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Particularidades da pesquisa em ambientes hospitalares e seus aspectos éticos

2 O PROCESSO METODOLÓGICO DA PESQUISA E A ELABORAÇÃO DA

2.5 Particularidades da pesquisa em ambientes hospitalares e seus aspectos éticos

A coleta de dados é a fase do processo investigativo em que a temática do estudo é desvendada sob o ponto de vista da história de vida dos sujeitos. Para que as expressões dos sujeitos possam fazer parte do processo de investigação e da construção de uma determinada produção teórica, o projeto de pesquisa deve ser avaliado e aprovado pela Comissão Científica de uma determinada Universidade e pelos Comitês de Ética das instituições, nas quais será realizada a etapa da pesquisa de campo.

O projeto de pesquisa que subsidiou a realização da tese Para além do cuidado hospitalar: significados do processo de hospitalização do idoso e o contexto da atenção domiciliar foi aprovado pela Comissão Científica da Faculdade de Serviço Social e, posteriormente, encaminhado ao Comitê de Ética da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul através da Plataforma Brasil, ferramenta que viabiliza a interlocução entre a academia e as instituições selecionadas pelo pesquisador para participarem do processo de coleta de dados. Nesse momento da pesquisa, observa-se a centralidade dos aspectos éticos para o desenvolvimento de qualquer processo investigativo, no que se refere ao contato com seres humanos. Essa formalidade esbarra em aspectos burocráticos, como a dependência da autorização de gestores, conforme critérios previamente estabelecidos pelos comitês de ética institucionais.

A pesquisa no Brasil depende do financiamento de agências de fomento e representa parte importante da produção de conhecimento e da formação acadêmica de inúmeros discentes. Entretanto, ainda carece de um entendimento da sociedade sobre a sua relevância, fato que contribui para o não incentivo à realização de processos investigativos em prol da preservação de aspectos éticos, como se as práticas institucionais permanecessem veladas e, dessa forma, não publicizadas. Do mesmo modo que se compreende a relevância da experiência dos sujeitos para a elucidação de fenômenos sociais, destaca-se a importância de que as experiências institucionais também sejam socializadas e não permaneçam ocultas em muros internos, pois representam a síntese da prática profissional apesar da complexidade que envolve as relações profissionais.

Não temos como negar a complexidade expressa na concretude das relações profissionais, ao mesmo tempo em que não podemos desconhecer a sua importância para a busca de novos conhecimentos, para a criação de outros procedimentos operacionais instrumentadores de conhecimentos elaborados dentro dos requisitos teóricos, fundamentados e enriquecidos por essa reconstrução que alimenta um outro agir profissional (SETUBAL, 2007, p. 17).

O incentivo à pesquisa está associado também ao estímulo à educação, ao conhecimento da realidade e fornece subsídios para a interpretação de fenômenos novos e que exigem do Estado a sua organização, como as transformações na estrutura da sociedade ocasionadas pelo envelhecimento populacional. Para que os processos investigativos se aproximem da realidade dos sujeitos, é imprescindível que fiquem claros os objetivos e as justificativas de qualquer pesquisa, sejam essas quantitativas ou qualitativas.

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido é o instrumento que preenche a lacuna entre os objetivos do estudo e a proposta do pesquisador em sua relação com o cotidiano dos sujeitos; demonstra, também, um comprometimento do pesquisador com os dados coletados e, principalmente, com os protagonistas das experiências reveladas. O documento deixa claro ainda que a identidade dos sujeitos do estudo será preservada e deverá ser mantida em sigilo. A subjetividade dos sujeitos torna-se visível na produção teórica consolidada, mediante os depoimentos que retratam as experiências vivenciadas. Os sujeitos do estudo, através de seus depoimentos sobre contextos particulares, contribuem com a formulação da produção teórica que se expande através da sua transformação em conhecimento. Por isso, a socialização de dados na pesquisa qualitativa torna-se tão essencial, pois tem o poder de desvendar determinados fenômenos através do olhar dos protagonistas dos processos sociais e, ao mesmo tempo, contribuir para a transformação da realidade.

A coleta de dados é o momento do processo investigativo em que os sujeitos reconhecem os propósitos do estudo, colocando-se à disposição do pesquisador para a realização de questionamentos e para o estabelecimento de uma relação de proximidade que a mobilização acerca do tema em comum proporciona. Nesse mesmo espaço, os sujeitos sensibilizam-se com o interesse do pesquisador em desvendar determinado contexto, e aproximam-se de suas próprias experiências e de sua subjetividade. Ao passo que representa uma importante etapa da pesquisa, a coleta de dados pode ser desenvolvida em contexto bastante determinado por rotinas e por significados complexos, como na internação hospitalar. A realização da coleta de dados em ambientes hospitalares requer o entendimento de toda a equipe sobre a importância do estudo e da preservação dos depoimentos, sem que haja qualquer tipo de constrangimento. É bem comum a realização de processos investigativos em ambientes hospitalares ser confundida com a avaliação dos serviços prestados ou como uma forma de denúncia quanto ao atendimento disponibilizado. Por esses motivos, torna-se tarefa complexa envolver a equipe no processo de coleta de dados, o qual sugere um comportamento natural e não prejudicial para o bom andamento das rotinas hospitalares. A falta de privacidade nas internações hospitalares, em decorrência da superexposição decorrente da organização estrutural dos leitos em instituições que realizam o serviço de alta complexidade, contribui para um distanciamento entre os sujeitos do estudo e o pesquisador. Esse distanciamento repercute, consequentemente, nos depoimentos dos sujeitos através da preservação de pontos de vista e histórias de vida.

Considera-se como o principal elemento, que caracteriza a realização de coletas de dados em ambientes hospitalares, o significado social do processo de hospitalização, que está associado a um processo de instabilidade física e de possível perda. Assim, pela sua complexidade, o pesquisador deve ter sensibilidade em identificar possíveis fragilidades, em situações nas quais os sujeitos não sentem-se aptos a expor determinadas situações, pois vivenciam o momento de extrema vulnerabilidade. A leitura dinâmica sobre determinada realidade vivenciada durante o processo de hospitalização torna-se essencial, por isso o necessário aporte da equipe profissional. O desvendamento da realidade vivenciada em instituições tão fechadas é fundamental para a formulação de proposições para esses espaços, que representam elementos significativos na vida dos sujeitos e profissionais da saúde.

No que se refere à construção desta tese, constata-se que a coleta de dados foi marcada pela sensibilização das equipes quanto à relevância do estudo e pela convivência com a manutenção das rotinas hospitalares. Não houve nenhuma negativa quanto à realização das entrevistas e do preenchimento do questionário, embora tenha se evidenciado sobremaneira o

interesse da pesquisadora, sendo que a coleta de dados e a análise de resultados foram materializadas mediante o empenho em desvendar a realidade e a relação entre os fenômenos. Um importante desafio da pesquisa, portanto, é sua passagem de contexto acadêmico para um interesse coletivo que pode ser materializado através da própria socialização das práticas profissionais, que extrapola muros internos e possibilita o reconhecimento de novas propostas interventivas.