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1. O PODER DO CANTO OU O CANTO DO PODER?

1.3 OLHARES DOS DIRIGENTES CATARINENSES

Entre os anos 20 e 40, parte da intelectualidade catarinense viveu um período de efervescência, derivada do cenário nacional. A Academia Catarinense de Letras fundada em 1924, reunia escritores, literatos e políticos mostrando a preocupação política com a cultura. Também, o Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina e o Instituto Estadual de Educação de Florianópolis se tornaram um ponto de encontro e referência da intelectualidade da capital, tendo em vista que essas instituições reuniam um número considerável de intelectuais e educadores. O tema sobre a formação moral e cívica do cidadão referenciada naquilo que se concebia enquanto nacionalidade brasileira era a principal pauta de discussão entre esses pensadores. 195 O intercâmbio com a intelectualidade nacional tornava-se mais candente devido à problemática enfrentada pelo governo estadual. Contrastando com o sentimento nacionalista e de unidade propagado por todo o território nacional, aparecia a questão dos “quistos raciais”.

Aproximadamente cinco milhões de imigrantes europeus ingressaram no Brasil até a década de 40 devido às políticas imigratórias da agricultura. A maioria fixou-se no sul do Brasil constituindo-o local de grande concentração de imigrantes e descendentes de imigrantes do país. Havia uma forte influência européia, com grupos espalhados pelo litoral e pelo interior. Alguns imigrantes se estabeleceram nas cidades formando bairros concentrados e identificados por etnia; outros se organizaram em forma de colônias em regiões afastadas do convívio direto com a sociedade nacional, mantendo uma identidade própria, com cultura diferente e linguagem distinta.196

Em Santa Catarina, os núcleos de origem estrangeira se localizaram em diversas regiões. Os descendentes de alemães concentravam-se, sobretudo na região do vale do rio Itajaí em Hamônia, Blumenau, Brusque, Gaspar, Indaial e Rio do Sul. No norte do Estado, fixaram-se nas cidades de Jaraguá, Joinville, São Bento, e um pequeno núcleo na cidade de Porto União. Na zona central se estabeleceram no município de Bom Retiro. Houve também

195 NASCIMENTO, Carla D’Lourdes do.; DANIEL. Leziany Silveira. Instituto de Educação de Florianópolis e

os intelectuais Catarinenses na década de 40. In: SCHEIBE, L.; DAROS, M. D. (orgs.) Formação de

Professores em Santa Catarina. Florianópolis: NUP/CED, 2002. p.53-70. p. 55.

outros núcleos com menor densidade populacional espalhados por diversas cidades catarinenses, ou próximos a estas. Tal foi o caso de cidades do litoral como Itajaí, Palhoça, São José, Nova Trento e São Pedro de Alcântara. Nos municípios do oeste, os descendentes de alemães concentraram-se nas cidades de Cruzeiro (com uma colônia tirolesa), Concórdia (com uma pequena colônia no distrito de Ipira), Campos Novos (com uma pequena colônia no distrito de rio do Peixe), Chapecó (com várias e densas colônias à margem do rio Uruguai) e Caçador. No sul, uma pequena colônia fixou-se em Tubarão.197

A maior parte dos descendentes de italianos habitou no vale do Itajaí, mas houve outros grupos que se espalharam por várias regiões do Estado formando pequenos núcleos. Entre estas regiões destacam-se as cidades de Rio do Sul, Timbó, Rodeio e Indaial. Outros se concentraram no vale do rio Tubarão, em Urussunga, Tubarão, Criciúma, Jaguaruna e Orleãs. No litoral, esses imigrantes se estabeleceram em Tijucas e Nova Trento. Algumas cidades do oeste, como Concórdia, Campos Novos, também foram habitadas por italianos, com colônias à margem do Rio do Peixe e no interior. Em Chapecó formaram colônias na linha limítrofe de Cruzeiro. Os imigrantes de origem polonesa e ucraniana espalharam-se nas cidades de Itaiópolis, Mafra, Porto União e Rodeio.198

Devido a essa forte presença de colônias européias em Santa Catarina, a necessidade de fomentar os sentimentos de brasilidade neste Estado, tornou-se foco de grandes atenções para os governantes da nação. As ações governamentais em prol da brasilidade neste período estão registradas em documentos oficiais, revistas e jornais da época. Também as histórias contadas por protagonistas que viveram este momento testemunham o autoritarismo do Estado Novo, voltado à imposição de restrições tanto quanto de propaganda pró- nacionalismo.

Os núcleos estrangeiros, na ótica do governo, eram ameaçadores aos ideais de unificação nacional, principalmente os de origem germânica pela vigorosa conservação de costumes e tradições da pátria de origem.199 Esse isolamento cultural, político e até mesmo comunitário, somado à multiplicidade cultural, idiomática e de identidade pátria variável, se constituía no maior desafio do governo Vargas, potencializado pela Segunda Guerra Mundial.

197 D’AQUINO, Ivo. 1942, op. cit. p. 28. 198 Ibid. p. 29.

O perigo de uma invasão alemã na América do Sul passou a ser considerado real. As idéias imperialistas do Fuhrer não escondiam o desejo de tornar a Alemanha um império poderoso. Os estrangeiros e descendentes foram apresentados como inimigos do país e prováveis colaboradores do Eixo. Quase toda a preocupação foi concentrada nos núcleos de colonização estrangeira, e era o grupo alemão o que mais se prestava a essa estigmatização, pela proximidade sempre a ele associada com o nazismo.200 Havia um clima de tensões políticas, tornando-se oportunas as questões da educação de uma consciência nacional, de sentimento patriótico e a confiança em um governo forte, cuja figura fosse o símbolo de um grande chefe paternalista que vela e protege seus filhos.

Dentro desse contexto, num esforço conjunto para a formação da consciência nacional, os Governos Federal e Estadual tomaram uma série de medidas, compelindo a integração dos imigrantes e seus descendentes aos valores político-culturais da nação brasileira. Segundo Schwartzman, Bomeny e Costa, não havia, em projetos nacionalistas como o do Estado Novo, espaço para a convivência com grupos culturais estrangeiros fortes e estruturados nas regiões de colonização.201 Portanto, deveria haver um ou mais elementos catalisadores do sentimento de pertencer a uma pátria, a brasileira, minimizando ou mesmo anulando sentimentos de desagregação pela ligação emocional, cultural ou de qualquer outra ordem com a nação de origem. Coerente com essa preocupação, o governo Vargas, com apoio dos políticos dirigentes, atuou em duas frentes distintas. De um lado buscou a desagregação dos elementos que mantinham as colônias ligadas ao passado, tentando cortar os laços que pudessem representar a manutenção do sentimento de pertencer à pátria que um dia haviam deixado. De outro lado alimentou entre os colonos o mesmo sentimento que já se disseminava por todo o território nacional, de pertencer a esta Pátria, sua nova grande Pátria Brasileira.

A estratégia foi aplicada em relação aos mais fortes elementos de identidade dos colonos, com destaque para o idioma, que era um dos mais importantes fatores de unidade entre eles. Como já visto na sessão sobre a Primeira República, as escolas alemãs utilizavam abundantemente cantigas alemãs nas salas de aula para salvaguardar seus valores culturais. Assim sendo, nessa época em que o perigo alemão parecia real, tanto a língua alemã quanto as músicas entoadas nesse idioma foram associadas ao sentimento nazista. O poder do canto foi

200 Cf. FÁVERI, Marlene de. 2004, op. cit. p. 41-42.

201 SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena Maria Bousquet,; COSTA, Vanda Maria Ribeiro. (orgs.). Op.

considerado necessário para plasmar o poder nacionalista. Além de obrigar as escolas a praticarem os cantos nacionalistas, tornou-se proibido cantar e falar em outros idiomas, tanto nas escolas como nas comunidades. Os simbolismos culturais foram fortemente vigiados, impedindo-se pela força as apresentações, mesmo folclóricas202, que pudessem alimentar os sentimentos cívicos e pátrios dos antepassados dos imigrantes.

Além da repressão em relação ao idioma estrangeiro e simbolismos culturais, houve várias estratégias para despertar os sentimentos nacionalistas. Os intelectuais e os políticos dirigentes da sociedade catarinense elaboraram e colocaram em prática, ações que contribuíram de diversas formas para integrar a população à nova ordem. Campos identifica o consenso entre eles, em relação à escola como “lugar adequado para concretizar os dispositivos normatizadores e consolidar um projeto de regeneração social”203 e referenciar os jovens nos princípios de brasilidade. Ivo D’Aquino204 representando o pensamento dos dirigentes políticos desse Estado, aponta a educação como o principal pilar da defesa nacional:

A educação é o primeiro e fundamental capítulo da defesa nacional, por que é por ela que, nas primeiras madrugadas da razão, a criança aprende a querer e a sentir a Pátria e, com ela vibrar sintonizadamente nos seus anseios, nas suas lutas e nas suas glórias. Diz ainda, Pátria não é um termo vago e retórico: mas o patrimônio comum da história, as tradições, da religião, dos costumes da língua, da cultura, das esperanças, das lutas e dos

ideais incorporados à Nação. 205

A escola assumiu importante papel na formação da identidade do Estado-Nação. Esta foi vista como uma instituição que poderia formar a nova geração comprometida com a

202 Marlene Fáveri conta que um grupo de alemães foi preso por cantar “Noite Feliz” em alemão na véspera de

Natal durante uma reunião familiar. Este fato ocorreu na cidade de Bom Retiro no ano de 1942. FÁVERI, Marlene. Memórias de uma outra Guerra. 2004, op. cit. p. 243-245.

203 CAMPOS, Cynthia Machado. As Intervenções do Estado nas Escolas Estrangeiras de Santa Catarina na Era

Vargas. In: Brancher, A. (org.) História de Santa Catarina: Estudos contemporâneos. 2.ed. Florianópolis: Letras Contemporâneas Oficina Editorial LTDA, 2004. p.149 - 166. p. 160.

204 Ivo D’Aquino Fonseca (1896-1974). Político brasileiro, nascido em Florianópolis, SC. Foi prefeito de

Canoinhas de 1919 a 1920. Professor da Faculdade de Direito de Santa Catarina. Deputado estadual em três legislaturas: 1922 a 1924, 1925 a 1927 e 1928 a 1930. Foi Secretário de Estado do Interior e Justiça em 1930 e da Viação, Obras Públicas e Agricultura em 1936. No período do Estado Novo exerceu a função de Secretário de Estado do Interior, Justiça, Educação e Saúde, atuando ao lado de Nereu Ramos, na função de colaborar na obra iniciada nesse governo a partir de 1938, em benefício da educação nacional. Ao término do Estado Novo, em 1945, elegeu-se simultaneamente a deputado federal e senador. Disponível: http://pt.wikipedia.org/wiki/. (acessado em 10/11/07).

205 D’Aquino, Ivo. Estudos Educacionais, ano 1, n.1, p.12, agosto, 1941. (Discurso proferido como paraninfo

identidade da sociedade e, conseqüentemente reduzisse naturalmente o número de desleais. A educação seria capaz de traduzir em manifestações cívicas, brincadeiras e práticas esportivas a devoção patriótica, o progresso intelectual e o vigor físico que o Estado Novo pretendia imprimir, nos hábitos diários da população brasileira. “A educação de jovens estava associada ao civismo e à preocupação de imunizá-los contra influencias exógenas”206. A nacionalização do ensino empreendida nos anos 1938 e 1939, capitaneada pelo interventor Nereu Ramos foi o grande passo importante nessa direção. Ele governou Santa Catarina a partir de 1935, e atuou como interventor entre os anos 1937-1945. Em sua gestão houve um movimento nacionalista ímpar na história catarinense. Este político priorizou a escola, no processo nacionalizador. Nesse período, a boa educação e um corpo saudável foram tomados como requisitos básicos para a formação da nacionalidade brasileira.

Através de Decretos e Leis impostos por esse legislador, devidamente aplicados e controlados pelos seus assessores e inspetores escolares, a escola tornou-se palco de brasilidade. Esse assunto é abordado com mais detalhes no capítulo seguinte dessa tese. Os procedimentos de nacionalização do ensino visavam atingir particularmente as comunidades estrangeiras, especialmente as mais organizadas. Os imigrantes poderiam representar, nesse momento, a expressão da vontade de seus países de origem no território nacional. Uma medida de segurança se juntava a um ideal de nacionalidade.

A esse respeito é significativo o artigo publicado na Revista Estudos Educacionais com as impressões do professor Roger Bastide,207 sobre a problemática enfrentada no estado catarinense. Ele viajou a Santa Catarina para proferir aula inaugural dos cursos do Instituto de Educação de Florianópolis, e no seu regresso foi entrevistado por jornais de S. Paulo, desejosos de saber sua opinião sobre o tema germânico nesse Estado. Ele elogiou profusamente as ações do Governo do Estado dizendo que as autoridades de Santa Catarina souberam compreender com rara lucidez a gravidade extrema da problemática nacional. Bastide considerou o esforço do interventor Nereu Ramos em prol da nacionalização das

206 D’ARAUJO, Maria Celina Soares. Op. cit. p.35.

207 Através da reportagem notificada em São Paulo, percebe-se relevância dada ao assunto. Roger Bastide, no

momento era considerado um grande mestre da moderna sociologia, com alta expressão da cultura francesa. Aceitou o convite do governo brasileiro para dirigir uma cadeira na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de S. Paulo. Revista Estudos Educacionais. Junho de 1943, Ano III, n.4, , p.29.

escolas, como notável. A seguir afirma categoricamente: “não tenho dúvida em afiançar que essa política poderá acabar com a influência política alemã” 208.

Era cada vez mais evidente para a elite pensante, a necessidade da educação cumprir um papel socializador e constituir-se num instrumento eficaz para aplacar impulsos de resistência popular. LeGoff209 analisa o papel do intelectual e o identifica como o profissional que tem consciência de sua função e que reconhece as escolas como oficinas de onde as idéias são exportadas.

Entre os educadores e políticos catarinenses, coadjuvantes do interventor Nereu Ramos, no processo nacionalizador via educação destaca-se o intelectual e político Ivo D’Aquino. Ele atuou à frente da Secretaria do Interior, Justiça Educação e Saúde de Santa Catarina, à qual estava vinculado o Departamento de Educação Estadual. Porém, este Departamento, órgão máximo responsável pela orientação e administração do ensino público estadual, foi liderado pelos inspetores escolares João dos Santos Areão210 (Inspetor Federal das Escolas Subvencionadas), Luiz Sanches Bezerra da Trindade211 (Inspetor Geral das Escolas Particulares e Nacionalização) e Elpídio Barbosa212, (Inspetor Escolar). O escalão superior da instrução pública era constituído por esses inspetores escolares. Devido à atuação conjunta e permanente desses três educadores, tornaram-se conhecidos como a “santíssima trindade da educação catarinense” 213.

208 Ibid. p.32.

209 LE GOFF, Jaques. 2003, op. cit. p. 88.

210 João dos Santos Areão atuava como Inspetor Geral das Escolas Subvencionadas pela União desde o ano 1933,

mas, a partir do golpe do Estado Novo, essa nomenclatura foi alterada para “Inspetor das Escolas Subvencionadas pelo Governo Federal e Nacionalização do Ensino”. Mais que a mudança de nome, este assunto passou a ser orientado, em linhas gerais por um plano federal de nacionalização do ensino, comum para o sul do país. FIORI, Neide Almeida. Op. cit. p. 124.

211 Luiz Sanches Bezerra da Trindade. (1892-1971) catarinense nato. Trabalhou com Orestes Guimarães desde

1912, do qual parece ter recebido grande influencia. Começou sua carreira como professor de curso primário e posteriormente ocupou os cargos de diretor de grupo escolar, inspetor escolar e diretor do Departamento de Educação. Ao exercer esta função, foi o mentor intelectual da reforma do ensino público catarinense de 1935, que ficou conhecida pelo seu sobrenome – Reforma Trindade. Em 1938, o Decreto-Lei n. 124 cria a Inspetoria Geral das Escolas Particulares e Nacionalização do Ensino, e Trindade passou a exercer essa função. MONTEIRO, Jaecyr. Op. cit. p. 57; 66.

212 Elpídio Barbosa (1909-1966) nasceu na cidade de Florianópolis, SC. Atuou na área da educação como diretor

de grupo escolar, inspetor escolar, subdiretor técnico do Departamento de Educação do Estado (1935-1940). Na década de 40 foi diretor geral do Departamento de Educação. Nos anos 60, ocupou a Secretaria de Educação e Cultura, Também foi organizador e primeiro presidente do Conselho Estadual de Educação e co-fundador e primeiro reitor da Universidade do Estado de Santa Catarina. DALLABRIDA, Norberto. A Fabricação Escolar

das Elites: O Ginásio Catarinense na Primeira República. Florianópolis: Cidade Futura, 2001. p.250.

O poder que esses três inspetores escolares detinham em assuntos educacionais, era tão grande que, segundo Neide Fiori, incomodava a muitos, até o Interventor Federal Catarinense, Nereu Ramos. Então, para evitar constrangimentos, mas numa hábil tentativa de esvaziar a força daquele departamento, o governador em 1938, criou a Superintendência Geral do Ensino. A coordenação de todas as ações referentes à educação, inclusive o próprio Departamento de Educação, estava a sob responsabilidade desse cargo. O professor paulista Sebastião de Oliveira Rocha foi nomeado como primeiro superintendente, e permaneceu nessa função até 1940. Porém não foi muito bem sucedido em sua missão e retornou à São Paulo. Ironicamente justamente um dos três da “santíssima trindade” foi nomeado para sucedê-lo: Elpídio Barbosa. Logo depois esse órgão foi extinto voltando o Departamento de Educação a ser o responsável pela direção dos assuntos educacionais do Estado. Esse departamento foi coordenado pelo próprio Elpídio por quase dez anos214. Assim, a administração educacional do Estado ficou nas mãos desses educadores entre os anos 1935 e 1950.

Esses inspetores definiam a escola como o local onde se preparavam os novos brasileiros dentro do verdadeiro espírito de nacionalidade, através de professores orientados para este fim. Para eles a escola teria que ser uma oficina de caracteres adaptáveis ao regime político brasileiro. Coerente com essa visão, durante as inspeções às escolas, Areão focava três aspectos: a parte pedagógica, a escrituração e, sobretudo a nacionalização. Neste aspecto verificava a capacidade do professor com o domínio da língua vernácula, o conhecimento dos hinos pátrios, dos heróis da nossa história bem como a atenção com o culto às autoridades. A maneira como os professores eram orientados e a dinâmica das ações do magistério nessa direção se verão detalhadamente no decorrer desse trabalho, nos próximos capítulos.

O Inspetor Federal das Escolas Subvencionadas, João dos Santos Areão, considerou o Canto Orfeônico um fator primordial no processo nacionalizador. Por isso, ele assumiu a responsabilidade de orientar e fiscalizar essa modalidade de ensino em todo o território catarinense215. Sua concepção era que “através do canto seria possível levar às longínquas

214 FIORI, Neide Almeida. Op. cit. p. 124.

215 AREÃO, João dos Santos. Inspetoria Federal das Escolas Subvencionadas do Estado de Santa Catarina:

Inspetor João dos Santos ao Ministro da Educação e Saúde - Gustavo Capanema. Florianópolis, 20/04/1939. Relatório, 1º trimestre de 1939. APESC. (ver anexo n. 6)

escolas espalhadas pelos sertões colonizados por ‘elementos alienígenas’, a palavra vivificadora da alma nacional”.216

Pode-se notar sua firme convicção da função que o Canto Orfeônico deveria desempenhar no processo de nacionalização e formação de uma nova consciência cívica nos alunos, por suas observações escritas no 21º relatório de inspeção dirigido a Gustavo Capanema, então Ministro da Educação do país. Entre outras informações que considerou relevantes, destacou o progresso alcançado pela educação catarinense no último quadriênio de 1938. Em seguida mencionou que sua Inspetoria assumiu a tarefa de orientar, organizar, promover e fiscalizar os orfeões nas escolas catarinenses. Quanto a este trabalho ele declarou: “tomando o encargo de orientar o ensino da música, o ‘Canto Orfeônico’, penso ter assumido um compromisso que não póde deixar dúvida quanto a vontade de ser útil a tão elevado desiderato”217.

Os relatórios da inspetoria federal das escolas subvencionadas dirigidos a Capanema, deixam transparecer o quanto Areão considerou importante acumular essa nova responsabilidade. Ele reafirmou seu compromisso com o Canto Orfeônico em todos os relatórios do ano 1939. Nestes documentos, destacou reiteradas vezes o valor do canto para elevar o espírito de civismo. No relatório do segundo trimestre de 1939, escreve:

No relatório correspondente ao primeiro trimestre deste ano (1939) tive a honra de apresentar a Vossa Excelência, disse que esta Inspetoria havia assumido o compromisso de orientar o ensino do canto nas escolas e organizar os orfeões. (...) É outro trabalho que esta Inspetoria tomou ao seu encargo, visando fazer com que as bocas infantis vocalizem as impressões

de sua alma, moldando-as dentro do mais elevado espírito de civismo. 218

No terceiro relatório trimestral, ao manifestar seu empenho patriótico junto aos escolares através da música, declarou: “É visando a parte cívica do canto com os conhecimentos do espírito que ela encerra que estou procurando nortear o seu encaminhamento” 219 . Também no último relatório trimestral deste mesmo ano encontrou-se declaração similar: “encarregado como estou de incentivar o cultivo da música em nossas escolas, (...) fiz várias aulas para orientar o ensino da música e Canto Orfeônico para despertar

216 Idem. Relatório, 3º trim., 1939. fl. 228, p.9.

217 O primeiro parágrafo desse documento registra que este foi o 21º relatório enviado ao Ministro Capanema.

Idem. Relatório, 1º trim., 1939. fl 164, p. 2.

218 Idem. Relatório, 2º trim., 1939. fl. 199, p. 5. (ver anexo n. 7) 219 Idem. Relatório, 3º trim., 1939. fl. 229, p 7.

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