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Esta seção apresenta uma breve reconstrução de como uma análise de chave da RRI é estruturada usando ferramentas analíticas existentes. O objetivo é simplesmente apresentar um subconjunto de amostra dessa análise para um caso real, usando a metodologia de RRI desenvolvida durante os últimos anos como parte dos esforços contínuos para ampliar a aplicabilidade da estrutura. Mais informações podem ser encontradas no site RRI Tools ou no projeto RRI-P, que são dois importantes repositórios que fornecem recursos para os interessados em RRI:

https://rri-tools.eu/

https://www.rri-practice.eu/

viii. A chave ética

Seguiremos a perspectiva geral usada no projeto RRI-P para estruturar a análise/apresentação dos dados para as chaves de RRI. Concretamente, isso envolve considerar os seguintes tópicos:

Como a ética é definida em uma organização?

Quais são as principais barreiras enfrentadas na promoção da ética na organização?

Quais são os principais motores que facilitam a promoção da ética na organização?

Quais são os exemplos das melhores práticas éticas na organização?

Quais indicadores, se existentes, são usados para medir os resultados éticos na

organização?

Que pontos específicos de melhoria foram encontrados?

Ética nas organizações

O principal ponto para definir 'ética' na UNICAMP é o Comitê de Ética, responsável por

coordenar as avaliações de ética em pesquisas e desenvolver programas educacionais para

conformidade ética.

Dado que o Comitê foi desenvolvido pela primeira vez como parte da escola de Medicina para adaptar os padrões de conformidade ética em pesquisas com seres humanos, a perspectiva médica sobre a ética ainda é fundamental para a definição organizacional, que também se alinha às diretrizes nacionais de ética médica.

A influência do Código de Ética em Pesquisa da

FAPESP também tem sido forte, e as duas organizações compartilham pontos comuns, até

porque documento semelhante não estava disponível na universidade.

A perspectiva da FAPESP sobre a ética é mais centrada na ética como ‘integridade da

pesquisa’ e na prevenção de negligência na pesquisa (como plágio ou criação de falsificação

de dados).

A ética é abordada por meio de três alvos específicos: educação, prevenção e punição justa, mas eficaz em casos de violações comprovadas da ética, de acordo com diretrizes abrangentes e publicadas.

Nenhuma das organizações considera o impacto social da pesquisa como um tópico ético

explícito, embora informalmente às vezes seja considerado na avaliação. Na verdade, o

impacto social às vezes foi posicionado como um ataque potencial à autonomia da pesquisa

ou como uma carga burocrática desnecessária que não era uma parte desejável do ciclo

normal de pesquisa

.

ix. Barreiras éticas

Na UNICAMP, a falta de um documento formal de ética delineando a perspectiva ética da organização foi uma barreira fundamental para a disseminação, padronização e sanção dos princípios éticos. Outras barreiras incluíam uma resistência à intrusão no espaço tradicional do pesquisador e da ética, levando ao aumento da burocratização, particularmente para campos de pesquisa não acostumados com comitês de ética. Para a FAPESP, a maior barreira consistia na divulgação ainda limitada do Código de Ética, mas a administração esperava que um programa intensivo de educação e comunicação superasse o problema.

x. Direcionadores éticos

Como uma universidade de alto nível, a administração da UNICAMP foi capaz de ver a RRI como uma forma de estrutura de "melhores práticas internacionais" que poderia ser usada como um guia para conversas institucionais destinadas a implementar formalmente a ética. O código existente da FAPESP e os vínculos entre as duas instituições também foram um forte capacitador para garantir o cumprimento da ética dentro da organização. Conscientização da importância da ética em termos de integridade da pesquisa e responsabilidade para com o público, embora não formalizada institucionalmente, estava presente tanto na gestão quanto na equipe.

xi. Melhores/piores práticas

A criação de comitês de ética e códigos de compliance na UNICAMP, bem como a promoção do Código de Boas Práticas Científicas da FAPESP como modelo para a universidade foram evidências de boas práticas. As RRIs tiveram um papel potencial como um indicador para a eficácia da contagem na padronização de práticas institucionais em um ambiente global. Para a FAPESP, melhorar a 'qualidade' por meio da prevenção da má conduta ética e da responsabilidade como gestora de recursos públicos era uma meta institucional existente. A liderança da FAPESP na criação de um código de ética foi um grande marco, pois influencia diretamente tanto os pesquisadores financiados quanto as diversas instituições para as quais os recursos da FAPESP são direcionados.

xii. Indicadores éticos

Na UNICAMP, havia marcadores qualitativos que podiam ser traçados institucionalmente para aferir a conformidade ética presente versus futuro, como número de projetos avaliados por conselhos de ética (aspectos positivos); ou número de artigos retirados de periódicos (aspectos negativos). A FAPESP, por seu forte interesse em promover a ética, já possuía esses marcadores. Violações e sanções éticas são

bem documentadas e relatadas publicamente como um incentivo contra tais práticas. Uma seção de ética também aparece com destaque no sitio da agência.

xiii. Todos os pontos de melhoria

No caso da UNICAMP, a formalização da ética institucional foi vista como um importante passo futuro, que ajudaria a materializar uma postura existente em relação à ética e a consolidar estruturas já implantadas. Isso também ajudaria a normalizar a ética como parte integrante da pesquisa. A FAPESP, dada a sua posição mais consolidada sobre a ética, talvez pudesse se beneficiar de uma política mais avançada de incluir reflexões de impacto social nos processos de pesquisa como é feito atualmente na UE; ou incluir reflexões sociais como parte dos objetivos do projeto. Embora isso estivesse mais em sintonia com os objetivos de RRI, também era compreensível que trazer as práticas da UE para um contexto cultural diferente só poderia ser apresentado como um convite, e não como uma violação de "boas práticas".

xiv. Apresentação dos resultados

A seção anterior resumiu como uma chave específica pode ser abordada usando as ferramentas teóricas e analíticas apresentadas nas seções iniciais. As tabelas a seguir apresentam uma visão mais abrangente, ao passo que os leitores com maior interesse podem acessar o relatório completo online para obter mais informações. Observe que, embora a análise dos processos organizacionais possa ser feita separadamente (ver relatório completo), eles são implicitamente usados na avaliação-chave da Ética, considerando como antecipação, reflexão, abertura e transparência aparecem na prática por meio de políticas e ações institucionais. No caso da ética, diversidade e inclusão não aparecem como parte importante dos processos, mas sua importância é significativa em outras chaves.

Aspectos estruturais Aspectos culturais Relacionado ao intercâmbio

Aspectos das organizações

Código de Ética Nacional (Resolução nº 466, nº 510), Código de Boas Práticas Científicas da FAPESP.

A experiência de pesquisadores que passam por comitês de ética, problemáticas de conselhos de ética, culturas éticas variam entre as disciplinas e são incomuns no Brasil.

Existem marcos nacionais de ética em pesquisa com seres humanos e a FAPESP agora exige conformidade com o CoGP.

Potenciais

direcionadores para RRI

Criação de Conselhos de Ética com comitês dedicados às Ciências Naturais e Sociais e Humanas.

Boas práticas e ética já são uma preocupação para muitos pesquisadores, mesmo que não existam regras formais,

aumentando a conscientização e a educação de boas práticas institucionalmente sancionada.

Pressão para se conformar com as diretrizes externas, prestação de contas aos cidadãos como instituição pública.

Potenciais barreiras para RRI

Ausência de um código de ética oficial da UNICAMP.

Ver a RRI como um arcabouço burocrático dada a importância da autonomia pessoal, a RRI como insensível ao contexto brasileiro.

RRI como uma influência "colonial" externa e importância da autonomia institucional. Ações organizacionais potenciais mais importantes

Criar um Código de Ética institucional.

Estabilizar as práticas do comitê de ética; aumentar a conscientização da comunidade sobre os aspectos positivos das práticas de ética em pesquisa.

Comunicar a atores externos os avanços dos programas de ética na universidade.

Indicadores para o sucesso

Ter um código formal de ética em vigor.

Aumentar a eficiência e agilizar as práticas do comitê de ética; implementar programas de educação ética.

Aumento da conscientização da UNICAMP como uma instituição voltada para a ética. Indicador potencial para melhor desempenho da dimensão nas atividades / programas de pesquisa [Exemplo de gênero]

Formalizar e divulgar documentos que codifiquem o que a pesquisa ética significa para a Universidade

Implementação de órgão institucional central que organiza a revisão de ética na universidade

Aumento em% de projetos em revisão de ética em ciências humanas e sociais

Tabela 1: As chaves éticas da Unicamp

Aspectos estruturais Aspectos culturais Relacionado ao intercâmbio

Aspectos das organizações

Código de Boas Práticas Científicas FAPESP, Portarias 05/2103, 09/2013,

documentação online.

Enquadramento da ética como "boas práticas científicas pela alta administração" e aplicação de princípios pelos níveis inferiores.

Debates éticos nacionais, boas práticas internacionais de agências parceiras. Potenciais direcionadores para RRI As formulações de ética da FAPESP são compatíveis com os indicadores de RRI.

Importância crescente das discussões sobre ética nas culturas acadêmicas brasileiras.

A FAPESP é uma agência internacional e tem acompanhado o desenvolvimento de discussões semelhantes globalmente. Potenciais barreiras para RRI O escopo do significado da ética é mais restrito do que da RRI e há resistência em ampliar esta definição.

Desconhecimento generalizado de seguir procedimentos éticos formais em muitas culturas acadêmicas brasileiras. Perigo de procedimentos de ética

excessivamente burocratizados.

Nenhum que estejamos cientes.

Ações organizacionais potenciais mais importantes

Sugerir reflexões de impacto social e antecipação como parte do pensamento ético. Indicadores para o sucesso - -- - Indicador de potencial para melhor desempenho da dimensão nas atividades / programas de pesquisa

- Apoio ao debate público sobre aspectos éticos das pesquisas financiadas pela FAPESP, se considerado relevante;

- Estudos das melhores práticas e exemplos dos principais financiadores globais em relação à adoção de políticas práticas sobre impactos éticos e antecipação;

- Se considerado relevante, a adoção de uma ou mais dessas práticas.

Tabela 2: as chaves éticas da Fapesp

xv. Principais conclusões do estudo de caso brasileiro

O estudo de caso brasileiro mostrou que enquanto a RRI pode ser relevante para contextos diferentes do europeu, qualquer sucesso para isso implica levar em consideração vários fatores:

1. Sem uma compreensão adequada do lugar da ciência brasileira em um contexto global e dos avanços que o sucesso que o país alcançou em organizações de P + I como a FAPESP, a RRI poderia facilmente ser percebida como um arcabouço imposto de fora e irrelevante ou sem consideração com a pesquisa local e culturas acadêmicas.

2. No entanto, se as afinidades podem ser traçadas entre as culturas organizacionais de pesquisa local e os objetivos da RRI, é mais fácil que as organizações brasileiras considerarem RRI como uma possível estrutura para mudança.

3. Embora nem todos os objetivos de RRI e metas de mudança encontrem ressonância nas organizações brasileiras, há um número significativo de sinergia com as metas existentes de mudança nas instituições que analisamos.

4. A necessidade de refletir sobre a política institucional muitas vezes não faz parte das discussões mais formais nas organizações brasileiras, mas sim são temas de interesse de níveis gerenciais médios e inferiores. Muitas vezes, a reflexão surge precisamente por causa da falta de uma política escrita para tópicos que os gestores e profissionais já têm no radar.

5. Diferenças nas características sociais e culturais de um contexto como o do Brasil não necessariamente impactam negativamente os objetivos de RRI, mas na verdade podem servir para revisar e até mesmo recomendar mudanças na estrutura original. Um exemplo importante no projeto RRI-P veio do Brasil e outro parceiro, os EUA, que destacou a necessidade de abordar não apenas o desequilíbrio de gênero em uma chave, e estendê-lo, mas considerações mais gerais de desigualdade: raça, estratificação socioeconômica etc. 6. Se RRI deve se tornar influente em um contexto como o do Brasil, então alguns dos atritos

entre RRI e as características da organização local podem ter que ser "tolerados" por RRI e soluções alternativas encontradas de acordo com as normas culturais locais. Este foi o caso, por exemplo, de navegar na burocracia brasileira nos mesmos termos que os brasileiros: compreender as estruturas de poder e respeitar as hierarquias, mesmo que não ‘façam sentido’ para os de fora.

7. Embora algumas chaves pareçam particularmente determinadas de implementar em um contexto (por exemplo, engajamento social e equilíbrio de gênero como entendido na estrutura de RRI, estas foram chaves que foram particularmente desafiadoras para discutir na FAPESP), outras na mesma organização podem ser caracterizadas por excelentes práticas de responsabilidade (por exemplo, a chave da ética na FAPESP, se a dimensão social não tiver o destaque que tem na RRI).

Para encerrar esta seção, comparamos brevemente a experiência brasileira com a de um dos locais exemplares da RRI europeia: a Holanda. Foi observado por estudiosos que RRI é particularmente adequada para o contexto holandês, no qual as preocupações sociais/éticas são parte intrínseca do sistema de formulação de políticas, enquanto, ao mesmo tempo, o desenvolvimento econômico é um

componente igualmente importante.18

Em particular, três características do contexto holandês,

que aqui são comparadas ao caso brasileiro, são reconhecidas como raízes da afinidade

entre a formulação de políticas holandesas e as estruturas de RRI (e outras anteriores)

:

1.

Ciência e inovação para o bem público é, e tem sido nas últimas décadas, um

componente importante da política de P + I na Holanda

. Em contraste, enquanto o bem público era visto como desejável na FAPESP, também havia uma suspeita institucional de enquadrar a excelência científica em torno do bem público. Na verdade, a autonomia do empreendimento científico era apontada pela alta administração como um valor muito importante para a FAPESP e, mais do que um ponto de pressão externa, considerava-se que a responsabilidade surgia como resultado da autorregulação da ciência pelos cientistas. Como mencionado anteriormente, a este respeito, em vez de ser afim, RRI foi às vezes visto de forma suspeita como uma forma de intervencionismo "colonialista" na ciência brasileira.

2.

A Holanda é caracterizada por altos níveis de confiança e colaboração interinstitucional

.

O sistema de inovação holandês apresenta ampla participação de atores em todo o cenário de políticas e partes interessadas, incluindo a integração de parceiros públicos e industriais. Em contraste, encontramos profunda fragmentação no sistema de pesquisa brasileiro, incluindo, por exemplo, o nível universitário. Na verdade, uma das principais perspectivas positivas que a administração e os funcionários da UNICAMP poderiam ter era que a RRI poderia ser uma ferramenta para promover a cooperação e o diálogo dentro dos sistemas institucionais e interinstitucionais nos quais a fragmentação e a falta de cooperação eram a norma, ao invés de o

status quo.

3.

Responsabilidade e especificamente a RRI são integrados ao sistema holandês P + I

.

Embora "responsabilidade", uma vez dividida em componentes específicos, tenha sido tacitamente incorporada aos discursos institucionais no Brasil, era significativamente diferente da noção europeia e nunca foi uma parte importante do discurso explícito. A RRI era geralmente desconhecida da administração ou da equipe que ainda não interagia com a equipe de pesquisa no Brasil e, quando conhecida, estava apenas tangencialmente associada a projetos liderados pela Europa ou devido ao conhecimento anterior do programa Horizonte 2020.

Outras reflexões e meta-análises do projeto RRI-P produziram resultados ao longo dessas linhas, embora com algumas nuances, como se houvesse "enganosamente" um alinhamento fácil entre os princípios de RRI e os contextos locais em ambientes como a Holanda e a Austrália,19 mas deve-se

18 Van der Molen, F., Ludwig, D., Consoli, L., & Zwart, H. (2019). Global challenges, Dutch solutions? The shape of responsibility in Dutch science and technology policies. Journal of Responsible Innovation, 6(3), pp. 340-345. 19 Doezema, T., Ludwig, D., Macnaghten, P., Shelley-Egan, C. and Forsberg, E.M., 2019. Translation, transduction, and transformation: expanding practices of responsibility across borders. Journal of Responsible Innovation, pp. 323-331.

ressaltar também que existiam semelhanças entre localidades como Brasil e Alemanha quanto à importância dada à autonomia da ciência.

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