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CAPÍTULO II – A CONCORRÊNCIA FISCAL NA UE

3. OS AUXÍLIOS DE ESTADO

Desde o Tratado de Roma que está previsto um regime de proibição e controlo da intervenção dos Estados-Membros na economia, que visa impedir a depravação do mercado interno e distorções de concorrência pela intervenção do Estados no funcionamento dos mercados, como também impedir que a remoção dos obstáculos à livre concorrência fosse posta em causa pela intervenção do Estado nas condições económicas de exploração das empresas ou setores económicos (Gorjão-Henriques, 2014).

3.1. O REGIME JURÍDICO DOS AUXÍLIOS DE ESTADO

O regime dos auxílios de estado está previsto no artigo 107.º a 109.º do TFUE. Segundo o artigo 107.º n.º 1 “são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções”. Não estão, contudo, proibidos qualquer afetação de recursos a favor das empresas. Para que um auxílio de Estado seja considerado proibido é necessário o preenchimento cumulativo de todas as condições do 107.º n.º 1 (Gorjão-Henriques, 2014):

(i) Deve tratar-se de uma intervenção que recorra a recursos estatais, sendo para isso necessário que o Estado deixe de receber receitas que de outra forma receberia, que o Estado dispenda ou possa vir a dispensar recursos financeiros, implicando um encargo adicional para os poderes públicos. Isto inclui todo o tipo de prestações positivas como subsídios e subvenções como inclui intervenções que desoneram as empresas como as isenções, incentivos e deduções fiscais;

(ii) Passível de afetar o comércio entre os Estados-Membros. É necessário que um auxílio seja suscetível de fortalecer, nas trocas comerciais intracomunitárias, a posição da empresa apoiada em relação à posição dos seus concorrentes;

(iii) Atribuindo uma vantagem de forma seletiva a uma ou algumas produções e não a outras. Não constituem auxílios de Estado as medidas de política económica geral, tais como, alteração das taxas gerais do IRC e do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou contribuições para a segurança social, quando acessíveis a todas as empresas e todas as produções numa base de igualdade;

(iv) Falseando ou ameaçando falsear a concorrência. Um auxílio provoca distorções de concorrência se alterar a estrutura de mercado e afetar a posição das empresas concorrentes do mesmo mercado, quando favorece certas empresas ou produções em relação a outras, interfere com o principio da igualdade de oportunidades e equidade económica. Esta condição está, regra geral, indissociavelmente ligada à condição da afetação do comércio entre os Estados-Membros. O n.º 2 e o n.º 3 do artigo 107.º contem as derrogações ao principio da incompatibilidade dos auxílios de Estado. A diferença entre os dois consiste na compatibilidade com o mercado interno as derrogações do n.º 2 e na

possibilidade de serem compatíveis com o mercado interno as derrogações do n.º 3.

A Comissão procede ao exame permanente dos regimes dos auxílios de Estado existentes nos Estados-Membros, nos termos do artigo 108.º.

3.2. OS AUXÍLIOS TRIBUTÁRIOS EM ESPECIAL

Os auxílios tributários são uma das formas de auxílios de estado23 abrangidos pelo artigo 107.º do TFUE, pelo que, podem ser sujeitos ao principio da incompatibilidade com o mercado interno como também beneficiar das derrogações previstas, caso satisfaçam todos as condições.

A necessidade de uma ação coordenada, a nível comunitário, para contrariar a concorrência fiscal com efeitos prejudiciais, levou a Comissão a emitir, a 10 de dezembro de 1998, uma Comunicação sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade direta das empresas, publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (JOCE) C 38424. A Comunicação baseada na jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância reconhece a ligação entre Código de Conduta e regime dos auxílios de Estado. “O Código de Conduta aumentará a transparência no domínio fiscal graças a um sistema de informação mutua entre os Estados-Membros e de avaliação das medidas fiscais suscetíveis de serem abrangidas pelo seu âmbito de aplicação. As disposições do Tratado em matéria de auxílios estatais com o seu mecanismo próprio contribuirão igualmente, por seu lado, para a consecução do objetivo de luta contra a concorrência prejudicial em matéria fiscal”.

O objetivo da Comunicação, é “de clarificar e de reforçar a aplicação das regras em matéria de auxílios de estatais, a fim de reduzir as distorções da concorrência no mercado único”, para alem disso, pretende assegurar a coerência e a igualdade de tratamento entre os Estados-Membros.

A importância do tema do controlo dos auxílios de Estado ganhou particular interesse com o avançar dos processos de integração. Por um lado, a realização do mercado único e a liberalização dos movimentos de capitais, por outro lado a criação da UEM e os esforços de consolidação orçamental que a mesma compromete obrigam um controlo ainda mais exigente dos auxílios de estado, exigindo-se, em nome do interesso geral, a consideração dos efeitos de certos auxílios fiscais sobre as receitas dos outros Estados-Membros.

Assim, para que uma medida fiscal possa ser considerada como auxilio de Estado tem que preencher os requisitos cumulativos do artigo 107.º n.º 1 do TFUE. A medida deve, em primeiro lugar, conferir aos beneficiários uma vantagem, através de uma redução da carga fiscal, nomeadamente uma diminuição da matéria coletável, uma diminuição total ou parcial do montante do imposto, uma dilação, eliminação ou reescalonamento excecional da divida fiscal. Em segundo lugar, a vantagem deve ser concedida pelo Estado ou por meio de recursos estatais. É referido na Comunicação que “uma perda de receitas fiscais é equivalente ao consumo de recursos estatais na forma de despesas fiscais”, podendo a intervenção do Estado assumir diversas formas, quer por via de disposições fiscais de natureza legislativa, administrativa, regulamentar ou práticas da administração fiscal. Em terceiro lugar, deve afetar as trocas comerciais e a concorrência entre Estados-Membros. Esta condição fica preenchida quando o beneficiário da medida fiscal efetua trocas

23 Os auxílios de Estado assumem as mais diversas, sendo as mais comuns, as subvenções, os empréstimos a taxas inferiores às de mercado e bonificações de juros, concessão de garantias em condições vantajosas, regimes de amortização acelerada, injeções de capital, vantagens fiscais e reduções de contribuições para a Segurança Social, transações de bens e serviços em condições vantajosas (IFDR, 2009).

comerciais no mercado comunitário, e consequentemente reforça a sua posição em relação às outras empresas concorrentes no comércio intracomunitário. Por fim, deve a medida ser seletiva ou especifica, favorecendo certos setores da economia ou certas formas de empresas, podendo resultar de exceções de diversas naturezas à legislação fiscal ou de práticas discriminatória da administração fiscal.

No entanto, por razões de natureza ou economia do sistema pode ser justificada a seletividade de uma medida fiscal, e, nesse sentido, não ser considerada como auxilio de Estado, nos termos do artigo 107.º n.º 1 do TFUE. Para isso, a Comunicação contempla importantes considerações, são elas, a distinção entre auxílios estatais e medidas de caráter geral, o critério de seletividade ou especificidade, as práticas administrativas discricionárias e a justificação de uma derrogação pela natureza ou economia do sistema.

Sobre a distinção entre auxílios estatais e medidas de carater geral, refere a Comunicação que, as medidas fiscais acessíveis a todos as empresas numa base de igualdade são, em princípio medidas de caráter geral. Assim, as medidas de pura técnica fiscal, como a definição de taxas de tributação, regras de depreciação e amortização e reporte de prejuízos fiscais, e medidas com objetivos de política económica geral que diminuem a carga fiscal que sobrecarregam certos custos de produção como custos de investigação e desenvolvimento, ambiente, formação e emprego, não constituem auxílios estatais. Pelo contrario, constitui auxilio de Estado se uma medida fiscal estabelecer a favor de determinadas empresas do Estado-Membro uma exceção à aplicação do sistema fiscal, uma exceção à aplicação do regime geral.

Relativamente ao critério de seletividade ou especificidade de uma medida, consiste em favorecer, como refere o n.º 1 do 107.º do TFUE, “certas empresas ou certas produções”. Desta forma, são excluídas as medidas que abranjam a totalidade do território de um Estado. Pelo contrario, as medidas de caráter regional porque podem favorecer certas empresas são qualificadas como auxilio estatal e sujeitas ao controlo por parte da Comissão, estando previstas para este tipo de auxilio, derrogações ao principio geral de incompatibilidade.

As práticas administrativas discricionárias também podem dar origem a uma presunção de auxilio estatal quando se afastam das regras fiscais usualmente aplicáveis, nomeadamente quando existe falta de transparência nas deliberações adotadas pelas administrações tributárias.

Quanto às derrogações por razões de natureza ou economia do sistema, justificam-se naquelas medidas “cuja racionalidade económica as torna «necessárias ou funcionais em relação à eficácia do sistema fiscal»”. É necessário distinguir aquilo que são os objetivos intrínsecos ao próprio sistema fiscal e os que lhe são externos, nomeadamente os objetivos sociais ou regionais.

Os auxílios fiscais podem, da mesma forma que os outros tipos de auxílios, beneficiar das derrogações do nº 2 e n.º 3 do artigo 107.º do TFUE desde que não sejam contrários ás regras dos Tratados e às disposições do direito derivado em matéria fiscal25. Para que as medidas fiscais destinadas a favorecer o desenvolvimento económico de uma região possam beneficiar de uma derrogação é necessário certificar que contribuem para o desenvolvimento regional e as atividades desenvolvidas tenham impacto local, que correspondam a desvantagens regionais reais e que sejam examinadas num contexto comunitário, tendo em consideração os efeitos nos outros Estados-Membros.

Em 9 de fevereiro de 2004 foi publicado o Relatório sobre a implementação da Comunicação, este demonstrou

25 O direito derivado inclui os atos unilaterais (diretivas, regulamentos, decisões, pareceres, recomendações, comunicações, as recomendações, os Livros Brancos e os Livros Verdes) e os atos convencionais (os acordos internacionais assinados entre a UE, por um lado, e organizações ou países terceiros, por outro, os acordos entre Estados-Membros, os acordos interinstitucionais, isto é, entre as instituições da UE) (EUR-Lex, 2010).

a necessidade de ações destinadas “reforçar o conhecimento das regras em matéria de auxílios fiscais, tanto a nível dos Estados-Membros como das empresas”, revelando-se um instrumento apropriado para a analise dos auxílios estatais sobre forma fiscal.

O regime dos auxílios de Estado pode aplica-se a qualquer tipo de tributo, assim, para efeitos de enquadramento no conceito de auxílio tributário tanto a forma ou a modalidade como a finalidade do auxilio são irrelevantes desde que sejam suscetíveis de trazer vantagens para as empresas em posições de concorrência real ou potencial com outras, ficando abrangidas, para além dos impostos, outras espécies de tributos criadas por lei, são exemplo, as taxas, as contribuições financeiras a favor de entidades publicas e outras contribuições e taxas de natureza parafiscal (Santos A. C., 2003).

3.3. AUXILIO DE MINIMIS

Os auxílios de minimis são ajudas de reduzido valor concedidos a uma empresa que não são suscetíveis de afetar de forma significativa o comércio e a concorrência entre os Estado-Membros, por essa razão, não são aplicados a este tipo de auxílios o disposto nos artigos 107.º e 108.º do TFUE, ficando assim dispensados da notificação prévia à Comissão.

Estes auxílios são regulados pelos diplomas Regulamento (CE) n.º 69/2001, de 12 de janeiro, o Regulamento (CE) n.º 1998/2006, de 15 de dezembro aplicável entre 1 janeiro de 2007 e 31 de dezembro de 2013 e o Regulamento (UE) n.º 1407/2013 da Comissão, de 18 de dezembro aplicável de1 de janeiro de 2014 e 31 de dezembro de 2020. Por questões de transparência, igualdade de tratamento e monitorização efetiva, as regras dos auxílios de minimis só devem ser aplicadas aqueles auxílios que não necessitem de uma avaliação de risco, são exemplo, as subvenções, bonificações de juros e isenções fiscais sujeitas a limite.

O montante total de auxilio de minimis a uma empresa única26 não pode exceder o valor de 200.000,00€ durante um período de três exercícios financeiros, o mesmo período utilizado para efeitos tributários. O período de três anos deve ser verificado numa base móvel, ou seja, para cada nova concessão auxilio de minimis, deve-se ter em conta o montante total concedido durante o exercício financeiro em causa e os dois anteriores.

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