CAPÍTULO 4 – TÍTULOS EM EVIDÊNCIA: O ESTILO ACADÊMICO
4.2 OS TÍTULOS: APRESENTAÇÃO DO CORPUS
No plano global, as construções que constituem os títulos apresentam notáveis regularidades, isto é, os aspectos estilísticos convergem para agrupamentos regulares de recursos linguísticos amplamente utilizados em todos os enunciados dos títulos, como se poderá observar no decorrer das análises empreendidas nesse capítulo. As análises foram organizadas a partir de quatro categorias: regularidades no uso da pontuação, regularidades no uso dos recursos linguísticos, indícios de heterogeneidade explícita e, por fim, aspectos concernentes a processos de interlocução. Esses agrupamentos dizem respeito a dois eixos principais de análise: a) eixo das regularidades; b) eixo das especificidades. O eixo das regularidades relaciona-se aos elementos estilísticos dos enunciados que compõem os títulos dos trabalhos; já o eixo das especificidades orienta-se para aspectos discursivos e para aqueles respectivos a cada enunciação em particular, considerando que cada trabalho constitui uma única enunciação, da qual analiso o ato, a situação em que se dá e os instrumentos de sua realização.
Elementos presentes em todos os títulos, constantemente se reiteram. “Costumamos tirá- las de outros enunciados”, observa Bakhtin (1997), ao se referir às palavras que utilizamos para
53 Apenas para citar alguns exemplos, cinco dos TCCs (nº 14, nº 24, nº 32, nº 35) possuem como objeto de investigação currículos diversos, escolares e de cursos de graduação vinculados à área de Letras. Os currículos são documentos pautados em contextos históricos específicos, produtos de contextos sociopolíticos bem delimitados. Ao trazer esse elemento no título do trabalho, o acadêmico vincula-o a contextos históricos bem demarcados e explicitados – Bakhtin (2002, p.82) chega a falar, ao referir-se ao plurilinguismo e às forças centrípetas e centrífugas operantes no enunciado, de “língua do dia, da época, de um grupo social, de um gênero, de uma tendência, etc”. É a esses contextos e esferas que se atrelam os objetos de investigação, os temas, os estilos etc, nos enunciados. Para citar um exemplo, um dicionário, bastante renomado entre os norte-americanos, o Dicionário Oxford, tem por tradição eleger, a cada ano, uma “palavra do ano”. Em 2015 o dicionário elegia, por exemplo, a palavra “emoji”. O Dicionário escolhe o termo vencedor com base no "potencial duradouro" e na "significância cultural". Em 2012 a palavra do ano era “selfie”, em 2018 “Tóxico” e em 2019 “emergência climática”. Disponível em:
https://www.upf.br/biblioteca/noticia/emergencia-climatica-e-eleita-a-palavra-do-ano-pelo-dicionario-oxford. Acesso em: 10 jun. 2020.
compor nossos enunciados. Também os títulos dialogam com títulos de trabalhos acadêmicos, tidos como modelos exemplares.
Assim como as notícias de jornal se assemelham, muito embora, varie o conteúdo e o assunto da notícia, e imediatamente são reconhecidas como tais pela presença de elementos indissociáveis no enunciado, como o conteúdo temático, a construção composicional e o estilo, os títulos dos TCCs (artigos, monografias e ensaios), imediatamente são reconhecidos como tais, como trabalhos acadêmicos, apresentando, também, tendências específicas conforme o gênero e/ou à (sub)área pertencentes, dentre outros fatores que se refletem na construção desses enunciados.
Títulos da área de Linguística Aplicada, Letras e Artes como um todo certamente possuem especificidades em relação às áreas de exatas, às engenharias e biológicas, por exemplo. Mesmo que supostamente se trate todos de trabalhos da esfera acadêmica, títulos das (sub)áreas Linguística Aplicada, Ensino de Línguas e Literatura também possivelmente apresentarão tendências específicas – estilísticas, composicionais, temáticas e discursivas. Trata-se de uma questão de estilo dos enunciados, que se relaciona com conteúdos e recortes temáticos das áreas específicas, inalienáveis da situação comunicativa em que se dão. Esses aspectos não se dissociam da estrutura composicional54. Tal como bem observa Marinho (2010), os gêneros são bem mais relativamente estáveis do que supomos: um mesmo gênero varia de curso para curso e, mesmo, de uma disciplina para outra.
Quanto mais próximo o acadêmico estiver do diálogo com os enunciados de seus congêneres, em termos estilísticos, sobretudo, mais bem-sucedido pode se considerar em sua empreitada na escrita acadêmica55, uma vez que não basta sistematizar o conhecimento, é preciso fazê-lo por meio de um gênero específico. Enquadrar-se às restrições desse gênero, o que muitas vezes acaba se tornando mais importante do que a própria produção e sistematização do conhecimento, já que o acadêmico precisa do reconhecimento da comunidade56, necessita dialogar com ela, mais do que isso, ser legitimado por ela. O que modela a estrutura esquemática do discurso seria, segundo Swales (1990), o propósito comunicativo. Se todas as expectativas de
54 Como já observado há de um total de 46 trabalhos, 22 da área de Ensino de Línguas, 14 da área de Literatura e 10 da área de Linguística Aplicada e suas respectivas (sub)áreas.
55 Muito embora essa preponderância esteja ligada a outros fatores, por exemplo, os concernentes a questões de poder.
56 Ivanic (1998) apresenta uma interessante definição de comunidade discursiva, a qual ela diferencia de discurso acadêmico e de comunidade disciplinar. A autora argumenta que normas e convenções linguísticas resultam das relações de poder e das práticas discursivas pertencentes a comunidades discursivas determinadas.
probabilidade mais altas forem realizadas, o exemplar será visto como um protótipo pelos membros da comunidade de discurso. Esse reconhecimento começa a partir do título.
Na tabela a seguir, apresento os títulos dos trabalhos conforme a convenção numérica estabelecida para fazer referência a cada um dos trabalhos analisados:
Quadro 32 – Títulos de Trabalhos de Conclusão de Curso.
(continua)
nº 1
OS NÓS DA MATERNIDADE EM MEIO AOS LAÇOS DE FAMÍLIA nº 2
O ENSINO DE GRAMÁTICA COMO CIÊNCIA
UMA REFLEXÃO SOBRE O MÉTODO CIENTÍFICO E O PRECONCEITO LINGUÍSTICO57
nº 3
A RELEVÂNCIA DO PIBID NA EDUCAÇÃO BÁSICA: REFLEXOS A PARTIR DA EXPERIÊNCIA NO CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS-FRANCÊS DA
UEPG nº 4
DIVERSIDADE LINGUÍSTICA NO ESTADO DO PARANÁ: UM
LEVANTAMENTO E ANÁLISE DE ESTUDOS ACADÊMICOS REALIZADOS nº 5
IMAGINÁRIO LINGUÍSTICO NO FACEBOOK: UMA ANÁLISE DA NOÇÃO DE LÍNGUA SUBJACENTE À SÉRIE DE VÍDEOS NÃO SEJA BURRO E AOS
COMENTÁRIOS DOS INTERLOCUTORES NA REDE SOCIAL nº 6
O ENSINO DA LÍNGUA FRANCESA PARA SUJEITOS SURDOS
nº 7
O POTENCIAL DOS JOGOS DE VIDEOGAME PARA A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA INGLESA COMO LÍNGUA ADICIONAL: ANÁLISE DO JOGO RED
DEAD REDEMPTION
nº 8
A REPRESENTAÇÃO FEMININA NOS TEXTOS LITERÁRIOS DO LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA: UMA ANÁLISE DO PROJETO TELÁRIS –
9º ANO nº 9
DA LITERATURA PARA O CINEMA: O DIÁLOGO ENTRE JONQUET E ALMODÓVAR58
nº 10
A JORNADA DO HERÓI NA SAGA TRONO DE VIDRO:
UMA DISCUSSÃO SOBRE O ESTRANHO E O GROTESCO NA NARRATIVA DE SARAH J. M
57 Este título vem acompanhado da seguinte nota de rodapé: “Artigo apresentado como Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, na condição de requisito parcial para a obtenção do título de Licenciada no Curso de Letras Português- Inglês. Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG. Ponta Grossa, PR. 2018.”
Quadro 32 - Títulos de Trabalhos de Conclusão de Curso.
(continuação)
nº 11
A VARIEDADE DE LÍNGUA PORTUGUESA DOS ALUNOS DO COLÉGIO ESTADUAL DO CAMPO PROFESSORA FABIANA
PIMENTEL59 NA VISÃO DE PROFESSORES DE LÍNGUA
PORTUGUESA
nº 12
A CONTRIBUIÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL MÚSICA NAS AULAS DE LÍNGUA ESPANHOLA
nº 13
DE VOLTA À JORNADA: O MONOMITO NA FRANQUIA DE VOLTA PARA O
FUTURO
nº 14
QUEERIZANDO O CURRÍCULO DE LITERATURA
nº 15
ATIVIDADES LÚDICO-PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA ESPANHOLA NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL I nº 16
HOMINIZAÇÃO EM OS HERDEIROS, DE WILLIAM GOLDING nº 17
A OUTRA FACE DA HISTÓRIA:
UMA COMPARAÇÃO ENTRE MALÉVOLA E SOL, LUA E TÁLIA
nº 18
ENTRE DITOS E NÃO-DITOS: A LEITURA DE NOTÍCIAS À LUZ DA ANÁLISE DO DISCURSO
nº 19
MENAS INTOLERÂNCIA E MENOS PRECONCEITO LINGUÍSTICO: UM ESTUDO DAS ATITUDES LINGUÍSTICAS DOS ALUNOS DOS CURSOS DE
LETRAS
nº 20
(Re) leituras da alteridade em aulas de Língua Portuguesa: uma análise a partir do Pacto de San José da Costa
nº 21
REPRESENTAÇÃO DO PROFESSOR NO CINEMA: ANÁLISE DA IMAGEM FICCIONAL.
nº 22
ATUAÇÃO DA LÍNGUA FRANCESA COMO PONTE ENTRE O ENSINO E A INCLUSÃO ESCOLAR
nº 23
AS METODOLOGIAS DE ENSINO: A PERSPECTIVA DE ACADÊMICOS DE UMA UNIVERSIDADE PÚBLICA
nº 24
Quadro 32 - Títulos de Trabalhos de Conclusão de Curso.
(continuação)
A INFLUÊNCIA NEOLIBERAL NOS CURRÍCULOS BRASILEIROS: LDB 9394/1996 E LEI 13.415/2017
nº 25
GÊNERO E NARRATIVA: CONSTRUÇÕES DISCURSIVAS DE GÊNERO NA OBRA A LOUCA DE SERRANO, DE DINA SALÚSTIO
nº 26
ALTERAÇÕES NO ENSINO DA LÍNGUA ESPANHOLA NO SISTEMA EDUCATIVO BRASILEIRO
EM DECORRÊNCIA DA EFETIVAÇÃO DA LEI 13.415 nº 27
QUAIS SÃO AS CRENÇAS DOS PROFESSORES EM FORMAÇÃO DO CLEC- UEPG SOBRE O QUE É SER UM BOM PROFESSOR DE LÍNGUA ESTRANGEIRA? nº 28
SER PROFESSOR: DOM OU PROFISSÃO? UMA ANÁLISE DAS CRENÇAS DOS/AS ACADÊMICOS/AS DE LETRAS ESPANHOL DA UEPG
nº 29
FICANDO PERTO DE DAVID FOSTER WALLACE: REFLEXÕES SOBRE A EXISTÊNCIA HUMANA
nº 30
O DISCURSO DO ACADÊMICO SOBRE A DEFINIÇÃO DE TEXTO E SUA IMPORTÂNCIA NA FORMAÇÃO DO FUTURO PROFESSOR nº 31
OS SAPATINHOS VERMELHOS DE ANDERSEN E SUAS SIMBOLOGIAS nº 32
CURRÍCULO, DIVERSIDADES DE GÊNERO E SEXO: A HISTÓRIA DOS CURRÍCULOS DE LETRAS DA UEPG (1952-2015)
nº 33
A NOTÍCIA: DO JORNALISMO IMPRESSO PARA O JORNALISMO ON-LINE nº 34
VIOLÊNCIA E INFÂNCIA EM “GAVIÃO VEIO DO SUL E PUM!”, DE BOAVENTURA CARDOSO
nº 35
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA A PARTIR DO CURRÍCULO DO CURSO DE LETRAS
nº 36
A DIVERSIDADE PELO OLHAR DO PROFESSOR HOMOSSEXUAL EM ATUAÇÃO¹ 60
nº 37
DIÁLOGO ENTRE A LITERATURA E O CINEMA A PARTIR DA OBRA LARANJA MECÂNICA
nº 38
Quadro 32 - Títulos de Trabalhos de Conclusão de Curso.
(conclusão)
Onde está a polidez? Análise dos livros didáticos de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental (6º e 7º anos) da rede pública do Estado do Paraná nº 39
REFLEXÕES ACERCA DO PRECONCEITO A PARTIR DE “AS MÃOS DOS PRETOS”, DE LUÍS BERNARDO HONWANA
nº 40
ENTREMEIO DE VOZES: INVESTIGANDO AS MARCAS DO SUJEITO AUTOR EM NOTÍCIAS SOBRE A INTERVENÇÃO FEDERAL NA SEGURANÇA DO RIO
DE JANEIRO. nº 41
BILINGUISMO E EDUCAÇÃO BILÍNGUE: CONCEPÇÕES E IMPLEMENTAÇÃO DE UMA ESCOLA BILÍNGUE EM PONTA GROSSA
nº 42
ASPECTOS DA MODERNIZAÇÃO DO ROMANCE HISTÓRICO EM O LEOPARDO, DE LAMPEDUSA.
nº 43
GUERRA ÀS DROGAS – ENTRE O MORRO E O ASFALTO:
ANÁLISE DOS SENTIDOS PRODUZIDOS PELOS SUJEITOS FAVELADOS E OS SUJEITOS FARDADOS
nº 44
FICÇÃO, HISTÓRIA E PROTAGONISMO FEMININO NA OBRA “AS ESPIÃS DO
DIA D”
nº 45
Identidade Negra e suas relações semióticas de pertencimento a partir de encartes publicitários
nº 46
HUMANIZAÇÃO E A LINGUAGEM Fonte: Elaborado pelo autor.