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os dados do Monte dos Castelinhos (Vila Franca de Xira)

João Pimenta Técnico Superior da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira. Arqueólogo do Museu Municipal de Vila Franca de Xira. Mestre em Pré-História e Arqueologia (joao.marques@cm-vfxira.pt).

Resumo

As escavações em curso no povoado de Monte dos Castelinhos em Vila Franca de Xira, vêm aduzir novos elementos à investigação sobre o início da produção oleira romana no extremo ocidente peninsular.

O povoado fortificado de Monte dos Castelinhos, situa-se em posição de destaque sobre o Vale do Tejo.

Trata-se de uma estação com características singulares. Fundado aparentemente na primeira metade do século I a.C., o sítio foi alvo de uma destruição generalizada ainda no século I a.C., possivelmente correlacionada com

os conflitos entre César e Pompeio.

É precisamente nestes níveis de abandono brusco do sítio, bem datados de inícios da segunda metade do século I a.C. pela presença de Campaniense B e ânforas Béticas do Tipo Classe 67, Haltern 70 e Classe 24, que se encontram atestadas as primeiras ânforas de produção Lusitana.

A sua presença nestes contextos bem definidos atesta de uma forma categórica o início da produção de ânforas de tipologia romana no ocidente peninsular em época tardo-republicana.

Trata-se de um conjunto de fragmentos de bocais moldurados e fundos que, pelas suas características formais, se aproximam das primeiras produções de ânforas da Baetica, principalmente das Haltern 70, Classe 67 e do universo das Dressel 7/11.

Estas ânforas aproximam-se das mais antigas produções atestadas para as olarias lusitanas do vale do Sado, remontando ao período Júlio-Cláudio.

Palavras-chave: Monte dos Castelinhos, ânforas, comércio, Época Romana (republicana), produção. Texto entregue para publicação em Abril de 2012. Revisto pontualmente em Novembro de 2013.

Abstract

The ongoing excavations at Monte dos Castelinhos settlement in Vila Franca de Xira have added new elements to the investigation into the beginning of Roman pottery production in the peninsula west region.

The fortified settlement of Monte dos Castelinhos, is placed in a prominent position on the Tagus Valley.

It is an archaeological site with unique characteristics. Founded apparently in the first half of the 1st century BC, the site was subject to widespread destruction still in the 1st century BC, possibly correlated with the conflicts between Caesar and Pompeius.

It is precisely in these levels of abrupt abandonment of the site, well dated from the beginning of the second half of the 1st century BC by the presence of Campanian B and Baetic Amphorae of the Class 67 Type, Haltern 70 and Class 24, which are attested the first amphorae of Lusitanian production.

Their presence in these well-defined contexts clearly confirms the beginning of the production of Roman amphorae in the Western peninsula at the Late Republican period.

It is a set of rims and bases fragments, due to their formal characteristics, are close to Baetica's first amphorae productions, mainly Haltern 70, Class 67 and Dressel 7/11 family.

These amphorae are close to the oldest attested productions at the Lusitanian potteries on the Sado valley, dating back to the Julius-Claudius period.

1. Introdução

O projecto de investigação em curso em torno do sí tio arqueológico de Monte dos Castelinhos, Vila Franca de Xira, vem aduzir novos elementos à inves- tigação sobre o início da produção oleira romana no extremo ocidente peninsular.

Trata-se de uma estação com características singula - res. Fundado aparentemente na primeira metade do sé culo I a.C., o sítio foi alvo de uma destruição gene- ralizada pouco tempo depois (PIMENTA e MENDES, 2012). Ainda que alguns materiais recolhidos à su - per fície atestem uma reocupação no principado de Au gusto até aos Flávios, a escavação ainda não lo - grou identificar estruturas atribuíveis a esta fase (ver PIMENTA, MENDES e NORTON, 2008).

É precisamente nos níveis de abandono brusco do sítio, bem datados de inícios da segunda metade do século I a.C. que se encontram atestadas as primeiras ânforas de produção lusitana 1.

A sua presença nestes contextos bem definidos atesta de uma forma categórica o início da pro dução de ânforas de tipologia romana no ocidente peninsular em época tardo-republica - na.

2. Monte dos Castelinhos, um discurso em construção…

O sítio arqueológico de Monte dos Castelinhos ocupa um extenso morro calcário sobranceiro à antiga foz do rio Grande da Pipa, na freguesia de Castanheira do Ribatejo, concelho de Vila Franca de Xira, situan- do-se hoje em dia a cerca de dois quilómetros e meio da margem direita do rio Tejo (Fig. 1) 2.

Esta estação, com mais de dez hectares de exten são, encontra-se numa área de portela de ligação natu ral entre as margens do Tejo e o interior da Península de Lisboa, através do vale do rio Grande da Pipa (PI - MENTA, MENDES e NORTON, 2008).

Em Torno dos Mais Antigos

Modelos de Ânfora de Produção Lusitana

os dados do Monte dos Castelinhos

(Vila Franca de Xira)

João Pimenta Técnico Superior da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira. Arqueólogo do Museu Municipal de Vila Franca de Xira. Mestre em Pré-História e Arqueologia (joao.marques@cm-vfxira.pt).

Texto entregue para publicação em Abril de 2012. Revisto pontualmente em Novembro de 2013.

1 O termo “lusitana”, aqui utilizado com uma perspectiva geográfica, ainda que anacrónico para a época a que nos re- portamos, é usado de uma forma consciente, por ser mais ope- racional numa fase da investigação em que os centros produto- res destes modelos ainda não são bem conhecidos.

2Escavações da responsabilidade do signatário e do Dr. Henri - que Mendes, a quem expresso aqui o meu agradecimento por todo o apoio.

As características da sua implantação, com ampla visibilidade e defensibi- lidade natural, levam a que assuma uma posição geoestratégia de controlo de uma zona de fronteira natural. Em frente a Castelinhos encontra-se uma extensa zona de alagadiça, onde correm três importantes linhas de água subsidiárias do Tejo: o rio Gran - de da Pipa, o rio de Alenquer e o rio da Ota.

As escavações em curso iniciaram-se em 2008, e in- serem-se dentro de um projecto plurianual de inves - tigação do Museu Municipal de Vila Franca de Xira aprovado pelo IGESPAR – “Monte dos Castelinhos: Po voamento e dinâmicas de ocupação em época ro - mana republicana no vale do Tejo”.

As áreas colocadas a descoberto até ao momento re velaram um notável conjunto urbano de época ro - mana republicana em excelente estado de preserva- ção.

A análise da sua planta permite identificar distintos edifícios e áreas de circulação obedecendo a um pla no predefinido de cariz ortogonal, que denotam um elevado padrão de romanização.

O esforço para implantação deste urbanismo é assi- nalável, visto estarmos perante uma área de encos ta com forte pendente. Para vencer este desnível, os di versos compartimentos foram construídos em so - calcos sucessivos, tendo os níveis calcários de base sido escavados para o efeito.

Pouco tempo após ter sido edificado, o povoado é abandonado de forma brusca e repentina. As pare - des são derrubadas, os telhados colapsam e nesses níveis de destruição recolheram-se diversos elementos de armamento militar itálico compatíveis com um ce nário bélico (PIMENTA e MENDES, 2012). O estudo das cerâmicas importadas, nomea- damente as cerâmicas campanienses, as paredes

finas, as lucernas e a cerâmica comum, leva-nos a sublinhar a homogeneidade do espólio exumado e das suas associações formais, enquadradas grosso modo na segunda metade do século I a.C.

O estudo das ânforas presentes nos níveis de aban - dono permite-nos confirmar esta cronologia. Os con - tentores de produtos alimentares são maioritariamen - te da vizinha província da Baetica, nomeadamente for mas tardo-republicanas das Haltern 70, Classe 24, Clas se 67 e ovóides gaditanas, encontrando-se escas - samente representadas as ânforas vinárias itálicas do tipo Dres sel 1, tão características dos contextos repu- blicanos da pri meira metade do século I a.C.

Perante a inexistência de sigillata itálica, e face ao es - tudo das campanienses, das ânforas, e do conjunto nu mismático, torna-se plausível uma ocupação / aban - dono centrada em meados da segunda metade do sé culo I a.C. (50/30 a.C.) 3.

A construção de raiz de um sítio desta dimensão em meados do século I a.C. e a sua brusca destruição apenas alguns anos depois levanta um amplo quadro de questões, que nos encontramos a tentar clarificar, e que se prendem com a interpretação da funcionalida - de e relevância do sítio arqueológico.

PIMENTA, J.

Figura 1 – Localização do Monte dos Castelinhos na Carta Militar de Vila Franca de Xira, escala 1: 25.000, Folha n.º 390.

3Esta proposta de cronologia, apesar de se afigurar verosí - mil, ainda é provisória e poderá sofrer afinações, visto o estudo exaus tivo dos materiais datantes encontrar-se em curso.

Figura 2 – Planta simplificada do urbanismo romano republicano

identificado na área de Sondagem 4, em 2010.

Figuras 3 e 4 – Trabalhos de 2010. Fotografias do desenrolar da campanha de escavação (à esquerda) e do aspecto final do Ambiente 6 (em baixo).

3. Breves considerações

sobre as ânforas do Monte dos Castelinhos Não sendo aqui o sítio para apresentar o já ex - tenso conjunto de ânforas recolhido nas diversas campanhas realizadas no Monte dos Castelinhos, importa porém traçar em linhas gerais o ambiente em que surgem as primeiras produções lusitanas. As intervenções realizadas até ao momento lo - graram aferir e registar uma sequência estratigráfica bem definida, que permite enquadrar o ritmo de importação de ânforas ao longo da vida do sí tio.

Em Torno dos Mais Antigos Modelos de Ânfora de Produção Lusitana: os dados do Monte dos Castelinhos (Vila Franca de Xira)

A análise do conjunto anfórico permite verificar, des - de a fundação até à destruição / abandono do sítio, a relevância do abastecimento de produtos alimentares em ânforas.

Em linhas gerais, verifica-se um claro domínio da im portação de ânforas da área da Bética, mais em concreto do vale do Guadalquivir (55 %). Entre estas, destacam-se formas precoces das suas produções, com bons paralelos com o panorama das importações verificado para Scallabis em meados do século I a.C. (ALMEIDA, 2008), tais como exemplares das formas Haltern 70, Classe 67 e Classe 24.

Em segundo lugar, surgem as importações da área da Bética costeira, possivelmente da baía de Cádis, (22 %), com a presença de ânforas piscícolas das for - mas Dressel 12, Ovóides Gaditanas e algumas ânforas da Classe 67.

A importação do vinho e do azeite da península itá - lica encontra-se escassamente representada (7 %), cor respondendo a níveis correlacionados com a fun - dação do sítio. Nos níveis de ocupação e abandono do urbanismo romano republicano, estas ânforas pra ticamente já não circulam.

Por último, as ânforas de produção lusitana encon- tram-se bem atestadas no momento de abandono / / des truição do sítio (15 %).

A sua presença nestes contextos bem definidos ates - ta de uma forma categórica o início da produção de ânforas de tipologia romana no ocidente peninsular em época tardo-republicana.

Trata-se de um conjunto de fragmentos de bocais moldurados e fundos que, pelas suas características formais, se aproximam das primeiras produções de ânforas da Baetica, principalmente das Haltern 70, Classe 67 e do mundo das Dressel 7/11.

A análise macroscópica das pastas dos exemplares em estudo permitiu definir um único grupo de fa bri - co, que identificamos com as conhecidas pastas atri- buíveis ao Vale do Tejo / Sado. Caracteriza-se por uma pasta compacta e pouco depurada. A cor varia entre o vermelho-claro (5 YR 6/6) e o castanho-avermelhado (10 YR 5/4). Os elementos não plásticos são abundantes, constituídos por quartzos de dimensões variáveis pre dominantemente rolados ou sub-rolados, algumas inclusões negras, escassos elementos de cerâmica moída e vacúolos alongados. As paredes apresen- tam-se alisadas, do tom da pasta ou com uma leve aguada de tom castanho-acinzentado.

4. Os mais antigos modelos de ânforas de produção lusitana

Uma das questões que se mantém na ordem do dia, no que diz respeito à produção e tradição oleira de ânforas na província romana da Lusitânia, é a do seu início, quer em termos de cronologia, quer de en- quadramento (FABIÃO, 2008).

Ainda que intuída (ver DIOGO, 1987 e DIOGO e FA RIA, 1990), a existência de uma fase inicial de pro dução de ânforas de tipologia romana datada de época ro - mana republicana, só recentemente começou a de- finir-se com base sólida assente em dados de índole estratigráfica (MORAIS e FABIÃO, 2007).

A questão foi levantada por Rui MORAIS (2003), na sequência da identificação de diversos conjuntos de ânforas de fabrico claramente lusitano evidenciando morfologia ovóide, recolhidos em contextos tardo- -re publicanos (concretamente, de meados a finais do século I a.C.) provenientes de vários sítios da Galiza (Castro de Panxón, Montecastro e Castro de Vigo - Vi - go), da região entre os rios Douro e Minho (Castro de Santa Luzia e Castro da Terronha, Viana do Castelo; Rua da Banharia e Aljube, Porto; e Castro de Fiães, Vi la da Feira), e a Sul no Vale do Guadiana, no sítio de Castelo da Lousa, Mourão (MORAIS, 2003: 40).

PIMENTA, J. 7% 55% 22% 15% 1% ImportaçõesdeÂnforas Itália BéticaGuadalquivir Béticacosteira Lusitânia Tarraconense

Figura 5 – Gráfico de distribuição de proveniência das ânforas identificadas em contexto. NMI 127.

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