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Capítulo 3: O Projeto Granberyense

3.2. A Prática Educacional Granberyense

3.2.3. Os Aliados

Procuro, neste item, entender em que medida o apoio dado pela geração de intelectuais liberais ao projeto educacional Granberyense, por um lado, refletia os projetos dessa própria elite parceira e, por outro lado, influenciou e alterou os rumos do empreendimento missionário em Juiz de Fora.

É possível percebermos que um grupo formado por intelectuais como o Dr. Eduardo de Menezes e José Massena, José Rangel ao lado de políticos e empresários como Francisco Valadares se empenharam em transformar a cidade em um centro educacional e, mais que isso, em um centro moderno e progressista.

Entre os vários projetos criados por esses intelectuais, um em particular suscitou muitas discussões, o de criar uma Escola de Medicina na cidade. Os debates em torno dessa questão nos permitem analisar os projetos políticos que estavam associados a esse e a outros projetos.

O projeto e sua discussão foram publicados no Jornal do Commercio, entre abril e julho de 1908. Foram, então, quatro meses em que diversos artigos publicados com o objetivo

84 Idem, p. 32. 85 Idem, p. 32.

de informar sobre os avanços das discussões, mas, ao mesmo tempo, conquistar apoio do seu público leitor, os membros da Academia de Commercio e Indústria, ou seja, a elite econômica e política local.

A criação de uma instituição como aquela representava a definição final da jornada em direção ao progresso. Entre os pontos lembrados por Antônio Aguiar, redator da introdução do projeto, estava a histórica ausência de universidades no Brasil e o imobilismo social causado pelo colonialismo que havia impedido a iniciativa própria, livre e autônoma do povo.

Nesse sentido, os Estados Unidos são lembrados pelo seu grande desenvolvimento e por manter universidades e cursos superiores em praticamente todas as cidades importantes. Ao lado da referência ao modelo norte-americano, aparece também a referência ao liberalismo econômico, uma vez que era a iniciativa privada que deveria promover o progresso social. Outra questão importante abordada foi a transição da monarquia para a república. Havia uma forte crença de que o novo regime político teria rompido completamente os entraves do progresso. Em verdade, havia uma avaliação de que isso já estava acontecendo devido ao aumento do número de instituições escolares, inclusive em Juiz de Fora. É aí que o modelo educacional do Granbery aparece pela primeira vez associado à modernização da cidade. Os ginásios equiparados ao Ginásio Nacional da cidade e as escolas de farmácia e odontologia foram descritos com o sangue novo que o organismo desfibrado e combalido recebia.86

O projeto da Escola de Medicina é apresentado e recebe o apoio de políticos nos níveis federal e estadual, além da Sociedade de Medicina e Cirurgia. A cidade era naquela introdução enaltecida por ter uma indústria “poderosa e florescente”, um comércio “empreendedor e honesto” e administradores e “cabeças pensantes” que a transformaram na “princesa do Paraibuna” – rio que corta a cidade. Aguiar é enfático e acaba por resumir o objetivo maior de um projeto como aquele, ao afirmar que era:

(...) preciso que não fiquemos onde nos deixaram nossos avós, é preciso que desse coruchéu formado pela peanha de seus feitos augustos, saibamos divisar no presente e no futuro a diretriz de seu continuo progredir, a trajetória de seu evoluir sem termo.87

Além de publicar no jornal local o seu intento em criar a escola, Aguiar enviou carta para um considerável número de potenciais apoiadores do projeto. Considerável também foi o número de adesões que o projeto teve. Entre eles estavam: C. Malta, A. de Andrade, José Tristão de

86 Jornal do Commercio, 22/03/1908, p. 1. 87 Idem, p. 1.

Carvalho, J. Mendonça, Eloy de Andrade, Bras Bernardino Loreiro Tavares, Albino Machado, Fernando de Moraes, Ambrósio Braga, José Marciano Loures, Hermenegíldo Villaça. J. L. do Couto e Silva, Candido Teixeira Tostes, Mello Brandão, J. Procópio Teixeira, Cornélio Goulart Bueno, Feliciano Penna, B. Aroeira, Luiz de Souza Brandão, Duarte de Abreu, Jayme Gonçalves, Martinho da Rocha, Christovam Pereira Nunes, V. Garcia, Luiz Barbosa Medeiros Gomes, F. Bernardino Rodrigues Silva, João Evangelista da Silva Gomes, Pinto de Moura, J. Navas, José Cesário Monteiro da Silva, João Penido, Barão de Cattas Altas, o editor e chefe do Jornal do Commercio, Francisco Valadares, o então presidente da câmara dos vereadores Antônio Carlos Ribeiro de Andrada e os professores do Granbery Eduardo de Menezes, Brant Horta. 88

Esse grande grupo de apoiadores era formado por políticos, homens de letras, intelectuais, jornalistas, industriais e alguns deles tinham formação na área da saúde. A busca por apoio, ao que tudo indica, fazia parte da estratégia inicial para fazer com que o projeto saísse do papel. Nesse sentido, Aguiar foi bem sucedido. Todos responderam as suas cartas, parabenizando a iniciativa e oferecendo a ajuda que fosse necessária. Porém, mais que a resposta positiva, Aguiar desejava fazer com que esse apoio se tornasse público. Com o apoio do Jornal do Commercio, a correspondência recebida foi, aos poucos, sendo publicada e, na medida em que isso acontecia, mais adesões se somavam às anteriores.

A resposta de Brant Horta merece destaque, particularmente. Ao contrário dos demais, que enviaram respostas apenas externando a adesão e parabenizando a iniciativa, Brant Horta foi além e publicou uma carta aberta em que avalia o universo educacional brasileiro.

Não é bem que nós, os filhos deste grande Estado que nas eras coloniais fora o centro do movimento intelectual do Brasil, cruzemos os braços e por indiferentes ou por falta de tenacidade e força de vontade deixemos morrer à mingua de coadjuvação real, tão nobre quão útil iniciativa e bradar num deserto quem se dispõe a lutar conosco em prol do nosso progresso e grandeza.

De fato, é vergonha senão crime nós, povo jovem, que devíamos ser crentes, cheios de esperanças, de energia e de vida, andarmos pelo desânimo deixando que as gentes de além-mar nos venham dar lições de mais civismo e provas de maior interesse pelo nosso evoluir.

O Brasil tem todos os elementos para marchar ao lado da grande nação norte-americana e si o não faz é pelo não quererem os seus filhos.

Já é tempo de deixarmos a nossa característica inércia e provado indiferentismo, ser um povo autônomo.

(...)

Apresenta apenas o projeto da fundação de uma Academia de Medicina,

88 Jornal do Commercio: 23/03/1908, 03/04/1908, 05/04/1908, 07/04/1908, 09/04/1908, 11/04/1908, 12/04/1908,

projeto este perfeitamente realizável num meio que reúne corporação tão numerosa quão distinta de médicos competentíssimos.

Venho por isso louvar e apoiar a sua bela iniciativa e espero que todos cônscios das vantagens desta instituição, diplomados, jornalistas, comerciantes, industriais, funcionários públicos e mais habitantes desta cidade, façam braço forte e comum acordo para a realização de tão magnífico projeto.89

A menção ao progresso e sua associação aos Estados Unidos como centro da argumentação em defesa da Escola pelo professor do Granbery é reflexo da cultura política liberal da geração de intelectuais da qual ele fazia parte.

Outros nomes importantes que apoiaram o projeto foi o Dr. Ambrósio Braga, presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia. Ele destacou a necessidade da criação de uma escola do gênero no estado e classificou a situação como urgente. Ofereceu apoio ao projeto como os demais e fez um apelo diretamente ao Presidente do estado, o médico Dr. Silviano Brandão, para que a escola recebesse atenção. Depois de angariar o apoio de forte grupo de intelectuais locais e mineiros, foi a vez de fazer coro junto a administração federal.

A diretoria do Granbery também externou seu apoio para a criação da Escola de Medicina e na ocasião reconheceu ter a esperança de criar um curso de medicina em seu estabelecimento.90 As palavras de apoio do Granbery também foram publicadas junto à série

que registrava as adesões no Jornal do Commercio.

As administrações de outras cidades também foram mobilizadas como, por exemplo, Lavras, Ponte Nova, Além Paraíba, Uberaba, Caxambu, Formiga e Belo Horizonte, que responderam positivamente. Considerando essas e outras manifestações, podemos perceber que a adesão ao projeto foi expressiva, mobilizando um grande número de homens públicos e de letras e a acolhida de diversas administrações. Mas, não foi suficiente. Esse foi um dos vários projetos que não se concretizou ao longo da primeira república.

O Granbery se apresentou no momento em que esse projeto era discutido como um parceiro ao oferecer seu apoio. Há de fato uma troca de apoio entre o projeto educacional granberyense, considerado modernizador, e a elite intelectual de Juiz de Fora. O desenvolvimento da cidade e a concretização da aposta de que ali nasceria um centro progressista era desejado pelos missionários metodista, contanto que estes pudessem influenciar diretamente. Na mesma medida para a realização das ambições da elite liberal juiz-forana, não se poderia prescindir de nenhuma das instituições locais de prestígio. Muito menos uma que representava o modelo de progresso em maior evidência, ou seja, o

89 Jornal do Commercio, 22/04/08, p. 1. 90 Jornal do Commercio, 17/06/08. p. 1.

americanista.