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Mapa 06 Distribuição espacial territórios da cidadania no Ceará

2. CONFIGURAÇÕES DO CAMPO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO:

2.3. Origens do enfoque territorial do desenvolvimento

Dentro do contexto que se esboçou acima, sobre as permanências e coexistências no espaço agrário brasileiro, considerando-as como base fundamental para pensar o processo de desenvolvimento da política territorial, torna-se necessário assinalar os prelúdios que redundaram nas origens do enfoque territorial do desenvolvimento rural.

Para Oliveira (2005), o estudo que paute a respeito da agricultura brasileira, bem como das diversas realidades que compõem o espaço agrário nacional, requer a leitura compreensiva acerca dos processos de desenvolvimento do modo de produção capitalista e suas implicações socioespaciais no Brasil e no mundo.

Essa perspectiva passa necessariamente pela busca de compreensão sobre o fenômeno do desenvolvimento. Este entendido como realizado de modo contraditório e combinado, isto é, ao passo que segue reproduzindo relações capitalistas mais dinâmicas e avançadas, recrudesce de maneira substancial e paradoxal, relações outra ordem: não capitalistas de produção e trabalho, tais como as camponesas de resistência. Contraditoriamente necessárias à sua lógica de desenvolvimento.

Esse a via de análise interpretativa indica caminho possível para a discussão sobre temas relativos ao desenvolvimento em escala mais ampla, como: globalização, fragmentação, identidade territorial, perda da soberania nacional, formação socioespacial, dentre outros.

Assim, passados aproximadamente vinte anos da formulação da Declaração Rio-92, que pretendia estabelecer um novo paradigma para o desenvolvimento, na prática, as mudanças realizadas em torno das orientações gerais para o desenvolvimento são bastante inexpressivas.

O tom que rege a pauta das discussões sobre a problemática ambiental, em escala global, leva a tônica maior sob o jugo da superioridade economicista das concepções dominantes. O contraste possui notoriedade a partir da contradição do discurso que apregoa o denominado desenvolvimento sustentável, bem como do conjunto de seus elementos constitutivos como garantia para a sustentabilidade (ambiental, econômica, social, espacial e cultural).

A lista de compromissos que envolvem as convenções e acordos ambientais, em síntese, gira em torno dos seguintes pontos: conservação e uso racional da biodiversidade, emissão de gases poluentes e mudanças climáticas e o processo de desertificação em áreas áridas e semiáridas, sintetizando Vasconcelos (2009).

O discurso que perfaz a ideologia do desenvolvimento sustentável considera, dentre outros aspectos, a garantia do direito às oportunidades das gerações futuras. Também defende o ideário da adoção de um modelo que supere a atual ideia do desenvolvimento (possível apenas para poucos, e que, por isso, leva à exclusão da maioria). Lança mão da construção de um viés de desenvolvimento pautado na superação de modelos, calcados estruturalmente na exploração dos recursos e na promoção da desigualdade.

A reflexão teórica permite assinalar alguns aspectos críticos ao modelo de desenvolvimento capitalista para a agricultura brasileira sob a perspectiva do agronegócio, como afirmam Fernandes & Molina (2004): Monocultura – Commodities; paisagem homogênea e simplificada; tecnologia com elevado nível de insumos externos; competitividade e eliminação de empregos; concentração de riquezas – aumento da miséria e da injustiça social; êxodo rural e periferização urbana; fortalecimento da identidade e da pluriatividade capitalista. São características que reafirmam o debate sobre que perspectiva complementar a considerar: a monocultura agroexportadora do agronegócio ou a agricultura camponesa?

Nesses moldes, a Agenda 2115, sucintamente, é incisiva quanto ao desenvolvimento sustentável. Remete à adoção de nova cultura de produção e consumo. O desafio reside na

15 A Agenda 21 é um dos resultados mais importantes da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro com a representação de 178 países, em 1992. Refere-se a uma tentativa de especificar quais ações são necessárias, em nível global, para repensar o padrão de desenvolvimento,

busca pela superação do modelo de desenvolvimento calcado no fetiche de mercado, para a afirmação de um discurso sustentável para a abordagem do desenvolvimento.

A destruição do meio ambiente provocado pela moderna agricultura pode ser comprovada pelo processo de nutrição das plantas de modo artificial, acarretando alterações nas funções fisiológicas da planta, devido à absorção desproporcional dos elementos nutritivos. Assim, as plantas tornam-se um alvo fácil de ataque das pragas, que conseguem mais sucesso, exigindo uma maior quantidade de venenos, agravando a degradação do ecossistema (SILVA, 2005: 10).

Portanto, o mundo estaria vendo, nesse sentido, a chegada de uma leitura de desenvolvimento que segue uma proposição bastante subversiva à ordem de crescimento econômico vigente. Gera profundos questionamentos sobre o modelo que continua em marcha.

O foco da construção ideológica residiria, então, no esforço teórico de criar condições estratégicas para a sustentabilidade. A tendência de rejeição à fragmentada vida social imposta pela economia estaria, ao menos no discurso, sendo posta de lado, para receber uma proposta de redefinição da relação natureza-sociedade, tendo em vista a (re) construção da civilização futura.

Desse modo, no seio do debate acerca da problemática do desenvolvimento, urge questionar as origens do enfoque territorial como primazia para as políticas públicas de desenvolvimento do Estado brasileiro.

Inicialmente, seria interessante levantar alguns questionamentos relevantes: porque residiria no território a chave conceitual para a formulação destas políticas? Haveria uma disseminação do conceito de território no discurso e na prática intervencionista do Estado, ou seja, um uso exacerbado e difundido entre as instâncias de governo? Estaria o enfoque de DT pautado sob essas condições?

Ao considerar o conteúdo dos questionamentos supracitados evidencia-se a primazia da perspectiva territorial do desenvolvimento, como novo instrumental teórico para a formulação das políticas de Estado, em se tratando do estabelecimento relacional entre os conceitos de território e desenvolvimento.

Todavia, torna-se significante para a compreensão desse enfoque político, a busca pelas origens desta abordagem. Assim, no que se refere à prática do planejamento estatal, poder-se-ia dizer que, de um modo geral, a abordagem territorial do desenvolvimento nasce,

levando em consideração as premissas básicas da tríade relacional: viabilidade econômica, equilíbrio ambiental e equidade social.

enquanto formulação teórica e prática intervencionista a partir de 2002, com o advento da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), ligada ao MDA.

A compreensão da leitura territorial deve procurar, minimamente, dar conta das origens dessa formulação política; dos pressupostos teóricos pensados para redefinir as estratégias de desenvolvimento do Estado. Sendo assim, indaga-se: estar-se-ia diante de um modismo conceitual, ou pautando-se no rebuscar da tradição do uso do conceito de território para a política de Estado, agora visto como conceito motriz para o desenvolvimento?

O DT, nesse tocante, teria então suas origens a partir do conjunto de mudanças com ênfase nas políticas públicas. As políticas estariam movendo olhar para os condicionantes estruturais que se revelam diante à sociedade contemporânea. Tendo como vieses analíticos os elementos levantados nesta tese como desafios ao DT, tratados neste capítulo enquanto “permanências e coexistências”.

Para se ter uma ideia desta percepção, o desafio da visão integradora; a essência que constitui a leitura do território como espaço constituído por contradições entre o rural e o urbano, por exemplo, o põe diante de seu reconhecimento como elemento estruturante e objeto de política de Estado.

Vale enfatizar que a perspectiva do território também embasa a definição de instrumentos e enfoques não apenas no Brasil. Este novo viés é observado também em parte dos países da América Latina, como a Bolívia, o Peru e o México, Montenegro (2010). No entanto, a aplicação desse enfoque encontra-se em estado ainda incipiente. No Brasil, há o esforço pela definição das estratégias para dar ao mesmo corpo e lugar junto ao ideário de desenvolvimento.

Outro aspecto bastante significativo é o que se refere à construção das políticas que possuem fontes básicas nas “teorias de desenvolvimento regional”. O que torna ainda mais complexo o desafio sobre a leitura do desenvolvimento calcado no território. A experiência sob a perspectiva regional do desenvolvimento serviria, portanto, de base histórica e instrumental para repensar o próprio desenvolvimento. O espaço estaria, agora, desde os primeiros anos do Século XXI, assumindo as feições de território. Mas, para tanto, com a contribuição histórica da abordagem regional, a partir da releitura de seus componentes, dinâmicas e processos.

Entretanto, vale salientar que, em termos de consideração histórica das políticas públicas de desenvolvimento brasileiras, este trabalho assinala ainda que é salutar a menção da leitura que perpassa o conceito de região e sua discussão, na tradição da prática do regionalismo para o planejamento. Tendo como conceito motriz a região e suas aferições

socioespaciais, de acordo com a escala geográfica a considerar (micro, meso ou macrorregionais, ou até mesmo mega-regionais, em se tratando do estudo do comportamento sociopolítico, econômico e cultural dos megablocos econômicos regionais).

A lógica contraditória do capital é que constrói e desconstrói formações territoriais. Dissemina ou aniquila processos sociais, que ordenam ou desordenam territorialidades múltiplas. Valorização, produção e reprodução do capital, acabam conformando as regiões nesse, seguindo o princípio da construção das geografias da desigualdade no espaço.

Agora, o que há de novo no contexto das políticas de desenvolvimento do Estado brasileiro é a emergência do enfoque territorial, que possui, hoje, a pauta no conceito de território. A região ficaria relegada à visão de atraso conceitual em relação ao planejamento do Estado para o desenvolvimento? Ou ainda possuiria alguma relevância para a prática intervencionista? São questões que impulsionam a reflexão ora proposta e que se lançará reflexão a posteriori, sem a pretensão de aprofundá-la em demasiado, mas ainda como suporte.

Na leitura de Oliveira (2005: 74),

[...] o território deve ser apreendido como síntese contraditória, como

totalidade concreta do processo/modo de

produção/distribuição/circulação/consumo e suas articulações e mediações supranacionais (políticas, ideológicas, simbólicas etc.). [...] O território é assim produto concreto da luta de classes travada pela sociedade no processo de produção de sua existência.

Assumido o desafio, caberia a busca pela integração territorial, outrora tida como integração regional. Nesse rol, a visão do todo ganha status de território. O desenvolvimento estaria ainda pleno do ranço regional, que se construiu em torno das desigualdades inter e intrarregionais. Essa perspectiva de política pública remete aos antecedentes das estratégias de desenvolvimento que priorizaram a integração regional e a intercomunicação. Segundo Perico (2009), esses elementos propositivos eram destacáveis no final da primeira metade do século passado (Século XX). Quando se considerava a urgente necessidade de superar a fragmentação do território político tradicional; o isolamento, a inexistência de mercados regionais e a até então precária integração nacional.

A abordagem territorial do MDA aponta para a leitura do território como referência para a construção de uma estratégia de apoio ao desenvolvimento rural, justificando-se a partir de quatro aspectos norteadores da concepção.

O primeiro diz respeito à compreensão de que o rural não se resume ao agrícola. Para além das atividades produtivas que correspondem ao setor econômico, o que define as áreas rurais enquanto tais são as suas características socioespaciais.

O segundo se refere à problemática da escala de abrangência do fenômeno do planejamento. Fala da restrição que se limita ao espaço municipal nesse tocante, considerando também que, ao mesmo tempo, a escala estadual é excessivamente ampla, dificultando as ações e estratégias de mobilização e as iniciativas de resolução dos problemas.

Em seguida toma-se como necessidade o movimento de descentralização das políticas públicas, com atribuição de competências e atribuições aos espaços locais, o qual tem ganhado relevo nas últimas décadas.

Por fim, o território seria a unidade que melhor pode vir a gerar aspectos positivos para a ação do planejamento, pois reflete os laços de proximidade entre as pessoas, grupos sociais e instituições que vivem e produzem o próprio território. “Nessa assertiva é que residiria o trunfo crucial para o estabelecimento e iniciativas voltadas para o desenvolvimento”, segundo o MDA (2005b, p. 08)

Sob essas bases estariam estabelecidas as origens do enfoque territorial do desenvolvimento. Cabe agora considerar suas implicações como fundamento para a formulação das políticas e como interferem na prática do desenvolvimento do referido ministério. O que pretende ser a pauta do capítulo a seguir.

3. O TERRITÓRIO COMO IMPERATIVO DA PRÁTICA INTERVENCIONISTA DO