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1 Introdução

2.5 Evolução da paisagem florestal em Portugal continental

2.5.5 A política florestal no século XX

2.5.5.1 O Regime Florestal

A instituição do Regime Florestal17 em 1901, ao legitimar a intervenção estatal em áreas baldias18, terá contribuído igualmente para um aumento da área florestal no território português, embora, como refere Mendes & Fernandes (2007, p: 93), consagre “o abandono do

instrumento de expansão da propriedade florestal pública em benefício do «comando e controlo» da administração pública” nas áreas privadas e públicas. Com a sua criação foi

definido o quadro jurídico de intervenção da Administração Pública nos espaços florestais (Vieira, 2000a: p. 22).

Mendes & Fernandes (2007: p. 95) referem que em 1931 se encontrava submetida ao Regime Florestal uma área de cerca de 400 000 ha, sendo em 1973 já de 1 419 000 ha.

Em 1922 encontravam-se “arborizados cerca de 10 000 ha de baldios serranos” (Mendonça, 1961: p. 28). Com o fracasso da campanha do trigo implementada em 1927 e 1928, o Estado inflectiu na sua estratégia, entregando os terrenos comunitários aos Serviços Florestais para arborização. “A área florestal aumenta 19% dos começos do século XX até aos finais da década

de 1920” (Devy-Vareta, 2005a: p. 129).

Com a aprovação em 1938 da Lei do Povoamento Florestal (Lei nº 1971 de 15 de Junho), também conhecida por Lei dos Baldios, pretendia-se, entre outros objectivos, para um período de 30 anos, a arborização de 420 000 ha (315 000 ha de sementeira e 105 000 ha de

17 O Regime Florestal diz-se total, se aplicado a propriedades do Estado, ou parcial, se aplicado a propriedades de câmaras

municipais, juntas de freguesia, associações ou de particulares. O regime parcial pode ser obrigatório, para as propriedades das autarquias locais e outras instituições, ou facultativo para as propriedades privadas, podendo ser de simples polícia quando as obrigações de conservação e arborização são mínimas. O regime florestal de simples polícia, relativo à propriedade privada, estava mais ligado às questões cinegéticas e à fiscalização da sua usufruição, tendo maior representatividade nos distritos com predomínio da grande propriedade.

18 O direito romano instituiu o estatuto de propriedade plena, privada, embora não se tenha alargado a todo o território pois

mantiveram-se áreas onde se mantinha o direito comunitário céltico sob a forma de livre pastoreio ou de baldio, cujos restos terão chegado ao século XIX (Caldas, 1991: pp. 30-31)

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plantação), a instalação de 60 200 ha de pastagens e a constituição de 33 500 ha de reservas naturais (Gomes & Quaresma, 1988: p.1; Radich & Alves, 2000: p. 138; Radich & Baptista, 2005: p.147; Mendes & Fernandes, 2007: p. 101). Neste Plano é, para alguns autores, já apontada a intenção de criar um grande Parque Nacional (Radich & Alves, 2000: p. 142; Rego, 2001: p. 55), o que viria mais tarde a ser concretizado com a criação do Parque Nacional da Peneda-Gerês.

Após a aprovação daquele diploma apenas foram plantados 15 054 ha nos terrenos baldios19 do Norte e Centro do País até 1943 (Gomes & Quaresma, 1988: p.1). Refere Devy-Vareta (1993: p. 174) que só no segundo semestre de 1944 foram submetidos ao regime florestal um pouco mais de um quarto de todas as áreas baldias serranas em Portugal Continental (123 825 ha). Ainda segundo esta autora, os Serviços Florestais do Estado já administravam em 1958 cerca de 430 000 ha de baldios nas serras, tendo sido, segundo Vieira (2000b), arborizados 175 270 ha no período de 1939-1960. Até aos anos 50 o aumento da área agrícola e da área florestal levou à redução dos incultos.

Os anos 50 constituíram um ponto de viragem. O período de 1956 a 1964 corresponde aos anos em que mais se florestou nas serras (Devy-Vareta, 2005a: p. 130), sendo a área arborizada em 1970 de 270 000 ha (Radich & Alves, 2000: p. 139), e em 1972 de 297 641 ha nas serras e 8255 ha nas dunas (Mendes & Fernandes, 2007: p. 101), o que constituía pouco mais de metade da área inicialmente prevista. A espécie mais largamente utilizada foi o Pinheiro-bravo. De referir ainda o grande esforço desenvolvido na criação de uma rede viária fundamental para a exploração económica e defesa dos povoamentos florestais.

Em 1978, segundo estatísticas fornecidas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), a área florestal submetida ao regime florestal totalizava 1 373 891 ha, representando cerca de 46,5% da área florestal do território continental.

Caldas (1978: p. 69) considera que, independentemente dos méritos técnicos, o Plano de Povoamento Florestal constituiu-se como um instrumento de agressão ao baldio das montanhas sendo um desastre social. Este estigma ainda é hoje perceptível na sociedade rural, particularmente no Norte e Centro do País, e mesmo ao nível político onde recorrentemente se faz alusão à prepotência do Estado sentida na época pelas populações.

19 Baldios são os terrenos possuídos e geridos por comunidades locais, constituídas pelo conjunto dos compartes, e que

constituem normalmente um logradouro comum para efeitos de apascentação de gados, recolha de lenhas ou de matos ou de outras actividades de natureza agrícola, florestal, silvopastoril ou apícola. Os compartes são os moradores de uma ou mais freguesia ou de parte delas que, de acordo com os usos e costumes, terão direito ao uso e fruição do baldio.

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Para Baptista & Santos (2005: p. 53) o seu lançamento consagra “uma silvicultura em que a

preocupação produtiva já se havia sobreposto aos temas ambientais”. Este processo de

arborização poderá, segundo Mendes & Fernandes (2007: p. 101), ter contribuído para acelerar o processo de êxodo rural e aumentar a vulnerabilidade dos espaços florestais instalados para com os incêndios florestais dado que metade da área foi arborizada com Pinheiro-bravo.

Baptista & Santos (2005: p. 1) consideram que os anos 60 do século XX marcaram o declínio da complementaridade que existia na utilização das matas, na medida em que, “sendo parte

integrante dos sistemas agrários e dos modos de vida dos lugares e aldeias”, forneciam

madeira para as habitações e dependências agrícolas, resina e pinha, lenha para aquecimento e lumes domésticos e onde era obtido estrume pela roça dos matos.

Figura 2.4 – Distribuição das principais espécies em Portugal Continental (Fontes: Devy-Vareta, 1999; Radich & Alves, 2000; Mendes, 2004; Mendes, 2007; AFN, 2010; ICNF, 2013a)

De uma forma sintética Radich & Alves (2000: p. 116) consideram três momentos essenciais na evolução da paisagem: o alastramento do Pinheiro-bravo (até à década de 70 do século XX), a alteração da forma de exploração do Sobreiro a partir do século XVIII e a expansão do Eucalipto desde meados do século XX (Figura 2.4). Esta expansão incidiu mais nas áreas de pinheiro e de folhosas mediterrâneas, com um maior peso no Alto Alentejo e distrito de Castelo Branco (Devy-Vareta, 1999: p. 62). Nos finais do século XX registou-se um decréscimo acentuado e contínuo da área de Pinheiro-bravo e um aumento da área de Eucalipto.

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