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Instituições internacionais e política redistributiva

3. O regime contestado (SQ1)

O equilíbrio no ponto SQ1, correspondente ao resultado (-A), é atingido quando é satisfeito algum dos três conjuntos de condições:

a2 – x > a1 + b > (a2 – b) - z (6) (a2 – b) – z > a1 + b; C > B; y > x (7) (a2 – b) – z > a1 + b; B > C (8)

Dessa forma, são três as possíveis distribuições dos valores dos parâmetros que permitem atingir-se o equilíbrio SQ1. De acordo com as condições expressas em (6), quanto mais baixos são os valores dos parâmetros “a1” e “x”, e mais alto o valor do parâmetro “z” (havendo ambigüidade com relação aos valores de “a2” e de “b”), mais alta é a probabilidade de que seja atingido o equilíbrio no ponto SQ1, caracterizado pela manutenção do status quo, a despeito da existência de regime internacional, a que o Estado decide não aderir. De acordo com (7), a probabilidade do equilíbrio em SQ1 aumenta quanto mais baixos são os valores de “a1”, “b”, “z”, “B” e “x”, e quanto mais altos os valores de “a2”, “C” e “y”. De acordo com (8), o equilíbrio em SQ1 é mais provável quanto mais baixos são os valores de “a1”, “b”, “z” e “C”, e quanto mais altos os valores de “a2” e “B”.

As condições descritas em (6) representam situação em que existe regime capaz de gerar custos significativos em caso de descumprimento das normas, ao mesmo tempo em que se verificaria baixa pressão sistêmica em prol da adesão ao regime – e, portanto, prevalência do equilíbrio doméstico original, caracterizado pela dominância da coalizão contrária à redistribuição. Este seria o caso típico de regimes que, embora possam apresentar estruturas normativas “profundas” e alto grau de legalização, apresentariam limitadas possibilidades de universalização, em função de algumas possíveis condições:

i)constituição do regime com vistas à oferta de bens públicos “regionais”; ii)percepção de problemas, no plano da legitimidade, no tocante à substância das normas ou ao funcionamento do regime – isto poderia ocorrer quando as normas consagradas no regime apresentam saliência doméstica para grupo limitado de países, possivelmente unidos pela presença de interesses comuns ou de base cultural comum (conforme as considerações da Escola Inglesa).

As condições expressas em (7) representam situação em que as condições domésticas são pouco favoráveis a pressões internacionais, uma vez que o processo decisório apresenta limitada permeabilidade a pressões (baixo “b”) e a coalizão “obstrucionista” prevalece no jogo político interno. O regime padeceria, ainda, de deficiências significativas, uma vez que seria baixa a capacidade de pressão sistêmica em prol da abertura ao sistema normativo internacional (baixo “x”), seria limitada a capacidade de imposição de custos em caso de descumprimento das normas (baixo “z”), e seria alto o custo associado ao exercício da ação coletiva (C > B). O regime se apresentaria, portanto, em descompasso tanto com a realidade estrutural do sistema internacional como com o equilíbrio político observado nas esferas nacionais.

As condições expressas em (8) apresentam elementos em comum com o equilíbrio retratado em (7), uma vez que novamente se trata de situação em que as condições domésticas são pouco favoráveis a pressões internacionais: o processo decisório apresenta limitada permeabilidade a pressões (baixo “b”), além de a coalizão “obstrucionista” prevalecer no jogo político interno. A diferença observada seria a presença de baixo custo de exercício da ação coletiva (B > C), o que, no entanto, seria contrabalançado pela baixa capacidade de imposição de custos em caso de descumprimento das normas (baixo “z”), a exemplo do caso anterior.

De maneira geral, o equilíbrio SQ1 representa a situação de regimes que apresentam baixa capacidade de pressão sobre jogos políticos domésticos, seja no tocante à atração de Estados para a órbita de seus sistemas normativos (parâmetro “x”), seja no tocante à capacidade de imposição de custos em caso de descumprimento de normas (parâmetro “z”). O equilíbrio reflete, ademais, a realidade de Estados cujo processo decisório ainda apresenta baixa permeabilidade aos canais de influência e de pressão da

comunidade internacional. Os sistemas normativos cobertos por SQ1 constituem, nesse sentido, regimes “contestados”, cujos funcionamento e eficácia apresentam claras limitações.

O modelo apresentado pode aplicar-se a cenário específico de manifestação da pobreza em países de renda média, com sistemas políticos democráticos e sociedades desiguais, nos quais a incidência de pobreza não decorre de insuficiência de recursos, antes emanando de equilíbrio político alcançado que dificulta a condução de políticas redistributivas, no âmbito doméstico, favoráveis aos interesses de grupos socialmente vulneráveis. Ao mesmo tempo, procura captar dificuldades subjacentes à implementação de políticas redistributivas em países desenvolvidos, caracterizados pela presença de níveis elevados de renda per capita, de sistemas democráticos consolidados e de níveis limitados de desigualdade de renda e de riqueza. Neste tipo de sociedade, o modelo apresentado poderia apresentar interesse particular para o estudo do que se poderia denominar “economia política” da ajuda oficial ao desenvolvimento: a relação entre pressão internacional e a configuração de equilíbrios domésticos que viabilizam iniciativas ambiciosas, destinadas à transferências de recursos internos com vistas a beneficiar projetos de combate à pobreza em países em desenvolvimento.

Neste contexto, os próximos capítulos serão dedicados ao estudo de casos relativos à “economia política” da redistribuição, baseados no arcabouço teórico desenvolvido neste capítulo, que enfatiza os canais de transmissão entre o sistema normativo internacional e processos decisórios internos. Serão apresentados dois casos que têm por referência o ambiente econômico e social de países em desenvolvimento – o impacto de normas e instituições internacionais sobre a implementação de políticas de combate à fome e ao racismo no Brasil -, e um estudo de caso centrado na realidade de países desenvolvidos – o impacto de instituições internacionais sobre a implementação de políticas de ajuda ao desenvolvimento no Reino Unido.

CAPÍTULO 5

Política doméstica e assistência ao desenvolvimento: