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4 OS PARADIGMAS FORMATIVOS DOCENTES: SÍNTESE DAS ABORDAGENS

4.3 OS PARADIGMAS FORMATIVOS QUE CARACTERIZAM O

PROFORMAÇÃO/PEDAGOGIA

O conhecimento sobre essa organização curricular nos permite perceber que um dos paradigmas mais evidentes na proposta de formação desse Programa Especial é o da perspectiva da prática, com forte presença do enfoque reflexivo sobre a prática, a qual considera que a formação docente será baseada na aprendizagem da prática, para a prática e a partir dela. Conforme vimos na descrição anterior sobre os paradigmas, esse enfoque apresenta metáforas alternativas frente à racionalidade técnica para representar o novo papel que o professor deve desempenhar como profissional confrontado com situações diversas, complexas, mutantes, incertas e conflitantes, evidenciando em todas elas o desejo de superar a relação linear e mecânica entre o conhecimento científico-técnico e a prática na aula.

Discutindo sobre as abordagens que tratam da necessidade formativa de um professor reflexivo para atender às exigências atuais do contexto educacional, Pimenta e Ghedin (2005, p. 19) evidenciam que a reflexão é um ato inerente ao ser humano, e que, por isso mesmo, fazendo referência a um adjetivo que já lhe é próprio, não haveria nenhuma novidade em se falar sobre o professor reflexivo, tornando-se inclusive redundante essa afirmação. Assim sendo, no sentido de esclarecer a diferença entre a reflexão como atributo dos professores (adjetivo) e o movimento que se denominou professor reflexivo (conceito), os autores apresentam uma gênese contextualizada desse movimento.

Pautados nos elementos dessa apresentação, bem como nos estudos de Garcia (1999), evidenciamos aqui algumas de nossas considerações sobre os paradigmas formativos docentes que caracterizam o Proformação.

De acordo com Garcia (1999, p. 41), as origens da abordagem reflexiva sobre a prática remontam a Dewey que, em 1933, se referia ao ensino reflexivo como aquele em que se realiza “o exame activo, persistente e cuidadoso de qualquer crença ou forma de conhecimento, à luz dos fundamentos que lhes são subjacentes e das conclusões que retira” (DEWEY, 1933 apud GARCIA, 1999, p. 41). Porém, é nos estudos de Donald Schön que o

conceito de reflexão ganha dimensão em discussões inerentes às práticas docentes, ao estender ao campo da formação desse profissional às teorias sobre a epistemologia da prática.

As contribuições de Donald Schön são muito férteis no campo da formação de professores, em especial as que dizem respeito aos currículos necessários para a formação de professores reflexivos e pesquisadores. Segundo sua análise (SCHÖN, 1992), a formação do profissional reflexivo supera a visão de uma formação com base na racionalidade técnica (cuja proposta curricular de formação é, de modo geral, meramente normativa), uma vez que valoriza a experiência, através da reflexão, da análise e da problematização dela, e o conhecimento tácito, presente nas soluções que os profissionais encontram em ato.

Ao se referirem à epistemologia da prática, tomando como base os estudos desse teórico, Pimenta e Ghedin (2005, p. 19-20) assim a descrevem, numa citação extensa, mas extremamente definidora desse processo:

Esse conhecimento na ação é o conhecimento tácito, implícito, interiorizado, que está na ação e que, portanto, não a precede. É mobilizado pelos profissionais no seu dia-a-dia, configurando um hábito. No entanto, esse conhecimento não é suficiente. Frentes a situações novas que extrapolam a rotina, os profissionais criam, constroem novas soluções, novos caminhos, o que se dá por um processo de reflexão na ação. A partir daí, constroem um repertório de experiências que mobilizam em situações similares (repetição), configurando um conhecimento prático. Estes, por sua vez, não dão conta de novas situações, que colocam problemas que superam o repertório criado, exigindo uma busca, uma análise, uma contextualização, possíveis explicações , uma compreensão de suas origens, uma problematização, um diálogo com outra perspectivas, uma apropriação de teorias sobre o problema, uma investigação, enfim. A esse movimento, o autor denomina de reflexão sobre a reflexão na ação. Com isso, abre perspectivas para a valorização da pesquisa na ação dos profissionais, colocando as bases para o que se convencionou denominar o professor pesquisador de sua prática. (Grifo dos autores).

Porém, ao apresentar o conceito de reflexão-na-ação definido por Schön, como sendo “o processo mediante o qual os práticos (inclusive professores) aprendem através da análise e interpretação da sua própria actividade docente”, Garcia (1999, p. 41) chama a atenção para o fato de que há uma confusão e uma dispersão ao se conceptualizar a reflexão e seu processo, sendo necessário perguntar se é válido qualquer tipo de reflexão, como processo que possa favorecer a aprendizagem do professor. Para responder a essa questão, o próprio Garcia (1999) define, a partir de estudos de Zeichner e Liston (1987), três níveis de reflexão ou de análise sobre a realidade circundante: a técnica, a prática e a crítica.

O primeiro nível, segundo Garcia (1999, p. 42) diz respeito à análise das ações manifestas, as quais os professores desenvolvem e que são observáveis; o segundo nível implica a planificação do que se vai fazer e a reflexão sobre o que se fez, salientando o seu

caráter didático. E, por último, o nível de considerações éticas, que tem a ver com a análise ética ou política da própria prática bem como das repercussões contextuais.

A partir dos elementos de análise, é possível perceber, na estrutura curricular do Proformação, através de suas diretrizes metodológicas, filosóficas e operacionais, a definição de uma proposta que tem como base perspectivas de formação de um professor reflexivo num nível prático, o qual entende o professor como um artesão, artista ou profissional clínico que tem de desenvolver sua sabedoria e sua criatividade para enfrentar as situações únicas, ambíguas, incertas e conflitantes que figuram a vida da aula. Garcia (1999, p. 39) afirma ser a orientação prática, juntamente com a orientação acadêmica, “a abordagem mais aceita para se aprender a arte, a técnica e o ofício do ensino.” Essa perspectiva de formação parte da prática pedagógica dos professores-alunos e circunda em torno dela num vai-e-vem dinâmico.

A proposta pedagógica do curso é

Investigar a natureza do saber da experiência na perspectiva da formação e da identidade profissional do educador, implica na procura dos princípios de um processo reflexivo dirigido para a ação, ou seja se situa a análise no paradigma da relação teoria-prática. Teorias da ação oriundas da reflexão do homem e do seu contexto social nos fornecem as condições de inteligibilidade da ação docente. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, 1999, p. 6)

As relações que se estabelecem entre as atividades presenciais e vivenciais e a ação docente supervisionada garantem uma permanente discussão do cotidiano do professor para avaliar e fundamentar a sua prática com vistas a uma constante melhoria tanto no próprio desempenho pessoal, quanto na qualidade do processo ensino/aprendizagem. Dessa forma, o trabalho pessoal e autônomo, a análise de situações de sala de aula à luz de teorias pedagógicas e a integração entre a formação acadêmica e a profissional encontram mais e melhores possibilidades na dinâmica do curso, reforçando suas bases metodológicas.

Isso permite aos professores analisar problemas complexos surgidos no dia-a- dia de suas salas de aula e enfrentar situações incertas e desconhecidas, de ordem prioritariamente prática, as quais, de acordo com Pérez Gómez (1998b), nem sempre podem ser resolvidas mediante a aplicação de uma regra técnica ou procedimento. Possibilita, ainda, o desenvolvimento de mecanismos de intervenção na busca de um processo de ensino que garanta aprendizagens reais aos seus alunos.

Nesse sentido, Perrenoud (2002, p. 104) contribui com essa discussão ao afirmar que

a formação de ´profissionais reflexivos` deve se tornar um objetivo explícito e prioritário em um currículo de formação de professores; em vez de ser apenas uma familiarização com a futura prática, a experiência pode desde a formação inicial, assumir a forma simultânea de uma prática ´real` e reflexiva”.

Essa afirmação nos permite considerar, a partir dos elementos expostos ao longo deste capítulo, que a proposta do Profomação/Pedagogia possibilita caminhos importantes rumo à profissionalização dos professores que dele participam, entendida como capacidade de construir a própria prática, os próprios métodos, no contexto de uma ética e de objetivos gerais, a qual só pode ser desenvolvida em campo, em contato com os alunos e os professores mais experientes.

Assim entendido, fica evidente que a proposta em questão apresenta uma forte valorização da prática na formação dos profissionais, mas uma prática refletida na mediação com os tutores, que possibilite aos seus alunos-professores compreender os rumos norteadores de suas vivências diárias, com vistas a responder às situações novas, às situações de incerteza e de indefinição. Portanto, o currículo do Proformação/Pedagogia explicita o seu objetivo de propiciar o desenvolvimento da capacidade de reflexão na prática e sobre a prática dos professores em exercício ali envolvidos.

5 AS CONTRIBUIÇÕES DO PROFORMAÇÃO/PEDAGOGIA PARA A MELHORIA DA PRÁTICA: DESVENDANDO O DISCURSO DOS DOCENTES

Apresentamos, neste capítulo, a discussão sobre as questões realizadas no trabalho empírico e utilizamos o quadro interpretativo das respostas. A investigação empírica quanto à avaliação dos professores sobre AS CONTRIBUIÇÕES DO PROFORMAÇÃO/PEDAGOGIA PARA A MELHORIA DA PRÁTICA foi realizada através de instrumentos pré-definidos, respondidos por quatorze alunos do Proformação/Pedagogia, então professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Aplicamos um questionário com quinze tópicos, conforme Anexo I, sendo doze deles relativos à caracterização social e profissional dos sujeitos envolvidos, considerando elementos de suas vivências atuais na docência a partir de indicadores da inserção inicial no magistério; contém ainda, dois tópicos que dizem respeito à estrutura curricular e um referente aos conceitos avaliativos a serem atribuídos ao curso, visando perceber, numa escala de valores, o olhar dos sujeitos para questões próprias desta organização curricular.

A segunda parte dos instrumentos se constitui de questões abertas aplicadas, relativas aos eixos norteadores de nossa investigação, já descritas neste trabalho, totalizando sete questões (sendo cinco referentes ao primeiro eixo, uma do segundo e uma do terceiro) na perspectiva de ampliar o diálogo e, assim, obter mais elementos para a nossa reflexão sobre as contribuições do curso para a melhoria da prática dos sujeitos investigados. É a partir das respostas dadas pelos professores que apresentamos a categorização que nos permite a análise objeto de nosso estudo.

Para a análise do questionário, no que se refere à caracterização dos sujeitos organizamos três quadros: o primeiro identifica o perfil pessoal dos professores, o segundo trata de suas experiências (tempo médio de serviço) e a atuação de cada um, quando da realização da entrevista (nível de atuação, natureza das instituições de atuação, etc.), bem como da renda salarial dos sujeitos investigados. E o terceiro quadro apresenta uma caracterização profissional dos investigados através de alguns dados relativos à situação funcional, ao nível de escolarização quando do início de suas carreiras docentes, e à motivação de acesso à profissão.