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CAPÍTULO III AS MIGRAÇÕES NA HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA

2. O SISTEMA EUROPEU

Na Europa viveram-se diferentes experiências no que concerne às migrações no Século XX. Pode dizer-se que, já neste Século, tende a aproximar-se dos países re- cetores tradicionais como os que compõem o sistema norte-americano, ou como a Austrália, em especial se observarmos os números referentes à Europa ocidental e à quase duplicação da população imigrante na Europa do Sul entre 1995 e 2005 (quadro 3.1).

Neste ponto caracteriza-se o sistema europeu de migrações, em dois pontos fun- damentais. Começa por ser descrita a sua configuração em termos históricos e es- tatísticos. Depois são apresentadas as linhas de orientação política nas migrações europeias, por serem fundamentais na contextualização e demarcação da política migratória portuguesa e por, dessa forma, exerceram influência como constrangi- mento ou facilitador das migrações referentes a Portugal.

Os países da Europa ocidental enfrentam a realidade de se terem tornado países recetores e todos alojam populações estrangeiras em crescimento. Na globalidade, a Europa acolhia 64 milhões de imigrantes em 2005 (quadro 3.1). Entre 1950 e 1990, a população estrangeira residente só na Europa ocidental subiu de 5,1 milhões (1,3% da população total), para quase 17 milhões (4,5% da população total) (Stalker, 1994: 189). E estes números camuflam a tendência de aumento porque omitem as natu- ralizações. Os imigrantes que aí viviam em 1995, representando 11% da população,

eram 19,8 milhões; 10 anos depois esse número já era de 22 milhões (quadro 3.1). Em alguns países com imigrantes cujos processos de fixação são mais longos, já existem segundas e terceiras gerações.

A orientação dos imigrantes para países da Europa do Sul estará associado ao fecho de fronteiras dos países de acolhimento tradicionais e a um contexto de receção em países que, não conhecendo a imigração, não tinham legislação adequada nem prática de controlo das entradas. Entre 1995 e 2005, a população estrangeira residente quase duplicou em termos absolutos e relativos na população total da Europa do Sul (quadro 3.1). Acresce ainda o facto de esta região ser composta por países que se caracteri- zam por habitualmente serem destinos finais de viagens de turismo, o que facilitou a chegada de pessoas na condição de turistas, mas já sabendo que iriam à procura de trabalho e dispostas a passar por uma situação de irregularidade (Barou, 2001).

Quadro 3.1 - Stock de imigrantes na Europa, por sub-região, 1995 e 2005

Fonte: Nações Unidas (2009), Departamento de Assuntos Económicos e Sociais, Divisão da População. Nota: o conceito de imigrante é, nesta fonte, o de “não cidadão”.

Sub-região Indicador 1995 2005

Europa (total) stock de imigrantes (milhares) 55.286,6 64.115,8

% da população 7,6 8,8

Europa do Norte stock de imigrantes (milhares) 7.352,5 8.949,5

% da população 7,9 9,3

Europa do Sul stock de imigrantes (milhares) 5.583,6 10.712,9

% da população 3,9 7,2

Europa ocidental stock de imigrantes (milhares) 19.834,2 22.075,3

% da população 11,0 11,9

Europa do Leste stock de imigrantes (milhares) 22.516.3 22.378,2

% da população 7,3 7,5

A evolução da imigração na Europa terá tido quatro períodos assinaláveis ao longo do Século XX (Ardittis, 1990) e confunde-se com parte da história das migrações sin- tetizada no ponto anterior.

O primeiro período situou-se no início do Século XX e estendeu-se até ao fim dos anos 1940, coincidindo com a tendência dos europeus para uma emigração massiva, tendo sido as Américas (do Norte e do Sul) os destinos para onde mais se dirigiam.

No segundo período, entre os anos 1960 e meados dos anos 1970, a Alemanha e a Suíça tornam-se países importadores de mão de obra originária de países do Sul do Continente. Nesta época, continuavam a sair emigrantes da Europa para as Amé- ricas e para a Austrália e, por essa razão, o Sul da Europa revelou-se fornecedor insuficiente; governos e empregadores começaram, assim, a recrutar nos países do Mediterrâneo e do Norte de África. A complexificação de movimentos no interior do continente constituía um facto novo.

A terceira fase começou com o primeiro choque petrolífero, em 1973, quando se de- sencadeou uma recessão económica e consequentes reestruturações económicas e deslocamento de trabalhadores. As políticas de imigração passaram do recrutamento ativo (mesmo condicionado) à restrição de entradas. Nesta fase, em países do Sul da Europa, como a Itália, Grécia, Espanha e Portugal, diminuíram as saídas, aumentaram entradas de imigrantes e passou-se a importar trabalho de países exportadores de mão de obra, enquanto os países importadores tradicionais viam crescer a população imigrante, apesar das pressões restritivas, por via dos processos de reunificação fa- miliar. O autor concluiu a periodização das migrações na Europa com a fase que ia ter início em 1993, com a efetivação do mercado único de trabalho nos países membros da União Europeia. Neste período, além de movimentações regionais no espaço europeu da livre circulação, desenvolveram-se fluxos com direção a países do Sul e Norte da Europa, a partir dos países do Leste da Europa, do Norte de África e da América La- tina. Do Leste da Europa a direção era, em especial, a Alemanha, enquanto do Norte de África a direção era França. No que se refere a deslocações de refugiados, mais de quatro milhões de pessoas requereram asilo na Europa, 43% dos quais vindos de outros países europeus, 35% da Ásia e 19% de África, entre 1989 e 1998 (Stalker, 2002). Este padrão variado de migrações na Europa não exclui a consideração deste como um sistema unificado (Massey e outros, 1998). No domínio das migrações, a diferenciação entre o Norte e o Sul do Continente estabelece-se pela emigração substancial que tem existido nesta última região desde o início dos anos 1970. Se tivermos em atenção, na análise dos fluxos e de stocks de imigrantes, que a Europa é um continente com imigração interna desde os anos 1960, e que este sistema congrega vários países com passados históricos e coloniais heterogéneos, há uma impossibilidade de conseguir grande rigor nos dados, porque os países não têm os mesmos critérios para a catego- rização da origem dos imigrantes;33 “cada país na Europa classifica os imigrantes de

33. Alguns países não registam fluxos de entrada por país de nascimento, mas por nacionalidade (como a França), o mesmo se passando na contabilização dos stocks de migrantes, e é este tipo de descoinci- dência que dificulta a comparabilidade estatística.

acordo com a sua própria história peculiar, imperativos legais, necessidades políticas e interesses nacionais” (Massey e outros, 1998: 110). Estas dificuldades também se conjugam com a diversidade e complexificação dos estatutos dos migrantes, decor- rentes de dificuldades que vão desde a obtenção das autorizações permanentes, à uti- lização estratégica dos estatutos temporários e à própria indefinição nos projetos dos migrantes, passando pela frequência de oportunidades instáveis no mercado de traba- lho, pelas posições de regularidade ou irregularidade em função das leis de imigração (Peixoto, 1999a) e pela maior facilidade de circulação no espaço europeu.

Deste modo, vão ser salientadas neste ponto apenas algumas características funda- mentais do sistema europeu de migrações, que resultam, em grande parte, de desen- volvimentos históricos do passado, assim como vão ser nele privilegiados os países, por um lado, de onde saíram migrantes nas migrações transatlânticas e que assistem à chegada de brasileiros; e, por outro lado, os que receberam e/ou recebem portugueses. Uma das origens mais significativas da emigração europeia transatlântica no final do Século XIX e início do Século XX foi a Itália. Cerca de um Século mais tarde é, juntamen- te com Espanha e Portugal, um dos países que acolhe a imigração mais recente, por comparação com outros países da Europa, tendo-se nele revelado um padrão misto de emigração e imigração. No início dos anos 1990, mais de um quarto da população imi- grante legal tinha partido de África, em particular de origens como Marrocos e Argélia (Stalker, 1994). De acordo com os dados do SOPEMI de 2008 (OCDE, 2008b), o Brasil ocupa o sexto lugar na lista dos países de origem dos fluxos de entrada em Itália em 2006, sendo esta liderada por países da Europa do Leste como a Roménia (com 32,5 mil entradas) ou a Polónia (com 10,5 mil entradas), mas também o Norte de África (en- traram 12,7 mil marroquinos) e a Ásia (6 mil chineses entraram em Itália nesse ano). Que o Brasil tem ganho significado emigratório nos últimos dez anos nota-se também neste destino, com a subida para 5,8 mil em 2006, contrastando com o que haviam sido 2,4 mil entradas de pessoas com essa origem em 1998. O ano de 2002 foi o que regis- tou a maior subida de fluxos de entrada, pois entraram 388 mil estrangeiros em Itália, sendo a Roménia o país com teve uma subida vertiginosa na representação da origem dos imigrantes, de 19 mil para 50 mil entradas entre 2001 e 2002.

A Espanha tem tido um aumento sem precedentes na imigração, pois entre 1997 e 200634 a imigração cresceu intensamente, de 36 para 803 mil entradas de população

34. A Espanha passou por duas amnistias neste período, em 2000 e 2001 (e já tinha passado por uma em 1996) para migrantes irregulares, o que explica algumas subidas nos fluxos, nomeadamente de 99,1 mil entradas de estrangeiros em 1999, passaram para 330,9 mil em 2000 (Pellegrino, 2004).

estrangeira (OCDE, 2008b). Na lista dos fluxos mais significativos, encontramos tam- bém movimentos de direção contrária aos que aconteciam até às primeiras décadas do Século XX, com países da América Latina e Caraíbas, como a Bolívia, Colômbia, Argentina, Peru, Equador, República Dominicana a serem, agora, os exportadores de mão de obra. A Espanha recebeu 28 mil indivíduos de nacionalidade brasileira e cerca de 19 mil de nacionalidade portuguesa em 2006, e qualquer dos fluxos dava mostras de desenvolvimento. As entradas de brasileiros praticamente duplicaram entre 2003 e 2004, passando de 7,3 mil, para 13 mil. Em 2006 residiam, em Espanha, 113,4 mil indi- víduos nascidos no Brasil e 111,6 mil indivíduos nascidos em Portugal (OCDE, 2008b). Os números referidos contrastam fortemente com os 250 mil estrangeiros residen- tes em 1989, ou os 400 mil em 1993, após a regularização extraordinária em 1991 (na qual houve 133 mil candidaturas e 108 mil aprovações) (Stalker, 1994). A tendência de subida que já se notava no início dos anos 1990 tem explicação no aumento da atração que a Península Ibérica passou a exercer depois da entrada (de Espanha e Portugal) na CEE; no caso concreto de Espanha, é preciso não esquecer os latino-a- mericanos com ancestralidade hispânica. Este fascínio foi acompanhado pelas con- dições facilitadoras no que respeitava ao estatuto preferencial relativo a permissões de trabalho e naturalização de que podiam usufruir os provenientes das ex-colónias espanholas na mesma época (Stalker, 1994).

Com a harmonização das políticas de migração na Europa a partir de 1993, e com a exigência de pedidos de visto de migração por parte de migrantes originários do Norte de África, aos quais está vedada a livre circulação no continente, emergiu o contrabando (smuggling) de migrantes a partir de Marrocos, através de Espanha, com resultados frequentemente dramáticos. No entanto, existe em Espanha um flu- xo legal de entrada de cidadãos de Marrocos, que se encontra no terceiro lugar do conjunto dos países emissores de migrantes (OCDE, 2008b), e que se terá desen- volvido por uma reorientação de parte do que se dirigia anteriormente para França, após a entrada daquele país na CEE, e onde se entraria com mais facilidade como turista (Stalker, 1994).

Em França houve absorção de alguns dos maiores fluxos de imigração na Europa durante todo o Século XX, sendo a emigração portuguesa uma das que maior impor- tância história teve. Admite-se a possibilidade de que sem imigração o país teria me- nos cerca de 10 milhões de pessoas (Stalker, 1994).35 Nos últimos anos, os maiores

35. Em 1990 a população total francesa era de cerca de 58 milhões de pessoas, portanto seria de 48 milhões sem a imigração, de acordo com a afirmação do autor em 1994.

fluxos de entrada de população estrangeira provêm da Argélia, Marrocos e Tunísia (OCDE, 2008b), matriz que espelha, aliás, o seu passado colonial. Houve uma subida do total de entradas de população estrangeira em França, de cerca de 74 mil para 135 mil, entre 1997 e 2006. Os nacionais dos países da Europa do Sul, como Portugal, desapareceram da lista das 15 primeiras origens dos fluxos de entrada,36 estando

o Norte de África, a Turquia e a Ásia amplamente representados ao longo dos anos (OCDE, 2008b).

O Reino Unido, também com um historial de colonização, tinha o terceiro número mais alto na Europa relativo a residentes estrangeiros, 1,9 milhões em 1990. Con- tudo, 638 mil destes eram irlandeses que podem entrar livremente no Reino Unido para trabalhar e no início dos anos 1990 acreditava-se que uma grande parte da imigração correspondia a processos de reunificação familiar (Stalker, 1994). No início do Século XXI, na lista dos 15 países de onde provêm os maiores fluxos de população estrangeira estão a Índia, o Paquistão e Bangladesh, e no topo da lista aparece a Austrália (33,5 mil entradas daí provinham) e a Nova Zelândia (11,5 mil entradas) em 2001 (OCDE, 2008b). O país recebe também fluxos europeus de França, Alemanha e Grécia, mas também a Ásia está representada, com a China (em segundo lugar da lista, e em franco crescimento). Assim, e continuando a confirmar a Europa como continente com imigração significativa, o total dos fluxos de entrada no Reino Uni- do subiu de 175 mil, em 1992, para 373 mil, em 2001 (OCDE, 2008b). Nos stocks de nascidos no estrangeiro residentes em 2006, o maior contingente pertence à Índia, o Paquistão encontra-se em terceiro lugar, e aparecem países das Caraíbas, como a Jamaica. Não surge a China, ainda, nos quinze países com população mais numero- sa residentes no Reino Unido (OCDE, 2008b).

O destino que acolhia mais emigrantes portugueses nos anos 1960, a Alemanha, e que nos anos 1990 era o que concentrava o maior número de imigrantes na Europa com 5,8 milhões de estrangeiros, ou seja, 8,7% da população total (Stalker, 1994), já não tem Portugal incluído na lista dos países que representam os principais fluxos de entrada. Até meados da década de 1990 houve uma intensificação da emigração portuguesa para a Alemanha, em direção às oportunidades na construção civil no pós reunificação, mas este fluxo diminuiu até progressivamente se extinguir quando as autoridades e sindicatos alemães tiveram sucesso na imposição de restrições à entrada de trabalhadores estrangeiros (Peixoto, 2004). Nem Espanha, que era uma

36. Sendo uma migração intraeuropeia, é mais difícil de medir e a França não tem registos adminis- trativos municipais como Espanha, por exemplo, que permitiriam ter acesso a quantos portugueses entram ou residem no país.

outra origem de mão de obra imigrante na Alemanha, aparece no final da primeira década dos anos 2000 na distribuição dos países emissores mais significativos. Ape- nas Itália, de entre o conjunto das origens de trabalhadores convidados no passado, ainda é visível hoje em dia, embora neste caso o fluxo de entrada de nacionais ita- lianos venha baixando, tendo passado de cerca de 20 mil em 1997, para cerca de 18 mil, em 2006 (OCDE, 2008b). Países da Europa de Leste como a Polónia, a Roménia, a Hungria e a Federação Russa, ocupam os primeiros lugares; e a República Checa, a Sérvia e Montenegro também representam fluxos de entrada que, neste último caso, são mais baixos, mas já foram elevados em 1998. A Turquia aparece listada no conjunto dos países de origem dos fluxos de migração mais volumosos para a Ale- manha, o que aliás mantém visível uma imigração que já não é recente, devendo-se este fluxo maioritariamente a processos de reunificação familiar (desceu de 57 mil entradas em 1997 para cerca de 30 mil em 2006).37 A representação asiática no con-

junto dos fluxos de entrada de migrantes para a Alemanha é feita pela China e pela Índia. Não há qualquer país africano representado na matriz de fluxos de entrada. Quanto aos stocks de população estrangeira residente por nacionalidade, o grupo mais representado é a Turquia, mas a proporção de imigrantes turcos na população estrangeira tem vindo a diminuir. No conjunto dos estrangeiros residentes na Ale- manha em 2006, já se encontram portugueses (115 mil), assim como espanhóis (106 mil). Os países do Leste da Europa também têm uma representação expressiva nos stocks de estrangeiros residentes (OCDE, 2008b).

No que respeita à Suíça, que recebeu portugueses para trabalhar sazonalmente quando estavam em vigor os programas de guest worker, tem havido um cresci- mento do fluxo de entrada de portugueses (de 5,6 mil em 1997, passou para 17,7 mil em 2008). Portugal é mesmo o segundo país no conjunto dos fluxos de entrada mais significativos de população estrangeira na Suíça, de acordo com o instituto de estatística local (Office Fédéral de la Statistique).

Como país de imigração desde o fim do Século XIX, no início da I Guerra Mundial os 600 mil estrangeiros residentes compunham 15,4% da população da Suíça e vinham de países vizinhos para trabalhar na construção e nos setores de trabalho públicos (Stalker, 1994). A imigração para a Suíça continuou com flutuações no Século XX, mas foi reativada nos anos 1950 em resultado de um período de expansão económica. Em

37. A imigração na Alemanha, outrora vista como temporária e escolhida com precisão no início dos anos 1960, tornou-se uma imigração de fixação hoje em dia, com origens muito diversificadas e no interior da qual o número de homens ativos que vivem sós desceu de 80% para 20% (Barou, 2001).

1991 havia 1,2 milhões de residentes estrangeiros, excluindo trabalhadores sazonais, o que fazia com que este país tivesse uma das maiores taxas de contribuição de estrangeiros para a população total, 16% (Stalker, 1994). Em 2006, viviam na Suíça 1,5 milhões de estrangeiros e a tendência da imigração por proximidade geográfi- ca mantém-se, já que países vizinhos como a Alemanha, França e Itália estão nos primeiros lugares dos que contribuem com mais entradas na Suíça (OCDE, 2008b), havendo também trabalhadores destes países que aí se deslocam diariamente para trabalhar e voltam a casa, em sistema de migração pendular (Stalker, 1994). Nos stocks, os portugueses são 205,5 mil (Office Fédéral de la Statistique) e constituem o terceiro grupo nacional mais numeroso no conjunto (OCDE, 2008b).

O padrão europeu de política migratória que contextualiza estes movimentos foi, até aos anos 1970, influenciado por critérios associados à necessidade do mercado de trabalho, aos compromissos políticos celebrados com ex-colónias, ou à política da Guerra Fria. Esta influência marcou as políticas de entrada de nacionais oriundos de países determinados.

A partir dos anos 1970 a migração entrava no debate, porque se observavam impac- tos na sociedade, pois a entrada dos trabalhadores imigrantes tinha efeitos que não se confinavam ao mercado de trabalho e transbordavam para os serviços sociais e da segurança social, e por sua vez para a coesão social. Deste modo, “os partidos po- líticos depressa descobriram que estas preocupações forneciam material excelente para a mobilização política” (Boswell, 2003: 3) e a politização da migração desenvol- veu-se nos anos 1980 e 1990 na Europa, fazendo terminar a fase da “não política”.38

A imigração ilegal e o tráfico de imigrantes são as problemáticas recorrentes na dis- cussão das políticas migratórias neste Século (Boswell, 2003), num contexto em que também se reforçou a associação direta entre migração e terrorismo. Aqueles fenó- menos fazem com que se questione a capacidade dos estados em proteger os seus cidadãos em relação aos estrangeiros, e evidencia-se a hipótese do fosso, segundo a qual existem frequentemente descoincidências importantes entre as políticas for- muladas e os resultados pretendidos por essas políticas (Tsuda e Cornellius, 2004). As respostas aos eventos do 11 de setembro reforçaram a ligação entre (in)segu- rança e migração (Hollifield, 2004) e os governos da Europa ocidental e da América do Norte fortaleceram as fronteiras com controlos externos e internos de cidadãos

38. A politização da migração começou nos anos 1970 no Reino Unido, nos anos 1980 em França, no início dos anos 1990 em Itália (Boswell, 2003) e no fim dos anos 1990 em Portugal (Pires, 2003).

estrangeiros. Ainda assim, a ligação direta da migração ilegal e do controlo de migra- ção ao terrorismo, nesta securização da política de migração, não se terá prolongado na Europa, em termos do discurso político, a seguir a 2001 (Boswell, 2007a: 596), co- meçando por os perfis dos terroristas não corresponderem ao dos migrantes ilegais. Do lado dos países do Sul, quanto mais empobrecem e aumenta a sua dívida externa, maior a dependência das remesses dos emigrantes residentes no Norte, e menor o interesse em gerir a emigração e o tráfico ilegal de pessoas (Sassen, 2002: 234). A securização da migração faz parte da elevação a uma meta política na qual as migrações internacionais são convenientemente ligadas a outras questões, espe- cialmente perigo e ameaça militar, mas também sociais, económicas, políticas e culturais. Ou seja, “esta meta política liga questões do mundo real a medos em torno da migração internacional” (Faist, 2002: 11).

O aumento da restrição nas políticas de migração, provocado pela politização da mi-