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CAPÍTULO I FUNDAMENTAÇÃO TÉORICA

1.1 MOTIVAÇÃO E APRENDIZAGEM DE UMA SEGUNDA LÍNGUA : DE

1.2.3 Os aspectos cognitivos presentes no ciclo da tarefa

Como já dissemos, as tarefas são o ponto-chave do qual parte o processo de aprendizagem dentro da abordagem que retratamos aqui. Elas devem ser estruturadas e pensadas de modo que contribuam para que o aprendiz lide com as demandas cognitivas de casa fase e possibilite a canalização dos recursos atencionais em relação à forma linguística (SKEHAN, 1996). Nesta perspectiva, cada tarefa deve ter três fases: a pré- tarefa, a tarefa e a pós-tarefa (ver Figura 3), as quais são caracterizadas por diferentes aspectos cognitivos no momento de sua implementação.

23 “a task is an activity in which: meaning is primary; learners are not given other people’s meaning to

regurgitate; there is some sort of relationship to comparable real world activities; task completion has some sort of priority; the assessment of the task is in terms of outcome” (SKEHAN, 1998, p. 95)

FIGURA 3: O ciclo da tarefa adaptado de Willis (1996, p. 60)

A fase pré-tarefa é caracterizada pela introdução ao tópico que será tratado ao longo da tarefa. É a fase da contextualização e das instruções que prepararão os aprendizes para a fase da tarefa, podendo, para isso, ler um texto ou ouvir uma passagem de áudio com alguma similitude com o que será pedido na tarefa. Nesta fase, o professor pode ainda destacar expressões e palavras importantes para serem usadas na fase seguinte. Por exemplo, uma tarefa cujo tópico seja “viagem” pode ser iniciada com questionamentos “Você gosta de viajar?”, “Para onde você viaja normalmente?”, “Como você vai?” e elicitar o vocabulário que os aprendizes já conhecem, assim como introduzir novas palavras ou expressões que eles precisem para a próxima fase.

Já na fase do ciclo da tarefa, os aprendizes recebem uma tarefa a ser cumprida. Em um primeiro momento, eles irão, individualmente ou em pequenos grupos, planejar como farão a tarefa e, por fim, reportar para a turma como fizeram. Retomando o exemplo da viagem, o professor pode iniciar dizendo que, em pequenos grupos, eles deverão criar um roteiro da viagem a ser feita com amigos (a tarefa que exigirá um outcome), contendo planos sobre quando, como, com quem e quanto tempo iriam passar em uma nova cidade com o propósito de prepará-los para uma tarefa semelhante a ser desempenhada na vida deles. Ao formarem os grupos e iniciarem o planejamento, o

professor não faz grandes intervenções, a não ser quando for necessário, e monitora o trabalho dos aprendizes. Quando terminam, eles relatam para a classe o trabalho que fizeram.

Em um momento pós-tarefa, o professor pode, a partir da língua utilizada pelos aprendizes durante a tarefa, promover atividades de tomada de consciência (awareness- raising activities) com um foco linguístico e ainda propiciar a prática dessa nova língua por meio de atividades de follow-up.

Em cada uma das fases descritas são, consequentemente, implementadas demandas linguísticas e cognitivas de diferentes sortes. Skehan (1996) apresenta o Quadro 3 a seguir, dispondo os propósitos de cada fase e respectivos exemplos.

QUADRO 3 - As demandas cognitivas de cada fase da tarefa

Fases Propósito da fase Exemplos

Pré-tarefa

Cognitivo: Amenizar a carga de

processamento subsequente.

Contextualização (definição do cenário, introdução do tópico)

Observação

Condução de tarefas similares Planejamento

Linguístico: Introduzir novas

formas para atenção.

Ensino explícito Ensino implícito Tomada de consciência Durante a tarefa Manipular a pressão: influenciar o equilíbrio do processamento. Velocidade Prazos Número de participantes Calibrar: influenciar o equilíbrio do processamento

Prover suporte visual Introduzir elemento surpresa Pós-tarefa Retrospecto: relembrar os aprendizes da importância da forma. Apresentação pública Análise Tomada de consciência Fonte: Adaptado de Skehan (1996, p. 24)

De acordo com o autor, as fases da tarefa servem para que o aprendiz lide com as demandas cognitivas presentes em cada momento. Na pré-tarefa, o aprendiz possui uma capacidade limitada de atenção, já que precisa responder a ambas demandas linguística e cognitiva. As atividades cognitivas que o autor sugere para diminuir a carga de cognição são as de: tematização (foregrounding) para ativar conhecimentos prévios sobre determinado assunto sem a necessidade de direcionar excessiva energia para “recuperação on-line de informação da memória de longo prazo durante a

realização da tarefa” (p. 25)24; observação e execução de tarefas semelhantes para que o

aprendiz tenha oportunidades de direcionar sua atenção para a linguagem que será usada ao invés de despender demasiado tempo refletindo sobre como a tarefa em execução será estruturada, e planejamento para favorecer a oportunidade de maior elaboração sintática das estruturas e variedade lexical.

Quanto ao trabalho linguístico desempenhado durante a fase pré-tarefa, novas formas podem ser introduzidas para o aprendiz, entretanto deve-se ter em mente que, não necessariamente, elas serão incorporadas na execução da tarefa ou aprendidas – neste momento propiciam-se as condições para que isso possa ocorrer (SKEHAN, 1996).

Já na fase da realização da tarefa, há de se atentar para o fato de que a dificuldade imposta por ela possa interferir no desempenho dos aprendizes. A este respeito, Skehan (1996) discute a questão da pressão de tempo para finalizar a tarefa, já que, segundo ele, pouco tempo pode lidar a escolhas mais simples de formas linguísticas em vez de novas criações, e ainda a questão do número de participantes na tarefa que, conforme o autor, quantos mais participantes houver, haverá também um maior desenvolvimento de fluência – em detrimento da complexidade e acurácia25.

Por fim, as exigências cognitivas na fase pós-tarefa são as de análise da língua utilizada para compor a tarefa, provendo um “outro meio de induzir o uso efetivo de recursos atencionais durante as tarefas, e de balancear os vários objetivos” (SKEHAN, 1996, p. 27). O mesmo autor ainda propõe o uso de suportes visuais para amenizar a carga de processamento, pois eles podem exigir que menos informações sejam mantidas na memória de trabalho.

Os aspectos cognitivos nas fases da tarefa de L2 que acabamos de descrever podem impactar diferentemente no nível de motivação experimentado pelos aprendizes em momentos distintos da realização das tarefas. Consideramos a relevância de aspectos concernentes à motivação da tarefa na seção seguinte.

24 “retrieval of information from long-term memory ‘on-line’ during task completion (…)” (SKEHAN, 1996, p. 25)

25 Fluência, acurácia e complexidade são dimensões de performance de natureza comunicativa. Segundo Skehan (1996), a fluência está relacionada à capacidade do aprendiz de produzir linguagem em tempo real sem pausas e hesitações; a acurácia indica a esfera do quão bem a língua é produzida em relação ao sistema de regras da L2; e a complexidade está relacionada à elaboração da linguagem (subordinação, reestruturação da interlíngua etc.).