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O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Correntina

Foto 10 – Aniversário de 2 anos da agricultura familiar

2.4 O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Correntina

Como já exposto, será na década de 1960 que ocorrerá a fundação em “massa” de STRs no Brasil. Se em outras localidades, sobretudo Pernambuco e Paraíba, já haviam sindicatos criados que datassem desse período, seja pela influência da Igreja Católica ou do Partido Comunista, será apenas em 1980 que o STR de Correntina será criado. Se levarmos em consideração que a construção dos sindicatos em 1960 estavam associados às lutas travadas contra a ameaça às terras camponesas pelo cultivo da cana-de-açúcar, é justificada a criação “tardia” do STR em Correntina, sobretudo porque é no período de 1980 que os conflitos com as empresas reflorestadoras se intensificam, assim o STR é criado para dar respostas ao quadro conflituoso oriundo das grilagens que se estabelecera naquele período no município.

A construção do STR, assim, contará com esforços de Padre André e, também, de Wilson Furtado. De acordo com uma informação recolhida posterior ao trabalho de campo, Padre André terá mais influência na fundação do Sindicato do que Wilson. A partir da análise desenvolvida por Novaes (1997), talvez possamos afirmar que o próprio acúmulo do “trabalho de base” desenvolvido por Padre André desde a sua designação para Correntina, seja responsável pela sua construção enquanto autoridade moral legítima, o que o torna a pessoa mais influente na cidade.

Após à construção do STR, Wilson Furtado será o responsável pela criação do Jornal “A Foice”, que se tornará uma importante ferramenta de denúncia contra as grilagens, além de contribuir para a formação política dos trabalhadores rurais acerca de seus direitos e da consciência de classe. As edições do jornal publicavam os informativos das comunidades rurais e seus problemas específicos, fazia o balanço da quantidade de associados e o trabalho realizado pelo sindicato, como reuniões, assistência a trabalhadores e orientação jurídica.

47 Nacionalmente, a Igreja estreita os laços com o Governo de Getúlio Vargas e, já na década de 1960, a CNBB lança um documento oficial em apoio ao golpe militar de 1964.

Através da análise de alguns exemplares do Jornal “A Foice”, pode-se dizer que existia uma parceria entre a direção do STR com os agentes religiosos na figura da CPT, que foi estruturada formalmente em 1980 no município de Bom Jesus da Lapa (SOBRINHO, 2012)

Figura 4 – Jornal “A Foice”, Ano I, nº 11, p. 2, fevereiro, 1981. Fonte: Centro de Pesquisa e documentação Vergueiro.

Na figura 4, em trecho específico, o jornal publicou o balanço de reuniões realizadas nas comunidades rurais junto à CPT, onde trataram questões relacionadas à sindicalização e o problema das grilagens. Já na figura 5, em outra edição, do ano de 1980, o jornal destaca uma atividade realizada no mês de dezembro que incluíram falações de Wilson Furtado e de Padre André, o primeiro relatou os acontecimentos recentes no município e o segundo, abordou o trabalho das comunidades de base.

A partir da fala de Padre André, o jornal afirma o “quanto é importante participar todos nós das Comunidades de Base, pois só assim podemos melhorar a nossa vida...”. Observa- se, então, que embora a presidência do sindicato seja ocupada por Wilson, um dos quadros do Partido Comunista, a influência da Igreja se mantêm muito forte entre os trabalhadores também via sindicato. Em entrevista, Dulce descreve um pouco do trabalho de assistência tanto da Igreja quanto do Sindicato:

Então a paróquia criou esse sindicato pra dar um aparato né. E muitos conflitos foram acentuando mas ai acabou tendo assim: o sindicato acompanhava mais as áreas de conflitos nos gerais e a pastoral acompanhava mais essa questão da organização comunitária (Entrevista concedida durante trabalho de campo, Correntina – BA, Ago. 2019).

Isso não quer dizer, porém, que a “parceria” entre Padre André e Wilson tenha se dado sempre de maneira consensual, como vimos anteriormente, a disputa ideológica estava colocada da igreja com demais mediadores. Houve, inclusive, uma informação de que teria ocorrido um “racha” entre ambos posteriormente por divergências político-ideológicas.

A atuação do STR de Correntina, eleva, dessa maneira, a organização dos trabalhadores rurais e de camponeses, possibilitando o desenvolvimento de condições subjetivas não só para o entendimento dos processos que acometiam a região do Oeste Baiano, mas também de como organizar as ações para frear o avanço das grilagens. Em 1983, o sindicato contava com 1.750 associados, em 1984, um ano depois de sua fundação, contava com 2.200 associados. O jornal publicava em todas as edições a importância de seus associados manterem e estarem com suas contribuições em dia, além de participar da construção do próprio jornal e enviar matérias sobre suas comunidades rurais.

Figura 6 – Jornal “A foice”, Ano VI, nº 23, 1987. Fonte: Centro de Pesquisa e Documentação Vergueiro.

Figura 7 – Jornal “A foice”, Ano, nº, 198. Fonte: Centro de Documentação e Pesquisa Vergueiro.

As edições do jornal traziam, constantemente, questionamentos a respeito de datas históricas (como o 1º de Maio) e do significado do Sindicato para os trabalhadores, esse papel de conscientização realizado pelo Jornal do Sindicato, pode-se dizer, foi um dos instrumentos importantes nesse período, e, provavelmente, proprocionará maior condição de resistência, enfrentamentos à ordem vigente e pensamento crítico sobre os processos, qualidades que tornarão o município de Correntina em uma realidade sui generis.

Na direção do STR de Correntina, Wilson Furtado se destacará significativamente como uma das maiores lideranças sindicais da Bahia, o que lhe proporcionará reconhecimento político e a ocupação da secretaria-geral da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAG-BA), no período de 1998 a 2002.

Também é importante destacar a construção do Centro de Treinamento de Líderes em Correntina em 1991, com a ajuda de um amigo de Padre André. O CTL tinha como objetivo a formação e capacitação de lideranças paroquiais e diocesanas para atuarem nas atividades da Igreja. Outra ferramenta criada e que diz respeito à formação política, pelo domínio da Igreja, é a Rádio Carícia. Criada em 1998 pela paróquia, surge com o intuito de divulgar os feitos da comunidade paroquial, além de conscientizar e de denunciar situações através do programa de jornalismo debate Acorda Cidadão, que através dos debates políticos e de formação, “preenchia a lacuna”, no sentido daquilo que a igreja já não mais conseguia fazer, como a assistência mais cotidiana às comunidades. O papel exercido pela rádio era o de fomentar debates políticos e de formular questionamentos que levasse os ouvintes a refletirem criticamente sobre as situações que ocorriam, como os próprios conflitos socioambientais que estavam colocados.