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3 A SEGURANÇA INTERNACIONAL

3.4 OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

Segundo o Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América, o terrorismo é o uso calculado da violência ou da ameaça de sua utilização para insuflar medo, com a intenção de coagir ou intimidar governos ou sociedades, a fim de conseguir objetivos geralmente políticos, religiosos ou ideológicos.

A percepção do terrorismo como ameaça ao seu estilo de vida, seus princípios e valores fundamentais foi potencializada pelo atentado de 11 de setembro de 2001, na qual foram mortas aproximadamente 3.000 pessoas em seu território.

Dias após esse atentado, o Congresso norte-americano aprovou o Patriot Act (Ato Patriótico) e a Resolução denominada “Autorização para o Uso de Força Militar”. A Lei do “Ato Patriótico” foi aprovada para conceder às autoridades o respaldo legal para conduzir a vigilância eletrônica, escutas telefônicas, rastreio financeiro e permitir que o presidente confisque as propriedades de pessoas envolvidas em ataques contra os EUA. Em 2005, a Lei sofreu uma revisão sem grandes alterações e foi renovada até o ano de 2015, quando em junho, o Presidente Barack Obama aprovou uma lei substituta, o USA Freedom Act20 (Ato da Liberdade).

20 Lei que renovou algumas medidas da lei anterior, porém excluiu o programa de metadados e

Dessa forma, verifica-se que o terrorismo estava com uma elevada percepção de ameaça pelos dois últimos mandatários e pelo Congresso norte-americanos, no período de 2001 a 2016.

O texto da Resolução de “Autorização para o Uso de Força Militar” deu plenos poderes ao Presidente norte-americano para empregar “toda a força necessária e apropriada contra as nações, organizações, ou pessoas que ele determine que tenham planejado, autorizado, realizado ou auxiliado os ataques terroristas ocorridos no dia 11/09/01, ou abrigado tais organizações ou pessoas, para prevenir quaisquer atos futuros de terrorismo internacional contra os EUA por tais nações, organizações ou pessoas”.

A partir de então, o uso de seu aparato militar tem sido a tônica da Estratégia de Segurança Nacional para prevenir ameaças terroristas.

Entretanto, segundo o Artigo 2º da Carta das Organizações das Nações Unidas, havia restrições quanto ao uso da força para solução de conflitos, pois feriam os princípios de integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado:

4. Todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas.

Para se antecipar a qualquer questionamento futuro no campo da Segurança Internacional, os EUA empregaram sua habilidosa diplomacia junto aos organismos internacionais como a ONU e a OTAN, para enquadrar o terrorismo internacional como ameaça à paz e à segurança internacional, suscetível do emprego do uso da força.

Esse reconhecimento foi fundamental para legitimar a sua primeira ação de “Guerra Global ao terror”, com a invasão do Afeganistão, em 2001, durante a Operação Enduring Freedom, para combater os talibãs apoiadores da Al Qaeda.

Para obter esse aval, os EUA conseguiram a aprovação da Resolução nº 1368, do Conselho de Segurança da ONU (CS/ONU), de 12 de setembro de 2001, que qualificou apropriadamente o atentado com os requisitos abaixo desejáveis para se justificar o uso da força:

a. Equiparar o “ataque terrorista” ao “ataque armado”, permitindo, de acordo com o artigo 51 da Carta da ONU, o direito de legítima defesa individual ou coletiva dos EUA; e

nais” para assegurar, conforme o artigo 39 da Carta da ONU, a obrigatoriedade da mesma percepção da gravidade da ameaça por todos os estados-membros.

Portanto, segundo Souza (2008, p. 115), a Resolução poderia ser lida como uma autorização do CS para que os EUA usassem da força armada em legítima defesa “até que o Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais” (art. 51 da Carta da ONU). A Resolução nº 1.368, em suma, representaria a chancela do sistema de segurança coletiva da ONU para uma eventual ação militar norte-americana justificadamente classificada como uma resposta ao ataque terrorista sofrido.

Alguns dias depois, foi aprovada a Resolução nº 1.373 do CS/ONU que estabelecia a obrigatoriedade de que Estados deveriam se abster nas suas relações internacionais da ameaça ou uso da força contra a integridade territorial ou independência política de qualquer Estado, ou de qualquer outra forma inconsistente com os propósitos das Nações Unidas. Desse modo os EUA direcionavam suas ações diplomáticas contra o Afeganistão, país de homizio de terroristas da Al Qaeda.

No entendimento de Souza (2008, p. 116), a Resolução nº 1.373 endossou o entendimento de que um Estado (Afeganistão) que organiza, instiga, auxilia ou participa de atos terroristas em outro Estado ou permite, em seu território, atividades organizadas com o intuito de promover o cometimento desses atos está violando o princípio que proíbe a ameaça ou uso da força armada. Em consequência, o Estado vitimado (EUA) desse ataque terrorista teria o direito de empregar a força armada em legítima defesa individual ou coletiva.

Consolidado o suporte legal da ONU para suas ações de retaliação, os EUA partiram para angariar o apoio da União Europeia, valendo-se do arcabouço jurídico da OTAN, aliança militar firmada pelo Tratado de Washington de agosto de 1949.

O Tratado reconheceu no atentado de 11/09/01, a conexão entre o seu artigo 5º, que afirma que um ataque armado contra um ou mais países membros será considerado uma agressão contra todos, e o artigo 51, da Carta da ONU, alegado pelos EUA, e dessa forma, colocou-se à disposição norte-americana para uma ação militar conjunta contra o Afeganistão.

A política externa norte-americana sempre foi muito individualista na busca de seus objetivos e a coordenação dessa ação com organismos internacionais (ONU e OTAN) nem sempre foi a regra.

conservador de George W. Bush, foi a invasão do Iraque, em 2003, na Operation Iraqi Freedom (Operação Iraque Livre).

Segundo Heisbourg (2003, apud TORRES, 2015, p. 3), o presidente George W. Bush, em 29 de janeiro de 2002, durante o Discurso sobre o Estado da União, antecipou a principal ideia da Estratégia de Defesa Nacional dos EUA - 2002:

“Temos de impedir que terroristas e regimes que buscam armas químicas, biológicas ou nucleares de ameaçar os Estados Unidos e do mundo. Mas alguns governos ficarão tímidos frente ao terror. Mas não se enganem: se eles não agirem, a América irá”

No entanto, embora contasse com o apoio de uma coligação de países, entre eles, o Reino Unido, Espanha, Itália, Portugal, Dinamarca e Polônia, a ação não possuía o mesmo respaldo daquela do Afeganistão, qual seja, a alegação da “legítima defesa” prevista nos tratados e resoluções internacionais para realizar ataques preventivos contra o suposto apoio ao terrorismo ou a suposta posse de ADM. A ação no Iraque sofreu críticas da comunidade internacional, sendo condenada pela ONU.

Segundo Reisman (1999, apud SOUZA, 2008, p. 118), os EUA possuem capacidade militar suficiente para retaliar um ataque sofrido em qualquer lugar do mundo, mas não estão dispostos a dependerem totalmente de instituições internacionais na resposta ao terrorismo, muito em razão de que os seus Estados membros têm revelado uma atitude ambígua a respeito do terrorismo frequentemente. Conforme Aguilar (2011), apesar de países como os EUA advogarem o uso unilateral da força e de todos os meios autorizados pelo Presidente e pelo Congresso para conter o terrorismo no país e no exterior, face à complexidade de ambas as atividades de combate, ao caráter transnacional de algumas organizações terroristas e à ligação entre elas e outras organizações criminosas internacionais, há um consenso de que o Estado nacional isoladamente não tem capacidade de combater com eficiência e eficácia esse fenômeno. Nesse contexto, os Estados nacionais, organizações e instituições internacionais discutiram, aprovaram e colocaram em prática uma série de instrumentos para prevenir, conter e combater o terrorismo.

Nessa direção, a Estratégia de Segurança Nacional dos EUA, de 2015, aprovada pelo Governo de Barack Obama, propôs o afastamento do modelo de guerra terrestre dispendiosa e em larga escala no Iraque e no Afeganistão, nos quais os EUA carregavam um enorme fardo. Em vez disso, buscou-se uma abordagem mais sustentável que priorizasse as operações antiterror direcionadas, ações coletivas com

parceiros responsáveis e maiores esforços para evitar o crescimento do extremismo violento e da radicalização que impulsionam o aumento das ameaças.

Algumas ideias contidas nessa recente Estratégia são importantes para compreender a nova perceção americana sobre o combate ao terror:

a. A liderança americana permanecerá essencial para interromper o fluxo sem precedentes de combatentes terroristas estrangeiros oriundos de zonas de conflito ou que para lá se dirijam;

b. Abordar as condições subjacentes que podem ajudar a promover o extremismo violento, como pobreza, desigualdade e a repressão;

c. Ajudar a construir a capacidade dos estados e comunidades mais vulneráveis para derrotar os terroristas localmente;

d. Treinar e equipar os parceiros locais e prestar apoio operacional para ganhar terreno contra grupos terroristas;

e. Rejeitar a mentira de que os EUA e seus aliados estão em guerra com o Islã;

f. Agir dentro das normas legais;

g. Deter, interrogar e perseguir terroristas fora de áreas de hostilidades ativas através de aplicação da lei;

h. Tomar as medidas decisivas quanto à captura ou ações para interromper a ameaça não são viáveis. Sempre fazer isso de forma legal, discriminatória, proporcional e vinculada por responsabilidade rigorosa e supervisão forte;

i. Os EUA, e não os nossos adversários, definirão a natureza e o alcance desta luta, para que não nos defina;

j. Trabalhar com a OTAN e outros parceiros para treinar, aconselhar e auxiliar a Força Nacional de Segurança do Afeganistão para que o novo governo assuma a responsabilidade pela segurança e bem-estar;

k. Empregar nossas capacidades militares junto aos aliados locais para deter o avanço do ISIS e para degradar suas capacidades tanto no Iraque como na Síria; e

l. Trabalhar com nossos parceiros para treinar e equipar uma oposição moderada da Síria para fornecer um contrapeso aos terroristas e a brutalidade do regime de Assad21.

21 O regime do Presidente Bashar al-Assad faz guerra em duas frentes: uma contra os insurgentes

sírios que querem a sua derrubada e outra contra o Daesh, que se aproveita da fragilidade do Estado para ocupar o território sírio para criar um califado. Tem sido extremamente violento contra ambos.

Atualmente, segundo o Índice Global de Terrorismo 2016, os EUA estão na 36ª/163 posição com um grau de 4,87, considerado mediano.

Em suma, a nova percepção do terrorismo como ameaça aos interesses e ativos norte-americanos pelo mundo fez com que os EUA mudassem sua postura de enfrentamento individualista para adoção, nos últimos anos, de medidas coletivas de caráter universal, regional e por parte dos EUA, no esforço global antiterrorismo.

O emprego do seu poderio militar e econômico no combate ao terror não tem limites. O país tem sua própria estratégia de enfrentamento ao terror e a capacidade de influenciar o posicionamento de atores internacionais quanto ao assunto.

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