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5 O CENÁRIO DO TBC EM COMUNIDADES TRADICIONAIS DA

5.4 Comunidade São Thomé: histórias, memórias e implicações para o turismo

5.4.1 O turismo na minha comunidade: cenários, transformações e perspectivas de

É importante compreender como os comunitários percebem o TBC em sua localidade e como se dão as trocas entre visitantes, visitados, as instituições privadas (agências de viagens e hotéis), o estado e as ONGs nessa comunidade. Segundo relatos de moradores:

[...] O turismo na nossa comunidade já acontece bastante tempo, desde a década de 80. Mas, foi através do programa do Luciano Huck em 2010 que a nossa comunidade ficou conhecida mundialmente. Antes aqui, nós era esquecido, não tinha nem luz, nem água aqui na nossa comunidade, depois, que a Globo veio aqui foi que chegou o Luz Para Todos e eles fizeram poço artesiano para abastecer toda comunidade. Mas, no meu ver, apesar de a nossa comunidade receber muito turista, não há emprego pra todo mundo, não há desenvolvimento não, porque não somos nós que trazemos os turistas pra cá, são as agências e os hotéis, então, muitas das vezes o turista só passam por aqui não dar nem tempo de almoçar aqui e nem

Legenda

(A) Artesanato; (B) Artesã confeccionando as peças; (C) Artesão confeccionando redes; (D) Redes

artesanais.

B

C A

comprar o artesanato, daí nem sempre eles deixam um dinheirozinho aqui na comunidade, nos comércios né, nos restaurantes também. Mas, o meu desejo é que o turismo se fortaleça aqui e gere emprego e renda pra todo mundo, porque também nem todos que moram aqui trabalham com o turismo, porque nas pousadas daqui não dar pra empregar todo mundo e nem todo mundo sabe fazer artesanato. Nós tivemos cursos pela FAS e SEBRAE, mas, só quem participa é quem tá envolvido mesmo, os outros não participam. Nós só temos ajuda aqui da FAS e ainda é muito pouca, do governo nós não temos ajuda, só na construção de escola mermu, porque quem reformou toda comunidade foi o Luciano Huk. Seria bom se o governo olhasse com carinho pra nossa comunidade, porque aqui nós não temos posto de saúde, a escola tá precisando de uma reforma, precisamos de transportes e outras coisas. Se o governo investisse no turismo seria bom, mas, por eu acredito que o turismo gera renda e emprego, eu gosto muito de receber os turista aqui, conversar com eles, falar do nosso dia-a-dia como que a gente vive aqui, né. O turismo é uma forma de preservar também a nossa cultura né, e nossas florestas [...] (ENTREVISTADO 7, informação verbal).

Ao ser questionado sobre os cenários do TBC, suas mudanças e perspectivas o entrevistado se expressou da seguinte forma:

[...] O Turismo é bom pra alguns, pra aqueles que trabalham na pousada, leva os turistas pra andar nas trilhas, focar jacaré, pra quem é dono de pousada, mas, pra mim que não trabalho com turismo, não acho que ele gerou desenvolvimento aqui na comunidade não. Até agora, a comunidade tá do mesmo jeito, não tem emprego, a atividade econômica aqui é mais a pesca e o comércio né. A comunidade melhorou assim, em termo que ficou mais conhecida por causa do Programa Caldeirão do Huck da rede globo que veio aqui e reformou todas as casas da comunidade, pousadas, restaurantes, tudo, tudo daqui mermu até o barco de pesca que hoje vive aí abandonado. Então eu vejo assim, apesar de ter uma visitação boa de turistas, não há lucro e geração de renda aqui na comunidade, porque quem traz os turistas são as agências e os hotéis, antes era melhor no tempo do hotel Ariaú, porque muitos daqui trabalhava lá, ele dava emprego pra todo mundo daqui do Acajatuba, agora com o fechamento dele ficou mais difícil até mesmo os turistas estão vindo pouco pra cá. E espero que melhore né, que a nossa comunidade possa se desenvolver economicamente [...] (ENTREVISTADO 4, informação verbal).

Nota-se que no entendimento do entrevistado, o TBC tem contribuído como renda complementar apenas para as famílias envolvidas no turismo, como os proprietários de empreendimentos hoteleiros, restaurantes e para alguns artesãos. Evitando causar ou acirrar conflitos na comunidade, o TBC, segundo seus próprios princípios, deveria proporcionar “desenvolvimento” e melhores condições de vida, envolvendo, de alguma forma, grande parte dos comunitários e não apenas para algumas famílias. Nesse caso, cria-se uma espécie de “diferenciação social”, distinções de classes e obviamente conflitos velados ou evidentes.

Levando em consideração as diversidades de experiências dos moradores, e mesmo com o risco das diferenciações, identificamos em alguns relatos à percepção de que o TBC tem contribuído para o desenvolvimento e fortalecimento comunitário.

[...] O turismo para mim é muito bom, só não dar pra viver dele o ano todo né, porque no tempo de cheia aqui não dar ninguém pra visitar. Por causa que aqui enche tudo, a comunidade fica toda alagada, as casas aqui ficam tudo debaixo d’água, aí não vem ninguém, não tem como vim né (risos). A comunidade mudou muito de 2010 pra cá depois que o Luciano Huck veio aqui com toda equipe do Programa dele, eles reformaram todas as casas da comunidade, pousadas, restaurantes, o parquinho das crianças, o centro comunitário, tudo, mais tudo mesmo e até o barco de pesca da comunidade, mas, agora o barco tá parado, precisa de outra reforma (risos). Agora a gente recebe mais turistas, até mesmo o pessoal de Manaus, muitos vem aqui fazer pesquisas, outros vem visitar mermu. Mas, o turismo é bom, é bom receber turistas aqui pra comprar o nosso artesanato, se hospedar na pousada, conversar com a gente, né, conhecer a nossa comida que é uma comida bem caseira á base de peixe fresquinho porque a gente pesca no mesmo dia. Graças á Deus na época de verão dá bastante gente e é do turismo e da pesca que eu e minha família vive, né. A comunidade em si é bem unida, só que não tem emprego pra todo mundo e quando vem turista não dar pra trabalhar todo mundo nas pousadas né. O turismo comunitário é bom porque, o turista conversa com a gente, se hospeda na nossa comunidade, quando tem futebol ou outra brincadeira eles participam com a gente, isso é bom né. Eles acham bonita a nossa comunidade, ficam encantados (risos), incentivam a gente preservar nossos rios, nossa floreta, nossos animais [...] (ENTREVISTADO 6, informação verbal).

A narrativa manifesta a importância do processo de organização, planejamento e participação das comunidades nas atividades turísticas.

[...] Eu fui seringueiro aqui na Amazônia, e hoje trabalho aqui na comunidade com a demonstração da borracha para os turistas, faço objetos em forma de animais da comunidade com o látex, conto um pouco da minha história pra eles também né, eu já conheci Veneza, O Luciano Huck veio aqui e perguntou qual é o meu sonho e disse que meu sonho era ver minha comunidade bastante visitada por turistas, igual Veneza na Itália, daí ele me levou pra conhecer (risos) e também que tivesse luz, poço artesiano porque aqui não tinha né, aí ele reformou toda comunidade e a minha casa também, eu fiquei muito feliz com isso. Olha pra ti falar sobre o turismo aqui já foi bem melhor, só que mesmo quando dava muito turistas aqui, o turismo nunca foi organizado, não tem quem organize, pra que todo mundo trabalhe, se tivesse uma Instituição seria bom. Porque eu acho que ia colocar todo mundo pra trabalhar né. No tempo que os gringos do Ariaú estavam vindo pra cá, eles nos ajudavam muito, sempre deixava um dinheirinho (risos), agora que o hotel fechou tão vindo pouco e ás vezes veem mas, não deixam nada pra gente. Isso que é ruim, porque a gente passa horas esperando eles chegarem pra fazer a demonstração da borracha, contar como foi o ciclo da borracha aqui na Amazônia, falar da nossa cultura também né, e aí a gente não recebe nada, né, porque a gente vive disso. Então, eu queria que tivesse emprego pra todo mundo daqui da comunidade né, aí seria bom [...] (ENTREVISTADO 3, informação verbal).

O entendimento da atividade de TBC em São Thomé passa pela percepção dos moradores, interpretação que os residentes fazem do TBC, aliando a participação conjunta no desenvolvimento do turismo, enquanto gerador de emprego e renda e valorização ambiental e cultural. Ficou perceptível também a falta de organização e planejamento das atividades.