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2. ESTRUTURA, FORMATO E ASPECTOS DA LINGUAGEM NO TEXTO

2.5 Funções da linguagem jornalística

2.5.3 Organizando a linguagem jornalística

Um discurso jornalístico, ou seja, a construção de uma notícia, dentre outros

elementos, se estrutura a partir de uma linguagem, sendo que ela organiza a prática do

jornalismo. Seguindo a definição da Gomes (2000), percebemos que a linguagem é

responsável por organizar discursivamente a prática jornalística. Para isso é preciso

perceber em que termos temos essa função organizadora da linguagem. A autora separa

em dois grupos esta organização. O primeiro, no qual denomina de função testemunhal,

existe a confirmação, vigilância, desenho do espaço social/hierarquização.

Por confirmação, a autora relata que o jornalismo se coloca como confirmação

do primeiro pacto fundado na comunidade estabelecida pelo compartilhamento de uma

língua. Também, pela concentração de determinados temas, o jornalismo funciona como

sendo uma confirmação da aliança social. A palavra que será empregada precisa ser

lembrada como forma de atualização de um pacto instituído. A um relato jornalístico é

vetado ser escrito em primeira pessoa, mas não tanto em função da objetividade, mas sim

por um relato jornalístico falar em nome de todos, não podendo ser individualizado.

Podemos perceber essa confirmação sendo reiterada nas páginas de jornais com temas

que afirmem o pacto já instituído, ou seja, com a concentração em temas já instituídos na

sociedade, temas como economia e política (em geral) ocupam as primeiras páginas dos

jornais, as capas de sites noticiosos e os programas de televisão e rádio. É essa repetição,

ou periodicidade, que faz com que o pacto que o jornalismo faz com o seu público seja

renovado a cada nova matéria sobre os temas em questão.

O segundo ponto levantado pela autora é o da vigilância. Quanto a isso, relata

Gomes, que é tarefa do jornalismo observar e denunciar os deslizes do Estado, se

postando como um quarto poder, vigilando os outros três poderes (legislativo, executivo

e judiciário) que constituem o Estado de Direito, sendo o jornalismo aquele que investiga

e denuncia os demais poderes. Ao escrever em terceira pessoa, o jornalismo se porta como

um observador, mas mais do que isso, é aquele que vigia e denúncia os escândalos que

acontecem nesses poderes. Podemos observar essa vigilância pela quantidade de

jornalistas que se direcionam ao centro do poder (como em Brasília, no caso do Brasil)

para fazer a cobertura deste tema, visto que todos os três poderes possuem ligações entre

si e tem a sua base na Capital do País.

O terceiro ponto da função testemunhal diz respeito ao desenho do espaço

social/hierarquização. Esse desenho dá uma ordem de importância, coloca valores, pela

escolha e priorização de determinada temática. A autora classifica essa ordem em: Estado

em exercício/evento que desestabiliza a ordem social; economia -organização

para-estatal, feitos científicos – um contar épico; fait divers (acepção introduzida por Barthes14

cobrindo escândalos, curiosidades e bizarrices); esportes, lazer e cultura. Destes termos

destacados pela autora, o fait divers reforça o quadro social, “dando a tônica de uma

inserção de curiosidade que é parte consistente do cotidiano” GOMES, 2000, p. 23).

Podemos perceber este caso nos jornais impressos ou mesmo em um telejornal.

Exemplificando pela televisão, percebemos assuntos relacionados ao governo ou grupos

contra decisões, economia, algum feito científico, deixando para o final deste jornal (ou

para as últimas páginas dos jornais) assuntos considerados mais leves (como exporte e

lazer) e aqueles inusitados que por vezes seguram a audiência até o fim do telejornal.

O segundo grupo, classificado como o testemunho do testemunho, Gomes separa

esse em: por causa de um sentimento, referencialidade/ilusão referencial, efeito de real,

credibilidade e verossímel. Por causa de um sentimento, a autora explica que neste caso

o jornalismo recorre sempre a estratégia da referencialidade. Para ela a lógica do signo é

a de construção e nenhuma palavra bastará porque a primeira falhou, assim, todo o

14 Podemos definir como: uma informação total, ou mais exatamente, imanente; ele contém em si todo seu

saber: não é necessário conhecer nada do mundo para consumir um fait divers; ele não remete a nada mais,

além dele mesmo” (BARTHES, 1966, p.189 apud DION, 2007, online).

testemunho vai implicar no testemunho de um testemunho e é para isso que, no

jornalismo, se recorre ao efeito da realidade.

Esse efeito da realidade, ou seja, da estratégia da referencialidade/ilusão

referencial é exposta em citações, o uso de fontes, fotografias, tabelas, que remetem ao

real. Esse desenvolvimento de técnicas para autenticar o real contribui para o exercício

da referencialidade (GOMES, 2000, p. 25).

Segundo a autora, há também uma oferta de estratégias que promovem um efeito

do real, que encarnam a referencialidade nos seus procedimentos discursivos.

Apoiando-se em Barthes, temos três funções interrogativas que criam o efeito do real, que são:

Índices Significantes que delineiam o caráter de

uma personagem, sua identidade,

atmosfera, estado de espírito

Informantes São significantes que servem para situar

no espaço e no tempo

Catálises Função cronológica pela qual se operam a

distensão e a compressão temporal

presentes no tempo da narrativa

Quadro 3. Funções interrogativas. Fonte: Adaptado pelo autor de Gomes (2000)

Este “efeito de real” encarna a referencialidade em seu procedimento discursivo,

“é o termo empregado por Barthes para designar o resultado das estratégias dos discursos

realistas, aqueles que, na busca de testemunho para o seu testemunho, recorrem a uma

realidade em cuja construção colaboram” (GOMES, 2000, p. 27).

Percebemos que a verdade pode se sobrepor ao verossímil e a credibilidade. O

primeiro tem relação ao efeito real discursivamente construído (como quando no uso de

fotografias ou dados escolhidos por veículos de comunicação ou jornalistas), enquanto

que o segundo está presente em todas as instâncias da sociedade, e é sua contrapartida na

ausência de uma verdade em plenitude. Sendo que, no jornalismo, o jogo da credibilidade

se joga sobre o sucesso da referencialidade suposta (GOMES, 2000, p. 30). No jornalismo

há a construção de uma verossimilhança, ou seja, uma matéria sobre um escândalo de

corrupção irá ilustrada por um político (se for o caso) indo prestar depoimento ou mesmo

já sendo preso, isso para ilustrar e ao mesmo testemunhar determinada notícia.

O sentimento de verdade, transcrito por palavras, apoiadas em elementos que

são inerentes a uma notícia, faz com que um veículo de comunicação contrua sua

reputação perante ao seu público. Um veículo de comunicação precisa manter a relação

com seu público e por isso sabe para quem informar e o que seu público gostaria de saber.

Nas escolhas que os veículos fazem, podemos citar as pesquisas eleitorais feitas pelos

diferentes institutos de pesquisas, no qual cada veículo analisa aquele que acredita ser o

melhor ou o melhor para seu público determinado. Ou seja, em qualquer veículo as

imagens, tabelas, dados, são recortes feitos para elaborar uma notícia, escolhas dos

veículos de comunicação ou mesmo dos jornalistas.

A narrativa presente no texto jornalístico, por mais que procure a objetividade e

se apoie em técnicas para isso, ela não é feita livremente pelo jornalista. A escolha dessa

narrativa é “orientada pela aparência que a realidade assume para o jornalista, pelas

convenções que moldam a sua percepção e fornecem o repertório formal para a

apresentação dos acontecimentos, pelas instituições e pelas rotinas” (TRAQUINA, 2016,

p. 235). E mesmo uma notícia elaborada de forma independente, por uma única pessoa,

carrega com si os valores pessoas de quem escreve.

A linguagem e a estrutura de uma notícia foram constituídas com o objetivo

primordial de transmitir um acontecimento para quem não pode acompanhar,

presencialmente, o ocorrido. Também com o objetivo de adquirir relevância e

credibilidade para quem lê. A profissionalização do jornalismo fez com que a notícia

ganhasse elementos próprios e consigo o seu espaço ao redor do mundo.

A notícia sempre dependeu dos aparatos técnicos disponíveis para a sua

divulgação, foi assim com o rádio, a televisão, com os veículos de comunicação de massa.

A cada novo surgimento de um aparato técnico, a notícia se modificava. Mas as mudanças

mais rápidas, percebidas no jornalismo, ocorreram com a popularização da internet e as

diversas formas que ele se adaptou (e continua se adaptando) a este “novo” meio. Na

internet, em especial em sites que publicam conteúdo com o mínimo de texto, as regras

para um texto informativo devem permanecer as mesmas, visto que o rigor, que a exatidão

e os outros elementos que foram trazidos até então são inerentes do jornalismo em

qualquer meio em que ele estiver. Porém com a facilidade de publicar, na internet, por

vezes apenas um elemento é usado para legitimar determinado texto como sendo

informativo, quando na verdade este texto é polarizado, utiliza mais elementos de outros

gêneros, buscando uma falsa ideia de legitimidade e de credibilidade perante a um público

que pode ser mais inocente e desprovido de informações e por esses motivos acreditar em

textos subjetivos como sendo textos informativos.