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OS TRAÇOS DO DARK TRIAD E A MANIPULAÇÃO DE RESULTADOS

Os traços de personalidade sombrios são importantes fatores de risco de manipulação e fraude, especialmente quando o gestor dificulta o diálogo honesto entre todos os níveis da hierarquia empresarial, devido à incapacidade de se admitir questionamentos, mesmo quando se exige um comportamento antiético/fraudulento dos empregados. Os gestores com esses traços de personalidade ficam satisfeitos com elogios e buscam a autopromoção a qualquer custo (J. Cohen, Ding, Lesage, & Stolowy, 2010).

Collins e Schmidt (1993) e Blickle, Schlegel, Fassbender, e Klein (2006) evidenciaram que os chamados crimes de colarinho branco são cometidos mais frequentemente por gestores que possuem personalidades sombrias. Os altos traços de Narcisismo, por exemplo, são mais evidentes em executivos que cometeram crimes de colarinho branco do que em executivos não criminosos (Blickle et al., 2006).

As pessoas narcisistas manipulam relatórios contábeis para melhorar a situação financeira da empresa e, em especial, a sua própria, com a intenção inerente de alcançar seu autoaprimoramento. Com essa crença, Buchholz, Lopatta, & Maas (2014) idealizaram um conjunto de 15 indicadores, com o intuito de medir a personalidade que reflete o comportamento narcisista de 1.126 CEOs de 671 empresas listadas no índice S&P 500, no período 1992-2012. Os resultados apresentaram evidências de que os CEOs altamente narcisistas estão associados com gerenciamento de resultados por accruals e gerenciamento real, cujas formas se configuram como passaportes para o mau comportamento gerencial.

Os autores salientam que os CEOs com alta personalidade narcisista não só aumentam o lucro, por meio do uso estratégico das escolhas contábeis, como também diminuem os ganhos, em especial nos dois primeiros anos de exercício na função, para obter sucesso de curto prazo. Apesar da limitação da rotatividade e sucessão dos CEOs, os resultados sugerem que eles fazem uso estratégico dos lucros excedentes, a fim de melhorar a sua reputação pessoal nos anos subsequentes do seu mandato.

Frino, Lim, Mollica, & Palumbo (2014) examinaram a relação entre Narcisismo nos CEOs e a manipulação de resultados, com o propósito de alertar reguladores e acionistas sobre o efeito desse tipo de personalidade nas decisões empresariais. Os autores selecionaram dados de empresas listadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque (New York Stock Exchange – NYSE), incluídos no Annual Compustat Dataset, referentes ao período 2007-2013. Para se estimar o gerenciamento de resultados, foram extraídas observações sobre receitas, ativos totais, lucro antes de itens extraordinários e caixa de operações. As evidências confirmam que os CEOs mais narcisistas são mais propensos a se envolver em manipulação de resultados, com a finalidade de apresentar melhores performances, indicando mais probabilidade de falsos relatórios financeiros.

Olsen e Stekelberg (2015) constataram o envolvimento de CEOs narcisistas em evasão fiscal corporativa. Como os narcisistas sentem-se acima da lei e são agressivos ao perseguir o que acreditam lhes pertencer, eles possuem motivações para perseguir recompensas ou resultados desejáveis. As empresas com maior número de CEOs narcisistas

têm benefícios fiscais incertos e menor cash ETR (Effective Tax Rate), consistentes com as empresas que adotam esse mecanismo de economia fiscal.

Ham, Lang, Seybert, e Wang (2015) investigaram o efeito do Narcisismo de CFOs (Chief Financial Officer) sobre os resultados de relatórios financeiros, com base na associação entre o Narcisismo e o tamanho da assinatura. Os CFOs com assinaturas maiores apresentam mais provas de declarações incorretas e mais evidência de que gerenciam ganhos por accruals e ganhos reais.

Empiricamente, os autores examinaram as assinaturas autenticadas dos CFOs, coletadas pelo website da SEC (U. S. Securities and Exchange Comission), utilizando o método APL (Area-Per-Letter), que mede o tamanho da assinatura em função da área calculada pelo número de letras, traçando um retângulo ao seu redor. Os resultados evidenciaram que os CFOs identificados como narcisistas são propensos a gerenciar resultados, reconhecer menos perdas oportunas e manter controles internos mais fracos.

Ao analisar o Narcisismo no comportamento decisório antiético, Amernic e Craig (2010) argumentam que, como o diretor corporativo ocupa a função mais alta da hierarquia empresarial, ele pode definir e influenciar condutas oportunistas, sobretudo pelo uso dos resultados da contabilidade financeira, que passam a ser um cartão de visita pessoal de sucesso ou fracasso.

O Lucro Por Ação (LPA), por ser o resultado mais expressivo e visível da contabilidade, devido a sua divulgação trimestral e anual, pode ser alvo de manipulação para refletir a performance do CEO. Quanto maior for o LPA, maior será a quantidade de elogios e louvores necessários para apoiar o senso inflado de autoimportância apresentado pelos indivíduos com predisposição para comportamentos narcisistas (Olsen et al., 2013).

Ao investigar o Narcisismo nos CEOs e a ocorrência de fraudes, Rijsenbilt e Commandeur (2013) constataram uma relação positiva e estatisticamente significante entre essas variáveis. Para tanto, selecionaram do banco de dados do S&P 500 CEOs, no período de 1992 a 2008, 54 CEOs com três anos de mandato, cujas empresas perpetraram fraudes gerenciais divulgadas pela SEC. Os CEOs altamente narcisistas podem alcançar a grandeza para suas empresas; entretanto, se não houver controle, isso pode resultar em um comportamento antiético e prejudicar os interesses corporativos.

Se os CEOs são narcisistas extremos e controlam as atividades de comunicação e governança, associadas com a contabilidade financeira, a possibilidade de manipulação e interpretação maliciosa da própria construção da informação contábil ocorre com propósito narcisista. Os CEOs influenciam fortemente as políticas subjacentes das medidas de

desempenho da contabilidade financeira, já que, muitas vezes, sua remuneração depende direta e, indiretamente, de tais medidas (Amernic & Craig, 2010).

A percepção de auditores acerca de características narcisistas dos gestores-clientes e a motivação de atitudes fraudulentas foram objetos de estudo de Johnson et al. (2013). Os resultados apontaram que o comportamento narcisista de gestores e a predisposição para fraude são significativos e estão positivamente relacionados com a avaliação de riscos de fraude.

Ao se analisar a Psicopatia no contexto antiético, observa-se que sem o efeito inibidor da consciência os psicopatas corporativos são capazes de mentir, persuadir e manipular em busca de alcançar seus objetivos principais de poder, riqueza e status. Podem ser responsáveis por grande parte do mau comportamento organizacional, incluindo fraude contábil, manipulação de estoque, desemprego e danos ambientais por ausência de responsabilidade social (Boddy, 2006).

Os psicopatas são capazes de falsificar os resultados financeiros para obter promoção (McCormick & Burch, 2005), bônus, além de outros benefícios, e, até mesmo, de cometer fraude absoluta (Clarke, 2005) contra a empresa que os emprega. Além disso, o caos organizacional fornece o estímulo necessário e o terreno fértil para o psicopata corporativo satisfazer seu comportamento de busca por emoção, a criação de oportunidades para manipulação e o abuso de poder (Deutschman, 2005). Todavia, se esses executivos cumprem os objetivos corporativos do negócio, a atenção a essas tendências negativas pode ser negligenciada (Pech & Slade, 2007).

Não raro, fatores como ausência de regras institucionalizadas ou limites formais nas prerrogativas dos líderes, estabelecimento de metas abstratas, ausência de controle rigoroso nos sistemas de circulação de informações e recompensa sobre o aumento do valor dos lucros e dos preços das ações possibilitam, em algum grau, o comportamento desviante do psicopata corporativo, dando-lhe a liberdade necessária para o comportamento de liderança destrutivo e manipulador (Ouimet, 2010).

Os indivíduos com alto nível de psicopatia se envolvem em mau comportamento financeiro, mesmo na presença de clara e provável punição, especialmente pela natureza egoística desses indivíduos e pela necessidade de reputação e projeção no mundo financeiro. A má gestão do dinheiro de terceiros pode vir a custar aos proprietários dos fundos muito mais do que ao seu administrador. Com essa concepção, D. N. Jones (2014) desenvolveu um experimento no qual foi dada a cada participante a possibilidade de jogar com o bônus de outro participante, mesmo alertados de que poderiam ser punidos e perder tudo. Os altos

psicopatas demonstraram mais persistência em jogar, levando a uma maior perda financeira para o próximo participante, sem se importar com a provável punição.

Ao analisar a relação entre o Maquiavelismo e o comportamento antiético, Murphy (2012) investigou a racionalização como sendo uma das três características que compõem o triângulo das fraudes (oportunidade, pressão e racionalização), e comprovou que essa relação pressupõe a existência de declarações falsas nos relatórios financeiros. Byington e Johnson (2011) comprovaram a tendência de indivíduos maquiavelistas para a manipulação de rubricas orçamentárias.

A relação entre os traços maquiavélicos e a decisão pelo gerenciamento de resultados foi constatada por Shafer e Wang (2011). Nessa mesma perspectiva, Vladu (2013) evidenciou que a predisposição maquiavelística desempenha uma função central na decisão pelo gerenciamento de resultados financeiros, já que os indivíduos com alto escore na escala maquiavelística têm visualizações menos rígidas sobre a ética dessas práticas em curto prazo, considerando eticamente aceitável esse tipo de gerenciamento.

Os vendedores com orientação maquiavelística tendem a obter melhor desempenho e sucesso especialmente quando estão sob pressão para alcançar as metas impostas pela empresa para garantia de manutenção do emprego. Entretanto, Aziz, May, e Crotts (2002) sinalizam que a presença de tais pressões sugere mais probabilidade de manipular os resultados, sempre que necessário.

De acordo com os estudos até aqui apresentados, os indivíduos com os traços do Dark Triad possuem mais predisposição para manipular resultados, especialmente devido à frieza emocional e à necessidade de autopromoção no meio organizacional.

3 METODOLOGIA