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A recepção em Roma dos termos do art. 10.º presente na Convenção de 20 de Agosto de 1890 não foi a melhor. Logo a 9 de Setembro, depois da assinatura do convénio, Rampolla informou Vannutelli, que, apesar da Santa Sé acolher “o mais favoravelmente possível” os pedidos portugueses sobre o Padroado em África, os termos previstos no tratado vinham dificultar a decisão, ou seja, o âmbito do artigo levantava alguma agitação no seio da Cúria. Como poderia o padroeiro cumprir “os seus deveres de proteger, defender, promover e favorecer a religião católica” se ficaria obrigado a permitir a livre actuação dos “missionários heterodoxos?”. Aliás, uma das conclusões tomadas na congregação mista de 1889 era exactamente a de se exigir a Portugal o cumprimento da legislação referente aos protestantes, excepto na Bacia Convencional do Congo salvaguardada pelo art. 6.º do Acto de Berlim. Com o acordo luso-britânico essa área aumentava exponencialmente, pois na convenção de Agosto, o âmbito do art. 10.º estendia-se a todas as possessões ultramarinas das nações em questão. Um dos principais receios de Rampolla era o dinamismo missionário britânico, nomeadamente protestante, contra o qual Portugal não tinha meios de concorrer.129

Roma, reclamando da liberdade aceite, assumia que a única forma de inverter o iminente avanço da evangelização protestante era ela própria conseguir essa liberdade de acção, que constituía uma atitude contrária às regras do regime padroeiro. Além disso, a nova realidade trazia mudanças significativas aos pressupostos apresentados por Lisboa para se negociar sobre o Padroado. A política missionária portuguesa precisava de reordenar os seus argumentos, uma vez que o sistema padroeiro permanecia vital para o império e sua consolidação, nos termos planeados pelo governo português. Mas a tentativa de um novo espaço padroeiro para o “novo” império que se construiria a partir de 1891, com as delimitações luso- britânicas e a aquisição da Lunda, logo se deparou com uma sucessão de impasses causados pelas perspectivas e pelas relutâncias de ambas as partes em chegar a um                                                                                                                

129 Rampolla a Vannutelli, 9 de Setembro de 1890; ASV/ANL, N.º 318, Fasc. 4, Div. IV, Pos. III, Sez.

4ª: Collegio delle Missioni Ultramarine e Africane (1885-1888), fls. 227-228. Aquando da assinatura do Tratado do Zaire (1884), Vannutelli levantara as mesmas dúvidas sobre a dimensão religiosa associada aos termos de liberdade de culto no ultramar. Cfr. Jerónimo, A Diplomacia do Império, 291- 292.

modus vivendi, só conseguido de forma tácita, porque uma Concordata de África

demonstrou-se impossível de alcançar.

2.1 – Um Padroado para um “novo” império

Lisboa tentou, desde logo, explicar a Roma que da sua parte houvera a intenção de anular a cláusula sobre a liberdade religiosa nos convénios com a Grã- Bretanha. O ministro Barbosa du Bocage confessou a Vannutelli que os britânicos sempre a tinha visto como uma “condição absoluta e sine qua non” e nesse sentido, não havia sido possível aos negociadores portugueses recusar o tratado por “motivos religiosos”, mesmo que na discussão parlamentar tenha minimizado as críticas feitas ao alcance religioso do artigo. O núncio, por seu turno, estranhava que um estado constitucionalmente defensor da confissão católica “aceitasse oficialmente” a liberdade religiosa nos seus territórios, mesmo que fora do espaço metropolitano. Além disso, fora-lhe indicado que Serpa Pimental, durante a negociação, opusera-se pouco aos “aspectos religiosos” do acordo. Anos antes, o mesmo Serpa havia sido questionado sobre a falta de oposição portuguesa face ao conteúdo do art. 6.º do Acto Geral de Berlim, o que deixa transparecer a secundarização do fenómeno religioso aquando de negociações diplomáticas referentes à dimensão imperial, ou pelo menos, a inabilidade portuguesa em fazer valer o seu ponto de vista, porque no seu discurso oficial, o Padroado era um direito histórico irrevogável.130

Meses mais tarde, quando o Tratado de 11 de Junho de 1891 encerrou definitivamente o litígio aberto com o Ultimato, a Santa Sé compreendeu a inevitabilidade dos termos do art. 10.º. E, apesar, da nova redacção restringir a aplicação do acordo à África central e oriental, em vez de “todas as possessões ultramarinas”, isso não recebia qualquer júbilo da Cúria. Ao encarregado de negócios da Nunciatura de Lisboa, Giulio Tonti, Rampolla reforçou o desagrado pontifício pela aceitação portuguesa do artigo e a satisfação demonstrada pelo fim da “triste situação” em que Portugal se encontrava desde Janeiro de 1890, não escondendo “o desprazer” de Roma acerca do art. 10.º. O secretário de Estado fazia questão que o governo português tivesse consciência disso.131

                                                                                                               

130 Jerónimo, A Diplomacia do Império, 291-292.

131 Rampolla a Tonti, 18 de Junho de 1891; ASV/ANL, N.º 319, Div. IV, Pos. IV, Sez. 1ª: Miscellanea

De modo a deixar inquestionável a posição da Santa Sé, Rampolla encarregou Vannutelli de avisar o governo, que o disposto do tratado seria levado em conta, no seu teor religioso, nas futuras negociações sobre o Padroado, caso se viessem a realizar. Para Roma, o documento “modificava essencialmente o estado das coisas”: liberdade religiosa e privilégio padroeiro eram difíceis de conciliar. Por conseguinte, a Nota de 28 de Janeiro de 1887 e a Memória apensa teriam de ser revistas. Principalmente por Lisboa.132

Quando Portugal enviou esses documentos, as suas alegações territoriais baseavam-se nas convenções de 1886 com a França e a Alemanha, que lhe haviam garantido o espaço entre Angola e Moçambique para a sua esfera de influência. Entre o final da década de 1880 e o início da década de 1890, o país foi procurando fixar os limites dessa área, assim como aconteceu com as restantes potências coloniais. A conflituosidade levava à necessidade de regular diplomaticamente as pretensões individuais de cada Estado. O Tratado de 11 de Junho é exemplo de um dos inúmeros acordos assinados entre os estados europeus para essa definição territorial. Um dos seus feitos foi delimitar a fronteira de Moçambique com as possessões britânicas, o que traçava de forma quase permanente a configuração da África Oriental Portuguesa. Resolvidos, de forma mais ou menos permanente, os limites territoriais a oriente, o império no ocidente ficava num limbo maleável de fronteiras que apenas seria resolvido no início do século XX, com a questão do Barotse, referida abaixo.

Esta incerteza fronteiriça também era válida no caso da delimitação luso- congolesa, ou seja, entre o nordeste angolano e o Estado Independente do Congo. Apesar do Mapa Cor-de-Rosa não incluir o vasto território da Lunda, expedições militares foram patrocinadas com o objectivo de ocupá-lo ou incluí-lo na esfera portuguesa, mesmo que o grande projecto rosado estivesse, também, a ser levado a efeito. A estratégia lusa em direcção aos domínios do Muata Yamvo (Muatiânvua) despertou a rivalidade das autoridades belgas no Congo, desejosas, elas próprias, de alargarem a sua soberania à Lunda. E, procurando, aplicar a mesma receita que esperavam resultar no Niassa, as autoridades portuguesas promoveram a criação de uma nova missão em Malange, com o objectivo de facilitar precisamente, “a expansão da influência portuguesa”. A disputa com o Estado Independente era inevitável. Este não só alegava que a Lunda estava dentro dos seus limites, como                                                                                                                

132 Rampolla a Vannutelli, 9 de Setembro de 1890; ASV/ANL, N.º 318, Fasc. 4, Div. IV, Pos. III, Sez.

usava o Mapa rosado para comprovar que Portugal não tinha pretensões sobre o território. Nesse sentido, Leopoldo II assinou um decreto onde criava o distrito do Cuango, que incluía os territórios da Lunda. Era contrapor pretensões a pretensões. Havia que sentar à mesa das negociações.

Em Fevereiro de 1891, belgas e portugueses reuniram-se em Lisboa. Durante a discussão, Portugal contou com um aliado: a Congregação do Espírito Santo, a quem fora atribuída a missão de Malange. Esta decisão portuguesa demonstra tanto a dificuldade de recurso a clero secular e não congreganista, como o empenho dos espiritanos em se ressarcir das perdas de 1886-1888. Acima de tudo, o Estado Independente teria de enfrentar um opositor que não esquecera a saída imposta. Ao Geral espiritano, Van Eetvelde reclamava que os seus subordinados não perdiam “nenhuma oportunidade de hostilizar o Estado do Congo”. Emonet justificava “certas simpatias por Portugal”, nutridas por espiritanos a trabalhar nos territórios portugueses, como um “natural sentimento de reconhecimento” por quem os ajudara “com generosidade”. Esta realidade contrastava com a existente no Congo belga. O prefeito apostólico do Baixo Congo, Pascal Campana, visto com desconfiança pelos portugueses, chegou a escrever a Vannutelli opinando que o Muata Yamvo deveria ficar sob domínio português, por ser o “meio mais seguro de propagar o evangelho” no território. Não só ficava sob soberania portuguesa, como se abria à missionação espiritana, pois esta só teria garantias de aí permanecer se a área dependesse de Lisboa. A Convenção de 25 de Maio de 1891 estabeleceria as fronteiras entre a província de Angola e o Estado Independente do Congo. A Lunda passava para domínio português.133

A actuação dos espiritanos na questão da Lunda ao lado dos portugueses contra o Estado Independente não estava muito longe da lógica que presidira à campanha dos escoceses no Niassa. Tal como estes, também os missionários do Espírito Santo temiam que se o território caísse nas mãos de um poder que os via com desagrado, a sua actividade poderia ser prejudicada. Evidentemente que existiam significativas diferenças entre os dois processos. Os escoceses, que já estavam instalados no Niassa, apelaram à sua nação para empreender a anexação daquela                                                                                                                

133 «Relatório do Ministro da Marinha e Ultramar sobre a criação da missão de Malange», 31 de

Outubro de 1889; em Angola, III, 736. Emonet a Van Eetvelde, 10 de Fevereiro de 1891; Van Eetvelde a Emonet, 21 de Janeiro de 1891; AA, Portefolio 573, laisse 64. Annales Apostoliques de la

Congrégation du Saint-Esprit, n.º 21, Janeiro de 1891, 6.º ano. Campana a Vannutelli; 24 de Abril de

1891; Vannutelli a Rampolla, 20 de Maio de 1891; ASV/SS, 1893, rub. 250, fasc. 1, fls. 214-214v. Robert Cornevin, Histoire du Congo-Léo (Paris: Éditions Berger-Levrault, 1963), 120.

região, pelo contrário, os espiritanos não estavam na Lunda e apenas explicaram à Santa Sé as desvantagens do território ficar sob bandeira congolesa. O âmago de cada uma das estratégias está no recurso ao poder político imperial para garantir a sua acção evangelizadora e a expansão da fé. Além disso, a posição espiritana espelhava a sugestão feita por Lecomte, em 1889, da Congregação se juntar ao esforços em defesa do Padroado, de modo a cair nas boas graças dos portugueses, podendo vir a usufruir, no futuro, dos benefícios desse apoio.134

A aquisição da Lunda foi seguida da assinatura do Tratado Luso-Britânico, dias depois, o que dava a Portugal um espaço ultramarino mais estável do que os seus sonhos cor-de-rosa haviam podido concretizar. Ora, se o Padroado tinha, tanto na perspectiva nacional como na pontifícia, uma correlação com a geografia, estas novas circunstâncias alteravam “completamente” a situação em que foram apresentadas a Nota e a Memória de 28 de Janeiro de 1887, ultrapassadas pelos acontecimentos. Com uma realidade imperial de facto, Portugal poderia retomar as negociações paradas desde Dezembro de 1889, por causa das disputas interimperiais luso- britânicas e luso-congolesas, sendo “urgente” abreviá-las.135

Foi com vista a esse objectivo que no início de 1892, o Ministério dos Negócios Estrangeiros começou a elaborar uma nova proposta para submeter à Santa Sé. Tal como em 1887, a opinião dos prelados ultramarinos mantinha-se válida e necessária. O documento, que tinha em consideração um relatório do então missionário António Barroso, feito entre 1890 e 1891, foi remetido ao bispo de Angola e Congo e ao prelado de Moçambique, à data o próprio Barroso, para ser apreciado. Mais uma vez, a comunicação era directa entre o ministério e os religiosos ultramarinos, sem o recurso intermédio do Ministério da Marinha e Ultramar, o que revela a urgência que se continuava a dar à questão.136

Pela sua parte, o bispo angolense, António Dias Ferreira, vindo de Moçambique, concordava com a ideia de que a sé de Luanda deveria ser elevada a                                                                                                                

134 Porém se os espiritanos esperavam, de alguma maneira, que o seu apoio à causa portuguesa na

Lunda fosse mudar substancialmente as agruras de Portugal face a eles, estavam enganados. Cerca de nove meses depois da assinatura da Convenção luso-congolesa, a Direcção-Geral do Ultramar manifestava o seu desagrado pela instalação de uma nova missão francesa (espiritana) em Cabinda, à qual as autoridades portuguesas não se podiam “opor” em virtude dos termos do Acto Geral de Berlim.

DGU ao secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, 23 de Janeiro de 1892; AHD/MNE,

Concordata, Cx. 1010, fls. 385-385v.

135 António Costa Lobo (MNE) a Martens Ferrão, 26 de Janeiro de 1892; fls. Martens Ferrão a Costa

Lobo, 6 de Fevereiro de 1892; AHD/MNE, Concordata, Cx. 1010, 386-386v. e 387-388.

136 António Barroso, «Circunscrição diocesana no Padroado Africano. Apontamentos do bispo de

arcebispado primaz, em virtude do “desenvolvimento progressivo” que a cidade vinha tendo, premissa partilhada pelo governador-geral de Angola. Pelo contrário, entendia que Cabo Verde deveria permanecer sufragânea de Lisboa (ficando a Guiné como parte do bispado e governada por um vigário-geral), enquanto São Tomé poderia manter a dignidade episcopal, não havendo necessidade de passar a prelazia. Mas, o norte de Angola (o distrito do Congo) não deveria agregar-se a São Tomé continuando sob alçada do bispo em Luanda. Dias Ferreira também concordava que a Prelazia de Moçambique subisse a diocese, sendo “urgente manter ali” um Seminário. Por fim, alinhava com a ideia de criar um bispado no sul da província angolana, que teria o contributo do já existente Seminário da Huíla.137

Por seu lado, o prelado de Moçambique aprovava o documento, por “conciliar os verdadeiros interesses nacionais, com os religiosos”. Com os termos apresentados, Barroso entendia que se salvavam os lugares onde Portugal possuía missões e regulava-se a situação complicada de Cabinda e Lândana. Além disso, a organização de uma vasta província eclesiástica a sul do Equador, agregando as possessões portuguesas, poderia “ombrear com a francesa ao norte de África”. O religioso acreditava que da parte da Cúria não se poderiam levantar “objecções sérias” contra a proposta, uma vez que o país prescindia de regiões que o direito histórico lhe haviam associado, e que o passado recente demonstrava o empenho moral e material do governo para a acção missionária católica. Barroso ia mais longe, afirmando que sem o auxilio das autoridades portuguesas nada se conseguiria fazer no sul de Angola e que as divisões representadas pelas Prefeituras Apostólicas do Baixo Congo e da Cimbebásia não passavam do papel e do exposto no “atlas das missões católicas” e que “sobre o terreno” existia “bem pouco” que fosse pertença da Propaganda. Também usava o argumento da existência material de missões que a Santa Sé sustentava face a Portugal. A principal ressalva que fazia aos termos do projecto era respeitante à transferência dos privilégios da sua Prelazia para a Prelazia da Guiné a ser criada, pois a Santa Sé estaria relutante a manter “privilégios excepcionais”. Contudo, na sua opinião, o governo tudo deveria fazer para mantê-los como “uma relíquia gloriosa do muito que mereceram os [...] antepassados da magnificência dos Pontífices romanos”. Para contributo da documentação a enviar a Roma, juntava                                                                                                                

137 Dias Ferreira a Costa Lobo, 24 de Maio de 1892; AHD/MNE, Concordata, Cx. 1010, fls. 392-394.

Entretanto, Costa Lobo deixava a pasta, a 27 de Maio, sendo substituído por D. António Aires de Gouveia.

quadros estatísticos sobre a prelazia, como elementos negociais indispensáveis. Alertava para a urgência da conclusão do acordo, pois em vinte anos, este seria ainda mais difícil, em virtude do desenvolvimento e dos planos empregues no continente, que consolidariam a realidade religiosa. Para Portugal seria muito mais complicado contrariar a Propaganda e retirá-la das prefeituras apostólicas se a sua presença no terreno se fortalecesse através de uma rede de missões e estações civilizadoras que servissem de argumento favorável ao dicastério, protegido pelas garantias das convenções internacionais. Havia perfeita consciência de que Roma não esqueceria as possibilidades que o art. 6.º de Berlim lhe dava.138

O embaixador português junto do Papa era da mesma opinião, pois alterar qualquer status quo, que viesse a existir, apresentaria mais dificuldades e suscitaria maior oposição por parte da Cúria. Tinha em conta que desde 1887, o contexto eclesiástico já se alterara: primeiro com a protecção prevista no art. 2.º do Acto de Bruxelas, renovando Berlim, e depois com os pressupostos do art. 10.º do Tratado de 11 de Junho, além da contínua criação de jurisdições eclesiásticas. Para Martens Ferrão era imprescindível negociar com a Santa Sé, entendendo que este era um assunto fundamental na acção do governo português.139

O Ministério da Marinha e Ultramar foi igualmente abordado e, antes do ano de 1892 terminar, remeteu as suas considerações acerca do projecto enviado pelos Estrangeiros. Para Moçambique, o parecer do Ultramar defendia a elevação da prelazia a diocese, uma ideia antiga e recorrente, fazendo-a corresponder aos limites definidos pelos acordos com os alemães e os britânicos. Esta conciliação entre mapa político e mapa eclesiástico era o meio necessário para o desenvolvimento do trabalho missionário, pois dava “uma unidade de acção às missões católicas, assim nacionais, como estrangeiras”. Não obstante de referir que em “nada pode prejudicar os convénios internacionais de liberdade religiosa”, o relatório não deixava de sublinhar a importância da missionação católica em contraponto a actividade religiosas distintas do catolicismo, mesmo que as missões católicas fossem estrangeiras, até porque o sistema padroeiro acabaria por incluí-las na supervisão portuguesa. Tinha-se em mente o pró-vicariato do Niassa, dos padres brancos, e a Missão do Zambeze, dos jesuítas. A formação de um bispado para toda a província                                                                                                                

138 Barroso ao Director-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, 20 de Junho de 1892;

AHD/MNE, Concordata, Cx. 1010, fls. 395-396v.

139 Martens Ferrão a Aires de Gouveia, 1 de Agosto de 1892; AHD/MNE, Concordata, Cx. 1010, fls.

era vista como uma “verdadeira força contra as invasões de propaganda religiosa de outra espécie, especialmente da propaganda maometana”. A presença do Islão na África oriental era entendida como uma “verdadeira calamidade”, por causa das “suas diligências para a continuação do estado servil”, o que mostra a importância do discurso humanitário na defesa do Padroado, cuja estruturação contribuiria, no futuro, para conter a actividade dos comerciantes arabizados do Índico. De modo a promover a obra evangelizadora, propunha-se o estabelecimento de um seminário diocesano em Inhambane ou noutra localidade, “que prepare para a carreira eclesiástica os filhos do país”, uma importante alusão a um dos objectivos primordiais da evangelização cristã: a formação de clero autóctone. Além disso, um seminário era condição indispensável a uma diocese.140

Para Angola, concordava-se com a constituição de um arcebispado primaz, com o título de Primaz da África do Sul, correspondendo a toda a província, ideia que tivera o apoio tanto de Dias Ferreira como de Barroso. Por outro lado, a conseguir-se, este plano afastava qualquer possibilidade de concretizar os rumores que haviam envolvido a missão do britânico Lintorn Simmons à Santa Sé, em 1889, sobre dar esse primado à Grã-Bretanha.141

A proposta de Angola formar uma única entidade jurisdicional era a que representava maior dificuldade nas negociações, por causa da inclusão nessa circunscrição das discutidas prefeituras apostólicas existentes na província – Baixo Congo e Cimbebásia. Contudo, havia a esperança de que “os esforços empregados pelo Padroeiro” fossem “argumento ponderoso para encaminhar a questão”. Por outro lado, procurava-se prevenir que viessem a existir jurisdições mistas em vez de jurisdições absolutas, exclusivamente dependentes do Padroado, pelo que as soluções propostas pelos espiritanos, em 1889, não eram opção. Tendo em conta a dimensão do território a atribuir à arquidiocese primaz, concordava-se com a formação de um novo bispado, no sul da província, designado dos Ambuelas (compreendendo parte dos distritos de Benguela e Moçâmedes), que serviria de centro promotor da acção missionária portuguesa e “um auxiliar poderoso das missões católicas estrangeiras”, isto é, espiritanas, que passariam à dependência do futuro bispo dos Ambuelas. Deste modo, não se prescindia do trabalho da Congregação do Espírito Santo, dificilmente                                                                                                                

140 DGU a DGNPD, 24 de Dezembro de 1892; AHD/MNE, Concordata, Cx. 1010,fls. 91-95v.

141 O título de Primaz de África fora atribuído ao cardeal Lavigerie em 1884, quando Leão XIII o

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