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Para a elaboração deste capítulo, valemo-nos de autores como Boris M. Levinson, Reinhold Bergler, e Françoise Dolto. Os dois primeiros estão intimamente ligados a trabalhos que versam sobre interação homem-animal. Já o fato de recorrermos a Françoise Dolto justifica-se por essa autora preocupar-se em aplicar os conhecimentos psicanalíticos a fim de melhorar a vida diária de pais e crianças, procurando assim amenizar os acidentes no percurso do desenvolvimento da personalidade.

Bergler afirma que segundo o corrente pensamento científico, a psicologia do desenvolvimento humano está propriamente envolvida com o curso integral da vida humana. No que concerne às pesquisas em relação ao papel dos cães, no que tange a psicologia do desenvolvimento, as mesmas têm se ocupado até o momento em focalizar as áreas dos desenvolvimentos infantil e geriátrico – com particular referência a pessoas que vivem sós (1988, p. 51, tradução nossa).

Uma explicação apresentada por Bossard para os milhões de cães, gatos, peixes ornamentais cuidados por um sem-número de crianças está no fato de o amor dos humanos pelos animais ser um dos pontos em comum na existência de ambos (em LEVINSON, 1969, p. 158, tradução nossa).

Uma outra razão para essa paixão das crianças pelos animais está contida no seguinte comentário de Levinson, em que podemos notar o amor incondicional do animal pelo seu dono assim como o benefício disso para a criança quanto a sua auto-aceitação:

De certo modo, o animal de estimação se torna o espelho no qual a criança se vê querida e amada não por o que ela seria, ou poderia ser, ou poderia ter, mas por aquilo que ela é. O animal e seu dono olham-se e compreendem-se apenas com o olhar. A criança aprende que é possível comunicar os

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sentimentos mais íntimos sem palavras, por meros gestos, olhar, ou mesmo pela postura corporal (LEVINSON,1969, p. 160, tradução nossa).

Curiosamente, Dolto (1999, p. 253), traçando uma evolução do interesse das crianças pelos animais, observa que os primeiros animais a chamar a atenção de um bebê de oito ou nove meses são

(...) as pulgas, as formigas, os pequenos vermes, as coisas buliçosas (...). Se ele dá atenção aos animais grandes, é porque vê os pais cuidarem deles. Os pássaros só o interessam por educação, ou então os pássaros distantes, aqueles que aparecem como pontos, e não os que são tangíveis, se é que o podemos dizer.

Nessa idade, ao se interessar pelos bichinhos, a criança não tem nenhum temor. No entanto, descobrindo o poder que um dedo seu tem de esmagar ou fazer com que um inseto pare de mover-se, é tomado por uma mistura de prazer e terror. É a primeira oportunidade de a criança tomar contato com a morte, ao presenciá-la nesses pequenos animais a princípio como sinônimo de cessação da mobilidade (DOLTO, 1999, p. 253).

Françoise Dolto traça a seguinte seqüência com que algumas espécies passam a compor os relacionamentos “inter-específicos” com a criança. Por volta dos nove meses, sublinha a autora, que a criança mesma “(...) está na idade da motricidade nascente: descobre os bichinhos; por volta da idade da locomoção, descobre os patos, as galinhas; por volta de dezoito meses, dois anos, os mamíferos” (1999, p. 253-254). Assim, notemos que pelas observações dessa autora a criança começa a perceber os mamíferos – considerando que o maior número de espécimes domesticados e considerados de estimação estão agrupados na classe Mammalia, os cães e gatos – quando completa 18 meses ou 2 anos de vida.

Mas as crianças também se encantam pelos animais selvagens – como veremos a seguir, a partir dos dados obtidos da pesquisa realizada por Salomon, citada por

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Bergler (1988, p. 52, tradução nossa), crianças de todos os grupos etários, quando questionadas sobre quais eram seus animais selvagens favoritos, responderam “leão” e “tigre” como suas duas primeiras preferências. A respeito da identificação das crianças com animais selvagens, Dolto comenta que a razão para tanto é que

(...) há no ser humano instintos de agressão não utilizáveis na sociedade. Então, para a criança, projetar-se na imagem de um ser selvagem que vive muito longe, em lugares onde não há humanos, dá-lhe o direito de exprimir emoções agressivas que a ajudarão a desenvolver-se e que, de fato, não prejudicam ninguém (DOLTO, 1999, p. 256).

Sobre a conduta dos pais em relação a esse tipo de comportamento, Françoise Dolto comenta:

(...) E, como a esses animais habitantes das selvas, saibam dar a seus filhos muita liberdade, que possam viver como selvagens, na rua se não há espaço suficiente em sua casa, ou no campo. Não digam a seu filho: “Não grite desse jeito!” Deixem-no fazer todas as coisas que são “de brincadeira” e que fazem tão bem. Pois quando podemos fazer coisas “de brincadeira”, podemos viver melhor seriamente (DOLTO, 1999, p. 256).

No entanto, Dolto nos adverte de que não faríamos nenhum bem às crianças caso compartilhássemos de suas brincadeiras de viver como os animais selvagens. Acrescenta que com a vivência do complexo de Édipo53, por volta dos quatro anos e meio, cinco anos, ocorrerá

(...) a primeira integração de seus instintos e da civilização num advento de sua consciência de criatura humana, indissoluvelmente ligada ao grupo por suas leis sociais. Eles [os filhos] terão muitíssimas possibilidades imaginativas para utilizar suas emoções agressivas, que, por isso, não passarão para emoções inter-humanas (1999, p. 256-257)

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Françoise Dolto diz que as emoções envolvidas nas relações entre irmão e irmã, garoto e pai, garoto e mãe, garota e pai, garota e mãe, podem – para a saúde psíquica da criança – migrar para as zonas da imaginação. Então, surgem “(...) lutas imaginadas entre animal e humano, entre dois animais, entre animal e planta, animal e pedra, animal e monstro” (1999, p. 257). Essa autora sublinha que os contos com personagens animais se prestam para essa finalidade. Atentemo-nos para este seu comentário:

Chapeuzinho vermelho, em que o lobo come a avó, é em geral contado cedo

demais. Mas há uma idade em que a criança tem fome dessas histórias (sic), e, se não lhas contamos, ela as inventa. Ela faz o lobo, simula comer você, mas já é tão agradável a simulação! Ela vive assim emoções de incorporação. Sente tão exatamente como os primitivos que, se ela pudesse incorporar os adultos, comeria alguém de quem gosta. Em vez dessa incorporação mágica e sensorial, ela tem de identificar-se com esses adultos de uma forma civilizada. Isso é, evidentemente, muito mais difícil; isso se passa unicamente num plano de identificação cultural (DOLTO, 1999, p. 257).

Em relação aos animais que vivem em meios líquidos – como os peixes e os anfíbios – e coexistem entre os ambientes terrestre e aéreo – como as aves, os morcegos, os insetos –, Dolto também acrescenta interessantes observações:

(...) pássaros, peixes, eles têm uma grande importância para o ser humano que tão dificilmente sabe nadar e voar. Quando uma criança pode amar um pássaro, quando esse pássaro pode levantar vôo para muito longe no céu, passear seu vôo por toda parte para onde a criança não poderia ir, parece que a criança fica um pouco menos impotente. Ao identificar-se com esses animais, ao dar-lhes um pouco de amor, é um pouco dela que escapa a essa condição terrestre tão difícil de suportar (1999, p. 259).

Dolto sublinha que não se deve pedir a uma criança que cuide bem de um animal em gaiola; ainda mais se ela for escrupulosa e apresentar sentimentos ternos. A autora ainda recomenda:

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(...) não digam na frente dela “pobre animalzinho engaiolado”, pois ela pode tornar-se culpada disso inutilmente. Se uma criança deseja possuir um animal em gaiola, não digam: “Você será obrigada a dar-lhe de comer todos os dias”. Será que ela própria se preocupa em comer todos os dias? Dêem o animal à criança para que ela sinta uma alegria de existir maior do que sem esse animal (1999, p. 259-260).

Françoise Dolto (1999, p. 260) observa que a criança só é capaz de assumir a saúde de um animal em cativeiro, como um pássaro, após ela completar dez anos de idade. Pode ocorrer de ela, ao perceber que o animalzinho não tendo o que comer, acabar “ornamentando” a gaiola com toda sorte de alimentos, para depois deixá-lo sem o que comer durante um largo período. E é claro que compete aos pais dar o exemplo de cuidar, alimentar, mostrar consideração pelo ser vivo dependente. Entretanto, Dolto assevera que há aqueles pais que usam da seguinte chantagem: “Eu não cuidarei dele, e você será responsável pela morte dele”. Sobre esse proceder, a autora aponta que se trata do “(...) exemplo duplo da preguiça e do sadismo por interposta pessoa. Se a criança cede a essa chantagem, não é por amor à vida, mas por culpa; e não se pode amar por piedade sem se diminuir a si mesmo” (DOLTO, 1999, p. 260).

Geralmente se fala dos benefícios psicológicos proporcionados pelos cães e gatos. Françoise Dolto nos diz algo interessantíssimo sobre os peixes54:

O peixe amado atende a necessidades afetivas específicas. Seu valor simbólico é especial e atua sobre conflitos quase uterinos. As pessoas que têm necessidade da presença, da amizade de um peixe são aquelas que, bem pequenas, tiveram dificuldades na adaptação aos pais. Isto é um fato de observação. Quando uma criança que não tinha contato, nem com seu círculo familiar, nem com os animais, e que destruía tudo, chega um dia a ter uma necessidade imperiosa de ver peixes, seja em aquário pequeno, seja em

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Ainda quanto ao interesse em manter uma relação – no caso não amistosa – com os seres que vivem no meio líquido, os peixes, a Psicanálise, buscando as motivações inconscientes dos atos humanos, pode explicar, por exemplo, o que subjaz à necessidade de se praticar caça submarina; necessidade presente tanto em crianças como em adultos. Dolto coloca que essa necessidade “(...) de dominar animais predadores sob o mar, às vezes é um modo de liquidar as tensões nervosas agressivas de um complexo de Édipo impossível de liquidar nas transferências propostas pelas circunstâncias da vida corrente” (1999, p. 260).

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aquário grande, seja de espreitá-los nos riachos, vocês podem ter quase certeza de que está a caminho da cura. É uma criança que recupera o direito de se ter amado, por pequena que seja a lembrança inconsciente de si mesmo que se possa ter. (...) Uma criança que pensa “Como eu gostaria de ser peixe e como estou contente de olhá-lo” está em vias de ganhar, de adquirir enfim a paz com seus primeiros contatos difíceis, seja intra-uterinos, seja bem perto da vida intra-uterina, seus primeiros contatos com a mãe que foram perturbados (1999, p. 260).

É interessante como os animais de estimação têm feito de maneira incessante e universal bons objetos de amor. No entanto, antes de presentear uma criança com um animal de estimação, deve-se ter claro que os animais diferem entre si quanto às habilidades de satisfazer as necessidades de amor de uma criança. Por exemplo, um que permite à criança uma relação de contato, em que esta pode acariciá-lo, é muito mais proveitoso do que um peixinho de aquário. (HARLOW, HARLOW & HANSEN, em LEVINSON, 1969, p. 159, tradução nossa).

Bucke (em LEVINSON, 1969, p. 163, tradução nossa), em 1903, quanto à preferência por animais, obteve os seguintes resultados por meio de um questionário respondido por meninos e meninas entre 6 a 17 anos, em que comentam sobre seus animais de estimação: 42,86 % escreveram sobre cães; 27,57 %, sobre gatos; 6,28%, sobre canários; 5,45 %, sobre coelhos, etc. Uma posterior análise dos questionários revelou que o cachorro, o cavalo e o coelho são preferidos pelos meninos; e o gato, o canário e o papagaio são os favoritos das meninas.

Esse autor indica que os adolescentes preferem cães que são briguentos, bravos, inteligentes, e bons caçadores. Já as adolescentes, cães que sejam graciosos, belos, amistosos, dependentes e dignos de confiança (BUCKE, em LEVINSON, 1969, p. 163-164, tradução nossa).

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Num estudo bem mais recente, Bergler (1988, p. 51, tradução nossa) cita os achados de Salomon, em 1984, no qual é demonstrado que as preferências por certos animais muda conforme o curso do desenvolvimento de cada um. No entanto, Bergler (1988, p. 53, tradução nossa) faz uma ressalva: tal estudo deve ser considerado como o primeiro passo para uma minuciosa investigação dos significados que os animais domésticos assumem em relação a determinadas idades.

Salomon (em BERGLER, 1988, p. 51, tradução nossa) apresentou as perguntas abaixo a uma amostra de 216 garotos e garotas com idade entre 5 e 13 anos:

1. Qual seu animal favorito?

2. Qual é o seu animal favorito entre os que vivem na natureza? 3. Qual o seu animal doméstico favorito?

4. Se você pudesse escolher ser um animal, que animal você escolheria ser? 5. A que animais você tem aversão, e quais o apavoram?

6. Quais animais mais freqüentemente aparecem em seus sonhos?

O primeiro ponto a se apresentar é que com exceção de três, todas as crianças, independentemente da idade, gostariam de ter um animal doméstico. Contudo, a preferência por uma determinada espécie varia conforme a idade, como claramente mostra a tabela abaixo (SALOMON, em BERGLER, 1988, p. 52, tradução nossa):

Pergunta:

Qual seu animal favorito? Grupo Etário I (média de idade 6,5 anos) % Grupo Etário II (média de idade 9,5 anos) %

Grupo Etário III (média de idade 11,5 anos) % Gato 21,7 30 12,5 Cavalo 19,5 16 17,5 Cachorro 17,3 29,9 35 Outros 41,5 24,1 35

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Conforme os dados acima, Bergler comenta algumas inferências dos mesmos:

Perguntadas quais eram seus animais selvagens favoritos, crianças de todos os grupos etários responderam “leão” e “tigre” como suas duas primeiras preferências. As mudanças de preferências relacionadas às idades por um animal particular, portanto, parecem estar determinadas em grande escala por o animal em questão, de qualquer modo, poder ser integrado ao desenvolvimento da pessoa – isto é, se (entre outras coisas) o animal pode auxiliar a satisfazer as necessidades psicológicas do indivíduo e igualmente elevar a qualidade de vida através da comunicação e do suporte emocional. (BERGLER, 1988, p. 52, tradução nossa).

Em relação aos motivos que influenciam a escolha dos animais de estimação, Salomon (em BERGLER, 1988, p. 52, tradução nossa) chegou aos resultados abaixo, assim divididos:

Grupo Etário I (média de idade 6,5 anos) % Grupo Etário II (média de idade 9,5 anos) %

Grupo Etário III (média de idade 11,5 anos) % Amor e segurança 41,7 18 28,3 Autonomia e independência 23,8 54,5 59,2 Autoconfiança e agressividade 19,4 23,8 9,8 Nenhuma classificação possível 15,1 3,7 2,7

Entretanto, Bergler (1982, p. 53, tradução nossa) faz a seguinte ressalva quanto aos rígidos modelos de fase acima mencionados:

Embora os rígidos modelos de fase desse tipo precisam ser interpretados com cautela, como eles estão fundamentados na hipótese de que as experiências e os comportamentos das crianças podem ser divididos em um número de fases distintas, definidas pela idade, os achados mostram-nos que essas preferências relacionadas a idades também são a expressão das necessidades e estados motivacionais relacionados a idades (...).

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Bergler (1988, p. 53, tradução nossa) comenta os motivos relacionados por Salomon:

A importância dos animais como uma possível direção para a autonomia, para um comportamento relativamente independente, e para a ação parece aumentar com a idade. “Amor e segurança” estão em primeiro lugar para o grupo mais novo – embora esse fator recupera alguma coisa de seu significado com o início da puberdade.

Em relação à maioria dos estudos que tratam do papel dos cães na psicologia do desenvolvimento, Bergler comenta que, até o momento, os mesmos se baseiam em diversos critérios subjetivos de plausibilidade. Acrescenta que seria de grande utilidade se tais estudos se desenvolvessem propriamente fundamentados em hipóteses teóricas, que poderiam, pois, ser testadas através de métodos empíricos. Levinson foi um estudioso do assunto que realizou muitos trabalhos sobre as possíveis influências dos animais sobre o desenvolvimento infantil, baseando-se demasiadamente em critérios de plausibilidade55 (BERGLER, 1988, p. 53, tradução nossa).

Bergler (1988, p. 53) afirma que Levinson admitia que o papel dos animais está relacionado a idades específicas. No primeiro ano de vida de uma criança, mais especificamente no segundo semestre, quando esta começa a distinguir a mãe de outras pessoas, sentindo medo de estranhos e prazer ao ver a mãe retornar para junto dela,

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Não obstante a crítica de Bergler feita a Levinson, quanto ao seu demasiado uso de critérios de plausibilidade, trata-se do autor de que dispomos para basearmo-nos. Segundo seu editor, “Boris Levinson foi o primeiro psicólogo clínico profissionalmente instruído para formalmente introduzir e documentar a maneira como animais de companhia poderiam incitar o desenvolvimento de um rapport entre o terapeuta e seu paciente, desse modo elevando a probabilidade de motivação deste”.

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(...) Crianças nessa situação necessitam de um “animal gostoso de abraçar”, um brinquedo macio que está sempre lá para funcionar como uma ponte entre elas e o mundo circundante, desse modo auxiliando-as a desenvolver confiança nesse mundo e nelas mesmas. Esse animal passa as ser visto pela criança como uma constante fonte de proteção e consolo, especialmente para aquelas ocasiões em que os adultos fazem suas primeiras exigências para uma criança (treino de toalete), e certos conflitos são inevitáveis (LEVINSON, em BERGLER, 1988, p. 53, tradução nossa)

Conforme o parágrafo acima, Levinson está se referindo ao conceito de

objeto transicional, de Winnicott. Um objeto transicional pode se fazer presente num bicho de

pelúcia, num boneco, tido como um objeto sentido como “não-eu”. Para a criança tem vital importância, porquanto serve de defesa contra a ansiedade (WINNICOTT, 1975, p. 17). Pelo exposto, Levinson está sugerindo que um animal de estimação pode funcionar como um objeto transicional.

“O primeiro animal de estimação importante de uma criança tem algo mágico, misterioso, e inacreditavelmente excitante em torno dele” (CAMUTI & ALEXANDER, em LEVINSON, 1969, p. 158, tradução nossa). Levinson comenta que “é de se esperar que essa mágica se transmita para toda a natureza, e a enorme necessidade da criança por amar ou ser protetor da vida animal seja um sinalizador da atenção que abarca todos seus companheiros humanos” (1969, p. 158, tradução nossa).

Levinson afirma que no brincar com animais a criança sente que pode

facilmente comunicar-se com os mesmos, sendo uma das formas pelas quais a criança atua muitos dos problemas comuns da infância (1969, p. 158, tradução nossa). Para ele, muitas

crianças acreditam numa mágica que possa ajudá-los a superar os obstáculos, sentimentos de solidão e inferioridade. Assim, o animal pode tornar-se um dos instrumentos para o pensamento mágico da criança, e aliado com o animal de estimação, a criança pode superar seus problemas de adaptação (LEVINSON,1969, p. 159, tradução nossa).

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Por exemplo, quando uma família se muda de residência, o animal doméstico pode também nessa situação desempenhar uma função muito útil, uma vez que para a criança um evento dessa natureza envolve a perda dos arredores da casa antes habitada, de amigos, de companheiros de escola, bem como de professores em que a criança já havia depositado sua confiança (LEVINSON, em BERGLER, 1988, p. 54-55, tradução nossa).

Assim como o processo de identificação envolve a relação da pequena criança com as figuras parentais, tal processo também se faz presente na relação com seu animal de estimação. Por identificação temos

Processo psicológico pelo qual um sujeito assimila um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo desse outro. (...) Mais do que um mecanismo psicológico entre outros, (é) a operação pela qual o sujeito humano se constitui (LAPLANCHE & PONTALIS, 1991, p. 226-227).

Alguns psicólogos acreditam que é mais fácil para a criança identificar-se com animais do que com seres humanos (BELLAK, em LEVINSON, 1969, p. 158, tradução nossa). Com efeito, em suas construções em que acreditam brincar com animais, as crianças afirmam freqüentemente que eles mesmos se tornam animais e os acolhem como seus iguais (STEKEL, em LEVINSON, 1969, p. 158, tradução nossa).

Freud afirma que no início da relação entre a criança e seu animal de estimação, a criança pode sentir medo do seu novo companheiro. Contudo, por meio do processo de identificação a criança pode começar a amar o animal (em LEVINSON, 1969, p. 159, tradução nossa). É por meio da identificação que a criança aprende a compartilhar das intenções e sentimentos do animal. Aquele que ama um animal e deseja “ler” seus sentimentos nos sons produzidos nas suas expressões e comportamentos, essa pessoa deve

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prestar muita atenção e usar de diligência, esforçando-se no sentido de colocar-se na posição ocupada pelo cão (LEVINSON, em BERGLER, 1988, p. 54, tradução nossa).

Levinson (1969, p. 159, tradução nossa) comenta que essa identificação com um animal de estimação é que faz esse ser vivo tão excepcionalmente valioso para ela. É pela identificação com o animal que a criança vê a possibilidade de incorporar a força daquele. Ao exercer certo domínio sobre seu animal, sente que pode competir numa posição mais equilibrada com seus pais, cujos mero tamanho e aparente força esmagadora são excessivos. Esse autor acrescenta que além da questão da posição em relação aos genitores, o sentimento de ser o “dono” do animal também pode lhe proporcionar um crescente sentimento de independência salutar (LEVINSON, em BERGLER, 1988, p. 54, tradução nossa).

Como vimos em Freud (1997, v. 20), uma criança não encontra diferença

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