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fundamentais para garantir o ciclo reprodutivo do sistema, o que vem se intensificando desde o inicio dos anos 1970, quando o sistema global do capital teve de buscar alternativas à crise que reduzia o seu processo de crescimento.

Assim, a crise denominada (equivocadamente) de crise do fordismo e do keynesianismo, nada mais é do que a manifestação fenomênica da crise estrutural do capital (ANTUNES, 2002).

2.2 O novo padrão de acumulação do capital e as novas determinações sobre o trabalho

Podemos assinalar, portanto, diante desse novo quadro histórico, que a crise estrutural do capital, manifestada desde o início dos anos 1970, desencadeou um processo de reorganização que se expandiu amplamente no sentido de reconfigurar, econômica, política, cultural e

socialmente todas as estruturas de suporte do metabolismo social do capital para garantir incondicionalmente a ampliação dos seus ciclos reprodutivos de acumulação.

São inúmeras as abordagens teóricas, de diferentes matizes, que surgiram na tentativa de entender e apreender o ritmo dessa reorganização e as mudanças engendradas por ela no escopo da expansão capitalista, bem como suas novas determinações sobre o trabalho.

David Harvey em um livro importante acerca dessas transformações político-culturais e sócio-econômicas, afirma em A Condição Pós-Moderna (1994) que as mudanças do capitalismo no final do século XX, sobretudo a partir do final dos anos 60 e início da década de 70, são oriundas de alterações radicais em processos de trabalho, hábitos de consumo, configurações geográficas e geopolíticas e poderes e práticas do Estado.

Para visualizar o conjunto dessas mudanças e as causas que levaram ao desmoronamento de um modo de controle e regulação, Harvey incorpora em sua análise a teoria da escola regulacionista francesa, segundo a qual, o longo período de expansão de pós-guerra, que se estendeu de 1945 a 1973, teve como base um “conjunto de práticas de controle do trabalho”, tecnologias, hábitos de consumo e configurações de poder político-econômico, e de que, esse conjunto pôde com razão ser chamado de “fordista-keynesiano” (HARVEY, 1994, p.119).

Por conseguinte, para analisar o processo de transformação que se desenrola desde a década de 70, nosso autor desenvolveu três teses, através das quais fundamenta sua abordagem teórica acerca desse novo quadro de mudanças. A primeira afirma que no período de 1965-1973 tornou- se cada vez mais evidente a incapacidade do fordismo e do keynesianismo de conter as contradições inerentes ao capitalismo, decorrentes da rigidez do processo de trabalho fordista.

A segunda tem a ver com a mudança tecnológica, a automação, a busca de novas linhas de produtos e nichos de mercado, a dispersão geográfica para zonas de controle do trabalho mais fácil, as fusões e medidas para acelerar o tempo de giro do capital passaram ao primeiro plano das estratégias corporativas de sobrevivência em condições gerais de deflação. Nesse sentido, as décadas de 70 e 80, segundo Harvey, ‘foram um conturbado período de reestruturação econômica e de reajustamento social e político (HARVEY, 1994, p.140; TAVARES, 1996; CHESNAIS, 1996).

A terceira tese é a fundamentação de David Harvey na medida em que contempla e consolida as inúmeras transformações através das quais surge um novo regime de acumulação,

uma nova dinâmica do capital. Trata-se, portanto, da acumulação flexível que é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Conforme Harvey,

Ela se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões de desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego do chamado “setor de serviços” bem como novos conjuntos industriais (HARVEY, 1994, p.140).

A acumulação flexível concede e inaugura dessa maneira um novo padrão de produção e uma nova forma de controle sobre o trabalho em virtude de seu enfraquecimento diante da situação de desemprego estrutural.

Visando dar conta dessas novas determinações do capital, Maria da Conceição Tavares, num outro patamar de reflexão acerca da reestruturação do capital, entende a crise advinda dos anos de 1970 como uma crise do padrão monetário internacional e que o processo de ajuste macroeconômico e reestruturação industrial que se seguiram decorreram, na verdade, dos sucessivos choques monetário-cambiais e de preços do petróleo dos últimos anos (TAVARES, 1996).

Para superar essa crise, ocorreu um ajustamento global da economia, desencadeado pelas políticas de ajuste de balanço de pagamento dos EUA, que levou vários países, especialmente Japão e Alemanha a formularem respostas bem sucedidas de reestruturação industrial. Essas respostas, segundo nossa autora, foram bem sucedidas porque, diante de toda a situação de competição internacional, que obrigou a grande empresa a transformações industriais e tecnológicas, houve a compatibilização entre condições microeconômicas, organizações industriais e políticas do Estado (TAVARES, 1996).

Como exemplo bem sucedido de ajuste e reestruturação industrial, Tavares (1996) destaca o Japão que se dedicou, acima de tudo, à implementação de uma estratégia de transformação tecnológica centrada na eletroeletrônica de ponta e na difusão acelerada das novas técnicas de informação e controle no interior de todo o aparelho produtivo. Em outras palavras, o Japão inaugurou as primeiras respostas e estratégias para o que Harvey chamou de “acumulação flexível”, pois a conquista do mercado internacional levou aquele país a derrotar o taylorismo,

produzindo formas flexíveis de organização interna, favoráveis à incorporação de novas técnicas micro-eletrônicas, sem dispensa de mão-de-obra (TAVARES, 1996). Em outras palavras, trata-se do advento de novos processos e formas de organização do trabalho, que nascem acompanhados pela incorporação de novos métodos produtivos, só que agora sob novas bases tecnológicas.

Cabe destacar, ainda que de forma preliminar, que a reorganização do capital é um processo que envolve não só aspectos concernentes às garantias de aumento da produtividade do capital, levando assim a novos patamares de acumulação, mas também concerne a uma nova configuração do capitalismo mundial, cuja expressão mais acabada é a globalização, entendida como um novo ciclo de expansão e reprodução do capital global (IANNI, 1997).

Nesse sentido, podemos enfatizar a nova divisão internacional do trabalho como uma etapa significativa desse novo ciclo de expansão do capital. Afinal, a sua mundialização representa uma nova configuração do capitalismo no mundo (CHESNAIS, 1996; IANNI, 1997; HOBSBAWM, 2000; POCHMANN, 2001), na medida em que as empresas, corporações e conglomerados industriais são obrigados a se ajustarem diante das novas exigências do sistema (DEDECCA, 1996; QUADROS, 1996). Isso significa que há uma tendência inelutável à qual todas as empresas devem se adaptar no sentido de buscar: 1) novas formas de organização do processo de trabalho, com a incorporação de novas tecnologias aplicadas à produção; 2) ampliação dos mercados (nacional, regional e mundial), bem como novas condições sociais e técnicas para o desenvolvimento das atividades econômicas.

Diante dessa nova situação engendrada pelo sistema do capital, a classe trabalhadora se vê agora sob o regime do “tacão de ferro” (CHESNAIS, 1996), pois com a exigência do capital, agora sob a forma financeira, tem-se a necessidade de que todas as estruturas devam se adaptar ao fenômeno da globalização que aparece como irreversível e inelutável. O ressurgimento de formas agressivas e brutais de extração de mais-valia absoluta e relativa são utilizadas no escopo dessas novas estratégias de acumulação do capital sem nenhuma preocupação com as conseqüências sobre o nível de emprego (Idem, 1996). Isso acarreta, no interior das condições propicias aos novos surtos de expansão mundial do capitalismo, novas contradições sociais.

Estas são potencializadas na medida em que surge um novo compromisso com o capitalismo. Afinal, da mesma forma que surgiu no período do fordismo, determinadas condições que garantiam a reprodução do capital, com a constituição – conforme Gramsci – de um novo

CHIAPELLO, 2002) advindo da reorganização do capital, surgem novas ideologias e compromissos capazes de recompor tanto no plano objetivo quanto subjetivo, as condições imanentes da reprodução do capital.

Portanto, para entender a expressão dessas novas ideologias faz-se necessário analisar de que forma suas determinações materiais se erigiram no contexto da reestruturação capitalista. Por isso, cumpre-se analisar quais as respostas engendradas pelo sistema do capital a sua crise econômica fundamental.

2.3 Reestruturação produtiva e neoliberalismo: as novas determinações do