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4 ANÁLISE CRÍTICA SOBRE AS VIOLAÇÕES DE DIREITOS E

4.3 A vedação arbitrária aos direitos à progressão de regime e ao livramento

4.3.1 O sistema progressivo de cumprimento de pena

O livramento e a progressão compõem instrumentos do sistema progressivo adotado pela LEP95, dividindo a execução da pena em fases ou etapas através das quais o

condenado será avaliado quanto ao comportamento, sendo conduzido paulatinamente à liberdade, traduzindo-se em instrumentos que atendem o ideal de prevenção especial positiva da pena (LEAL, 2010, p. 76).

A história brasileira registra que antes do Código Penal de 1940 não existiam regimes prisionais. A pena cominada sempre era apenas uma: a de prisão. Os regimes fechado,

93 ENUNCIADO Nº 24 – O preso será devolvido ao juízo de origem nos casos de concessão de progressão de

regime ou de livramento condicional, bem como nos casos de incidente de insanidade mental ou de doença incurável que dependa de tratamento prolongado ou específico, inviável de ser prestado no âmbito das penitenciárias federais. (Editado no II Workshop com alteração de texto no III Workshop)

94 Normalmente, o juiz natural é tratado como princípio (LOPES JR., 2012, p. 449) ou como garantia (BADARÓ,

2017, p. 49). No presente trabalho utiliza-se como garantia em razão de ser este o uso realizado por Ferrajoli (2002, p. 472), visto ser este o referencial teórico do trabalho.

95 Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime

menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.

§ 1o A decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor.

§ 2o Idêntico procedimento será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas,

semiaberto e aberto, nesse aspecto, surgiram inspirados no sistema progressivo irlandês com a finalidade de contribuir para a reintegração social do condenado, possibilitando-o que fosse sendo preparado aos poucos para o seu retorno ao convívio social, mediante a comprovação do seu próprio mérito, pautado no comportamento carcerário (NUNES, 2009, p. 139).

Os regimes fechado, semiaberto e aberto se diferenciam, em primeiro lugar, pelo local de cumprimento da pena (art. 33, §1º, do CP): estabelecimento de segurança máxima ou média, para o regime fechado; colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, para o semiaberto; casa de albergado ou estabelecimento adequado, para o aberto. Essa é a razão por que o art. 11 do Decreto nº. 6.877/0996 determina expressamente que o preso recolhido em

presídio federal que obtiver a progressão de regime ou o livramento deverá retornar ao estado de origem, dado que o SPF é composto exclusivamente por penitenciárias de segurança máxima, vocacionadas ao regime fechado.

A progressão de regime é concedida através de incidente processual perante o Juízo competente para a execução da pena mediante decisão motivada, precedida de manifestação do Ministério Público e da defesa. No incidente, serão apreciados os requisitos objetivo e subjetivo. O primeiro refere-se à fração de tempo no regime anterior, que é de 1/6 (um sexto) da pena, ressalvados os casos de crimes hediondos ou equiparados, nos quais o condenado deverá ter cumprido 2/5 (dois quintos) da pena, se réu primário, ou 3/5 (três quintos), se reincidente.

Quanto aos requisitos subjetivos, podem ser aferidos por meio de exame criminológico, o qual é facultativo, conforme súmula vinculante nº. 439 do STJ97. Os requisitos

subjetivos constituem o pilar ideológico dos institutos da progressão e do livramento, prevendo- se uma série de valorações subjetivas diagnósticas e prognósticas voltadas ao preso, sempre com forte apelo à criminologia clínica, quando não ao mero e grosseiro exercício de adivinhação, razão porque são severamente criticados pela doutrina (PAVARINI; GIAMBERARDINO, 2011, p. 295).

Para a progressão, o preso deve apresentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo Diretor do estabelecimento (BRASIL, 1984, art. 112). Conforme entendimento jurisprudencial prevalente98, o cometimento de falta grave acarreta não só a

regressão de regime, mas também o reinício da fração de pena cumprida exigida para que se pleiteie a progressão de regime.

96 Art. 11. Na hipótese de obtenção de liberdade ou progressão de regime de preso custodiado em estabelecimento

penal federal, caberá ao Departamento Penitenciário Nacional providenciar o seu retorno ao local de origem ou a sua transferência ao estabelecimento penal indicado para cumprimento do novo regime.

97Súmula 439. Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada. 98 STF - HC: 103786 RS, Relator: Ministro Eros Grau, Data de Julgamento: 08/06/2010, Segunda Turma.

O livramento condicional também tem sua origem no sistema progressivo irlandês, no qual constituía a última fase de cumprimento da pena, e foi introduzido no Brasil pelo Código Penal de 1890. Atualmente, sua regulamentação legal conjuga dispositivos do Código Penal (arts. 83 a 90) e da LEP (art. 131 a 146), tratando dos requisitos e do procedimento a ser adotado na sua concessão, configurando mecanismo voltado à ressocialização do preso com a antecipação da liberdade, mediante o cumprimento de determinadas condições99, antes do

término da pena privativa de liberdade. Prepondera o entendimento que o livramento é um direito público subjetivo do preso, portanto exigível sempre que preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos para sua concessão (ROIG, 2017, p. 432).

Para concessão do livramento condicional, também se exigem requisitos objetivos e subjetivos. O primeiro consiste na fração de pena cumprida pelo apenado. Aos primários que cometem crimes não hediondos, exige-se o cumprimento de um terço da pena (art. 83, I, CP). Já para os reincidentes em crime doloso, é exigido o cumprimento de mais da metade da pena. Tratando-se de crime de tráfico de pessoas, delitos hediondos ou equiparados (tráfico ilícito de entorpecentes, a tortura e o terrorismo) exige-se o cumprimento da fração de dois terços da pena (art. 83, V, do CP). Em caso de reincidência específica em crimes hediondos ou equiparados e tráfico de pessoas, a lei veda a concessão de livramento condicional (art. 83, V, parte final, do CP). Ainda como requisito objetivo para o livramento, exige-se a reparação do dano causado pela infração, salvo impossibilidade de fazê-lo (art. 83, IV, CP).

O Código Penal elenca como requisitos subjetivos o comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e a aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho (art. 83, III, do CP). Ainda conforme o estatuto repressivo, exige-se para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça a pessoa, a constatação de que o liberado não voltará a delinquir (art. 83, parágrafo único).

Estabelecidas as premissas do sistema progressivo de cumprimento de pena, serão a seguir comentadas as violações ocorridas à garantia do juiz natural, ao princípio do devido processo legal e ao princípio da individualização da pena, decorrentes diretamente do entendimento do STJ no sentido de não ser possível a concessão de progressão de regime e de livramento condicional ao preso recolhido em presídio federal.

99 O art. 132, §1º da LEP prevê como condições obrigatórias: obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável se

for apto para o trabalho; comunicar periodicamente ao Juiz sua ocupação; não mudar do território da comarca do Juízo da Execução, sem prévia autorização deste. O §2º do citado artigo prevê ainda como condições facultativas: não mudar de residência sem comunicação ao Juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção; recolher-se à habitação em hora fixada; não frequentar determinados lugares.