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Papéis e cores para atrair a atenção

Capítulo 3 – Projetos Gráficos e Coleções: Estratégias editoriais planejadas para

3.2. Papéis e cores para atrair a atenção

Se os formatos e tamanhos dos livros são pensados pelos produtores com o objetivo de atrair determinado público leitor e marcar – ou não – sua distinção em relação à produção editorial em circulação no mercado, o mesmo se pode dizer a respeito dos papéis utilizados e das cores que constituem os livros.

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Novamente, inscreve-se na obra uma sutileza editorial que abarca os departamentos de

design e produção gráfica, isto é, um editor que, junto ao produtor gráfico, discute o

trabalho de ilustração, a escolha de papéis, cores e impressão, tendo em vista a qualidade do produto que se pretende produzir. (...) Constitutivo da materialidade do objeto livro, o olhar refinado para a escolha do papel que receberá a impressão da obra é determinante para seu conjunto. (DALCIN, 2013, p. 129-130).

Observamos em nossa análise que a qualidade do papel e das encadernações utilizadas também sofreram alterações importantes no decorrer destas quatro décadas. Se, nos primeiros anos, eram comuns as obras produzidas em papel poroso e sem brilho, a quase totalidade das

obras mais recentes é produzida em papel couché87, o que garante a qualidade e vivacidade das

cores utilizadas nas ilustrações.

As obras têm recebido encadernações de altíssima qualidade, muitas delas com capa dura,

e as demais - principalmente das edições relançadas pela Salamandra atualmente - contam com uma película plástica, que destaca a ilustração e o título do livro, além de apresentar o nome da autora em alto relevo.

Esse cuidado com a capa e, consequentemente, com a apresentação das obras reflete a preocupação com a imagem do livro como um produto durável, de qualidade, indicando uma concepção de um produto que deve ser resistente ao manuseio do leitor criança, possivelmente imaginado como um leitor não cuidadoso ou que não domina as habilidades necessárias para folhear um livro sem danificá-lo. Nesta perspectiva, tais livros são concebidos

Não como objetos descartáveis, de consumo rápido, nem como livros corroídos pelo tempo ou pela exploração de “mãos iniciantes”. (...), neste sentido, destaca-se o livro de capa dura, para transpor gerações: livro “guardável”, que entra “na onda” de um mundo que começa a propagandear a sustentabilidade – de crianças, portanto, que estão na dianteira de seu tempo: na contracorrente de uma cultura imediatista, ele pode ser sinônimo de economia e durabilidade. Enquanto alguns não resistem à primeira leitura, um volume de capa dura pode ser reaproveitado, muitos anos depois, pelo irmão mais novo ou por vários colegas da biblioteca. (TOZZI, 2011, p. 159).

87 “O papel couché é um tipo de papel especial, próprio para uso na indústria gráfica. Consiste basicamente de

um papel base (offset), que recebe uma camada de revestimento: carbonato de cálcio, caulim, látex e outros aditivos, com a finalidade de tornar a sua superfície muito lisa, uniforme. Consequentemente é o papel de melhor qualidade de impressão. É muito usado na impressão de folhetos, revistas, cartazes, livros de arte e outros impressos que exijam boa reprodução de retículas e traços. Quando o revestimento é aplicado em apenas um lado é chamado de Couché L1. Se o revestimento é aplicado em ambos os lados chama-se de Couché L2. O primeiro tipo é empregado em rótulos e embalagens, já o segundo é indicado para imprimir nos dois lados (livros, folhetos, etc...). Couché (camada, em francês).” Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Papel_couché, acesso em 05 de Novembro de 2012.

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As imagens a seguir demonstram as transformações operadas entre três edições de uma mesma obra:

Editora: Rocco Editora: FTD Editora: Salamandra

Ilustrador: Ivan e Marcello Ilustrador: Walter Ono Ilustrador: Mariana Massarani 1ª Edição: 1984 1ª Edição: 2005 1ª Edição: 2010

Formato: 23x16 cm Formato: 24x21 cm Formato: 24x17 cm Páginas: 24 Páginas: 32 Páginas: 3288

Figura 9: Edições da obra Armandinho, o juiz89.

Podemos observar a partir das imagens destas capas, a diferença no colorido das ilustrações. Enquanto a primeira apresenta poucas cores (tons de amarelo e vermelho) e nuances opacas, pouco chamativas (que representam possivelmente uma redução no custo da produção) a segunda já apresenta maior variedade de cores (verde, amarelo, vermelho), provavelmente adquiridas pela mistura de cores primárias, o que garante um visual que poderia ser considerado mais “alegre” ou mesmo “infantil”.

A própria ilustração reforça esta ideia, uma vez que o personagem representado na primeira capa aparece como alguém mais sério (de óculos e sem sorrir), enquanto o personagem da segunda capa, além de sorridente e expressivo (com os braços levantados), se aproxima mais

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Proporções entre as obras aproximadas.

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de uma imagem de “criança”, tanto pelos traços como pelas roupas que veste (boné, shorts, por exemplo).

A última edição, por sua vez, apresenta um colorido ainda maior, com efeitos inclusive no fundo – bolas de futebol desenhadas em tom mais escuro - resultando em um visual mais elaborado e sofisticado.

Estas escolhas editoriais também se relacionam a custos, condições de produção e qualidade da obra. De acordo com Moraes, em entrevista concedida a Dalcin (2013), há várias possibilidades de escolha das cores que irão compor uma obra, definidas a partir do custo e do resultado final que se espera do produto.

A impressão do livro se faz através de um sistema em que

... todas as cores [...] são formadas por quatro cores: o azul, o amarelo, o vermelho e o preto. Essas quatro cores impressas vão dar todas as cores [...] feita de pontinhos. Isso é quadricromia: com quatro cores fazem qualquer cor. São quatro cores que vão na máquina, mas são sempre as mesmas cores, o mesmo azul, o mesmo vermelho [...]. Quando tem uma cor muito específica que você quer, você pede que coloque a tinta específica na máquina, [...] aí chama cor especial. [...] Pode ter o livro impresso em três cores e em quatro cores que não seja quadricromia. O custo é diferente. Um livro até duas cores é mais barato do que fazer quadricromia, mesmo a cor sendo especial. Agora, se são três cores, ou o preço é o mesmo ou é até mais caro. Livro de três cores fica mais caro que quadricromia. Livro com três cores não vale a pena em matéria de custo, vale a pena para o produto. (MORAES, entrevista, 2010, apud DALCIN, 2013, p. 137).

Os papéis utilizados nestas obras também passaram por representativas transformações. Embora nenhum dos exemplares consultados traga especificações sobre o tipo de papel e impressão utilizados, as diferenças entre as obras são bastante evidentes. Enquanto a edição de 1984 apresenta um papel poroso, sem brilho, que reforça o tom ‘apagado’ das ilustrações, a edição de 2005 é produzida em um papel liso, que garante o brilho das cores. A última edição (2010) por sua vez, além da qualidade do papel, foi produzida utilizando-se recursos de relevo e plastificação: o nome da autora aparece em alto relevo e o personagem da capa recebeu uma espécie de verniz que ressalta o brilho da imagem.

Além isso, a encadernação desta edição mais recente, ao invés de simplesmente ser grampeada – como as demais – recebeu colagem das páginas que são envoltas por uma capa com papel mais resistente, resultando numa aparência mais moderna e sofisticada.

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Através de uma consulta online, verificamos que a encadernação presente nas duas primeiras edições, na qual as folhas são grampeadas, denomina-se encadernação canoa e é utilizada geralmente em revistas e panfletos, sendo um tipo de encadernação mais simples e barato. Já a encadernação que utiliza colagem, presente na edição da Salamandra, é chamada de

termoencadernação e “refere-se aos processos de encadernação que utilizam algum tipo de cola

ativada termicamente, sem necessidade de perfurar os materiais ao encadernar” o que garante um

melhor acabamento90.

Tais escolhas quanto ao suporte parecem refletir a intenção de atrair um público não mais preocupado com o custo da obra – como no caso das publicações compactas e através de coletâneas – mas um leitor que, reconhecendo o nome de uma autora já prestigiada, exige um produto bem apresentável, atraente, de qualidade.

Como se pode ver, todas estas escolhas referentes à passagem do texto a objeto impresso (CHARTIER, 1990, p. 133) são pensadas pelos produtores do livro considerando-se diversos fatores, com o objetivo de se equacionar custo e qualidade viáveis para a obra em cada época e contexto, objetivando, em última instância, atrair o interesse de determinado público leitor.