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3.1 A Parte Diversificada do Currículo do Ensino Médio

Atendendo ao disposto no artigo 9º inciso IV da LDB 9394/96 e por solicitação do Ministério da Educação e do Desporto, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação emitiu o Parecer 15/98 sobre as propostas de regulamentação da base curricular nacional e de organização do Ensino Médio. Esse parecer, homologado pelo Sr. Ministro, resulta na Resolução CEB/CNE nº 3, de 26 de junho de 1998, que insituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio.

Com base nas DCNEMs, em 1999, o Ministério da Educação divulga, via Secretaria de Educação Média e Tecnológica, os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Com a finalidade de apresentar uma proposta curricular relacionada às competências indicadas na Base Nacional Comum, esse documento estrutura o currículo em três grandes áreas de conhecimento – Linguagens, Códigos e suas Tecnologias;

Ciências Humanas e suas Tecnologias e Ciências da Natureza, Matemática e suas

Tecnologias. As competências gerais são definidas por áreas de conhecimento e reunidas em interfaces de uma com as outras áreas. E as habilidades específicas a cada uma das disciplinas, também articuladas com as demais disciplinas da área, são subagrupadas nas categorias de investigação e compreensão (de caráter mais específico), de representação e

comunicação e de contextualização sócio-cultural e histórica.

Buscando a regulamentação da parte diversificada do currículo 8, transcrevo a seguir as informações colhidas nos PCNEMs.

Interdisciplinaridade e contextualização formam o eixo organizador da doutrina curricular expressa na LDB. Elas abrigam uma visão do conhecimento e das formas de tratá-lo para ensinar e para aprender, que permite dar significado integrador a duas outras dimensões do currículo, de forma a evitar transformá-las em novas dualidades ou reforçar as já existentes: Base Nacional Comum/parte diversificada, e formação geral/preparação para o trabalho.

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Contatei o MEC a fim de que me fossem sugeridas algumas fontes de pesquisa. A resposta foi de que eu deveria reportar-me aos PCNEMs e à legislação.

Os fundamentos axiológicos e as diretrizes pedagógicas explicitadas para o Ensino Médio aplicam-se tanto para a Base Nacional Comum quanto para a Parte Diversificada, haja vista que numa perspectiva de organicidade, integração e contextualização não faz sentido que elas estejam divorciadas. Buscando preservar a autonomia da proposta pedagógica dos sistemas e das unidades escolares para contextualizar os conteúdos curriculares de acordo com as características regionais, locais e da vida dos seus alunos, assim entendida, a parte diversificada é uma dimensão do currículo, e a contextualização pode ser a forma de organizá-la sem criar divórcio ou dualidade com a Base Nacional Comum.

A parte diversificada deverá, portanto, ser organicamente integrada à Base Nacional Comum para que o currículo faça sentido como um todo e essa integração ocorrerá, entre outras formas, por enriquecimento, ampliação, diversificação, desdobramento, podendo incluir todos os conteúdos da base nacional comum ou apenas parte deles, selecionados, nucleados em áreas ou não, sempre de acordo com a proposta pedagógica do estabelecimento.

A parte diversificada poderá ser desenvolvida por meio de projetos e estudos focalizados em problemas selecionados pela equipe escolar, de forma que eles sejam organicamente integrados ao currículo, superando definitivamente a concepção do projeto como atividade “extra” curricular.

Entendida nesses termos, a parte diversificada será decisiva na construção da identidade de cada escola, ou seja, pode ser aquilo que identificará as “vocações” das escolas e as diferenciará entre si, na busca de organizações curriculares que efetivamente respondam à heterogeneidade dos alunos e às necessidades do meio social e econômico.

A parte diversificada do currículo deve expressar as prioridades estabelecidas no projeto da unidade escolar e a inserção do educando na construção de seu currículo. Considerará as possibilidades de preparação básica para o trabalho e o aprofundamento em uma disciplina ou área, sob forma de disciplinas, projetos ou módulos em consonância com os interesses dos alunos e da comunidade a que pertencem.

Sempre que assim permitirem os recursos humanos e materiais dos estabelecimentos escolares, os alunos deverão ter a possibilidade de escolher os estudos,

projetos, cursos ou atividades da parte diversificada, de modo a incentivar a inserção do educando na construção de seu próprio currículo.

Os sistemas de ensino e escolas estabelecerão os critérios para que a diversificação de opções curriculares por parte dos alunos seja possível pedagogicamente e sustentável financeiramente.

O desenvolvimento da parte diversificada pode ocorrer no próprio estabelecimento de ensino ou em outro estabelecimento conveniado. Não implica profissionalização, mas diversificação de experiências escolares com o objetivo de enriquecimento curricular, ou mesmo aprofundamento de estudos, quando o contexto assim exigir. O seu objetivo principal é desenvolver e consolidar conhecimentos das áreas, de forma contextualizada, referindo-os a atividades das práticas sociais e produtivas.

Se a parte diversificada deve ter nome específico e carga identificável no horário escolar é uma questão a ser resolvida no âmbito de cada sistema e escola, de acordo com sua organização curricular e proposta pedagógica. Em qualquer caso, a Base Nacional Comum deverá ocupar, no mínimo, 75% do tempo legalmente estabelecido como carga horária mínima do Ensino Médio.

Convém acrescentar que as informações aqui prestadas foram compiladas de um compêndio distribuído pelo MEC, composto de quatro volumes, divididos em: 1. Bases Legais; 2. Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; 3. Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias; 4. Ciências Humanas e suas Tecnologias.

Referindo-se ao Parecer 15/98 da CEB/CNE, Ramos (2002) lembra que os princípios axiológicos defendidos na reforma se orientam pelas quatro grandes necessidades apresentadas pela UNESCO e se objetivam, na educação, pela estética da

sensibilidade (campo propício ao “aprender a conhecer”), pela política da igualdade (plano do “aprender a conviver”) e pela ética da identidade (princípio do “aprender a ser”). Mas a despeito do humanismo sugerido nesses princípios, a autora entende tratar-se de “um humanismo abstrato ou personalista”, pois à educação compete a orientação de condutas calcadas em valores individualistas e temporalmente localizados. Na sua opinião,

não há dúvidas de que no Parecer está presente a proposta de uma formação básica sólida, que contemple a compreensão dos princípios científico- tecnológicos e sócio-históricos que organizam a produção e as relações sociais

modernas, visando a formação de cidadãos tecnicamente competentes. No entanto, essa perspectiva educativa circunscreve-se a alguns limites quanto às possibilidades emancipatórias da classe trabalhadora (p.139).

No que respeita a outro documento da base legal da reforma, no dizer de Alice Casimiro Lopes (2002), “propostas curriculares oficiais, como os PCNEM, podem ser interpretadas como um híbrido de discursos curriculares produzidos por processos de recontextualização”, associando textos de matrizes teóricas distintas. Isso não significa, porém, relações mais democráticas. As ambigüidades criadas por esse hibridismo visam a legitimar as finalidades educacionais de formação para a inserção social no mundo produtivo globalizado, junto a diferentes grupos sociais, sejam aqueles que produzem matrizes teóricas ou os que trabalhem em sua implementação e análise.

Um exemplo que a autora cita diz respeito ao progressivismo de Dewey, recuperado em novas bases e refocalizado com a proposta de “educar é para a vida”, traduzido, nos PCNEM, como educação contextualizada. Seu entendimento é que, nos parâmetros, essa proposta associa-se a princípios eficientistas: a vida assume uma dimensão especialmente produtiva do ponto de vista econômico, a cujas teses Dewey se opôs, em detrimento de sua dimensão cultural mais ampla, (idem,ibidem).

Ainda que haja ações de resistências na prática pedagógica, a força de um cotidiano escolar não se constrói a despeito das orientações oficiais. As exigências do setor produtivo falam mais alto e consolidam a busca por competências superiores associadas ao pensamento mais abstrato, à capacidade de solução de problemas, ao desenvolvimento do pensamento crítico, à adaptação e à flexibilidade (idem, ibidem). Ou seja,

Permanece a finalidade de submeter a educação ao mundo produtivo. Prevalece a restrição do processo educativo à formação para o trabalho e para a inserção social, desconsiderando sua relação com o processo de formação cultural mais ampla, capaz de conceber o mundo como possível de ser transformado em direção a relações sociais menos excludentes (p.398).

Como visto, os argumentos apresentados referem-se à análise crítica que as autoras fizeram acerca de elementos discursivos presentes nos documentos que compõem a base legal da reforma e desnudam os interesses ideológicos que subjazem ao discurso.