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concepção do homem muda. Foucault nos faz ver tudo diferente, sob uma outra perspectiva. A análise do poder manteve-se como pano de fundo. Foucault passou décadas tentando nos mostrar como os mecanismos de poder funcionam e como eles nos dominam a partir de pequenos detalhes da nossa maneira usual de ser. Foucault desempenhou com muito esforço o trabalho de recortar a história e mostrar novas e surpreendentes facetas. Temas como sexualidade, verdade, loucura e humanismo adquiriram uma roupagem absolutamente nova e original com seu trabalho.

3.3. PÓS-MODERNISMO, PÓS-ESTRUTURALISMO E O PENSAMENTO DE MICHEL FOUCAULT

Quando falamos em "história pós-moderna", falamos de um saber histórico organizado, mas não fechado, que rompe com a proposta linear de história; um saber que passa a trabalhar com conceitos de descontinuidade, ruptura, subjetividade. É fazer uso do saber histórico não no sentido de compor grandes unidades nas quais os indivíduos possam se reconhecer, mas no sentido de encontrar a heterogeneidade, a luta entre as forças que surgem de todos os lados e que constituem novos acontecimentos. É questionar a tradição, a origem e o devir.

Neste sentido, Foucault faz um alerta inicial sobre a questão da análise histórica estrutural, ―que parece apagar, em benefício das estruturas fixas, a irrupção dos acontecimentos‖, e sugere que, em vez de empreender análises totalizantes, prestemos ―uma atenção cada vez maior aos jogos da diferença‖. Propõe o desenho de uma história nova, ou melhor, uma leitura histórica nova das idéias e do saber, enfatizando, assim, o contraponto entre a história pura e simples e ―a história do pensamento, dos conhecimentos, da filosofia, da literatura, [que parecem] multiplicar as rupturas e buscar todas as perturbações da continuidade‖ (FOUCAULT, 1987, p.6-7).

Michel Foucault se apropria dos conceitos nietzscheanos para falar em "história efetiva", uma história que trabalha a descontinuidade, visão não totalizante, compreendendo

que a força que se encontra em jogo na história não obedece a uma destinação, nem a uma mecânica, mas ao acaso da luta. É uma nova forma de olhar e estudar o objeto a ser historiografado, um olhar que procura a profundidade e não mais a continuidade nas "leis do devir" (MUNIZ, 2000).

A descontinuidade é um dos eixos fundamentais na análise histórica de Michel Foucault. Essa é a estratégia utilizada no seu trabalho para desmontar os essencialismos com que enxergamos as questões de nosso tempo, para ironizar a pretensa natureza sublime da idéia de origem e para desestabilizar os lugares de verdade (e os poderes neles investidos) que ocupam os saberes, camuflados pelo discurso do conhecimento (OLIVEIRA, 2008). Foucault acusava a história de apegar-se à idéia de continuidade, subsidiada que era pela crença em uma origem essencial que subsiste ao tempo e que comanda os destinos da humanidade. Fazia eco a uma nova tradição de pensamento que combatia a noção de progresso, exaltada tanto pelos discursos filosóficos e científicos quanto pelo discurso capitalista, pelo efeito de verdade dado à ilusão de que o estado atual é a referência de evolução para a sociedade.

Com essa nova forma de olhar para a história/acontecimentos, Foucault não busca as fundações; ocupa-se em descobrir como as tramas históricas constituem os sujeitos singulares, sem interpretá-los como encarnações de um sujeito transcendental; edifica uma filosofia que sai das práticas concretas e não de uma suposta razão autofundada. Ele se recusa a fornecer verdades objetivas ou mesmo a nos mostrar qualquer coisa como uma representação, mesmo que seja de forma aproximada do mundo.

A história efetiva se distingue daquela dos historiadores pelo fato de que ela não se apóia em nenhuma constância, nada do homem, nem mesmo seu corpo. A história será efetiva na medida em que ela reintroduzir o descontínuo em nosso próprio ser; ela tem o poder de inverter a relação entre o próximo e o longínquo – lança o seu olhar para o próximo, mas não teme olhar em baixo, olha do alto, mergulha para apreender as perspectivas, desdobra as dispersões e as diferenças, ou seja, olha para o mais próximo, mas para dele se separar bruscamente e se apoderar à distância; não teme ser um saber perspectivo – olha de um determinado ângulo, com o propósito deliberado de apreciar, de dizer sim ou não, é um olhar que sabe tanto de onde olha quanto o que olha (FOUCAULT, 2000).

Veiga-Neto (1996) argumenta que, para o pensamento pós-moderno, o que passa a interessar é o sentido que damos ao mundo. Assim, não há uma perspectiva privilegiada a partir da qual possamos olhar e entender o mundo. O ser pós-moderno não tem a ―aspiração‖ de encontrar uma verdade oculta do outro. O que se encontra é uma série de superfícies que se desvanecem em tênues e agitados reflexos. A verdade, pensada dessa maneira, torna-se

inseparável do processo que a estabelece; a questão é saber quem pode dizer o que está sendo dito, que posição deve ocupar o sujeito que enuncia, de que lugar ele fala, a que campos de saberes pertence, com que outros enunciados ele se relaciona, ou seja, como se exerce o poder de produzir e definir verdades em detrimento de outras por meio das quais buscamos ordenar nossos mundos.

Nessa perspectiva ganham centralidade os pressupostos de que a linguagem e o discurso são constitutivos do social, da cultura e do sujeito. A perspectiva pós-estruturalista redimensiona a noção de cultura, tratando-a como campo de conflito e de luta, ao deslocar a ênfase de uma avaliação epistemológica (falso/verdadeiro) baseada na posição estrutural do ator social, para os efeitos de verdade inerentes às práticas discursivas (VARGAS, 2002).

Portanto, o pós-estruturalismo pode ser caracterizado como um modelo de pensamento, um estilo de filosofar e uma forma de escrita. Entretanto, o pós-estruturalismo não pode ser reduzido a um conjunto de pressupostos compartilhados, a um método, a uma teoria ou até mesmo a uma escola, mas deve ser pensado/concebido como um movimento de pensamento, ou melhor, uma complexa rede de pensamento interdisciplinar que corporifica diferentes formas de prática crítica (LYOTARD, 2002).

3.4. O REFERENCIAL FOUCAULTIANO E SUA APLICAÇÃO NA ENFERMAGEM