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CAPÍTULO 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1. Orientações metodológicas

Considerando que nenhum método de pesquisa é neutro, tendo em conta o alto grau de complexidade das construções envolvidas no fenômeno que estudamos e, dada a nossa intenção em enfatizar a caracterização e evolução das situações argumentativas, tomamos a perspectiva naturalística de pesquisa como base metodológica para o nosso estudo devido à compatibilidade de suas orientações com nossos objetivos e com a natureza complexa da situação que foi estudada e observada (LINCOLN & GUBBA, 1985).

Na pesquisa naturalística o pesquisador é o principal instrumento de coleta e análise de dados, o que disso decorre que de maneira acentuada tanto o pesquisador quanto a situação estudada se influenciam mutuamente (LINCON & GUBBA, 1985). Além disso, o paradigma naturalístico abre o nosso leque de opções quanto à demanda exigida pela pesquisa, ou seja, tomamos estruturas de análise e coletas de dados que foram combinadas de maneira a atender as necessidades da pesquisa, refletindo assim a noção de pesquisador enquanto bricoleur (DENZIN & LINCOLN, 2000).

Instrumentos

Para a coleta de dados, dispusemos dos seguintes instrumentos:

Instrumento 1: filmadora Digital com Tripé (utilizada para a gravação em vídeo das

aulas durante o período de observação).

Instrumento 2: gravador de Áudio Digital (utilizado para gravação em áudio das

entrevistas com o formador)

Instrumento 3: caderno de campo para anotações pertinentes aos movimentos gerais

dos interlocutores desde o início da disciplina até o seu término, de maneira que houve continuamente observação e produção de dados referentes ao contexto de ensino (seu espaço, características discursivas dos interlocutores, detalhes dos movimentos que não poderiam ser captados pelo vídeo) além de servir como meio de captar contextos argumentativos da NC paralelamente ao uso da filmadora.

Instrumento 4: roteiro para entrevista inicial semi-estruturada com o professor

formador (VER ANEXO B.1.).

Instrumento 5: roteiro para entrevista semi-estruturada com o professor formador após

O uso do vídeo

Levando em conta o nosso interesse nas situações argumentativas e, sendo o discurso das ciências essencialmente multimodal (KRESS et al., 2001), o uso do vídeo foi fundamental na tarefa de coletar os dados por possibilitar uma posterior recorrência aos mesmos e, ainda, por tornar possível a percepção não só do discurso verbal, mas de outros modos de comunicação usuais na sala de aula de ciências, como gestos, imagens, diagramas, modelos, etc.

Para a gravação das aulas contamos com um conjunto de 8 fitas MiniDV, que foram utilizadas em revezamento. Para cada fita utilizada para filmagem foi feita a captura para gerar um arquivo num formato que pudesse ser lido em qualquer computador com software de leitura de vídeo (os arquivos da captura foram gerados com extensão .wmv). Após a captura, os arquivos gerados de cada fita MiniDV foram gravados em CDROM e devidamente rotulados e armazenados.

É importante salientar que, pelo fato de cada fita gravar uma hora e trinta minutos, e muitas vezes as aulas terem duração que excedia este tempo, freqüentemente foi necessário trocar de fita durante as aulas, o que constituiu um “ponto cego” em nossa coleta de dados com a filmadora. Tentamos minimizar este inconveniente efetuando a troca em momentos em que houvesse atividades repetitivas ou momentos em que a discussão fosse menos relevante para a pesquisa.

O caderno de campo

O caderno de campo foi de grande importância ao longo da coleta de dados, uma vez que me acompanhou durante toda a observação presencial. Nele procurei fazer registros sistematizados da situação estudada a cada dez minutos de aula, além de registrar o cenário que compunha a sala de aula observada. Busquei também destacar neste instrumento os momentos de ruptura da rotina estabelecida na aula, além de registrar informações e dados que o vídeo não poderia captar.

Em momentos posteriores à coleta de dados, o caderno também se mostrou útil como uma primeira referência que nos direcionou e orientou posteriormente para trechos de vídeo, que foram fundamentais para a construção do “quadro de apresentação dos dados”, descrito na seção 3.3. A posterior recorrência ao vídeo a partir do caderno de campo foi possível graças à sincronização entre os dois, descrita na próxima seção.

Na figura 4, apresentamos um exemplo de registros realizados sistematicamente no caderno de campo.

Figura 4 – Trecho do caderno de campo

A sincronização do caderno de campo com o vídeo

A utilização conjunta do caderno de campo com o vídeo visou a reconstituição das situações observadas de tal forma a preservar os vários elementos verbais e não verbais, tais

como gestos, olhares, manipulação de materiais etc, que também constituem a produção discursiva nestas situações.

Além disso, o caderno de campo, enquanto instrumento primário de coleta de dados, foi utilizado de maneira a estar sincronizado com o vídeo da seguinte maneira: para todas as situações relevantes filmadas (sejam argumentativas, ou sobre a NC ou mudanças ocorridas no discurso estabelecido, ou aspectos que mereçam ser revistos ou sejam até mesmo situações que tenham causado uma impressão marcante no pesquisador quando da sua ocorrência) foram anotados no caderno de campo, primeiro em cor azul o tempo marcado pelo relógio do pesquisador, depois em cor vermelha o tempo acusado na filmadora, que é o tempo da fita de vídeo. Juntamente com essas duas marcas de tempo, foram redigidas, quando possível, pequenas descrições sobre a situação em relevo.

Além disso, mesmo depois da fita ser capturada e seus dados serem armazenados em mídia óptica, o tempo do vídeo na fita é preservado e passa a ser exatamente o mesmo que o tempo do vídeo na mídia óptica, o qual pode ser lido por qualquer computador que tenha um software de exibição de vídeo.

Tal procedimento nos permitiu, a partir da leitura posterior do caderno de campo, encontrar rapidamente na mídia óptica elementos chave e de importância significativa para os propósitos da pesquisa. Desta forma encontramos um filtro que nos possibilitou poupar tempo e orientar uma releitura dos dados brutos capturados pelo vídeo e pelo caderno de campo de maneira conjugada.

A identificação das situações argumentativas

O nosso critério para identificar as situações argumentativas se baseou, conforme já mencionamos, nas considerações de Billig acerca da contraposição de idéias como fator determinante do início de uma argumentação.

Assim, para toda e qualquer contraposição de idéias no plano discursivo da disciplina observada, registrei a sua ocorrência no caderno de campo, juntamente com a indicação do marcador do tempo da fita de vídeo e do relógio que utilizei. Posteriormente revisitei em vídeo todas as situações assim registradas com a finalidade de confirmar a sua legitimidade enquanto situações argumentativas. Este segundo procedimento serviu como um filtro e minimizou as chances de equívoco na especificação das situações argumentativas ocorridas na PEF I, uma vez que, neste segundo momento, foi possível contar tanto com disponibilidade de farto tempo quanto com a possibilidade de recorrência ilimitada às supostas situações

argumentativas, agentes facilitadores não disponíveis no contexto imediato de coleta de dados em sala de aula.

A identificação de situações referentes à NC

A minha proximidade com a área de ciências, enquanto licenciado em física, aliada às leituras que fiz sobre a filosofia e epistemologia das ciências durante o processo de revisão da literatura, foi o principal meio de “habilitar” o meu olhar para o reconhecimento de situações em que a NC estivesse presente de alguma forma no espaço discursivo da PEF I.

Tendo consciência de que muitas vezes, no contexto imediato da ocorrência de uma possível referência a NC, poderiam surgir dúvidas quanto à sua legitimidade, optei por sempre registrar a sua ocorrência no caderno de campo, indicando também o marcador de tempo da fita e do meu relógio. Posteriormente, todas estas ocorrências foram novamente revisitadas através do uso do vídeo e, neste contexto, com mais tempo disponível e, por isso mesmo, propício a uma reflexão mais profunda, confirmei ou descartei a caracterização inicialmente feita em sala no momento da ocorrência. Assim, da mesma maneira quanto ao procedimento de posterior recorrência às situações argumentativas, esse segundo procedimento serviu como um filtro, e minimizou as chances de equivoco na especificação de situações referentes à NC.

A identificação da presença do CPC e CPCSi na fala dos interlocutores

Nossos procedimentos de identificação quanto à manifestação de um CPC e CPCSi nos argumentos elaborados pelos diferentes interlocutores foram feitos durante a análise dos dados. O procedimento consistiu em verificarmos, para cada argumento identificado e enquadrado no modelo de Toulmin, a presença ou não de diferentes domínios de conhecimento no seu conteúdo e se tais domínios de conhecimento foram relacionados. Quanto mais conhecimentos de distintos domínios identificados e relacionados, maior seria o nosso indicador da presença de um CPC ou CPCSi em cada argumento identificado e avaliado. Por outro lado, também fizemos esta verificação longitudinalmente, quando da enunciação de vários argumentos por um mesmo interlocutor. Neste caso, identificamos uma seqüência de argumentos de um mesmo interlocutor que defendessem um mesmo ponto de vista. Assim, quanto mais conhecimentos de distintos domínios identificados e relacionados no conteúdo destes argumentos, maior seria o nosso indicador de um CPC ou CPCSi na fala do interlocutor considerado.