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3.4.1. Análise palinológica

O termo palinologia foi criado por Hyde e Williams (1944), usando como raiz a palavra grega “paluno” (pó fino, farinha fina), para designar o estudo morfológico de grãos de pólen e esporos (SALGADO-LABOURIAU, 2007). No entanto, atualmente a palinologia estuda não somente os grãos de pólen e esporos produzidos pelas plantas, mas como também qualquer microfóssil orgânico (e.g. fungos, algas) recuperado nas lâminas palinológicas a partir de sedimentos e/ou rochas sedimentares (TRAVERSE, 2007). Esses microfósseis referem-se a resíduos orgânicos, constituídos de esporopolenina, quitina ou pseudoquitina, e que podem manter-se íntegras por milhares de anos, resistentes à pressão, temperatura, umidade, e até a ação microbiana, contudo são vulneráveis como toda substância orgânica à oxidação (SALGADO-LABOURIAU, 1994; BARTH-SCHATZMAYR; BARROS, 2011).

Desde o início do Pleistoceno a flora é muito semelhante em termos taxonômicos à flora atual. Por isso, o estudo dos grãos de pólen e dos esporos depositados em sedimentos quaternários possibilita seus posicionamentos detalhados, e suas correlações com os táxons atuais. Uma grande quantidade de grãos de pólen e esporos produzidos pelas plantas é liberada e flutua no ar durante algum tempo, e quando depositados em ambientes sedimentares favoráveis a sua preservação, tendem a refletir as mudanças no clima e vegetação pretéritos em uma determinada região (SALGADO-LABOURIAU, 1994; BAUERMANN et al., 2002).

Os estudos palinológicos representam importante fonte de dados para a compreensão das condições ambientais ao longo do tempo. Estudos palinológicos em sedimentos quaternários têm resultado em muitas informações sobre a migração das plantas, composição da vegetação, e flutuações climáticas durante o Quaternário. A vegetação é sensível às mudanças de umidade e de temperatura, e por isso a palinologia de sedimentos quaternários pode ser um importante parâmetro para a reconstituição de ecossistemas passados, tais como estuários, turfeiras e lagos (SALGADO-LABOURIAU, 1994; LORENTE, 2010).

3.4.2. Estudos palinológicos quaternários em áreas da costa leste brasileira

Neste item foi realizada uma compilação de alguns trabalhos publicados para a costa leste do Brasil, utilizando-se a palinologia como uma das principais análises realizadas. Pouco se tem publicado sobre estudos palinológicos do Quaternário na costa brasileira, sendo que a maioria dos trabalhos resume-se aos estados do Rio Grande do Sul (CORDEIRO; LORSCHEITTER, 1994; MACEDO et al., 2007), Santa Catarina (AMARAL et al., 2012; CANCELLI, 2012) e Rio de Janeiro (LUZ et al., 2006; 2011). Dessa forma, novos resultados palinológicos em lagoas costeiras, como os disponíveis nesta tese, são importantes por aumentar o conjunto de dados paleoambientais disponíveis para o Quaternário costeiro no Brasil.

Cordeiro e Lorscheitter (1994) estudaram a palinologia da Lagoa dos Patos (RS), e verificaram a influência marinha no ambiente deposicional entre 5.170 e 4.000 anos AP. A ocorrência de elementos marinhos, tais como cistos de dinoflagelados (Operculodinium

centrocarpum e Spiniferites mirabilis) e palinoforaminíferos, foi utilizada para se inferir sobre

o evento transgressivo durante o Holoceno. Como consequência da transgressão, as áreas de entorno da laguna foram ocupadas por plantas halófitas e xerófitas, como Poaceae e Amaranthus-Chenopodiaceae. Após a transgressão, há cerca de 4.000 anos AP, houve o aumento da densidade florestal, com o predomínio de táxons florestais como Urticaceae, Myrtaceae, Mimosa sp., Anacardiaceae, Celtis sp. e Loranthaceae. Segundos os autores, a umidade foi mantida após a transgressão, e temperaturas mais altas foram estabelecidas.

A palinologia da Lagoa Campelo (RJ), localizada na margem esquerda da foz do rio Paraíba do Sul, evidenciou que há cerca de 2.800 anos AP o nível do mar estava mais baixo do que o atual e uma turfeira com vegetação predominantemente composta por Poaceae, Cyperaceae, Selaginella sp., Cabomba sp., Polygonum sp., Sagittaria sp., Scrophulariaceae, Typhaceae, Araceae e Borreria sp. se desenvolveu na região. Além dos táxons herbáceos identificados, tipos polínicos de plantas higrófilas e pioneiras (e.g. Alchornea sp., Cecropia sp., Loranthaceae e Piper sp.) na sucessão vegetal se desenvolveram na mata do entorno da lagoa. A turfeira se estabeleceu na área de estudo até por volta de 2.320 anos AP, sendo que após este período o registro sedimentar foi perdido (LUZ et al., 2006).

No município de Passinhos, planície costeira do estado do Rio Grande do Sul, Macedo et al. (2007) estudaram a palinologia de uma turfeira e mostraram que um lago raso e mixohalino, e vegetação composta por táxons de formações campestres, se desenvolveram há aproximadamente 10.600 anos AP no local. Segundo os autores, entre 6.000 e 3.000 anos AP

houve um aumento nos elementos arbustivos, refletindo assim no aumento da umidade e da temperatura durante o máximo transgressivo do Holoceno. A diversidade de elementos da Floresta Ombrófila Densa (e.g. Ilex sp., Melastomataceae, Moraceae/Urticaceae, Myrsine sp., Myrtaceae) se ampliou apenas após os últimos 1.000 anos, e formações de mata de restinga paludosas se estabeleceram na região.

Luz et al. (2011) realizaram a análise palinológica da Lagoa de Cima, litoral norte do estado do Rio de Janeiro, e verificaram períodos de estabelecimento de áreas com predomínio de elementos herbáceos, em substituição a floresta higrófila durante o Holoceno. No entanto, segundo os autores a floresta higrófila permaneceu na área de estudo desde a formação da lagoa, há cerca de 6.500 anos AP, apresentando períodos de maior e menor densidade. As mudanças ambientais observadas, de acordo com Luz et al. (2011), foram ocasionadas pelas oscilações do nível relativo marinho, que também refletiram no represamento do rio Paraíba do Sul e na drenagem da planície.

A análise palinológica da Lagoa do Sombrio (SC) indicou a ocorrência de três fases (laguna, transicional-turfeira, floresta) nos últimos 7.900 anos. Estas fases mostraram em linhas gerais a influência marinha no ambiente deposicional entre 7.796 anos cal AP e 3.800 anos cal AP, caracterizada pela presença de palinoforaminíferos e acritarcas, e o estabelecimento das condições de umidade e expansão da vegetação (Arecaceae, Ilex sp.,

Matayba sp., Melastomataceae-Combretaceae, Meliaceae, Myrtaceae, Myrsine sp.) arbórea

somente após o Holoceno Médio (CANCELLI, 2012).

Em um estudo multidisciplinar na região de Jaguaruna, estado de Santa Catarina, Amaral et al. (2012) integraram resultados isotópicos (C e N), granulométricos e de microfósseis (palinologia e diatomáceas) e propuseram um modelo de evolução paleoambiental para a região durante os últimos 5.000 anos cal AP. Com base nos resultados obtidos a partir de três testemunhos analisados (Lagoa Figueirinha, Vale Riachinho e Vale do rio Sangão), os autores propuseram que o sistema lagunar era mais extenso do que nos dias atuais, e que as mudanças observadas na vegetação indicaram a progradação dos ecossistemas costeiros, mas sem influência climática.

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