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Capítulo 3 Levantamento do Quarteirão do Martinho da

3.3 A Construção da Nova Lisboa

3.3.1 Os Planos da Baixa Pombalina

A baixa da cidade foi a zona mais sacrificada pelo terramoto e sobre ela justificava-se um aprofundado estudo. Entre as praças do Terreiro do Paço e do Rossio, numa área com 212000 m2, nasceu a “Nova Lisboa Iluminista”.

O Engenheiro Manuel da Maia apresentou a Pombal, em 19 de Abril de 1756, seis projectos, em duas séries, para a reconstrução da baixa. Esses projectos foram elaborados por três equipas (dois por cada), chefiadas pelos capitães Poppe, o Arquitecto Eugénio dos Santos e o ajudante Gualter da Fonseca. Todos os projectos tinham em comum a preservação dos edifícios, com especial interesse de caracter histórico, cultural, religioso e político e das importantes praças do Rossio e do Terreiro do Paço.

O primeiro projecto, elaborado pela equipa de Gualter da Fonseca (ver Figura 3.10a), limitava-se a reconstruir e a melhorar em pequenos aspectos a cidade destruída, impondo maior rigidez ao traçado mourisco existente, mas com pouca viabilidade para o futuro. Nele permaneciam as grandes ruas como a dos Ourives do Ouro, a Rua dos Douradores, a Rua dos Escudeiros, etc. O Terreiro do Paço permanecia intacto. A lembrança do passado permanecia relativamente intacta.

(a) (b)

Figura 3.10 – Projectos para a reconstrução: (a) Projecto N.º 1 de Gualter da Fonseca; e (b) Projecto N.º 2 dos capitães Poppe

O segundo projecto, apresentado pelos capitães Poppe (ver Figura 3.10b), seguia uma estratégia que não obedecia aos traçados das ruas existentes, optando por rasgar três

grandes ruas partindo do Rossio em direcção ao rio, em que duas ruas seriam perfeitamente rectas e a terceira seria uma pouco oblíqua. Várias ruas cruzariam com as primeiras, formando um ângulo recto. Contudo, o Terreiro do Paço e o Rossio continuavam com as suas formas originais. As restantes áreas seriam reconstruídas segundo a sua forma inicial e enquadradas com os novos arruamentos. Com este projecto, romper-se-ia com a lembrança do passado entre as duas Praças.

A mesma doutrina de criar uma malha regular de arruamentos estava patente no terceiro projecto, da equipa de Eugénio dos Santos (ver Figura 3.11a). Novamente três grandes arruamentos seriam alinhados desde o Rossio ao Terreiro do Paço. A meia distância entre as praças surgiria uma terceira, quadrada. A disposição dos novos arruamentos tentava solucionar, de uma forma racional, a ligação entre o Rossio e o Terreiro do Paço. Este último sofreria pequenos arranjos, abrindo-se ainda mais para o cais.

(a) (b) (c)

Figura 3.11 – Outros Projectos para a nova cidade: (a) projecto N.º3 de Eugénio dos Santos; (b) projecto N.º 4 de Gualter da Fonseca; e (c) projecto N.º 6 de Poppe

É notória, à excepção do primeiro projecto, a tendência dos projectistas para impor que a “Nova Lisboa” nascesse assente numa malha regular e orientada segundo Norte-Sul. Este aspecto viria a confirmar-se, e de uma forma mais acentuada, na segunda série de projectos apresentados.

No quarto projecto (ver Figura 3.11b), Gualter da Fonseca propunha criar onze arruamentos verticais perfeitamente orientados segundo o eixo Norte-Sul, que se iniciariam do lado do rio, terminando em cinco arruamentos do lado do Rossio. Os restantes arruamentos verticais terminavam na colina, limitando a Baixa. Todos os arruamentos verticais seriam atravessados por outros perpendiculares. Os três arruamentos completos no sentido Norte-Sul seriam divididos, a meio, por uma praça, a de S. Nicolau. O Terreiro do Paço sofreria, também, uma transformação, virando-se amplamente para o Rio Tejo.

No sexto projecto, guardando o quinto para o fim (Figura 3.11c), Poppe mostra-se mais imaginativo. Criando novamente um traçado rectilíneo e com a mesma orientação para as ruas, Poppe prolongava a malha destas para Nascente e Poente de uma forma dinâmica, de modo a enquadrar-se com as áreas circundantes. Persiste a praça simétrica, a meio dos arruamentos centrais, e o Terreiro do Paço assume um contacto completamente distante das anteriores, afastando-se do Tejo por dois enormes edifícios.

Porém, o projecto que mais se ajustou às ideias iluministas de Pombal foi o de Eugénio dos Santos (o quinto a ser apresentado).

Eugénio dos Santos apresentou um projecto com uma malha complexa, composta por oito ruas verticais e nove horizontais (ver Figura 3.12). As ruas que fazem ligação directa entre as duas importantes praças são denominadas por ruas nobres. A forma variada das ruas e dos quarteirões quebravam a monotonia e o ritmo metódico do urbanismo repetitivo. O Terreiro do Paço ficaria voltado para o rio, como se fosse uma enorme fachada e ao mesmo tempo a sala de entrada da cidade e do reino.

É de salientar que o conceito de edifício ou prédio tem agora uma interpretação de bloco, ou quarteirão, formando uma unidade programada. O conjunto dessas unidades programadas, conjuntamente com os arruamentos, formam a malha reticulada, bem estruturada, transmitindo a noção de urbanismo racional e iluminista.

Este brilhante projecto, concluído em 12 de Junho de 1758, trata o problema da urbanização da “Nova Lisboa” de uma forma harmoniosa, desligando-se completamente da memória do passado, respeitando as orientações de Manuel da Maia e tornando-se no orgulho do Primeiro Ministro. Com este projecto, Lisboa mostraria ao mundo que nada a deteria, nem mesmo uma catástrofe, de continuar a ser uma grande metrópole.

Figura 3.12 – Projecto N.º 5 de Eugénio dos Santos: solução adoptada para a reconstrução O projecto apresentado era provido de instruções sobre que madeiras deveriam ser empregues, bem como as regras gerais da reconstrução.

A largura das vias principais era fixada nos sessenta palmos (cerca de 12 m), dos quais vinte (cerca de 4 m) eram destinados a passeios que, pela primeira vez, eram providos de cogumelos ou frades para proteger os bordos das rodas das carroças. A largura das restantes vias era estabelecida em quarenta palmos (cerca de 8 m), sendo vinte (cerca de 4 m) reservados aos passeios.

A altura dos edifícios, de planta simétrica, também era fixada em dois andares com 16 palmos de pé direito (cerca de 3.25 m), com base nas observações empíricas de Manuel da Maia, que verificou que as construções com menor altura tinham resistido melhor ao terramoto. Foi também estabelecido que os edifícios, nas ruas principais, teriam varandas no primeiro andar e janelas de peito no segundo. Estas últimas propostas não tiveram aprovação do ministro do reino que pretendia edifícios de maior altura.

Eugénio dos Santos foi então encarregue de estudar um projecto variante para as fachadas e tipologia dos edifícios. No seu estudo delineou a construção de edifícios de quatro andares, com loja no R/C, primeiro andar guarnecido com varandas, os dois andares

seguintes com janelas de peito e o último andar em águas furtadas, que mais tarde seria substituído por um andar corrido sobre a cornija. Eugénio dos Santos apresentou também três tipos de fachada (ver Figura 3.13): a do tipo A destinada às ruas principais; e outras do tipo B e C, que viriam a marcar o estilo de Edifício Pombalino.

(a) (b)

(c)

Figura 3.13 – Diversos tipos de fachadas: (a) fachada do tipo A; (b) fachada do tipo B; e (c) fachada do tipo C