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Como primeiro marco, temos o texto constitucional promulgado em 1988, o qual incide no direito à informação pública, na proteção dos documentos e no acesso:

48 Art. 5 - Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.

[...]

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; [...].

[...]

Art. 37, cap. XXII, § 3°, II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observadas o disposto no art. 5º, X e XXXIII; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”.

Por certo, estes artigos da Constituição de 1988 evidenciam a garantia de um direito universal, com finalidade de promover o controle social no sentido da participação popular e da transparência nas ações governamentais de um Estado mais responsivo. Assim, percebe-se a intenção de um acesso equitativo à informação pública, capaz de possibilitar a inclusão social e política da sociedade civil, reduzindo desigualdades quando afirma que “todos tem o direito”.

O artigo 216, §2º, a CF prevê a gestão de documentos públicos como forma de garantir o acesso às informações:

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

[...]

§ 2º - Cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem.

Esta previsibilidade da gestão documental torna-se então uma condição sine qua non para garantia do direito à informação, conforme assegurado no art. 5°. A informação organizada possibilita o franqueamento da consulta, ou seja, a disponibilização da prova documental.

Debatidos os principais aspectos do primeiro marco da política de acesso à informação, consideramos como segundo marco, a Lei 8.159, de 8 de janeiro de 1991, conhecida como Política Nacional de Arquivos Públicos e Privados, a qual reforça a necessidade de proteção aos documentos e a difusão das informações governamentais:

Art. 1° - É dever do Poder Público a gestão documental e a proteção especial a documentos de arquivos, como instrumento de apoio à administração, à

49 cultura, ao desenvolvimento científico e como elementos de prova e informação.

Art. 2° - Consideram-se arquivos, para os fins desta Lei, os conjuntos de documentos produzidos e recebidos por órgãos públicos, instituições de caráter público e entidades privadas, em decorrência do exercício de atividades específicas, bem como por pessoa física, qualquer que seja o suporte da informação ou a natureza dos documentos.

[...]

Art. 4º - Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular ou de interesse coletivo ou geral, contidas em documentos de arquivos, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, bem como à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas.

Art. 5º - A Administração Pública franqueará a consulta aos documentos públicos na forma desta Lei.

A Política Nacional de Arquivos Públicos e Privados vem reafirmar o direito universal de acesso à informação, permeando a obrigatoriedade da gestão documental para toda a administração pública.

Como vimos, as correntes contra hegemônicas dos governos de Lula e Dilma culminaram na promulgação da Lei de Acesso à Informação (LAI), a qual podemos considerar como terceiro marco de uma política que enfrentou grandes desafios para ser efetivada. Podemos dizer que até a aprovação da LAI, muito já se tinha feito no tocante ao acesso à informação, mas o texto a seguir, enseja uma nova era ao Brasil, onde ainda se tem muito a se fazer para que o propósito de informar a sociedade seja efetivado plenamente:

Art. 5° - É dever do Estado garantir o direito de acesso à informação, que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão.

[...]

Art. 8o - É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.

O fechamento do ciclo, que institucionaliza o direito de acesso à informação, também indica a obrigatoriedade do dever do Estado em franquear as informações que sejam custodiadas por qualquer órgão.

Imaginamos que diante destes instrumentos impostos pelo próprio governo, será que se cumprem facilmente estas regras? Estabelecer a preservação dos documentos produzidos, em todas as esferas administrativas, franquear ao acesso dos mesmos para a sociedade civil, dar transparência às ações de um governo para que sejam evidenciadas através de seus documentos públicos. Será que tudo isso realmente funciona?

50 Como o Estado Brasileiro vem desenvolvendo mecanismos de ampliação, no sentido de incorporar a sociedade civil? Estas são questões que nos interpelam neste exercício do pensar crítico e que norteiam nossas reflexões aqui apresentadas.

2.5.1 Dialogando com as teorias contemporâneas de abertura do Estado

Ao longo dos últimos vinte e cinco anos dos governos supracitados, observou-se uma grande alternância em relação às posturas e formas de governo, inicialmente lideradas pelas forças de direita com ideias neoliberais, seguidas por treze anos de governos petistas com a inserção da “pequena política”.

Fazendo uma análise do Brasil nos dias atuais, com o agravamento de uma crise de ordem política e econômica, o país vive dias de retrocesso. O modelo de governo construído na estrutura da civilização do capital deixa a sociedade civil fragilizada, à mercê de um futuro incerto e temerário, por decorrência da inobservância dos valores éticos e morais.

Assim, com advento da posse de Michel Temer à Presidência da República, uma política neoliberalista volta a ser instaurada. Em pouco tempo de governo, já foram notórias as ameaças à sociedade civil, tais como: a proposta de reforma da previdência social, da redução dos investimentos públicos em saúde, educação e políticas assistenciais. Para o novo governo tudo converge em formas de garantir que os índices econômicos sejam reabilitados para benefício das elites rentistas, forjando-se um reajuste fiscal a qualquer custo.

Enquanto isso, a Política Pública de Acesso à Informação é atropelada pela Operação Lava Jato e outras denúncias de escândalos e desvios de verbas públicas, constatados nas diversas investigações dos poderes constituídos, em particular do Judiciário, como o caso do envolvimento da Petrobras6. Desta forma, um dos pilares basilares da LAI está sendo altamente infringido, ou seja, o combate à corrupção, através da descaracterização da prova material do crime, que certamente é constituído por informações de caráter governamental que, muitas vezes não se tornam públicas por serem controladas em segredo de justiça, evidenciando-se mais uma vez a cultura do segredismo e do domínio das informações pelo Estado.

Igualmente em outras partes do mundo, principalmente na América Latina, é possível

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É certo que muitas provas documentais fazem parte deste contexto histórico da Petrobras, com as Delações Premiadas gigantescos volumes de documentos são produzidos. As Comissões Parlamentares de Inquérito são as responsáveis pelo controle de toda a informação produzida que, por força da necessidade do “segredo de justiça”, são classificadas com grau de sigilo. A custódia destes documentos fica sob a responsabilidade do Arquivo Sigiloso da Câmara dos Deputados, sendo que um dia estas informações se tornarão de domínio público.

51 verificar o crescimento de políticas neoliberais, como é o caso de Honduras e do Paraguai. Segundo Carvalho (2016):

Forças conservadoras conseguiram que o Parlamento forjasse e aceitasse acusações sem respaldo jurídico, apenas como pretexto político para depor os Presidentes e a Presidenta Brasileira, configurando um Golpe de Estado com tessituras convenientes aos novos tempos da civilização do capital em crise. Na constatação de Carvalho, existe por trás do impeachment da Presidente Dilma uma trama dos segmentos da direita para um ajuste brasileiro, de acordo com um “modelo rentista- extrativista”, que privilegia os interesses do capital, através de uma “política de negócios” e concessões aos grupos de interesses dominantes, efetivados pelas alianças com as elites.

Fazendo uma analogia a esta realidade que se instaura em nosso país, podemos afirmar que a participação da sociedade privada, representada por grandes corporações, torna-se responsável pelo domínio da cadeia de valor das informações, assumindo também um controle privilegiado sobre a sociedade civil, pois detém os recursos econômicos e domina as Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs).