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O(S) DISCURSO(S) ANARQUISTA E SOCIALISTA EM RELAÇÃO

AO(S) CUIDADO(S) DE HIGIENE EM PORTO ALEGRE (1900-1910)

Eduardo da Silva Soares1

Glaucia Vieira Ramos Konrad (UFSM)2

Resumo:

Anarquistas e socialistas matem

elaborações teóricas sobre a sociedade e o seu futuro. Pontuam elementos que

qualificam a má condição dos

trabalhadores em oposição à situação dos

burgueses. Então surgem as

preocupações em relação às doenças, saúde e capacidade de trabalho em seus escritos. Tais pensamentos são elencados em seus jornais e transmitidos com as suas valorizações para o(s) seu(s)

público(s). Logo, é determinante

vislumbrar quais as propostas abordadas em relação ao bem estar físico e mental como também sobre outros tipos de doenças, tais como a tuberculose. Para isso, a leitura dos periódicos é contrastada com a bibliografia existente deste movimento operário, das ideologias anarquistas e socialistas e da história da saúde. Nesta produção encontra-se um universo de constatações e observações a

respeito do(s) imaginário(s)

caracterizados por linhas criticas que

objetivam a construção de uma

consciência de classe, a qual fomenta e organiza a luta de classes protagonizada por estes trabalhadores.

Palavras-chave: Movimento Operário;

Anarquistas e Socialistas; História da Saúde.

Abstract:

Anarchists and socialists keeps theoretical elaborations about the company and its future. Punctuate elements that qualify the poor condition of workers as opposed to the situation of the bourgeois. Then

come the concerns about diseases, health and ability to work in his writings. Such thoughts are listed in their newspapers and transmitted with its comments to the (s) is (s) audience (s). Therefore, it is

crucial glimpse which proposals

addressed in relation to the physical and mental well being as well as other types of diseases, such as tuberculosis. For this, the reading of journals is contrasted with the existing literature of this labor

movement, anarchist and socialist

ideologies and health history. In this production is a universe of findings and observations about (s) Fantasy (s) characterized by critical lines that aim to build a class consciousness, which promotes and organizes the class struggle carried by these workers.

Keywords: Labour Movement;

Anarchists and Socialists; History of Health.

INTRODUÇÃO

No ano de 1907, o periódico libertário A Luta de Porto Alegre publica a reflexão sobre a doença tuberculose e a sua relação com a miséria. Percebem-se então alguns fatores que levam grupos de militância política a refletirem sobre as condições de higiene, economia doméstica e de moradia entre os “populares”. Na verdade, a partir da leitura de um jornal designado Voix du Peuple, da Suiça, é constatado que morrem na Hungria cerca de 140.000 pessoas, anualmente, de tuberculose, e destes, a imensa maioria pertence à classe trabalhadora (A LUTA, 3 de fevereiro de 1907, p. 1).

Aqui há o elo que conecta os interesses dos anarquistas com os assuntos relativos à saúde pública. No caso, a morte de tantos trabalhadores que sofrem com a situação das fábricas, dos cortiços e

1Mestrando em História (UFSM)/ CAPES. eduardosoares@rocketma il.com 2 Professora de História do Programa de Pós- Graduação em História da Universidade Federal de Santa Maria 1 Mestrando em História (UFMS)/CAPES. E-mail: eduardosoares@rocketma il.com 2 Professora de História do Programa de Pós- Graduação em História da Universidade Federal de Santa Maria.

35 da ausência de saneamento. Os

discursos dos editores dos jornais cruzam com o cientificismo vigente entre os médicos do período. Logo, algumas motivações para tantas mortes, e de operários, são levantadas a partir de três grandes eixos de problemas a serem tratados. São eles: 1) mau arejamento; 2) nutrição insuficiente; e 3) o alcoolismo (A LUTA, 3 de fevereiro de 1907, p. 1).

Ao pensar que a saúde é assunto que aparece nos jornais, tem-se então, a compreensão de que este é um elemento que compõe as preocupações sociais da época, e que é primordial para a análise das relações que pessoas interessadas em discursos dotados de ideologia possuem em consideração ao tratar do corpo. Para isso, é necessário verificar quais as condições materiais existentes na cidade de Porto Alegre do início do século XX e cruzá-las com os pronunciamentos publicados no periódico A Luta (anarquista) e A Democracia (socialista).

Logo surgem alguns

questionamentos, afinal, quais as

doenças, ameaças vitais e

posicionamentos em relação ao tratamento, prevenção e trato dado por parte dos agentes do Estado tidos por estes anarquistas e socialistas? Deste modo, o artigo articula-se em dois capítulos, onde no primeiro são observadas as condições e no segundo os seus discursos conforme a realidade por eles apresentada e (re)valorizada.

PORTO ALEGRE, TRABALHO E

HIGIENE

Porto Alegre está crescendo e se desenvolvendo economicamente. As fábricas são abertas com

operários oriundos de diversas localidades. No espaço fabril, os trabalhadores devem (com)portar-se conforme um jogo de normas sociais que determinam fronteiras em relação à saúde pública e privada. Entende-se então, público como o espaço da rua e de contato(s) entre as pessoas e como privado, a casa

em seu âmbito doméstico e

individual, em síntese, do corpo. Identificar os componentes e sua posição social é extremamente relevante para a verificação da prevenção e salubridade dos espaços ocupados. Logo, Isabel Bilhão (1999) (2005) aponta que a identidade operária é traçada dentro da valoração do trabalho. Assim, os operários são os construtores de toda riqueza existente, e em Porto Alegre

é possível evidenciar tais

características dadas ao conceito de trabalho a partir dos periódicos anarquista e socialista, sendo o primeiro representando A Luta e os segundos no A Democracia.

A exploração na jornada de trabalho é outra característica essencial para a compreensão de “quem são estes anarquistas e socialistas”. Estes, dizem-se representantes do proletariado. Discordam em alguns aspectos e concordam em outros. Logo, é possível perceber as rivalidades e solidariedades existentes neste movimento operário. Neste sentido, há a disputa pela liderança da Federação Operária do Rio Grande do Sul (FORGS), eventos em benefício a um trabalhador enfermo ou em prol de alguma sociedade operária.

A dominação no ambiente de trabalho é crucial para o tipo de relação que estes anarquistas e

36 socialistas traçam entre as classes

sociais. Sandra Pesavento (1988) (1992) aponta que os burgueses tramam uma série de elementos que dão conta de disciplinar os trabalhadores. Então, é possível perceber que a presença do patronato está para além da fábrica, colaborando para associações mutualista onde também se fazem presentes, costumeiramente como presidentes.

Há ainda escolas para as crianças dos operários, as quais fecham em períodos de greves e mantém algum “capataz” para atentar aos ensinamentos ofertados às crianças. Estes fatos são denunciados pelos libertários. E mais, eles mantém uma circulação de ideias que preenchem a luta de classes por diversas localidades. Em Porto Alegre não é diferente, e Caroline Poletto (2011) aprofunda esta questão apontando que a preocupação não é apenas a de informar, mas também de instruir os trabalhadores a partir de textos e imagens.

A iconografia é repleta de componentes que contrastam a realidade social com o projeto de sociedade defendida. Portanto, estas reflexões giram de cidade para cidade, de grupo para grupo e de pessoa para pessoa. A fé é apontada como um problema moral, e a religiosidade como a principal destruidora da capacidade humana de racionalizar e utilizar da lógica na vida e nas relações de poder entre os burgueses e o proletariado.

A capacidade de compra, alimentação, vestimenta e moradia são fatores que apontam mais que

status, mas também as

probabilidades de uma vida saudável e de boas expectativas enquanto ao corpo e trabalho. Silva (2010) ao abordar sobre as condições de

habitação e alimentação do

operariado contribui para a hipótese de que a luta das agremiações operárias não visam apenas à melhoria econômica por si, mas sim, através e a partir dela a possibilidade de emancipação intelectual, bem- estar físico e mental.

Estas preocupações consistem em identificar o tipo de experiência que estes operários possuem. Assim, as relações ligadas ao espaço são tratadas a partir das reflexões que englobam “a distribuição desigual de recursos materiais na sociedade” a

qual fomenta e torna os

trabalhadores um grupo muito vulnerável às incertezas da vida, a resposta a isso é a constituição de redes comunitárias, a formação de identidades locais, envolvendo relações familiares e de vizinhança. Ainda dentro desta lógica, a questão da experiência e métodos envolve o desenvolvimento de inúmeras estratégias de sobrevivência, que o historiador não deve olvidar em nome de uma suposta primazia conferida às lutas desenvolvidas nos locais de trabalho (BATALHA, SILVA, FORTES, 2004: p. 14).

O cotidiano destes operários é de trabalho intenso, ou em outras palavras, de exploração excessiva. O trabalhador até 1906 passa mais de 10 horas por dia na fábrica. A jornada é intensa, conforme é perceptível nas páginas dos periódicos aqui problematizados. Em 1906 há a greve que diminui a jornada de trabalho para 9 horas. Fato este que não significa que todas

37 classes concordam, dito isto entre os

trabalhadores.

Afim de exemplificar, utiliza- se da publicação de um artigo dos socialistas a respeito de “o que é o trabalho”, o qual acaba apresentando um pouco de o que entendem como exploração. Expõem, então que

Um pão é pois a soma da qual são parcelas o suor derramado pelo homem que prepara a terra, planta, cuida e faz a sega; do trabalho de outro que à sociedade forneceu pela inteligência maquinas para o fabrico da farinha; do padeiro que perdem a noite em amassar a farinha, e ainda, do entregador que contribui para a nossa vida, sem falarmos na Natureza que fez crescer a planta. Por tanto, para que em nossa mesa possamos saborear esse pão sem sentirmos o sangue subir às nossas faces é preciso que derramemos o nosso suor, é preciso que trabalhemos.

Todos os que assim não fazem, todos os mais que não trabalham, não passou de exploradores dos seus irmãos, que vivem sem produzir e que são portanto indignos (A DEMOCRACIA, 21 de julho de 1907, p. 4).

A partir do exemplo do pão, que é alimento básico, os socialistas apontam outra série de elementos que podem ser cruzados com as reflexões levantadas por K. Marx. Porém, este texto não cita o seu

nome. Mas a natureza dos

pensamentos são pontos levantados pelo movimento socialista do mundo inteiro. Em outras palavras, os socialistas apresentam a realidade com pessimismo, quando:

Como é triste ser pobre nesta terra! E dizer-se que esta é a sorte, que isto é, em regra geral, o que acontece ao proletário, a este que labora de sol a sol, mal alimentado,

doente, às vezes, e que, produzindo muito, embora, não ganha, se quer, o necessário para poder colocar-se a coberto da miséria! (A DEMOCRACIA, 14 de maio de 1905, p. 1).

Identifica-se então que os pronunciamentos são negativos em relação à condição geral dos trabalhadores porto-alegrenses. As péssimas condições e a intensidade do trabalho facilitam que os operários adquiram doenças de vários tipos. Muitas vezes o lugar de trabalho é tido como insalubre por não ter boa circulação de ar e entrada de luz solar.

É interessante aqui também observar, por que revelador deste aspecto de extrema exploração do operário pelo capital, que a introdução das máquinas (da tecnologia) em nada veio a reduzir a jornada deste trabalhador, já que a exploração do mesmo continuou se dando através do que Marx chama de “mais valia absoluta” (pelo extensão das horas trabalhadas) e não pela “mais valia relativa” (pela intensificação do trabalho em um menor tempo) (ARAVANIS, 2005: 60).

A situação é que os operários tem jornada de 10 a 12 horas diária. As mudanças iniciam em 1906 após a greve que paralisa as atividades da cidade. Desta batalha há a aprovação da diminuição para 9 horas por dia. O que é uma vitória de um lado, acarreta outras pressões pelo outro. Alguns operários são demitidos, outros sofrem ameaças e aos poucos a vida cotidiana retoma a sua normalidade.

As demissões são arbitrárias, e a insegurança é alvo de uma iniciativa dentro do acordo que finda

38 a citada greve, porém, é possível

encontrar algumas denúncias nos periódicos supramencionados. Assim, encontram-se nas crônicas e artigos outros tipos de elementos, os quais apontam o inverno e a situação de subsistência como fatores que resultam na baixa imunidade das pessoas. Deste modo, a exploração no trabalho é o acréscimo desta realidade por eles apresentada, onde os operários estão à mercê de todas as mazelas sociais.

Além disso, os acidentes de trabalho também amedrontam o cotidiano dos operários. Na lógica do período, os operários possuem apenas “os braços” para vender no mercado de trabalho, logo, se ficam inaptos, não conseguem levar o sustento para casa. Neste contexto, cuidar do corpo e da saúde é armar- se para a luta de classes.

DOENÇAS, PREVENÇÕES E O