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C ONCLUSÕES /C ONSIDERAÇÕES F INAIS

A transição demográfica, o aumento da esperança de vida da população e o número crescente de doenças crónicas de evolução prolongada e terminal, resultam num aumento significativo de pessoas dependentes para realizar autonomamente as AVDs, passando a depender da ajuda de outra pessoa para realizá-las. Decorrente do envelhecimento da população, observa-se a tendência para manter o menor tempo possível a pessoa em instituições hospitalares, ocorrendo um regresso a casa cada vez mais precoce e, muitas vezes, em situações de elevada dependência e com necessidades de cuidados específicos. Por sua vez, os cuidadores são confrontados com dificuldades e até com falta de preparação para a exercer o papel de cuidador, apresentando necessidades que passam pelo aprender a cuidar, no sentido da aquisição de conhecimentos e de desenvolvimento de competências que, no caso específico do projeto de intervenção, está relacionado com a prevenção da UP. Vários autores (Martins et al., 2007; Rocha et al., 2011) alertam para a necessidade de capacitação do cuidador através de uma intervenção sistematizada de ensino/instrução e supervisão das tarefas inerentes aos cuidados a prestar no domicílio. O EEEC assume um papel fulcral na capacitação dos cuidadores, no entanto, em todo este processo as intervenções implementadas e as respostas dadas pelo enfermeiro devem respeitar sempre a realidade dos cuidadores e da pessoa cuidada, não impondo a sua perceção, antes usando-a como contributo para que os cuidadores descubram outras realidades, promovendo, assim, mudanças que favoreçam uma melhor adaptação à situação.

Somos da opinião que a equipa multidisciplinar, de entre os quais os enfermeiros, como educadores na área da saúde, devem estar atentos e promover assistência domiciliária, baseada num cuidar holístico ao doente e familiares, e não somente à realização de atitudes curativas, promovendo desta forma a capacitação dos cuidadores em tarefas relacionadas com a prevenção de UP, conducentes à qualidade dos cuidados prestados no domicílio e ao mesmo tempo para a diminuição dos custos em saúde.

As necessidades dos cuidadores, identificadas através do diagnóstico de situação, conduziram à constatação de uma ausência significativa de competências específicas para cuidados de prevenção de UP, demonstrada pelos cuidadores dos utentes dependentes referenciados para cuidados da ECCI Vila Real I, que tornaram prioritária a elaboração e implementação do

projeto “Cuidador: Capacitar para a prevenção de UP”, que visava desenvolver competências nos cuidadores no âmbito da prevenção de UP. O projeto incluiu avaliação de conhecimentos após as atividades de EpS, comparando-os com os inicialmente demonstrados, tendo sido utilizado o guião de entrevista relativo aos conhecimentos sobre prevenção de UP aplicado antes e após a formação. A avaliação das competências foi efetuada numa fase posterior, no domicílio dos utentes, durante a visita domiciliária da ECCI Vila Real I, para a qual foi elaborada uma grelha de observação, contemplando as dimensões relativas à observação e cuidados à pele e fatores de risco de UP. A supervisão de competências do cuidador, ficou limitada a estas duas dimensões dos conhecimentos relativos à prevenção de UP, em virtude do tempo disponível para a execução do projeto. De forma a permitir uma visão global do impacto do projeto no desenvolvimento de competências no âmbito da prevenção de UP, apresentaremos de seguida as principais conclusões do projeto de intervenção “Cuidador: capacitar para a prevenção de U”, começando pela caracterização dos cuidadores e pessoas cuidadas.

Os cuidadores dos utentes referenciados para cuidados da ECCI Vila Real I

O grupo de cuidadores neste projeto foi constituído na totalidade por elementos do sexo feminino, três casadas, uma viúva e outra divorciada, apresentando idades compreendidas entre 39 e 62 anos. Relativamente às habilitações académicas, três cuidadoras referiram possuir o ensino básico, uma o ensino secundário e outra o ensino superior. Apenas uma cuidadora não coabita com a pessoa de quem cuida, no entanto, reside na mesma localidade, a maioria é doméstica ou aposentadas/reformadas, quatro possuem relação de parentesco com a pessoa cuidada, sendo que, três são filhas, uma é tia e apenas uma possui relação profissional (empregada doméstica contratada pela família do utente). Prestam todos os cuidados que o utente necessita, tendo a maioria apoio dos familiares nessas tarefas. Três cuidadoras já tiveram formação sobre a prestação de cuidados a pessoas dependentes e duas nunca tiveram formação.

A pessoa cuidada, utente da ECCI Vila Real I

Relativamente às pessoas dependentes cuidadas, verificou-se que maioria é também do sexo feminino, sendo apenas um do sexo masculino, com idades compreendidas entre os 10 e 89 anos. Quatro são viúvas e um é solteiro. Apresentam baixa literacia, um não sabe ler nem escrever, três sabem ler e escrever, e um possui o segundo ciclo do ensino básico. O motivo

de ingresso na ECCI, foi maioritariamente o tratamento de úlcera e apenas um foi referenciado para cuidados de reabilitação. Todos classificados como incapazes, relativamente à autonomia física e instrumental e apresentam alto risco de desenvolver UP, após aplicação da escala de Braden. Apenas um não apresenta UP, os restantes apresentam desde uma a seis UP, classificadas nas categorias grau II e III.

De forma a explicitar os ganhos em conhecimentos sobre cuidados de prevenção de UP, obtidos pelos cuidadores que integraram o projeto de intervenção, faremos a comparação entre os dois momentos antes e após a actividade de EpS.

Obtiveram-se ganhos em conhecimentos na totalidade dos cuidadores nas dimensões relacionadas com o conceito e etiologia de UP, os locais anatómicos de risco em decúbito dorsal, a alimentação e hidratação e o uso de equipamentos de alívio de pressão. Somos da opinião que: conhecer os locais anatómicos de risco permitirá ao cuidador efetuar de forma mais dirigida e precisa a observação da pele após posicionamento neste decúbito e, por conseguinte, a identificação precoce de UP; conhecer a importância da alimentação e hidratação na prevenção da UP, possibilitará fazer escolhas seguras relacionadas com a ingestão de líquidos e de nutrientes essenciais à manutenção da integridade da pele e estruturas de suporte; conhecer e manipular os equipamentos de alívio de pressão promoverá a correta utilização destes recursos, contribuindo para diminuir fatores de risco como a pressão e fricção.

Relativamente à observação e cuidados à pele e locais anatómicos de risco em decúbito lateral, verificou-se que quatro cuidadores obtiveram ganhos em conhecimentos, o que poderá proporcionar-lhes um melhor desempenho nas tarefas relativas a estes cuidados, existindo no entanto um cuidador que necessita de reforço educativo neste domínio. Por último, nos conhecimentos sobre fatores de risco, técnica de posicionamento e locais anatómicos de risco em decúbito ventral, obtiveram-se resultados ligeiramente mais baixos em relação às outras dimensões avaliadas. Propõe-se o reforço educativo, através de intervenções efetuadas de forma sistematizada e com continuidade temporal, dirigidas a dois cuidadores, que mantiveram o diagnóstico de “conhecimento não demonstrado”, promovendo a aquisição/consolidação de conhecimentos necessários à realização de técnicas corretas de posicionamento corporal e identificação de fatores de risco, visando a prevenção de UP. Os resultados demonstram o sucesso do projeto relativamente aos ganhos em conhecimentos no âmbito da prevenção de UP, pelos cuidadores, estando de uma forma geral assegurada uma

das dimensões, o saber, e que certamente determinará a competência para o exercício do papel de cuidador.

No entanto, porque a competência incorpora também uma componente prática, que ao mobilizar o conhecimento para a ação, determina o saber fazer e principalmente o saber agir em diferentes situações. Por isso, procuramos saber se o conhecimento adquirido através da actividade ensino/instrução e treino, relacionado com a observação e cuidados à pele e prevenção de fatores de risco, se traduziu em competência do cuidador no domicílio. Os resultados obtidos não revelaram uniformidade, observando-se comportamentos diferentes relativos às dimensões avaliadas. Os ganhos em conhecimentos relativos à observação e cuidados à pele manifestaram-se em comportamentos dirigidos à prevenção em três dos cinco cuidadores que possuíam conhecimentos. Na dimensão relativa aos fatores de risco, que se previa produzir comportamentos orientados para a prevenção relativos à pressão, fricção e deslizamento, apenas o cuidador que não demonstrava conhecimentos, também não teve comportamentos adequados à prevenção de UP. Ressalta a importância de uma noção inerente à competência o “Querer”, pelo que se propõe o recurso a outras áreas do conhecimento, como da psicologia, numa tentativa de promover estratégias que potenciem a motivação do cuidador, orientando o comportamento para o querer fazer.

Resultante da reflexão do trabalho desenvolvido e dos resultados obtidos, emergem como principais conclusões do projeto de intervenção “Cuidador: Capacitar para a prevenção de UP”: i) a consciencialização da necessidade de envolvimento de diferentes estruturas/serviços para a concretização do projeto; ii) a reduzida participação do número de cuidadores, pelo que será importante equacionar estratégias que promovam a adesão dos cuidadores a projetos educacionais, por exemplo, garantir períodos de tempo livre para participação em ações de formação, a criação de grupos de cuidadores que atuem como dinamizadores dos programas educacionais e a promoção do papel de cuidador, conferindo-lhe maior visibilidade e valorizando o seu contributo na sociedade atual; iii) a constatação da aquisição de conhecimentos que deve ser certificada pela monitorização das competências dos cuidadores no contexto real da prestação de cuidados; iv) a necessidade de assegurar dinâmicas formativas que promovam o desenvolvimento de competências dos cuidadores e que também do bem-estar do cuidador, de que é exemplo a importância de estimular espaços e tempos de lazer e assegurar o apoio no cuidar; v) o desocultar do estereótipo do envelhecimento considerando que a UP é coexistente com a dependência; vi) a rotura com o paradigma do

“cuidar por” para um “cuidar com”, promovendo a autonomia e um envelhecimento bem sucedido; vii) a rentabilização e otimização dos diferentes recursos comunitários (juntas de freguesia, centros paroquiais, associações desportivas e recreativas), no sentido de potenciar o tipo de apoios aos cuidadores e pessoas cuidadas, minimizando os efeitos da solidão e exclusão social.

Para finalizar, importa ressalvar que, embora os objetivos a que nos propusemos tenham sido alcançados, como demonstram os valores atingidos pelos indicadores de resultado, fica a noção de que este projeto não termina aqui, propõe-se a sua continuidade pela equipa da ECCI Vila Real I, utilizando-o como ferramenta para conseguir indicadores de qualidade na prevenção de UP, no domicílio, numa perspetiva de continuidade e articulação entre os diferentes cuidados de saúde. Um projeto mais ambicioso poderá ser equacionado com base numa atitude conjunta entre os cuidados hospitalares e os cuidados primários, centrada nos utentes e seus cuidadores.

Coexistiu com o desenvolvimento do projeto de intervenção, a prestação de cuidados na ECCI Vila Real I e na USP, que conjugando a interdisciplinaridade do conhecimento, contribuíram para o desenvolvimento e aprofundamento das competências do EEEC e para o reconhecimento da sua intervenção na formulação de programas de intervenção que promovam a capacitação de grupos e comunidades. Se o desafio é grande e, por vezes, exaustivo, não deixa, no entanto, de ser compensador quando acontece em pleno a concretização do “empowerment” das pessoas, grupos e comunidades.

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