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ORGANIZAÇÃO, CATEGORIZAÇÃO E PRÉ-ANÁLISE DO MATERIAL

No documento Investigando a experiência musical (páginas 70-76)

CAPÍTULO 3 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA: ENCONTRANDO AS FORMAS DE

3.3 ORGANIZAÇÃO, CATEGORIZAÇÃO E PRÉ-ANÁLISE DO MATERIAL

Após a seleção dos sujeitos de pesquisa e dos respectivos materiais de análise, deu-se início a imersão no material.

Por ser o Histórico Sonoro-Musical um material extenso com diferentes enfoques para se abordar a experiência musical, diversas possibilidades de análise poderiam ser realizadas. Assim, para se chegar a forma de análise mais adequada procedeu-se da maneira que apresenta-se a seguir.

Em um primeiro momento foram realizadas leituras livres do material, através da qual pôde-se familiarizar com os relatos de cada sujeito de pesquisa, para refinar ainda mais este aspecto decidiu-se por fazer uma descrição do conteúdo do Histórico Sonoro-Musical em uma narrativa única, respeitando a estrutura sequencial do material e conservando ao máximo os termos utilizados e fluxos de linguagem dos sujeitos de pesquisa (anexo 01).

O intuito desse procedimento foi abordar o material de forma mais atenta para ver emergir possíveis formas de categorização e análise que poderiam ser adotadas para se compreender as experiências musicais dos sujeitos de pesquisa.

Após a descrição dos trabalhos em uma narrativa única, começou-se a evidenciar a melhor forma de categorizar o material para análise, buscando dados que pudessem levar a compreensão da experiência musical. Para Martins e Bicudo (2005) o conteúdo para análise categorial na pesquisa qualitativa é agrupado de acordo com o sistema próprio do pesquisador.

Para estes autores (MARTINS; BICUDO, 2005, p. 96):

A pesquisa fenomenológica está dirigida para significados, ou seja, para expressões claras sobre percepções que o sujeito tem daquilo que está sendo pesquisado, as quais são expressas pelo próprio sujeito que as percebe. Ao se concentrar nos significados, o pesquisador não está preocupado com os fatos, mas com o que os eventos significam para o sujeito de pesquisa. Ao deter-se no significado expresso pelo sujeito sobre sua experiência, o pesquisador descobre certos determinantes sobre as situações e sobre o sujeito. Essas situações, uma vez descobertas como genuínas, podem apresentar-se ao pesquisador como dados.

Por dados, entende-se as situações vividas que foram tematizadas pelo sujeito, e por significados os aspectos do evento que o sujeito tematizou. Cabe ressaltar que

neste tipo de pesquisa o sujeito é tido como um atribuidor de significados e não como um repetidor de ideias mecanicamente adquiridas. Assim, o alvo da investigação é chegar aos significados atribuídos pelos sujeitos à situação que está sendo pesquisada (MARTINS; BICUDO, 2005).

Martins e Bicudo (2005, p. 104) destacam que com a tematização dos significados e motivos repetidos, o pesquisador busca a unidade e a consistência das diversas experiências, e que a localização de temas repetidos é importante porque aponta para aspectos essenciais do fenômeno.

Por ser o Histórico Sonoro-Musical um material que apresenta uma estrutura prévia, incialmente se fez uma distinção dos sentidos que poderiam ser induzidos pelo próprio material. Considerou-se a possibilidade de que algumas das categorias poderiam surgir através do estabelecimento de relações (diferenciação ou continuidade) entre os subitens dos diferentes períodos descritos na parte da História Sonoro-Musical do trabalho, para isto foi realizada uma organização destes itens em quadros diversos.

Depois, a partir do relato dos sujeitos, buscou-se a identificação dos sentidos atribuídos a experiência musical pelos sujeitos de pesquisa através do processo exegético, no qual a contribuição dos sujeitos de pesquisa não é vista apenas como resposta às perguntas feitas, mas como descrição de aspectos dos seus mundo- vida, realizando um processo através qual “o mundo daquele que descreve revele-se na descrição.” (MARTINS; BICUDO, 2005, p. 56).

Para este fim, buscou-se agrupar as experiências dos sujeitos a partir de termos e temáticas recorrentes no relato em relação a experiência musical, usando como direcionamento a pergunta: o que seria a experiência musical para cada sujeito de pesquisa? A frase “música como algo que se ...” foi utilizada para achar os trechos temáticos do material. Para o estabelecimento de uma categoria, considerou-se ao menos três aparecimentos do mesmo termo ou sentido no decorrer do relato, iniciando pela Apresentação Pessoal e seguindo a ordem cronológica do relato. A partir deste procedimento foi criado uma coletânea de trechos e frases dos sujeitos que se referiam as temáticas. Este processo revelou as seguintes categorias para cada sujeito de pesquisa.

ANÁLISE INDIVIDUAL DOS SUJEITOS DE PESQUISA CATEGORIAS TEMÁTICAS - Música como algo que se...

Renata Carlos João

... tem interesse ... aprende ... ensaia ... apresenta ... prestigia em apresentações ... gosta

... vivencia a partir de uma fonte sonora

... ouve ... assiste ... dança ... canta

... toca em instrumentos musicais ... brinca

... imagina

... faz de maneira adequada ou não ... compartilha com outra pessoa ... vivencia em lugares que frequenta ...guarda como recordação

... ama, admira, adora ... expressa através dela ... compartilha com alguém ... vivencia em um lugar

... vivencia a partir de uma fonte sonora ... escuta

... assiste

... toca em instrumentos musicais ... brinca

... aprende (e ensina) ... apresenta para um público ... trabalha

... arte

... sonha, se imagina, faz planos ... cria ou se recria

... tem curiosidade ou interesse

... vivencia em um lugar

... mobiliza sensações e sentimentos ...compartilha com outras pessoas ... convive ... ouve ... imita ... observa ... canta ... brinca

... toca em instrumentos musicais ... cria

... aprende ... tem interesse ... conhece

Quadro 1 – Análise individual dos sujeitos de pesquisa: Categorias temáticas.

Comparando as categorias elencadas, pôde-se observar que a maioria delas se repetiam, demonstrando uma possível convergência sobre ideias e vivências musicais nos três sujeitos de pesquisa.

Um novo quadro foi criado colocando lado a lado as categorias semelhantes e e reagrupando as categorias aproximadas em novas categorias que pudessem facilitar a compreensão da experiência musical de uma forma mais ampla.

APROXIMAÇÃO E REORGANIZAÇÃO DAS CATEGORIAS - Música como algo que se...

Renata Carlos João Reorganização de Categorias

... vivencia a partir

de uma fonte sonora ... vivencia a partir de uma fonte sonora

... vivencia a partir de uma fonte sonora

CONTEXTO SONORO-MUSICAL - Lugares

- Pessoas

- Fenômenos sonoros e fenômenos musicais - Referências artístico-culturais

... compartilha com outra pessoa

.

.. compartilha com

alguém ...compartilha com outras pessoas ... convive

... vivencia em lugares que frequenta

... vivencia em um

lugar ... vivencia em um lugar

... toca em instrumentos musicais

... tem contato a partir de instrumentos musicais

... toca em

instrumentos musicais se manifestam de diversas formas, através da AÇÕES MUSICAIS: escuta, da interação ou do fazer musical.

- Tocar - Cantar - Dançar - Criar - Ouvir - Assistir - Prestigiar Apresentações ... canta ... canta ... canta

... dança ... dança

... cria ... cria ou se recria ... cria ... ouve ... escuta ... ouve ... assiste ... assiste

... prestigia em apresentações.

... tem interesse ... tem curiosidade ou

interesse. ... tem interesse - Os sentimentos e sensações despertados pela MOBILIZAÇÕES MUSICAIS: música

- Gostar, amar

- O interesse pela música - Preferências Musicais - Imaginação

... aprende ... aprende ou se

ensina ... aprende ... gosta ... ama, admira, adora

... mobiliza sensações e sentimentos ... sonha, se

imagina, faz planos ... sonha, se imagina, faz planos --- ... expressa através

dela FINALIDADES E FUNÇÕES DA MÚSICAIS:

- Expressão - Trabalho - Ensaio - Apresentar - Brincar ... ensaia ... arte ...trabalha ... trabalha

... brinca ... brinca ... brinca ... apresenta/

ensaia ... apresenta para um público ... guarda como

recordação - produtos musicais OUTRAS CATEGORIAS - música e religião

- música cultura Quadro 2 – Categorias semelhantes e reorganização das categorias

Apesar do material de análise referir-se a apenas três sujeitos de pesquisa, os procedimentos de categorização descritos acima geraram um extenso material de análise, com um grande número de dados e perspectivas diferentes, fez-se então necessário realizar um recorte para contemplar a realização da pesquisa.

Um aspecto bastante presente nos relatos dos sujeitos de pesquisa evidenciou-se: o Contexto Sonoro-Musical – que pode ser entendido como os dados que dizem respeito ao “onde”, “o quê” e “com quem” a música é experienciada. Assim, optou-se por considerar principalmente estes aspectos para realizar uma análise mais aprofundada dos dados.

O Contexto Sonoro-Musical é composto pelos lugares onde a música é vivenciada, as pessoas que compartilham destas experiências, as fontes sonoras e o universo artístico-cultural que aparecem no relato dos sujeitos de pesquisa.

Observou-se que tais aspectos podiam ser evidenciados já na estrutura prévia do material de análise em todas as etapas descritas no item da História Sonoro- Musical, uma vez que algumas questões indicavam este aspecto presente em cada etapa descrita. As questões que apontaram para estes aspectos foram:

Onde você nasceu e com quem foi morar?

Como eram as sonoridades dos ambientes em que você vivia? Momentos, pessoas e situações que considere importante destacar. Como era a presença da música e/ou sons na sua vida?

Quais eram suas preferências sonoro-musicais neste período? E suas recusas sonoro-musicais?

Lista de música e sons presentes no período.

Porém, cabe ressaltar que apesar do Contexto Sonoro-Musical constituir-se por um conteúdo pressuposto no material, as variações das respostas dos sujeitos de pesquisa para este aspecto foram muito amplas se estendendo por todo relato, e não se restringindo apenas às perguntas direcionadas a temática.

O recorte também foi sustentado pelo aporte metodológico de Martins e Bicudo (2005), escolhido para nortear a pesquisa, visto que estes colocam a interrogação do mundo ao redor como o objetivo da pesquisa qualitativa. Para chegar a este objetivo, os autores apresentam como possibilidades a perspectiva de primeira ordem na qual o pesquisador interroga diretamente o mundo perguntando- se “o que é isto que vejo?”; a perspectiva de segunda ordem que consiste no pesquisador perguntar às pessoas o que elas pensam sobre o fenômeno; ou ainda uma outra possibilidade na qual o pesquisador:

Pode olhar o fenômeno interrogado contextualmente, ou seja, pode querer ver como ele se relaciona com as demais entidades com as quais está no

contexto onde aparece e procurar compreendê-lo a partir dessa relação (MARTINS; BICUDO, 2005, p. 24).

Através desta última possibilidade as experiências musicais dos sujeitos de pesquisa foram descritas e analisadas. Desta forma, nos capítulos a seguir apresentam-se as descrições e os resultados das análises tendo como eixo o recorte proposto.

Uma vez que o material de análise refere-se a um Histórico Sonoro-Musical, os dados serão apresentados levando-se em consideração a perspectiva cronológica proposta no material. Este procedimento será apresentado primeiro individualmente, demonstrando o Contexto Sonoro-Musical de cada sujeito de pesquisa (capítulo 4) e depois através de uma descrição única entrelaçando a narrativas dos três sujeitos de pesquisa (capítulo 5).

Este entrelaçamento das narrativas constitui a análise nomotética, na qual, segundo Martins e Bicudo (2005, p. 106)

[...] há um movimento da Psicologia individual para o aspecto psicológico geral presente na manifestação do fenômeno estudado. O objeto ou o fim a chegar nesta análise nomotética é a estrutura geral psicológica. Esse empreendimento envolve uma compreensão dos diversos casos individuais como exemplos de algo mais geral e a articulação desses casos individuais, como exemplos particulares, em algo mais geral. A estrutura psicológica geral é a resultante da compreensão das convergências e das divergências que se mostram nos casos individuais.

Na análise conduzida no capítulo 5 se abordará separadamente cada um dos aspectos do Contexto Sonoro-Musical a partir do entrelaçamento de convergências e divergências encontradas nos relatos dos sujeitos de pesquisa. A partir desta nova movimentação, pode-se aproximar um pouco mais da compreensão geral do fenômeno de estudo: a experiência musical.

No documento Investigando a experiência musical (páginas 70-76)