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CAPÍTULO 5: FAMÍLIA E ESCOLA

6.4 Os alunos após a conclusão do ensino técnico

A realização do curso técnico não interfere de forma determinante na escolha do curso superior. Entre aqueles que almejam o ingresso no ensino superior há sete participantes que citam algum tipo de engenharia, um que cita profissões na área de moda ou alimentos e dois que citam cursos na área de humanidades. No quadro abaixo é possível ver a expectativa de cada sujeito em relação ao ensino superior e o que efetivamente os adolescentes estão fazendo após a conclusão do ensino médio.

Sujeito Expectativa em relação ao curso superior Atividades realizadas após conclusão do ensino médio Alan Engenharia Cursando Estatística/ Faculdade pública Amanda Engenharia ou Arquitetura Cursando Arquitetura e Urbanismo/Faculdade

particular

André Engenharia Trabalhando e fazendo cursinho pré-vestibular Cássio Letras, Psicologia ou Artes

cênicas

Trabalhando e finalizando curso técnico em outra instituição

Cíntia Moda ou gastronomia Cursando Gastronomia/ Faculdade particular Daisy Engenharia civil Cursando Engenharia Civil/Faculdade particular Daniel Não pretende cursar ensino superior Trabalhando e estudando para concurso público

Jonas Direito ou Engenharia Fazendo cursinho pré-vestibular Sara Engenharia Cursando Engenharia elétrica/ Faculdade particular

Vanda Engenharia de automação Trabalhando

QUADRO 4 - Expectativas em relação ao ensino superior e atividade dos alunos após a conclusão do ensino médio

Os dados do quadro acima mostram que cinco alunos, Alan, Amanda, Cíntia, Daisy e Sara já ingressaram no curso superior, quatro deles em estabelecimentos privados, e Alan conseguiu aprovação na UFSCar, universidade pública. Dos demais Jonas, está fazendo cursinho pré-vestibular e André trabalha e faz cursinho semelhante. Entre os outros dois que trabalham, Cássio exerce atividade remunerada em uma livraria também está concluindo curso técnico em outra instituição enquanto Daniel estuda para prestar concurso público. Por último, encontra-se Vanda, que apenas trabalha, mas ainda tem planos de cursar faculdade.

Dentre os alunos que estão estudando Sara, Amanda, Daisy e Cíntia relataram estar também trabalhando. Sara cursa faculdade no período noturno e trabalha no setor administrativo de grupo de planos de saúde. Amanda faz estágio em loja de materiais elétricos no período da manhã e Daisy trabalha em uma loja de equipamentos eletrônicos em sua cidade natal durante o dia e cursa faculdade no período noturno em Ribeirão Preto. Além do curso de gastronomia Cíntia já está trabalhando na área em uma padaria. Alan conseguiu auxílios alimentação e moradia na UFSCar e conta com ajuda dos pais sem precisar trabalhar, porém espera conseguir uma atividade remunerada na própria universidade, como bolsa atividade.

Como nove alunos afirmaram que desejavam ingressar no ensino superior, exceto Daniel, os dados mostram que metade deles concretizou essa aspiração e conseguiram inclusive aprovação nas carreiras que haviam escolhido, exceto Alan que conseguiu

aprovação em outro curso. Há ainda dois outros, André e Jonas, que estão fazendo cursinho o que indica a tentativa de realizar suas aspirações de escolarização.

Porém Cássio parece não ter conseguido atingir seus objetivos, já que suas opções pela continuidade de escolarização incluíam três cursos na área de humanas, mas ele trabalha e finaliza curso técnico em outra instituição. O mesmo pode ser aplicado a Vanda cuja aspiração era por engenharia de automoção, mas que está apenas trabalhando.

Mesmo nos casos de André e Jonas, que fazem curso pré-vestibular, ou nos de Cássio e Vanda, não se pode supor que suas aspirações não venham a ser realizadas ao longo do tempo ou que eles alterem seus projetos.

Nesse sentido, a retomada da coleta de dados após a conclusão do trabalho de campo trouxe algumas informações que ampliaram os referenciais empíricos, o que suscita a necessidade de pesquisas longitudinais. Sobretudo os casos dos quatro alunos citados acima poderiam ser retomados para se conhecer o modo como se posicionaram frente a aspirações que ainda não haviam conseguido concretizar.

O exame dos dados mostra ainda que apenas Alan conseguiu ingressar em curso superior de escola pública o que contraria os projetos de aprovação em instituições públicas dos demais sujeitos, o que leva a se questionar por que não conseguiram acesso a universidades públicas.

A comparação entre expectativas e a realidade, escolar e profissional, vivida pelos sujeitos leva a algumas interpretações. Na metade dos casos, ou seja, cinco alunos concretizaram suas expectativas. E se acrescentarmos os dois que fazem cursinho pré- vestibular esse número aumenta.

Cinco alunos que ingressaram no ensino superior e Cássio, Jonas, Daniel e Vanda não se encaminharam para exercer o tipo de atividade profissional para a qual foram habilitados – apenas André trabalha em atividade ligada ao curso mas faz curo pré-vestibular e pretende ter acesso ao ensino superior. Portanto nove alunos não seguiram a carreira para a qual foram habilitados no instituto. Isso suscita outra indagação: será que isto ocorre com alunos de outros cursos do Instituto, seja no campus de Sertãozinho, seja em outros campi?

Nesse caso, os cursos do Instituto não estariam preparando trabalhadores qualificados para o mercado de trabalho mas atuariam como cursos preparatórios para o acesso ao ensino superior de filhos de famílias das camadas populares, como pode ser constatado abaixo. No entanto, trata-se apenas de uma interrogação que surgiu no final da pesquisa e que fica em aberto, já que depende de outras investigações para poder ser respondida.

Por outro lado, é constante nas falas dos participantes a percepção de que o Instituto era a única opção disponível para a realização de uma escola pública e de qualidade, o que nos leva a indagar o que assegura essa qualidade? Será o corpo docente formado por professores com titulação de mestrado e doutorado e, portanto, com mais conhecimento e experiência docente? Será o processo de seleção pelo qual esses jovens passam antes de ingressarem?

Segundo dados do website do Instituto Federal São Paulo, em 2013 o curso de automação industrial contou com 184 alunos inscritos no processo seletivo, totalizando uma relação de candidato/vaga de 4,6. Em 2009, primeiro ano em que há dados, essa relação era de 2,68, e inscreveram-se 92 candidatos do sexo masculino e apenas 15 do sexo feminino na seleção para o curso de automação industrial. Mais dados acerca de número de inscritos constam do APÊNDICE B

.

A grande disparidade entre candidatos do sexo masculino e feminino fica aqui registrada como dado relevante para se indagar sobre as razões de tal disparidade, que realimenta a representação de que há cursos para homens e para mulheres e articula-se às análises sobre escolarização e relações de gênero. Todavia, por mais instigante que seja tal diferenciação não há como aprofundá-la, já que não cabe nos limites deste trabalho. No entanto, esse registro é importante para alimentar futuras pesquisas sobre a clientela desse curso, sobre sua divulgação e quais as razões que afastam as mulheres do processo seletivo.

Por outro lado, o processo seletivo aprova alunos com melhor desempenho escolar no ensino fundamental e, simultaneamente, exclui grande quantidade de adolescentes que poderiam se beneficiar desse ensino de qualidade. No entanto, quando se examinam os dados do ANEXO A que mostra a renda familiar dos alunos, o que se constata é que o Instituto recebe adolescentes de famílias de baixa renda, de escolaridade reduzida e igualmente com pouco capital cultural. Em 2012, 34,83% dos alunos matriculados no Instituto possuíam renda familiar per capita entre 0,5 e 1 salário mínimo, 28,37% entre 1 e 1,5 salários mínimos. Já a porcentagem de alunos com renda familiar per capita acima de 3 salários é a menor, representando apenas 2,25% do corpo discente, conforme consta do ANEXO A.

Pode-se supor que embora os alunos aprovados tivessem bom desempenho escolar no ensino fundamental, a maioria deles não provêm de famílias de camadas médias com renda e escolaridade elevadas e portadoras de capital cultural igualmente elevado. Desse modo, os dados coletados junto ao Instituto indicam que o processo de ingresso não opera uma seleção classista, melhor dizendo, não favorece alunos de segmentos econômica e culturalmente

privilegiados, mas aprova aqueles com melhor desempenho no ensino fundamental originários de escolas públicas e de famílias com recursos financeiros escassos. Isto é, a seleção ocorre, pelo menos aparentemente, entre uma clientela igualada pelas condições econômicas e culturais. Embora os dados não possam ser generalizados, já que se referem apenas a um curso e a uma unidade específica do Instituto, resta uma questão. Por que, dentre esses alunos não há filhos de famílias de camadas médias?

A presente pesquisa não pretendeu, e nem foi formulada, para responder todas as perguntas acima expostas; o que se propõe é compreender as motivações e as expectativas de pais e filhos ao escolherem esse estabelecimento de ensino e a forma como os filhos se apropriam do que lhes foi transmitido pelos pais. Do mesmo modo este trabalhou possibilitou levantar questões para outras pesquisas sobre o ensino técnico público.