• Nenhum resultado encontrado

Capítulo II- Evolução das políticas e pareceres de especialistas e de sindicatos

3. Parecer sobre o projeto de Decreto-Lei n.º 771/2007 – ME de João Barroso

Antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 75/2008, mais precisamente em janeiro desse mesmo ano, João Barroso publicou um parecer sobre o projeto de Decreto- Lei n.º 771/2007 – ME, relativo ao regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário. Este estudo tinha como um dos referenciais fundamentais a reflexão e os estudos desenvolvidos pelo autor na área da gestão escolar e da autonomia, mais especificamente, os estudos de avaliação elaborados sobre os Decretos-Lei n.º 172/91 e n.º 115/A-98, bem como outros trabalhos de investigação (Barroso, 2008: 1).

A sua análise ao projeto de diploma relacionou-se com três aspetos capitais. Foram eles: a) a concessão de autonomia às escolas; b) os seus modos de governação e c) a gestão escolar. Na altura em que o presente documento foi elaborado, a gestão escolar, segundo o autor, deparava-se com a dificuldade de “(…) saber como é possível dispor de boas formas de coordenação da acção pública sem que isso ponha em causa o funcionamento democrático das organizações.” (Ibid.: 2).

Este parecer refere que um dos motivos anunciados pela tutela para se proceder à revisão do regime jurídico da autonomia, administração e gestão das escolas, se baseou na necessidade de instituição de lideranças fortes. Porém, para o autor (Ibid.: 3), “(…) não existe nenhuma evidência empírica que o actual quadro legislativo seja impeditivo, só por si, desse desiderato (…)” na medida em que considera que a emergência deste

56

tipo de lideranças não está relacionado com a forma como se determinam os órgãos de gestão, nem com o seu sistema de designação. Acrescenta ainda que

“(…) aferir da qualidade das lideranças pela sua “força” e fazê-la depender exclusivamente do exercício da responsabilidade individual de um “chefe” (seja qual for a designação que lhe é dada) é completamente desajustado do que a literatura sobre o assunto (…) tem vindo a revelar como mais adequado.” (Ibid.: 3- 4).

Outra razão apontada que dificultou o entendimento da justificação apresentada pelo governo, para a implementação de um novo normativo, foi o resultado da avaliação externa das escolas, no ano letivo de dois mil e seis/dois mil e sete. Estes dados revelaram que noventa e um por cento das escolas tiveram uma apreciação de Muito Bom e Bom no domínio da “organização e gestão escolar” e oitenta e três por cento avaliação análoga no domínio da “liderança”. Assim sendo, era claro que o regime jurídico que vigorava com o Decreto-Lei n.º 115/A-98 “(…) não foi impeditivo da obtenção de uma apreciação bastante positiva sobre “a organização e gestão das escolas” e sobre as suas lideranças” (Ibid.: 4).

Referindo-se concretamente à criação do cargo de Diretor, Barroso (Ibid.: 6) afirmou que “A existência de um órgão de gestão unipessoal ou colegial não é, em si mesma, uma questão fundamental para a garantia da democraticidade, qualidade e eficácia do exercício das funções de gestão do topo de uma organização.” Nesse sentido, considerou que a solução consagrada no Decreto-Lei n.º 115/A-98, de permitir a cada escola a escolha entre as duas modalidades, unipessoal ou colegial, seria, no seu entender, a mais acertada.

No que concerne ao processo de designação deste órgão de administração e de gestão o autor viu como importante o facto de se ter conservado a obrigatoriedade de o Diretor ser um professor. Referiu igualmente que apesar deste projeto estabelecer que o Diretor seria eleito pelo Conselho Geral, o mesmo pressagiava uma certa desconfiança na

“(…) capacidade de juízo e de escolha dos membros do Conselho e introduz um sistema complementar para condicionar o livre juízo dos conselheiros, obrigando a um “procedimento concursal prévio à eleição” e à criação de uma comissão “especialmente designada para o efeito de elaborar um relatório de avaliação.”” (Ibid.: 7).

57

Considerou ainda, no seu estudo, que era essencial a votação ser individual e secreta, no sentido de os eleitores não sentirem nenhum constrangimento na livre escolha do candidato preferencial que consideram reunir as condições de uma melhor gestão escolar, acrescentando que estes são princípios essenciais da eleição democrática que “(…) o “procedimento concursal” nos termos em que é proposto parece querer pôr em causa.” (Ibid.: 8).

Finalmente, e no que respeita à cessação do mandato, Barroso considera que a possibilidade de esta poder ocorrer a todo o momento por despacho fundamentado de um membro do governo responsável pela área da educação, no seguimento de um processo de avaliação externa ou de uma ação de inspeção, pode ser causadora de um clima de desconfiança sobre a capacidade do Conselho Geral desempenhar as suas funções de “(…) órgão de direcção estratégica responsável pela definição das linhas orientadoras da actividade da escola.” (Id. Ibid.). Mais referiu que esta possibilidade só fazia sentido, se se quiser fazer da avaliação externa um instrumento de coação e de punição das atividades do Diretor.

Em suma, parece-nos que na perspetiva deste autor as razões apresentadas pelo Partido Socialista para a alteração do regime de autonomia, administração e gestão escolar que vigorava com o Decreto-Lei n.º 115-A/98 não se adequam aos princípios que se pretendiam estabelecer, ou seja, por um lado, nenhum estudo concluiu que as diretrizes do anterior regime impediam a concretização desses mesmos objetivos (constituição de lideranças fortes), por outro lado, nada assegurava que as mudanças que se queriam promover garantiam o alcance desses mesmos objetivos. Apesar das conclusões de João Barroso, no seu estudo encomendado pelo próprio Ministério da Educação, o governo decidiu avançar nas suas intenções e implementar o Decreto-Lei n.º 75/2008.

Documentos relacionados