. Então ele é uma pessoa assim. Acho que foi falta de carinho que fez isso. [...] Então acho que veio de... de... disso, ele viu muito pai batê na minha mãe. (Malva)

As mulheres também relacionaram o fato do homem não ser servido como ele esperava como responsável por desencadear as agressões, evidenciando que eles esperam que as mulheres estejam disponíveis para servi-los e providenciar o que eles desejam.

Mais era à noite, bêbado, aí chegava do serviço, aí se eu.... tudo era motivo, se tivesse faltando um sabonete no banheiro, era motivo dele falá , fazê aquela falazada, chutar os trem, começá a quebrar, tudo era motivo. (Açucena) A iniciativa de romper a relação violenta só deixava o agressor mais irritado evidenciando as amarras da violência doméstica, onde a mulher se vê aprisionada numa relação violenta que pode significar risco à sua integridade física e emocional. Porém, romper esta situação pode significar um risco muito maior para as mulheres, que permanecem junto do agressor por medo de represálias mais violentas do que

aquelas já conhecidas. Alamanda e Zínia relataram as agressões e perseguições que sofreram porque decidiram romper com os companheiros agressores.

Aí, depois eu não voltei, não quis saber dele mais, eu tava com uma prima minha perto do Primeiro de Maio, ele chegou e me deixou pelada na rua. [...] ele chegou e rasgou a minha roupa todinha, todinha [...] e me deu uns bicudo lá...

(Alamanda)

Ele me ameaçava muito mesmo, tinha dia que eu chegava em casa e ele tava na porta do prédio onde eu morava. [...] Verbalmente, que ia me matar se eu não voltasse com ele, que... ou então ele ia suicidar, [...] Só que teve um dia que ele esperou alguém entrar no prédio pra entrar juntamente com a pessoa, subiu até meu apartamento [...] Ele entrou dentro da minha casa, quando eu tava no quarto, tranqüila, ele já foi chegando. Aí... e onde foi um terror ali porque ele falou que ia suicidar se eu não voltasse com ele. Que ia me matá e matava ele junto. (Zínia)