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2. Aline – aprendizagem direcionada por metas de desempenho Propostas de mudança em relação à formação continuada no Pacto

4.2 O DISCURSO E O FAZER PEDAGÓGICO: Dos dados à interpretação

4.2.1 Os discursos e os significados de mediação

Elencar e identificar as categorias discursivas se configurou como primeiro passo da organização dos dados coletados nas entrevistas e observações. Vale lembrar que nossa proposta de pesquisa se debruça sobre os sentidos e significados de mediação pedagógica entre professoras vinculadas ao curso de formação continuada (Pacto) e a análise das estratégias mediacionais utilizadas na sua prática profissional.

Carina e Aline referenciaram-se nos mesmos autores e postulados, pois fizeram parte do mesmo curso de formação continuada. Ambas destacaram Emília Ferreiro como referência

basilar. Aline acrescentou os nomes de Magda Soares e Paulo Freire na sua lista de autores de referência.

Os Estudos de Emília Ferreiro sobre psicogênese da língua escrita embasaram-se em uma vertente extremamente prática e específica do conhecimento na fase escolar da alfabetização: a aquisição da escrita, o que foi extremamente necessário para os avanços na área de alfabetização e letramento. Vigotski Piaget, Feurstein e outros teóricos que apresentam o conceito de mediação pedagógica como uma prática pedagógica mais ampla – presente em todas as atividades do professor que intencionalizam aquisição do conhecimento – não foram citados, embora fizessem parte do conjunto de estudiosos abordados pelos formadores estaduais no curso de Formação Continuada que embasa este trabalho.

Embora essas hipóteses não sejam excludentes e não se esgotem, o relevante nos dados produzidos nessa pesquisa foi o fato de que, para ambas, o significado desse conceito estava intrinsecamente ligado à aquisição da escrita, sem uma ampliação para todas as situações pedagógicas intencionalizadas pelo professor em sala de aula. Os estudos de Ferreiro e Teberoski (2008) foram extremamente relevantes para a área de alfabetização; entretanto, eles se aplicavam especificamente ao reconhecimento dos níveis de escrita e hipóteses pela criança e as intervenções cabíveis para o avanço do aprendiz nessa trilha da aquisição da escrita. Os outros momentos mediacionais não foram contemplados nesse estudo. A pesquisa dessas autoras se configurou como um grande salto qualitativo para a compreensão do processo de alfabetização e letramento das crianças brasileiras, mas não resumiria as possibilidades mediacionais do professor em sala de aula. Não podemos reduzir a prática educacional da criança ao estágio de alfabetização e à aquisição do sistema escrito, visto que a mediação pedagógica envolve todos os processos de interação em um ambiente escolar em que há aprendizagem, culminando com a construção de conhecimentos e trocas de saberes, como postulou Vigotski (2001).

O conceito de mediação tinha sido apresentado para Carina no seu curso de graduação de Pedagogia, mas o estudou com mais profundidade no Pacto. Para ela, o maior desafio foi o de colocar a aprendizagem em prática. De acordo com as suas palavras, o conhecimento só se torna efetivo quando aplicado em situações reais. Isso se dá com o conceito de mediação. Tanto na graduação como no Pacto ela se debruçou sobre os estudos de Emília Ferreiro. Ela “se identificou” com a autora e pôde perceber o conceito na ação, a sua aplicabilidade. Essa oportunidade, o Pacto ofereceu-lhe.

Para Carina o significado de mediação estava conceituado no universo de aquisição da escrita para a alfabetização, a partir de intervenções qualitativas centradas nos níveis de escrita da criança. Essa perspectiva assumida por Ferreiro e Teberoski (2008) nos seus

estudos sobre a psicogênese da língua escrita discrimina fases específicas de aprendizagem da criança, em processo de alfabetização. Segundo essas autoras, as crianças começam a construir hipóteses e escrever mediante as construções cognitivas. A função mediadora do professor, para Carina, era de promover avanços qualitativos entre esses níveis de escrita, fazendo com que a criança pudesse consolidar o sistema de escrita alfabética, sem perder de vista o processo do letramento.

Aline citou Magda Soares e Paulo Freire como autores importantes que foram resgatados e discutidos no Programa. Com a primeira autora ela aprendeu as práticas sociais de leitura e escrita (SOARES, 1998). Além dessa perspectiva do uso social da língua, tornando a aprendizagem enquanto sistema de vida, comunicação e relacionamento social, referenciou-se também em Freire (2011) a partir da premissa do sujeito autônomo e transformador, fomentando uma visão mais comunitária e grupal para o processo de alfabetização. Segundo ela, esses autores foram importantes para a compreensão do significado de libertação e inclusão social pela via da educação. Aline conhecia o conceito de mediação antes do Pacto, sem aprofundamento, mas “faltavam alguns subsídios”. Antes de conhecer o Programa, ela pedia a uma colega mais experiente para orientá-la em algumas práticas de intervenção. A passagem pelo Pacto teve um efeito positivo sobre a sua prática profissional e sobre o planejamento das suas intervenções. Não precisou mais recorrer frequentemente à colega. A sua compreensão sobre a mediação pedagógica mudou, além de sua relação com o trabalho: “olhar, orientar o aluno de forma mais prazerosa”. A participação do aluno e seu engajamento em sala de aula passaram a ser levados em consideração de forma mais efetiva e consciente: “levar eles a investigar também” (sic).

Conceituar mediação não é tarefa fácil, considerando que é um conceito ao mesmo tempo procedimental e atitudinal. Por isso recorre-se, comumente, às situações práticas para expressar o conceito e sua “aplicabilidade”. Possivelmente em virtude disso, as participantes desta pesquisa consideraram que a formação continuada no Pacto favoreceu essa compreensão, pois puderam trabalhar e discutir autores, planejamento, atuação e mediação com muito mais profundidade. O Programa favoreceu o planejamento das aulas, a compreensão de conceitos: “Não é que antes eu não planejasse, eu planejava o todo. E agora é o planejamento mais detalhado, é uma atividade específica para o aluno que tem um nível de escrita diferente” (Aline).

Aline apresentou dois outros significados mediacionais em seu discurso que foram os de orientar o aluno de forma mais prazerosa e levar o aluno a se questionar/investigar. Esses significados corroboraram a concepção de vários teóricos, pois traziam a perspectiva de um sujeito autônomo capaz de construir, transformar e buscar o conhecimento (FREIRE, 2011).

Além disso, sublinha a função social da leitura e escrita como elementos que promovem sentido à aprendizagem do aluno (SOARES, 1998).