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CAPITULO 3: Aprendizagens colaborativas

3.1. A importância das interacções sociais na sala de aula

3.1.3. O papel da linguagem na interacção

Realmente, é por diálogo e interacção que objectivos de currículo se tornam vivos.

(Tinzmann, 1990) Cassany (1999) afirma que:

“el diálogo es el instrumento más eficaz para regular los processos de composición del aprendiz y para desplegar los procesos de análisis, reflexión y valoración que requiere” (p.

Quando o aluno fala, durante o momento de escrita, na linha do modelo cognitivo do processo de escrita de Hayes de 1996, verbaliza o seu conhecimento interno e permite que outras pessoas, colegas e o professor, o ajudem a ultrapassar as suas dificuldades, mostrando-lhe formas de resolver problemas ou alternativas que ele desconhecia.

O autor cita Camps (1998) que referencia, assim, os benefícios do diálogo durante o trabalho de escrita cooperativa:

9 permite verbalizar os problemas da produção escrita, fazê-los conscientemente e resolvê-los de forma cooperativa;

9 Favorece a capacidade de falar sobre a língua e, consequentemente, a actividade metalinguística;

9 Permitir repartir entre os colegas a carga cognitiva da gestão textual. Só o escrevente experiente é capaz de gerir de forma autónoma os diversos aspectos da produção escrita; os aprendizes não têm capacidade suficiente para o fazer e o trabalho cooperativo permite que cada aluno assuma uma parte desta carga, ao adoptar estratégias diferentes e complementares. Enquanto um lê, outro escuta sob a forma de destinatário ou preocupa-se com a questão da sequencialidade e coerência textual.

Cassany (2000) propõe que se comece por organizar a sala de uma forma mais comunicativa, que possibilite uma interacção entre professor/aluno e aluno/aluno. É necessário que o professor deixe de ser o único falante na sala de aula, o único transmissor de cultura, saberes e informação. Num espaço em que se pretende trabalhar a língua é fundamental que os alunos tenham um papel muito activo que passa por falar, ler, discutir, partilhar opiniões e a partir desta dinâmica comunicativa se construam caminhos de escrita. Uma escrita que tenha sentido para a criança, que parta dos seus interesses, necessidades, perguntas, problemas e que ela saiba, sempre, para quem escreve, o que escreve e porque o faz.

“The primary purpose for writing in almost all contexts its to communicate”, afirmam Grabe & Kaplan (1997:224). Os professores de Língua Materna, com uma responsabilidade acrescida na formação dos escritores inexperientes, devem-lhes proporcionar, desde o início da aprendizagem do processo de escrita, contextos reais para que possam aprender a escrever e o façam com motivação e gosto.

A escrita tem que ser entendida não apenas na sua dimensão cognitiva, mas também social e cultural. Aprender a escrever é aprender a adequar o uso da língua ao contexto, à situação real de comunicação.

Num estudo desenvolvido por Peterson (2003) foi examinado o modo como as revisões da escrita de quatro alunos do oitavo ano foram influenciadas pelo feedback de interacções informais, dos colegas, durante a escrita de uma narrativa.

As transcrições das conversas dos alunos foram analisadas para determinar as funções e os tópicos do feedback dos colegas. No estudo concluiu-se que esse feedback influenciou as revisões dos alunos ao nível da palavra, frase e organização de ideias, embora os alunos tenham feito mais revisões do que aquelas directamente propostas pelos colegas. A conversa do grupo que influenciou as revisões dos alunos serviu quatro funções:

a) jogar com as ideias; b) clarificar ideias;

c) questionar a plausibilidade; d) revelar resposta emocional.

Foi possível concluir que as questões dos alunos eram feitas para clarificar e consolidar ideias. Assim, eles recorreram ao diálogo para explorar ideias, beneficiando da oportunidade para encontrar informação nova para ajudar os

Aleixo (2005: 52) refere os estudos de Pontecorvo (1988), que comprovam que as discussões numa turma permitem a alternância de tipos de interacção, ou seja, facilitam a manifestação por parte dos alunos, da sua concordância ou oposição, argumentando e contra-argumentando, em torno de uma actividade comum. O autor propõe um esquema onde articula o tipo de facilitação social (apoio ou oposição) com o tipo de relação estabelecida (simétrica ou assimétrica). O tipo de interacções que desse cruzamento podem resultar podem ser de:

9 Tutoria: quando um aluno competente apoia outro menos competente, proporcionando-lhe o apoio necessário à execução da tarefa;

9 Co-construção: quando os alunos combinam o seu contributo individual na construção conjunta dos seus conhecimentos através dos diálogos que se vão estabelecendo;

9 Conflito intencional: quando o aluno mais competente se destaca nas intervenções recorrendo à apresentação de dados contraditórios para facilitar as mudanças de “ponto de vista” ou de representação do colega; 9 Argumentação: quando se verifica uma situação de oposição marcada por

contra-argumentos fundamentados e contrastantes.

A mesma autora (p.49), ainda no âmbito das interacções, apresenta quatro tipos de dinâmicas de co-elaboração, com base nos resultados obtidos por Gilly et alii (1989), através da observação das alternâncias sistemáticas de momentos de trabalho individual e de momentos de interacção:

1. colaborações concordantes – um dos elementos propõe uma resolução que é aceite pelo par, sem indícios de submissão, resultando de um acordo cognitivo;

2. co-construção – Um dos parceiros inicia uma acção ou frase que é retomada ou continuada pelo outro. Não há desacordos, no entanto não se pode ter a certeza de que os elementos do par teriam chegado à mesma construção trabalhando individualmente, poderá um dos elementos ter

acabado por orientar o outro para uma solução que não tinha pensado mas que aceitou;

3. confrontações com desacordo – um dos parceiros propõe uma solução que é automaticamente recusada pelo outro, no entanto este não lhe dá nenhuma alternativa. O primeiro opta ou por abandonar a proposta ou por explicá-la no sentido de poder vir a ser aceite.

4. confrontações contraditórias – os dois elementos do par avançam com propostas contraditórias. Esta situação encaminha-os para uma fase de confronto dos seus pontos de vista com o objectivo de superar o impasse. Na perspectiva de Gilly (1988:23), as interacções entre os pares têm um papel construtivo no desenvolvimento cognitivo possível pela co-resolução. Os progressos alcançados traduzem-se tanto ao nível da melhoria do desempenho dos alunos como ao nível da aquisição de procedimentos de resolução mais fortes.

A resolução de problemas através da interacção coloca em confronto diversas estratégias e propostas, exigindo uma negociação argumentada, a fim de os pares alcançarem uma proposta comum. As interacções que se activam entre os pares não são semelhantes nem quanto ao modo como se processam, nem quanto ao efeito que produzem.

O lidar com as diferenças individuais é uma mais-valia tanto para o trabalho da escola como o das suas vidas futuras. Permite analisar problemas sobre perspectivas diferentes, aprender a negociar e mediar os conflitos quando eles surgem.

De acordo com Gilly (1988), a desestabilização pode ser provocada por oposições ou desacordos de carácter socioconflitual, que tem origem nas informações novas, ou das interrogações sobre as consequências de uma acção. Para a autora é fundamental o controlo social na gestão consciente da actividade do sujeito.

No nosso estudo, em particular, é durante a revisão e reescrita em colaboração que vamos analisar o tipo de interacções que os diversos pares vão manter e que tipo de construções vão alcançar em conjunto.