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O trabalho prescritivo e o trabalho representado do professor

desta exposição, como referente à prescrição do trabalho a ser realizado pelo trabalhador, ou melhor, no que se refere aos objetivos esperados do trabalho. No caso da formação de educadores, a tarefa é dada pela equipe de formação, através do comando ou instrução. Consideramos que o comando, além de prescrever a tarefa, serve como mediador entre a tarefa que foi idealizada pela equipe de formação e a forma como os professores representam a tarefa a ser realizada.

1.4 O trabalho prescritivo e o trabalho representado do professor

Fazer pesquisa sobre o trabalho do professor sob a perspectiva da Clínica da Atividade e da Ergonomia do Trabalho, segundo Amigues (2002), implica considerar, de forma decisiva, as prescrições, em seus aspectos institucionais e normativos. Como em outras profissões, o trabalho do professor tem em sua dimensão a utilização de procedimentos concebidos por outras pessoas que não o próprio trabalhador. Os valores do trabalho do professor não são atribuídos somente por eles, mas por pessoas ou instituições que estão fora do domínio de execução do trabalho. Assim, por exemplo, documentos como os PCN´s são, na verdade, concebidos e construídos pelo Ministério da Educação e passam a nortear o projeto pedagógico da escola, o material didático e o agir docente.

Quando pensamos nas prescrições contidas nos manuais didáticos, observamos que estas chegam aos professores de maneira imprecisa. Uma das funções desse material deveria ser dar pistas das bases teórico-metodológicas que respaldam a proposta do autor do material didático, propiciando ao professor mais segurança para desenvolver o trabalho em sala de aula, e mais autonomia para intervir nas propostas.

No entanto, o material didático, normalmente, é uma colcha de retalhos de

documentos oficiais como os PCN’s e de teorias da linguagem, e assim o trabalho do

professor inscreve-se em uma organização com prescrições vagas, levando os professores a redefinirem as tarefas que lhes são prescritas de forma muito vaga, pois a distância entre o que esses materiais prescrevem e a atividade real é muito grande.

É evidente que as prescrições não chegam e nem devem chegar à sala de aula da forma como a prescrição inicial indica. Na verdade, a s ações realizada s pelos professores não se

limitam, portanto, a uma simples execução do prescrito, mas a um trabalho de reelaboraçã o do que é preciso fazer dentro do que há pa ra ser feito em tal situação. (AMIGUES, 2002). Essa reelaboração passa pelo processo de autoprescrição, uma vez que as situações reais de sala de aula são imprevisíveis, mutáveis; isso transforma os objetivos iniciais do professor. Para realizar essa reelaboração, o professor precisa ser um ator, um produtor de significação e de finalização de sua própria ação, o que, normalmente, não ocorre nas aulas de aula, uma vez que o professor aplica o roteiro da aula estabelecido pelo autor do livro didático, adaptando-o de forma intuitiva ao contexto de sua sala de aula.

Defendemos que essa reelaboração deve ter como base um agir reflexivo, pautado não apenas nas experiências profissionais dos educadores, mas também em uma reelaboração dos saberes, advinda de fundamentações teóricas, discutidas no âmbito de formação profissional do docente.

Neste trabalho, assumimos que prescrições são constitutivas da representação que o professor tem de seu agir, uma vez que estes, normalmente, fazem a mediação dos conhecimentos, em situação de sala de aula, orientados pelos manuais didáticos, que seguem um modelo de planejamento cristalizado e pouco engajado na formação crítica dos alunos (PEIXOTO, 2007).

Como já foi explicitado em nossa introdução, para analisar o trabalho do professor de forma ampliada, é necessário só lidar com as questões de ensino-aprendizagem, mas também com as relações entre os textos e o agir humano. Para isso, adotamos o quadro teórico do Interacionismo Sociodiscursivo, ISD. No próximo capítulo, realizamos uma resenha desse quadro teórico-metodológico e aprofundamos as nossas categorias de análises, focalizando, especificamente, as figuras de ação.

2 O QUADRO TEÓRICO-METODOLÓGICO DE ANÁLISE - O

INTERACIONISMO SOCIODISCURSIVO

Para estudar a representação que o professor tem de seu agir, optamos pelo Interacionismo Sociodiscursivo (ISD), na medida em que desenvolve uma teoria sobre o funcionamento e o desenvolvimento humano em que o agir e a linguagem a ele associada desempenham um papel fundamental. Assim, utilizamos o quadro teórico-metodológico do Interacionismo Sociodiscursivo (ISD) como ferramenta para análise dos textos e como perspectiva teórica que nos permite reinterpretar os nossos dados (BRONCKART, 1997; 2004; 2008).

Para alcançar o objetivo geral da investigação, utilizamos a noção de figuras de ação (BULEA, 2004, 2009, 2010, no prelo), que são configurações interpretativas do agir presentes nos textos, identificáveis pela interação de coordenadas temáticas e discursivas (BULEA, no prelo). Estas figuras interpretativas do agir dão forma ao trabalho de ressignificação do papel do professor e da tarefa a ser realizada por ele na formação de educadores.

A escolha discursiva desse capítulo teve como princípio a perspectiva descendente de análise dos textos assumida pelo ISD. Nesse sentido, inicialmente, situamos epistemologicamente o ISD; discutimos a noção de agir humano e de agir nos textos. Depois, explicitamos o modelo descendente de análise dos textos e a arquitetura textual, assumidas pelo ISD. Aprofundamos, nesta proposta de arquitetura textual, as categorias de análise necessárias para identificar as figuras de ação, a saber: os tipos de discurso e os mecanismos enunciativos. E, finalmente, explicitamos e discutimos a noção de figuras de ação interna s e externas.