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Os Paresi no contexto do primeiro reinado

CAPÍTULO 3 – O ETNODESENVOLVIMENTO E OS PROCESSOS

3.2. Apontamentos para uma história de perfil econômico entre os Paresi

3.2.2. Os Paresi no contexto do primeiro reinado

Nos planos do primeiro reinado do Império Brasileiro, a intenção era designar aos missionários católicos a missão de civilizar os índios, através da educação e da formação na agricultura e saúde. Alcida Ramos (1999) explica que tal ação visava “redimir o índio de seu destino selvagem, José Bonifácio propunha uma série de medidas, dentre as quais a apropriação legítima de suas terras, transformando-as em bens alienáveis”, nos moldes que ocorrera com os índios americanos.

A mesma autora aponta que os planos de Jose Bonifacio, eram inspirados nas ideias colocadas em pratica durante o Diretório dos Indios, no governo de Pambal. A mesma destacas os muitos “pontos em comum entre o Diretório de Pombal e os Projetos de José Bonifácio estão a insistência em assimilar os povos indígenas à população majoritária através dos intercasamentos, do trabalho assalariado e da domesticação do cotidiano e da intimidade dos índios” (RAMOS, 1999).

Da região do Vale do Guaporé a exploração mineradora voltou-se para a região de Diamantino, local privilegiado geograficamente, por ser o ponto de divisão das águas das Bacias Amazônica (ao norte) e Platina (ao sul), resultante do acidente geográfico conhecido como Chapada dos Parecis, e desta vez, reforçado pela vicejante mineração de diamantes. Inicia-se um novo povoamento e novamente os paresi-kaxiniti, com territórios vizinhos do então distrito de Diamantino, tornam-se alvo da mão de obra escrava, tanto para as minas de diamante e ouro, quanto para a navegação via Rio Tapajós. A cidade de Diamantino tornou-se um entreposto comercial na rota entre Cuiabá e o Pará, pois está localizada numa região privilegiada, próxima ao ponto navegável via Rio Arinos, com a extração de ouro e diamante (COSTA, 1985).

De acordo com os relatos do etnólogo alemão Karl Von den Steinen (1940), citados por Romana Costa (1985), que percorreu a região no final de 1874, “milhares de índios foram arrebatados pela voragem da morte, e somente aqueles que souberam fugir a civilização e conversão”, conseguiram sobreviver.

Os tempos faustos do ouro e diamante findaram-se e a partir de 1884 o comércio da extração da borracha inicia uma nova etapa financeira regional, conhecido na economia como as “frentes extrativistas”, da borracha (ou látex) e da poaia. Esta última considerada como “drogas do sertão” pelo valor medicinal. Ambas destinadas ao mercado internacional e basicamente extraídas ao custo da mão de obra escrava indígena, principalmente a paresi. Na medida em que os seringueiros iam se aproximando, aumentava-se a violência contra os indígenas: abuso às mulheres; expulsão e incêndios às aldeias indígenas; morte aos velhos e aos homens que se negavam a servir de escravos.

A partir da segunda metade do século XIX, o Brasil entra no circuito do capitalismo mundial como um dos principais fornecedores de matéria prima, particularmente o látex e a poaia. Tais empreendimentos foram facilitados pelo desfecho da Guerra do Paraguai (1865- 1870) com a intensificação dos mercados e a redução do custo e do tempo de transporte, graças a abertura dos rios da Bacia do Prata, que diminuía, consideravelmente, o tempo das viagens até a capital do império, a cidade do Rio de Janeiro (COSTA FILHO, 1996).

Mais uma vez, as frentes expansionistas atingiriam os Paresi-kaxiniti, e desta vez, também o território histórico dos Waimaré, que se encontrava nos caminhos de grandes processos econômicos, principalmente, porque esses grupos preferiram as áreas próximas às cabeceiras dos rios da região, onde se encontravam as matas de árvores da seringa (hevea

brasilieinsis) – região ocupada pelos kaxiniti, assim como a poaia (cephalis ipecacuanha),

abundante da região do Vale do Sepotuba – habitada pelos Waimaré.

De acordo com os relatos de Rondon, os Paresi já faziam uso do leite extraído das seringueiras para confecção dos objetos como pulseiras e outros utensílios, portanto, dominavam as técnicas de coleta e tratamento do látex, aliados à existência de abundância dessas árvores em seu território, “a hevea brasiliensis vicejava nas matas que circundavam as cabeceiras e acompanhavam os rios adentrando pelo território paresi” (COSTA, 1985).

Com base nas informações encontradas nos Relatórios da Comissão Rondon, no que diz respeito aos territórios explorados e a participação dos grupos Paresi, os territórios históricos por eles ocupados foram palmilhadas no sentido leste-noroeste (Diamantino/Juruena) e sul-norte (Cáceres-Tapajós). Costa (1985) destaca que naquele período a “perpetuação dos grupos foi profundamente afetada pela atuação dos seringueiros que se apossavam das mulheres indígenas”. Em 1907, prossegue a autora, Rondon observava nos relatórios, que “os mais puros representantes Parecis são os Kozarinis do Juruena, Cabaçal e Guaporé, porque se acham ainda livres do cruzamento que já tem atingido os Uaimarés e Kaxinitis, vizinhos dos seringueiros” (COSTA, 1985).

Com o advento da República, em 1889, novos projetos políticos e econômicos foram pensados para a ocupação regional, defesa das fronteiras e, principalmente, à incorporação de territórios históricos dos grupos indígenas. Seguindo o mesmo ritmo das tomadas de decisões, que resultaram na proclamação da república, Ramos (1999), explica que “(...) os projetos indigenistas da República foram elaborados totalmente à revelia dos próprios índios. Sua tutela pelos poderes constituídos, tema permanente na história do país, receberia mais variações ao longo da vida republicana”(RAMOS, 1999).

A jovem República, nascida sob os ditames militares, estava determinada em instituir um estado nacional laico, com pressupostos e influências intelectuais e econômicas do Positivismo. Em sua estrutura, trazia como uma das principais preocupações ampliar a autoridade militar aos “confins”, ainda inexplorados, e, consequentemente, em estado de total atraso (referência direta aos locais ocupados pelos grupos indígenas), do imenso território nacional (RAMOS, 1999).