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6. PRINCIPAIS TIPOS DE IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS

6.1 DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA

6.1.4 PATOGENESE DA DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA

Embora vários estudos venham sendo realizados no intuito de determinar a etiologia da SIgAD, a sua exata patogênese ainda não é totalmente conhecida. Uma vez que essa IDP tem uma natureza heterogênea, os achados sugerem que diferentes etiologias podem estar envolvidas no seu desenvolvimento. Dessa forma, a SIgAD tem sido associada a defeitos intrínsecos nas células B, a anormalidades nas células T e, mais recentemente, a alterações nas redes de citocinas envolvidas na troca de isotipos para IgA (YAZDANI et al., 2017).

A via de troca de classe de IgA dependente de células T só ocorre devido a interação de CD40 com CD40L e a presença de TGF-β1. A interação CD40L-CD40, induz a ativação do fator nuclear kappa da ativação (NF-κB) da célula B, que por sua vez ativa a expressão da enzima citidina desaminase induzida pela ativação (AID), uma enzima que age nos sítios de troca de isotipo de anticorpos. Porém, nessa interação dos LB com os LT, não basta a interação do CD40 com o CD40L para que a mudança de classe de anticorpos seja acionada, há necessidade também da ação de citocinas. No caso da IgA, essa citocina é TGF-β1, que é o sinalizador envolvido no processo troca para esse anticorpo (MURPHY; WEAVER, 2017).

O TGF-β1 tem um papel importante na indução da troca de isotipo para IgA por meio de diferentes fatores de transcrição, como SMADs, fator de transcrição 3 relacionado ao Runt (Runx3) e PU1 (BAGHERI et al., 2019). Para entender melhor o papel dos receptores de TGF-β1, estudos usaram modelos de camundongos com defeitos seletivos nos receptor I e II do TGF-β1 em células B. Camundongos com defeito no receptor II tinham uma maior deficiência de produção de IgA do que aqueles com defeito no receptor I (CAZAC & ROES, 2000; BORSUTZKY et al., 2004). Embora a diminuição da secreção de IgA no modelo de camundongos deficientes em receptor de TGF-β demonstre o possível papel dessa via na SIgAD humana, para esclarecer o

real papel dessa citocina na patogênese da SIgAD, estudos adicionais são necessários.

Como já citado, as proteínas SMAD, atuam como fatores de transcrição da via TGF-β1. Nesse sentido, camundongos deficientes em SMAD2 especificamente em células B, apresentam uma redução nos níveis de IgA (KLEIN et al., 2006). Por outro lado, a perda de SMAD7 nas células B resultou num aumento na produção de IgA, que se correlacionou com o pico de fosforilação de SMAD2 após estimulação com TGF-β (LI et al., 2006). Outro dado aponta que a super expressão de SMAD3 e SMAD4 em células B esplênicas aumenta a expressão de IgA (PARK, LEE & KIM, 2001), mas camundongos deficientes em SMAD3 foram relatados como tendo produção normal de IgA (YANG et al., 1999), indicando que in vivo, SMAD2 e SMAD3 podem executar funções redundantes e/ou SMAD2 possa ser o ativador dominante na troca de classe para classe IgA. Além desses fatores, os linfócitos de camundongos com deficiência de Rel-A (subunidade de NF-kB, também conhecida como p65) apresentam um defeito seletivo na secreção de IgG1 e IgA, o que sugere um candidato para estudos futuros (DOI et al., 1997). Portanto, defeito nos receptores de TGF-β e fatores de transcrição podem ter um papel importante na patogênese da SIgAD (BAGHERI et al., 2019).

Por outro lado, como já mostrado anteriormente, produção de IgA independente de células T ocorre por meio do envolvimento de diferentes receptores, fatores de transcrição e citocinas, como receptor de óxido nítrico (NO), ácido retinóico (RA), IL- 6, TACI, BAFF e APRIL (BAGHERI et al., 2019). TACI é uma proteína transmembrana da superfamília dos receptores do TNF, codificada pelo gene TNFRSF13B, tendo um papel importante nas respostas de anticorpo contra diferentes tipos de antígenos. Várias mutações polimórficas foram encontradas no gene TNFRSF13B em indivíduos com deficiência de IgA. Além disso, estudos têm mostrado que os camundongos nocautes de TACI têm baixos níveis séricos de imunoglobulinas, particularmente IgA e apresentam respostas imunes fracas a antígenos T independentes (VON BULOW et al., 2001; TSUJI et al., 2011). Outro estudo mostrou que a estimulação de células B murinas com APRIL in vitro via TACI estimulou a troca de isotipo para IgA, IgG e IgE nessas células, enquanto que células B deficientes para TACI não foram capazes de fazer troca de isotipo para IgA quando estimuladas por BAFF, outro ligante desse receptor, mas permaneceram com a capacidade de fazer a mudança de classe para IgG e IgE. Assim, esses dados sugerem que as interações dos ligantes ao receptor

TACI são necessárias para a produção de IgA (MACPHERSON et al., 2008, CASTIGLI et al., 2005), podendo alterações em TACI ou em seus ligantes, estarem envolvidos na patogênese da SIgAD.

Outro estudo mostrou que a mudança de classe para IgA é prejudicada em camundongos deficientes da enzima sintetase de óxido nítrico induzível (NOSi). O óxido nítrico (NO) é produzido pelas células dendríticas. Ele é produzido e está envolvido na via de sinalização para troca de classe para IgA, ou seja, ele sinaliza para a célula B que ela precisa produzir IgA. A transferência de células dendríticas (CDs), que são as boas produtoras de óxido nítrico, do tipo selvagem para os camundongos nocautes da NOSi, resgatou a produção de IgA nesses animais. Assim, devido ao importante papel das CDs no processo de troca de classe, defeitos na sinalização da NOSi podem estar envolvidos na patogênese do SIgAD (TEZUKA et al., 2007); no entanto, mais estudos sobre moléculas e fatores acima mencionados são necessários em humanos.

Do ponto de vista genético, 3 cromossomos, o 18, 14 e 6, foram significativamente associados à deficiência de IgA. Certos haplótipos de antígenos leucocitários humanos (HLA), tem sido associado à SIgAD. O sistema HLA codifica proteínas de superfície que reconhecem e apresentam antígenos próprios ou externos para o sistema imune adaptativo, essas proteínas são os MHCs I ou II (molécula de histocompatibilidade), então essas proteínas são de extrema importância na apresentação do antígeno da célula B para as células T auxiliares, para ocorrer a produção de imunoglobulinas. Isso ajuda a garantir o estabelecimento de células B de memória de longa duração produtoras de IgA. E também genes não-HLA, como os genes que codificam JAK3 e RAG1, têm sido associados à deficiência de IgA (BAGHERI et al., 2019).

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