• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III: SOBRE AS OPERAÇÕES DE CONSTRUÇÃO DE

3.2 Operações semânticas de construção de representações discursivas

3.2.1 Operações da sequência descritiva – Jean-Michel Adam

Como dito anteriormente, acompanhamos e concordamos com a sugestão de Rodrigues, Passeggi e Silva Neto (2012) de que as operações linguísticas da sequência descritiva podem ser compreendidas como operações de construção de representações discursivas, porque se aplicam aos demais tipos de sequências textuais, como a narrativa e a argumentativa, por exemplo. Assim, é pertinente aqui recuperar a definição de Adam (2011) para este tipo de sequência, bem como cada um dos tipos de operações apresentados pelo autor.

Conforme Adam (2011), a descrição difere dos demais tipos de sequências textuais porque não possui uma ordem de agrupamento das proposições- enunciados em macroproposições ligadas entre si, apresentando, portanto, uma frágil caracterização sequencial. Em razão disso, dizemos que a sequência descritiva não apresenta uma composicional típica, mas, como veremos, é formada por operações de base descritiva. Assim, no nível dos enunciados mínimos, isto é, da proposição, “a teoria ilocucional localiza a parte descritiva dos enunciados no conteúdo proposicional (p), sobre o qual se aplica um marcador de força ilocucionária F(p).” (ADAM, 2011, p. 217). Ou seja, no nível da proposição, a descrição se estrutura a partir da atribuição de uma predicação a um sujeito, o que constitui a base de um conteúdo proposicional.

Pensando assim, Adam (2011) sugere que as sequências descritivas possuem força ilocucionária, considerando que é um sujeito que realiza a descrição, ação que não é realizada independente de um ponto de vista, de uma tomada de posição. “Do caráter indissociável de um conteúdo descritivo e de uma posição enunciativa que orienta, argumentativamente, todo enunciado, decorre o fato de que um procedimento descritivo é inseparável da expressão de um ponto de vista, de uma visada do discurso” (ADAM, 2011, p. 217). Isto significa dizer que os conteúdos

descritivos não são expressos objetivamente pelos enunciados, mas apresentam uma atitude subjetiva.

No nível da composição textual, a extensão da estrutura da descrição é variável, independentemente dos objetos de discurso, sendo definida por um grupo de operações descritivas de base, ordenadas segundo determinação de cada plano de texto. Estas operações, acompanhando Adam (2011, p. 218), na verdade, constituem quatro “macrooperações que agrupam nove operações descritivas que geram uma dezena de tipos de operações descritivas de base”. As quatro macrooperações de construção da sequência descritiva apresentadas pelo autor são: tematização, aspectualização, relação e expansão por subtematização, as quais descreveremos a seguir.

A tematização, a principal macrooperação, “dá unidade a um segmento e faz dele um período tão fortemente característico que aparece como uma espécie de sequência.” (ADAM, 2011, p. 23). Trata-se de procedimento que consiste, pois, em expandir as propriedades do objeto do discurso, suas partes, a situação por meio da aspectualização ou da colocação em relação (estas duas últimas operações serão explicadas a seguir). Esta operação pode aplicar-se de três maneiras bastante diferentes e importantes para a construção do sentido: pré-tematização, pós- tematização e retematização:

OPERAÇÕES POR TEMATIZAÇÃO CONCEITO

Pré-tematização (ancoragem) “É uma denominação imediata do objeto que abre (escopo à direita) um período descritivo e anuncia um todo.” (ADAM, 2011, p. 217). Trata-se de uma espécie de revelação do objeto descrito.

Pós-tematização (ancoragem diferida) “É uma denominação adiada do objeto, que somente nomeia o quadro da descrição no curso ou no final da sequência.” (ADAM, 2011, p. 217).

Retematização (reformulação)

É a “nova denominação do objeto, que reenquadra o todo, fechando o período descritivo. Diferentemente da pré- tematização, a retematização implica a existência de uma primeira nomeação [N] do objeto do discurso e vem, portanto, interromper seu escopo.” (ADAM, 2011, p. 218). Linguisticamente, esta operação pode ser representada por elementos como em

suma, em resumo, em uma palavra, em outras palavras, dentre outros que sugerem

anteriormente citado.

Quadro 03: Operações de tematização. Fonte: Adam (2011).

A aspectualização se apoia na tematização e consiste em um conjunto de operações, nas quais o enunciador descreve o objeto a partir de suas propriedades ou de suas partes, mas por meio de duas formas específicas: a fragmentação (partição) e a qualificação.

OPERAÇÕES DE ASPECTUALIZAÇÃO CONCEITO

Fragmentação (partição) “seleção de partes do objeto da descrição. Operação de análise de um todo, em partes e subpartes de partes, tende a fragmentar o objeto do discurso.” (ADAM, 2011, p. 223).

Qualificação

“evidencia propriedades do todo e/ou das partes selecionadas pela operação de fragmentação. (...) é realizada, na maioria das vezes, pela estrutura do grupo nominal nome + adjetivo e pelo recurso predicativo ao verbo ser.” (p. 223).

Quadro 04: Operações de aspectualização. Fonte: Adam (2011).

A operação de relação compreende procedimento no qual o enunciador informa ao seu interlocutor (leitor-ouvinte) como o objeto descrito se encontra em um dado lugar e momento (isto é, a situação do objeto). Esta macrooperação pode ocorrer de duas maneiras:

OPERAÇÕES DE RELAÇÃO CONCEITO

Relação de contiguidade

“situação temporal (situação do objeto de discurso em um tempo histórico ou individual) ou espacial (relações de contiguidade entre o objeto do discurso e outros objetos suscetíveis de tornar-se o centro [tematização] de um procedimento descritivo, ou, ainda, contiguidade entre as diferentes partes consideradas).” (ADAM, 2011, p. 223). Relação de analogia “essa forma de assimilação comparativa ou metafórica permite descrever o todo

em partes, colocando-as em relação com outros objetos indivíduos.” (p. 223).

Quadro 05: Operações de relação. Fonte: Adam (2011).

Finalmente, a operação de subtematização consiste na extensão da descrição pelo acréscimo de qualquer outra operação a uma operação anteriormente estabelecida. Estas operações, “identificáveis e repetíveis”, segundo Adam (2011), são fundamentais para descrição de qualquer objeto, em todo gênero de discurso, de forma potencialmente infinita.

Agora, ainda retomando o autor, “na medida em que um segmento descritivo não comporta nenhuma linearidade intrínseca, a passagem do repertório de operações à textualização, implica a adoção de um plano” (224). Por isso, muitas vezes, conhecer os planos de textos e suas marcas características específicas se impõe como elemento de importância decisiva para a interpretação de qualquer descrição ou descrições em um texto.

Além disso, essas operações, ao tempo em que constroem descrição de um objeto, também constroem representações discursivas do próprio objeto, do enunciador do texto ou mesmo do interlocutor. Por isso, acreditamos que elas podem ser aplicadas a quaisquer outros tipos de sequências textuais como operações de textualização que estão na base da construção de todo texto. Associadas aos trabalhos de outros autores, elas serão, pois, fundamentais para o estabelecimento das operações de base de construção de representações discursivas que estão sendo adotadas em nossa pesquisa, conforme veremos em tópico seguinte.