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4 Concepções e práticas dos professores

4.2 Estratégias de ensino-aprendizagem utilizadas pelos professores

4.2.6 Para ampliar a compreensão da realidade

Nessa etapa é proposto que os alunos, com base no que se explorou por meio da pesquisa de campo e bibliográfica, explique os problemas propostos, levantando hipóteses num primeiro momento, para num segundo - como resultado do diálogo entre colegas e professor, considerando o objeto de estudo - surgirem as soluções.

Encontramos, nessa etapa, três estratégias utilizadas pelos professores a

observação, a dramatização, e os seminários.

Por possibilitar o olhar em direção ao objeto estudado, a observação foi citada por cinco professores como usada sempre ou quase sempre e apenas um disse nunca uso (Anexo G).

De caráter intuitivo, com centralidade no aluno, a observação não é descrita propriamente como uma estratégia de ensino pelos autores que utilizamos como referencial e sim como uma capacidade a ser desenvolvida, que envolve o perceber, o descrever e o adquirir conhecimento sobre a realidade. No entanto, é colocada

como uma estratégia alternativa visando ao levantamento de hipóteses para posterior sugestão de soluções.

Na visão dos professores entrevistados,

a observação é muito importante, às vezes ele (aluno] não sabe como olhar, como receber a pessoa. Então esta coisa de fazer o aluno olhar é muito importante [...] A gente já tem como uma diretriz da disciplina, o recurso da observação. Então este aluno, ele sai comigo em campo e vai observar procedimentos e situações em Terapia Ocupacional. (P5)

A observação, entendida como habilidade necessária ao desempenho profissional, acaba sendo configurada, considerando as especificidades da disciplina e a importância de perceber as necessidades dos pacientes,

A observação é um elemento importante, a capacidade de discriminar quais são as necessidades do paciente, quais são os procedimentos que eu estou utilizando e quais são os recursos e as estratégias que eu uso para esta intervenção, e por último, ou concomitantemente, de que orientações este paciente precisa, parte da observação (P6)

Bordenave e Pereira (1994) sugerem algumas atividades que potencializam esse aprendizado, é o caso de visitas e estágios.

Então este aluno, ele sai comigo em campo e vai observar procedimentos e situações em Terapia Ocupacional. Esta aula é sempre uma coisa que eu exponho o que ele vai olhar, o que ele precisa olhar, e deixando sempre possibilidade de ele olhar muito mais coisas do que as que a gente também vai indicando.(P5)

Um outro exemplo de como a observação pode ser utilizada como estratégia de ensino em uma experiência prática é descrito na fala a seguir,

Eu coloco metade do grupo para observar e a outra metade para trabalhar junto. A metade que está observando fica na mesa, eles podem anotar.[...] Os alunos que estão na observação não ficam só observando, na verdade eles ficam juntos, e aí eles começam a ver que os idosos estão com dificuldades e o próprio grupo solicita a ajuda desses alunos. Eu coordeno as atividades, eles observam e participam. (P1)

Ao subdividir o grupo em dois, colocando a metade para observar enquanto o outro grupo se relaciona com a clientela, esse professor potencializou a observação. A forma como realizou a estratégia se aproxima do que é descrito por Anastasiou (2004b) como Grupos de Verbalização (GV) e de Observação (GO). A principal diferença é que, no Grupo de Verbalização descrito na literatura, um grupo discute

um tema enquanto o outro grupo observa; ao passo que, no caso específico deste professor, um grupo observa outro grupo atuando junto aos idosos.

Em ambos os casos há um fechamento do que foi visto e com o que foi realizado ou debatido. (ANASTASIOU, 2004b; BORDENAVE; PEREIRA, 1994).

Outra forma de desenvolver a observação no campo implica observar o professor enquanto ele atende o paciente, visando ampliar a compreensão dos alunos sobre o contexto no qual o paciente está inserido e os preparando para o exercício autônomo da profissão

A partir do momento que eles tiveram experiência de me verem atendendo no grupo e já tiveram a observação e o relatório, eu passo a dividir em grupos menores de três ou quatro alunos e eles planejam a atividade, discutem os objetivos [...] eu coloca os aluno pra observar o que eu estou fazendo primeiro e depois eles vão e realizam (P1)

- Vocês fiquem observando. E a gente olhava a casa, o mobiliário. E a gente pegava uma população muito pobre. Aí a gente trabalhava com esta situação. E foi muito legal, a gente fez isto várias vezes. Elas vão lá no primeiro encontro e a gente percebe um pouco do grupo (usuários) (P3) Nesse tipo de observação estão envolvidos o professor e também o paciente, é um tipo de observação muito requerido pelos alunos que segundo um dos professores sempre reclamam de nunca terem visto um terapeuta atender. Se ser modelo é o papel assumido nesses momentos, querendo ou não, pelos professores, cabe ao aluno estabelecer reflexão e crítica sobre o que observa para, por meio da ação-reflexão-ação, poder significar seus papéis como futuros terapeutas.

Cabe ao professor fomentar o pensamento crítico e criador, à medida que considera a experiência trazida pelo aluno, mas aponta os limites do que é trazido, possibilitando uma visão mais elaborada do conhecimento (VILLA; CADETE, 2001).

A observação promove um contato inicial com a realidade na qual o aluno irá atuar. Nesse sentido, ao observá-la, os alunos vão desenvolvendo o seu poder de captação e de compreensão do mundo que lhes aparece, em suas relações com ele, não mais como uma realidade, mas como uma realidade em transformação, em

processo. Servindo à libertação, funda-se na criatividade, estimula a reflexão e a ação dos homens sobre a realidade (FREIRE, 1996, p. 86)

Algumas práticas desses professores coincidem com a descrição da estratégia estudo do meio. Segundo Feltran e Filho (2001), por essa estratégia o aluno pode entrar em contato com a complexidade do meio. Para os autores, esse tipo de estudo se organiza com a finalidade de explicar a relação entre o homem e a sociedade, buscando compreender melhor sua interação com o mundo.

Eu trabalho com eles uma espécie de pesquisa, mas na verdade é uma observação que eles fazem com uma atividade extraclasse. Eu passo um roteiro, eles vão visitar um asilo e eu coloco questões que eles têm que estar respondendo, por exemplo, observar o espaço físico, a equipe, o número de idosos a manutenção do lugar, como eles sobrevivem, como são os cuidados com a saúde, se tem terapeuta ocupacional, o que a terapeuta faz, o que eles teriam como proposta para estas instituições. (P1)

Nesse sentido, quando os professores dizem utilizar práticas problematizadoras de situações reais, pedindo aos alunos que façam visitas, que observem situações do cotidiano para, depois, apresentarem os resultados dessas observações, eles estão sim, utilizando-se do estudo do meio.

Essa estratégia é realizada por meio de pesquisa e problematiza a realidade social. Embora parte de suas atividades seja centralizada na figura do aluno que deverá observar, realizar as visitas, anotar, redigir relatórios e fazer pesquisa sobre o assunto, ela também apresenta uma série de outras intervenções do professor e interações com meio.

Percebemos que os dados trazem a preocupação dos professores com o paciente, uma preocupação em os alunos incitarem a busca de informações, desenvolver a capacidade de trabalho em equipe, confrontar a realidade e desenvolver conhecimentos, habilidade e atitudes destes alunos.

No levantamento de hipóteses, as dramatizações são usadas em sala de aula por algumas de suas características intrínsecas como, por exemplo, as

constantes tomadas de consciência e a modificação de si e do mundo promovidas por essa mimetização.

Eu acho a dramatização a estratégia mais interessante. Não sei em outras áreas, mas na saúde do idoso todo mundo tem um parente bem próximo e uma vivência bem próxima[...] conhece um idoso que está cheio de problemas, o avô, o vizinho, todo mundo tem um. Então eu acho que esta é a forma mais bem sucedida de trabalhar a situação real, pode ser com representação real ou com história pessoal dos alunos. Na saúde do idoso poder mobilizar as próprias experiências, o próprio repertório a aí acrescentar, comparar, agregar, ajuda muito! (P3)

Quatro professores declaram utilizar sempre ou quase sempre a dramatização e dois deles nunca ou pouca vezes (Anexo G).

A dramatização é uma estratégia que possibilita, entre outras coisas, a re- significação de conteúdos à medida que o aluno se aproxima da sua própria história, da história dos colegas e é levado a lidar com diferentes pontos de vista. “Re- significar significa o aprender, pois implica articular diferentes níveis de análise individual, grupal e social” (RUIZ-MORENO et al, 2005, p.201). Assim, ao usar a dramatização nos espaços das aulas, o aluno pode fazer inter-relações com o cotidiano e com as suas experiências pessoais. Fazendo essas correlações um outro nível de apropriação dos conhecimentos irá acontecer (Ibid).

Porque eles têm uma disciplina de laboratório, a gente tem historicamente isto no curso, às vezes ele vê situações no dia-a-dia na prática e ás vezes traz pra cá e produz algumas hipóteses, uma coisa que a gente chama de laboratório de vivências. Que é mais protegido para o aluno, porque ele está com o professor, com um grupo de alunos que ele conhece. Então ele faz a simulação de alguns casos que o deixaram mais inquieto, que o deixaram perdido, e reproduz aquilo. Então eu acho que trabalha procedimentos e atitudes.(P5)

Essas dramatizações são utilizadas como representações teatrais a partir do problema ou tema. Como já descrevemos, elas podem ser utilizadas em outros momentos como no contato inicial com o aluno e na exposição do problema.

Quando utilizadas com o objetivo de facilitar a explicação dos problemas devem possibilitar que os alunos tragam suas experiências, as formulações já realizadas e com esses componentes buscar sensibilizá-los para lidar com as

situações problemáticas, contribuindo com o desenvolvimento do manejo sobre esta realidade (DINIZ, et al, 2000).

Verificamos que a experiência tem como objetivo possibilitar a reconstrução individual e coletiva do conhecimento e os significando para a prática. Assim, traz a possibilidade de despertar o pensamento, a descoberta e a criatividade do aluno, e gerar o desenvolvimento de idéias, habilidades e a reflexão sobre os próprios sentimentos.

Ruiz-Moreno et al (2005) identificam como fundamentais no ensino em saúde que a aprendizagem ultrapasse a retenção de informações, indicando as experiências psicodramáticas como uma estratégia viável que possibilita momentos de reflexão e crítica, e proposições de caminhos,

Eu preparo um pequeno cenário. Eu afasto a mesa, ponho as cadeiras de lado. Aqui é o palco (sinalizando com as mãos), faço uns riscos no chão aquela coisa [...] Em geral eu preparo uma semana antes, em geral eu faço alguma papel, a secretária. [...] Se a dramatização começa a ficar muito extensa, ou quando aparece alguma coisa inadequada eu paro :- Congela! Vamos pensar esta cena aqui! Olha que cena legal! O que está acontecendo? O que ele falou? O que é que você faria no lugar dele? A gente faz um pouquinho a troca de papéis etc e tal (P3)

As dramatizações podem ser usadas também quando um aluno apresenta alguma dificuldade em determinado aspecto, servindo de apoio didático no preparo desse aluno para a prática junto à clientela.

Essa forma de utilizar a estratégia desenvolve no aluno a capacidade de decidir, interpretar, criticar e buscar suposições por meio das comparações e da imaginação.

Por ser uma atividade grupal, favorece também a aproximação, a interação e o diálogo - condição essencial ao desenvolvimento de processos de liderança, flexibilização, colaboração, acolhimento e inclusão (RANGEL, 2005).

Para a solução de problemas, momento posterior ao levantamento das hipóteses, as principais estratégias apontadas pelos professores foram: os

seminários e os projetos e para acompanhar o desenvolvimento das atividades

envolvidas na realização destas estratégias os professores utilizam os relatórios e os diários de campo.

Quatro dos sete professores apontam utilizar quase sempre o seminário, e dois deles às vezes (Anexo G).

Como ressaltam Abreu e Masetto (1997) os seminários giram em torno de temas a serem estudados com profundidade pelos alunos, que devem apresentar os dados como se fossem especialistas em parte de um problema. A apresentação deve contemplar uma discussão dos temas estudados que pode ser feita em um ou mais encontros. Para o emprego do seminário, são requeridas independência intelectual e maturidade por parte dos alunos, e organização e manutenção de envolvimento dos alunos por parte dos professores,

seminário pra mim,... seria aquela parte do processo ensino- aprendizagem... porque, (...) o aluno vem com aquela coisa, infelizmente, ainda, só da aula expositiva, da coisa pronta! Então ele tem dificuldade de buscar suas coisas, então o seminário de alguma forma, é uma provocação maior para ele poder conseguir buscar suas coisas. É alguma coisa que vai ajudá-lo também a trabalhar esta habilidade de comunicação, de organização (P5)

Este fragmento da entrevista nos indica a forma como o seminário pode ser visto. Alguns professores colocam entre os objetivos a provocação para o aluno buscar preencher as lacunas de conhecimento sobre determinado assunto.

Desenvolvida dessa maneira, torna-se uma estratégia propícia ao desenvolvimento de um ensino problematizador, que procura desenvolver no aluno habilidades para solucionar os problemas que são postos ou pelo professor, ou por questões que emergem da prática.

Porque eu não sei se é porque a gente é TO que a gente está pensando um pouco na atuação deles. Então têm uns elementos da habilitação pessoal que o próprio seminário, às vezes, vai ajudar. No seminário o aluno até tem uma indicação de referências, mas o aluno vai buscar textos, ele vai organizar, ele vai dividir tarefas, ele vai preparar uma apresentação. (P5)

Se, por um lado, os seminários são utilizados em forma de trabalhos mais complexos apresentados ao final do semestre, por outro são também utilizados como apresentações mais curtas de temas específicos quando discutem conteúdos teóricos a serem debatidos ao longo da disciplina.

Depois disso, eles têm meia hora de seminário e o seminário é elaborado por eles. Eu dou um tema e eu exijo dentro deste tema, (...) E não é um processo que eu cobro assim: “Tem seminário e vocês têm que dar todo este seminário hoje!” Às vezes a gente fica dois meses, três meses num único seminário. Mas a gente aprofunda absolutamente tudo.(P2)

Segundo Anastasiou (2004b), há três momentos na preparação dos seminários que precisam ser considerados para que ele apresente resultados positivos: a preparação do professor com a apresentação dos temas, a organização do calendário e do espaço físico, assim como a orientação para a pesquisa; o desenvolvimento que envolve a apresentação do tema e da discussão trazida pelos alunos, cabendo ao professor fazer um fechamento após esta exposição; e a elaboração de um relatório que pode ser desenvolvido, individualmente ou em grupo, pelos alunos.

Os dados coletados nessa pesquisa não nos permitem dizer que os professores sigam todas estas etapas, porém, podemos afirmar que a maioria dos professores realiza algum tipo de acompanhamento desse processo.

Um outro caso, no entanto, aponta entraves na utilização de seminários, considerando que o aluno não tem condições de fazer uma boa apresentação, já que não domina o tema em profundidade:

porque o que eu tenho percebido com os seminários é assim - eu tenho percebido comigo mesma - quando eu preparo uma aula de um assunto que eu não conheço, essa aula sai muito ruim, por mais que eu me prepare. (P4) Essa fala carrega um significado quanto ao uso do seminário como substituto da aula que deveria ser dada pelo professor. Essa estratégia é utilizada por esses professores com dois momentos, o primeiro no qual os alunos apresentam seus

achados e soluções; e um segundo, nem sempre previsto, em que são feitas considerações sobre a exposição do aluno.

Diante do exposto interrogamos: os seminários, quando propostos, têm sido realizados seguindo as etapas descritas acima? Sim, porque esse professor, ao trazer uma colocação sobre seu entendimento do que vem a ser essa estratégia, baseia-se em algo construído com aquilo que parece observar e praticar no cotidiano das suas aulas. E mais, estariam os seminários sendo utilizados dessa forma por outros professores?

Nos dados coletados nesse estudo percebemos que a maioria dos professores investigados considera o seminário como “um espaço em que as idéias devem germinar ou ser semeadas. Portanto, espaço onde um grupo discuta ou debata temas ou problema que são colocados em discussão” concordando com Anastasiou (2004b, p.90).