• Nenhum resultado encontrado

4.1 A AMAZÔNIA BRASILEIRA: ASPECTOS GERAIS

4.1.2 O regime militar (1964-1984)

A ocupação da Amazônia se torna prioridade máxima com o Golpe de 1964. Para Becker (2005), entre 1960-1980, a região foi alvo de um projeto nacional de desenvolvimento aliado ao capital internacional. O objetivo do governo brasileiro, apoiado na doutrina da segurança nacional, era a implantação de um projeto de modernização.

O interesse brasileiro em assegurar sua presença na região surgiu a partir de alguns fatores como a vulnerabilidade em relação ao tamanho da extensa área, a organização de focos revolucionários e o dinamismo interno de países vizinhos que, apesar de menos industrializados, possuíam seus investimentos nas suas Amazônias. Dessa forma, o governo passou a incentivar e subsidiar a ocupação das terras.

Silva (2004) considera que se iniciou a era dos chamados “grandes projetos” governamentais para a Amazônia tais como o Projeto Radar da Amazônia (RADAM); a Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM); a Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA) e o Banco da Amazônia (BASA). Todos esses projetos foram elaborados de acordo com as diretrizes da Doutrina de Segurança Nacional cujo o slogan era “integrar para não entregar”.

O Estado criou e acompanhou vários programas para a região em conformidade com o capital, através de um projeto de expansão articulado. Vários incentivos fiscais possibilitaram a transferência dos grupos econômicos para a região. Nesse sentido, o projeto SUDAM beneficiou o grande capital; já os pequenos produtores do extrativismo e da agropecuária não receberam esse benefício. O autor explica que os incentivos oferecidos pelo Estado geraram a concentração de renda, o empobrecimento das massas e a expropriação da terra dos indígenas e dos posseiros (PICOLI, 2006).

Os novos protagonistas do processo de (des)envolvimento regional eram os gestores territoriais civis e militares, o grande capital nacional e internacional. “As elites tradicionais da região, sobretudo as ligadas ao extrativismo, ficam marginalizadas” (GONÇALVES, 2005, p.95).

Embora tenham se iniciado na década de 1950, as construções de estradas, ligando a Amazônia ao resto do país, aumentaram no período militar. Em 1965, teve início a construção da BR-364 (Cuiabá-Porto Velho) e, em 1967, foram realizadas melhorias na BR-010 (Belém- Brasília), tendo sido asfaltada a partir de 1969. Em 1970, foi criado o Plano de Integração Nacional (PIN) que viabilizou a Transamazônica (BR-230) e a Cuibá-Santarém (BR-163) (MEIRELLES FILHO apud SILVA, 2004). Gonçalves (2005) ressalta que as estradas são construídas por grandes empresas, intimamente ligadas aos militares na construção do “Brasil- Grande”.

As estradas federais serviram de propaganda para o governo atrair empresas e pessoas para a região, bem como sinônimo de estrutura. Figuram-se como os corredores mais importantes as rodovias Cuiabá-Santarém, Cuiabá-Porto Velho, Belém-Brasília e Transamazônica. Estes são exemplos de integração proporcionados pelo Estado para a abertura dessa vasta região. Além dos esforços do governo da ditadura para contribuir com o já avançado processo de destruição, países centrais com interesse capitalista foram oportunos e decisivos no tocante à devastação e ao enxugamento das riquezas naturais da região (PICOLI, 2006, p.49).

As estradas foram planejadas para o estabelecimento de áreas de atividades econômicas na forma dos chamados “corredores do desenvolvimento”, mas que sua construção foi responsável por vários impactos ambientais. As bases legais, estipuladas para estabelecer a colonização estatal, seguiram as projeções do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), mas o número de assentados foi muito menor do que havia sido previsto. Além disso, a colonização agrícola, ao longo da Transamazônica, fracassou uma vez que as condições ecológicas não foram respeitadas (KOHLEPP, 2002).

Os projetos de colonização promovidos pelo Estado, que contaram também com o apoio de empresas de colonização privadas, tiveram o intuito de atender ao capital, com a produção de produtos agropecuários, formando a mão-de-obra para servir as cidades recém-criadas. O governo distribuiu as terras, porém não ofereceu aos colonos as condições mínimas de torná-la produtiva. “O Incra transformou-se em órgão a serviço da classe dominante como instrumento de manobra para a realização dos objetivos políticos e econômicos da burguesia” (PICOLI, 2006, p. 61).

A nova fase de modernização esteve apoiada no grande capital e os novos protagonistas dessa fase não são as velhas elites dominantes. Tanto isso é verdade que a criação da SUFRAMA coincide com a criação do Comando Militar da Amazônia, no contexto que foi extinto o Banco de Crédito da Amazônia cuja função era oferecer subsídios aos velhos seringalistas. Gonçalves (2005) lembra o caso do Probor, programa do governo federal que incentivava o “cultivo racional da borracha” e estimulava as empresas rurais, acabou investindo mais em São Paulo, Bahia e Mato Grosso do que na Amazônia.

As construções de estradas e hidrelétricas estimularam as correntes migratórias para a região amazônica, incentivadas pelo governo federal. Muitos migrantes saíram do Nordeste para trabalhar nessas obras. Porém, quando essas construções terminaram, vários operários optaram pelo garimpo, como uma opção de sobrevivência (GONÇALVES, 2005; SILVA, 2004).

A partir de 1974, os incentivos ficais da SUDAM voltaram-se para a pecuária extensiva a exploração mineral da Amazônia. Com a atividade pecuária, muitas florestas foram substituídas por pastagens, gerando impactos ambientais. A criação do Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (POLAMAZÔNIA) teve o objetivo de promover as potencialidades agropecuárias, agro-industriais, florestais e minerais em áreas prioritárias da Amazônia (SILVA, 2003). Atualmente, a floresta também tem sido devastada devido à plantação de soja.

Com relação à exploração de minérios, na época divulgou-se que os minerais da região serviriam para pagar a dívida externa e, muitos migraram em busca dessas novas riquezas. O garimpo de Serra Pelada é um caso emblemático. O governo também lançou o Programa Grande Carajás (PGC), na região da Amazônia Oriental, devido ao potencial de minerais como bauxita, ferro, ouro, manganês, caulim, cobre, salgema, areia e argila. Carajás foi um importante instrumento de ocupação regional e, para Silva (2003), esse projeto subordinou o

desenvolvimento sustentável aos interesses capitalistas que não tinham compromisso com a região.

Kohlhepp (2002) considera que o governo brasileiro, no auge do “milagre econômico” incentivou a exploração econômica setorial e a quase distribuição territorial ilimitada da periferia da Amazônia. Nesse contexto, o foco central da estratégia de desenvolvimento passou para o capital privado. A explicação oficial para essa decisão foi a primeira crise do petróleo cujos efeitos forçaram o Brasil a cancelar investimentos em decorrência dos elevados gastos para importação de petróleo. O governo passou a promover concessões tributárias e outros benefícios para que os grandes empresários investissem na região. Assim, “tornou-se vantajoso [...] investir na devastação da floresta tropical para introduzir grandes projetos de criação de gado, com subsídios oficiais, realizando a exploração das terras a preços baixos” (KOHLHEPP, 2002, p.39).

O Estado, através da doutrina de ocupação dos espaços vazios, transferiu grande parte das terras da região para os grandes conglomerados nacionais e internacionais. Representativo dessa questão é o caso de Tucuruí que desapropriou várias famílias, em grande parte proprietários rurais, posseiros, castanheiros. “Tucuruí, com um lago de 2.430 km2, que desapropriou 4.300 famílias [...]; destas 1.000 famílias foram `remanejadas´ para os vilarejos e para a `cidade planejada´, 1.800 para as áreas rurais e 1.500 famílias ficaram desabrigadas” (KOWARICK apud PICOLI, 2006).

Portanto, é no regime militar que se iniciou o planejamento regional da Amazônia. Esse planejamento revelou a emergência de novos grupos econômicos aliados ao capital internacional. Nesse momento grandes projetos foram idealizados, integrando uma perspectiva mais ampla de modernização nacional.

A fase posterior do desenvolvimento brasileiro implicou uma nova forma de tratamento da Amazônia, marcada por políticas públicas de integração do desenvolvimento econômico com a conservação dos recursos naturais, apoiada no discurso da sustentabilidade.