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3. ANTECEDENTES E CONSEQUENTES DO COMPROMETIMENTO

3.1. OS ANTECEDENTES DO COMPROMETIMENTO NO TRABALHO

3.1.1. Os antecedentes do comprometimento no nível do indivíduo

Não existe um padrão de nomenclatura ou de categorias relacionadas aos antecedentes do comprometimento. O que Mathieu e Zajac (1990) chamam de características pessoais, Meyer et al. (2002) denominam de variáveis demográficas. Os dados funcionais também foram incluídos por Mathieu e Zajac (1990) dentro da categoria características pessoais.

Diante do exposto, para fins desta dissertação, os antecedentes do comprometimento no nível do indivíduo foram organizados em três grupos, sendo: a) características demográficas – idade, sexo e outros dados afins; b) características de personalidade – valores atribuídos ao trabalho; e c) características funcionais – questões afetas ao vínculo empregatício do indivíduo com a organização.

a) As características demográficas

De acordo com Mathieu e Zajac (1990), a influência das características demográficassobre o comprometimento organizacional tende a ser bastante reduzida, já que os resultados evidenciam que a maioria dos pesquisadores usa tais características basicamente com caráter descritivo e não como variáveis explicativas do comprometimento propriamente dito.

Meyer et al. (2002) encontraram os mesmos resultados (fraca influência) para os itens constantes dessa categoria - idade, sexo, educação, estado civil - enquanto Bastos (1994), Medeiros (1997) e Medeiros e Enders (1998) confirmaram o predomínio das mulheres e dos indivíduos casados como os mais comprometidos.

Os resultados encontrados por Mathieu e Zajac (1990) permitem, ainda, confirmar que o nível educacional influencia negativamente o comprometimento, considerando que indivíduos com maior nível de escolaridade tendem a apresentar menores índices de comprometimento, o que já havia sido apontado por Mowday, Porter e Steers (1982).

Medeiros (1997), contudo, encontrou evidências de que o comprometimento organizacional cresce à medida que a idade dos trabalhadores aumenta. Segundo o

43 autor, este comprometimento decresce com o aumento da escolaridade, apesar de ser mais forte entre os indivíduos que cursaram o nível médio de ensino.

Quanto ao estado civil, Mowday, Porter e Steers (1982), Mathieu e Zajac (1990) e Medeiros (1997) encontraram evidências de que o comprometimento organizacional tende a ser maior entre indivíduos casados.

b) As características de personalidade

Os valores relativos ao trabalho se baseiam no sentido que lhe é atribuído pelo indivíduo. Segundo Morin (1996 apud TOLFO; PICCININI, 2007, p. 39), o

sentido do trabalho é “estrutura afetiva formada de três componentes: o significado, a orientação e a coerência”. Estes componentes envolvem, de acordo com Brandão

(1991) e Bastos (1994a): a) a avaliação que o indivíduo faz quanto à importância do trabalho para sua vida (centralidade do trabalho); b) as crenças normativas (éticas, políticas, humanistas, marxistas, organizacionais) sobre o papel do trabalho na vida dos indivíduos; e c) a importância atribuída aos resultados e objetivos (produtos) do trabalho.

Brandão (1991) adotou em sua pesquisa de mestrado a classificação proposta por Wollacket al. (1971), que os classifica em valores intrínsecos, extrínsecos ao trabalho e mistos. Entre os valores intrínsecos, a autora destaca: a) o orgulho pelo trabalho bem feito; b) a iniciativa, envolvimento, responsabilidade e participação; e c) preferência por manter-se ativo e ocupado. Entre os extrínsecos: a) valorização do trabalho em função dos ganhos financeiros e b) valorização do trabalho em função dos status social proporcionado. Finalmente, como valores mistos, a autora destaca a valorização do trabalho em função da ascensão profissional e funcional.

As crenças normativas se relacionam aos deveres e direitos, sendo que os primeiros se referem aos padrões sociais sobre o trabalho que o indivíduo considera correto na sua relação com a sociedade, enquanto os segundos estão relacionados às obrigações da sociedade para com o indivíduo (MOW, 1987 apud TOLFI; PICCININI, 2007). Nesse sentido, se, por um lado, o indivíduo pode considerar sua obrigação contribuir para o bem social com seu trabalho, avaliando e otimizando as formas de executá-lo, por outro ele tem direito de se considerar merecedor de um trabalho interessante e significante, de participar de programas de treinamento e desenvolvimento e de participar das decisões relativas ao trabalho.

44 Segundo Mow (1987 apud BASTOS, 1994a, p. 102), os produtos do trabalho são valorizados de acordo com funções abrangentes, que podem ser expressivas ou instrumentais:

obtenção de status e prestígio; dos rendimentos necessários; a função de manter o indivíduo ocupado, em atividade; a função de contato social, de permitir estabelecer relações; a função de se sentir fazendo algo de útil à sociedade; e a função autoexpressiva ou intrínseca, quando se valoriza o trabalho interessante e que permite a autorrealização (MOW, 1987 apud BASTOS, 1994a, p. 102).

Pesquisa realizada por Arciniega e Gonzalez (2002 apud CAVALCANTI, 2009) apontou que o comprometimento afetivo é mais bem explicado pelos valores9autotranscendência e abertura à mudança, enquanto o normativo tem como preditores os valores autotranscendência e autovalorização e, finalmente, que a dimensão instrumental tem como melhor preditor o valor conservação, estando ainda relacionada negativamente ao valor autotranscendência.

Finegan (2000 apud GÓES, 2006) também encontrou resultados que indicam diferença entre os valores que antecedem as dimensões de comprometimento afetivo/normativo e instrumental. Numa pesquisa realizada junto a trabalhadores de uma instituição financeira em Brasília, a autora concluiu que o valor prestígio se relacionou positivamente com o comprometimento do grupo, contrariamente ao valor estabilidade no cargo.

Cohen (2007) aponta os valores crenças e personalidade como fatores que afetam a propensão ao comprometimento, etapa preliminar ao estabelecimento do vínculo propriamente dito e que se estabeleceria num segundo momento após o ingresso na organização, quando as expectativas do indivíduo são atendidas como, por exemplo, quando há congruência entre os valores pessoais e os organizacionais. c) As características funcionais

As características funcionais se relacionam à vida funcional, ao contrato

9Autotranscendência: composto pelos valores universalismo (tolerância, compreensão e promoção do

bem-estar de todos e da natureza) e benevolência (promoção do bem-estar das pessoas (íntimas). Autovalorização: composto pelos valores poder (controle sobre pessoas e recursos), realização (sucesso pessoal) e hedonismo (prazer e gratificação em si mesmo). Conservação: composto pelos valores segurança (integridade pessoal, estabilidade da sociedade), tradição (respeito e aceitação dos ideais e costumes da sociedade) e conformidade (controle de impulsos e ações que podem violar normas sociais ou prejudicar os outros). (TAMAYO et al., 2000)

45 formal de trabalho celebrado entre o indivíduo e a organização, refletindo questões afeitas ao caráter legal do vínculo empregatício. Assim, entre as variáveis apontadas pela literatura, podem ser destacadas: a) forma de ingresso – concurso público, por exemplo; b) tempo no cargo e na organização; c) cargo ocupado – chefe ou não chefe, área meio ou área fim, nível médio ou nível superior; e d) salário ou remuneração percebida.

Segundo Bastos e Lira (1997), quando o indivíduo, durante o processo de admissão, avalia que suas expectativas foram atendidas no momento de construção inicial do vínculo, bem como recebe informações realistas daquilo que a organização pode oferecer, tende a apresentar maiores níveis de comprometimento.

Nesse sentido, Caldwell, Chatman e O‟Reilly (s/d apud BASTOS, 1994a) já

haviam apontado que processos de recrutamento e seleção, quando associados a um sistema de valores claros, também se associavam a altos níveis de comprometimento organizacional, resultantes de um processo de identificação e internalização.

A variável tempo de serviço influi sobre a intensidade do comprometimento organizacional, que aumenta com o decorrer dos anos em que o indivíduo permanece na organização (LUTHANS et al., 1987; GLISSON; DURICK, 1988; MOTTAZ, 1988 apud BASTOS, 1994a). Mathieu e Zajac (1990), bem como Meyer et al. (2002) também encontraram evidências, embora pouco significativas, neste sentido. Para os primeiros, a explicação residiria nos investimentos realizados ao longo dos anos.

Medeiros (1997) e Moraes, Marques e Correia (1998) concluíram que a variável salário está mais diretamente relacionada ao comprometimento instrumental, enquanto Medeiros e Enders (1998) encontraram evidências de que a variável salário não teria alcance sobre o comprometimento instrumental, mas influencia as dimensões afetiva e normativa, quando abstraídas quaisquer associações com componentes instrumentais.

Mathieu e Zajac (1990) e Bastos (1994a) concluíram que o comprometimento é maior entre os indivíduos que atuam na área fim do que entre aqueles atuantes na área meio, assim como Bastos e Lira (1997) concluíram que o vínculo tem sua intensidade elevada quando os indivíduos são lotados em cargos compatíveis com sua competência técnica, afinidade, habilidade e vocação. Nesse sentido, a influência da variável funcional será potencializada pelas variáveis relacionadas às características do trabalho.

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