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Imunodeficiências Primárias: Uma revisão sobre aquelas de maior prevalência na população.

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS

CURSO DE BIOMEDICINA

IANCA QUEIROZ ANDRADE

Imunodeficiências Primárias: Uma revisão sobre aquelas de maior prevalência na população.

NATAL Junho, 2019

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Imunodeficiências Primárias: Uma revisão sobre aquelas de maior prevalência na população.

por

IANCA QUEIROZ ANDRADE

Orientadora: Prof. Dra. Janeusa Trindade de Souto

NATAL Junho, 2019

Monografia Apresentada à Coordenação do Curso de Biomedicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como Requisito Parcial à Obtenção do Título de Bacharel em Biomedicina.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS CURSO DE BIOMEDICINA

A Monografia: Imunodeficiências Primárias: Uma revisão sobre aquelas de maior prevalência na população.

elaborada por Ianca Queiroz Andrade

e aprovada por todos os membros da Banca examinadora foi aceita pelo Curso de Biomedicina e homologada pelos membros da banca, como requisito parcial à obtenção do título de BACHAREL EM BIOMEDICINA Natal, 07 de junho de 2019 BANCA EXAMINADORA _________________________________________ Profª. Drª. Janeusa Trindade de Souto - Orientadora Departamento de Microbiologia e Parasitologia Universidade Federal do Rio Grande do Norte

_________________________________________ Profa. Dra. Fabiana Lima Bezerra

Departamento de Microbiologia e Parasitologia Universidade Federal do Rio Grande do Norte

_________________________________________ Me. Cássio Ricardo Medeiros de Souza

Instituto de Medicina Tropical

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Kaline e Chrystian, por sempre lutarem para que eu tivesse uma educação de qualidade e irem contra a opinião de todos me colocando nas melhores escolas para que eu tivesse uma boa formação. Além de toda dedicação e cuidado por toda minha vida.

À minha avó e meu avô por sempre terem nos ajudado nessa jornada da vida. Ao meu irmão Apolo, por não ter atrapalhado meus estudos depois que ficou grande, e um conselho: estude por que no final vale a pena.

Ao meu namorado, Arthur, por toda paciência do mundo nessa fase, por toda ajuda e carinho, e por ter me acalmado muitas vezes.

Ao meu cachorro, Jon Snow, por ser o animal mais amável desse mundo, por ter me proporcionado tantos momentos de felicidade.

À cantora, Beyoncé por ter me ajudado com as suas músicas perfeitas nos momentos mais difíceis e estressantes.

À minha orientadora Profa Dra. Janeusa Trindade, por toda paciência, todos os ensinamentos e por ter ajudado tanto no processo de escrita e correção, sem você esse TCC não teria saído. Realmente não tenho como agradecer, gratidão é o que sinto por você!

Aos membros da banca Profa. Dra. Fabiana Lima e ao Me. Cássio Ricardo, por terem aceitado participar do processo de avaliação.

Aos meus amigos de curso por toda ajuda acadêmica, risadas, momentos e por terem aguentado meu mau humor diário, sem vocês teria sido difícil aguentar.

À Deus e aos espíritos de luz que nos acompanham nessa jornada de evolução. Por fim, gostaria de agradecer a UFRN, por ser uma das melhores universidades do Norte/Nordeste, por ter sido minha casa durante esses 4 anos e meio, graças a investimentos na educação superior. Sem a UFRN eu não teria tido a chance de ter uma graduação de qualidade. Gratidão enorme, espero um dia poder retribuir.

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RESUMO

As imunodeficiências primárias são doenças causadas por falhas no sistema imunológico do indivíduo. Essas falhas podem ocorrer devido a problemas genéticos que impedem a expressão de proteínas cruciais para o desenvolvimento de células, de receptores e de moléculas envolvidas nas vias de sinalização bioquímicas. As imunodeficiências primárias são doenças subnotificadas principalmente em países em desenvolvimento como o Brasil, e que não possuem sistemas de notificação. Além disso, por serem doenças consideradas raras e pouco difundidas, não levantam suspeitas na comunidade médica, levando muitas vezes o paciente a óbito por não terem o tratamento correto. Dados epidemiológicos do Centro de Referências de Déficits francês (CEREDIH), registra uma prevalência de 4,4 pacientes por 100 mil habitantes, já dados dos Estados Unidos mostram uma prevalência de 1 para 1.200 pessoas, sendo a maior prevalência mundial. Na Europa, foram identificados 28 mil pacientes em mais de 125 centros médicos. Dados da Sociedade Latino Americana de Imunodeficiências (LASID), mostram que foram registrados 7.506 pacientes em abril de 2019 no continente latino-americano, sendo que o Brasil registrou 1.528 pacientes em seu banco de dados, nesse mesmo período. Das imunodeficiências primárias as mais prevalentes são as deficiências de anticorpos, sendo a mais comum a deficiência seletiva de IgA, seguida das síndromes bem definidas com imunodeficiência, destacando-se a Ataxia-telangiectasia como a mais prevalente. As deficiências de células T ou combinadas, estão em terceiro lugar como as imunodeficiências mais prevalente, sendo mais conhecidas como Imunodeficiência combinada grave (SCIDs), e por fim as deficiências nas células fagocitárias, como a Doença Granulomatosa Crônica, ambas aproximadamente com a mesma prevalência. A deficiência seletiva de IgA, que é relatada como a mais frequente, pode ocorrer de forma esporádica ou familiar, ou seja, com um gene hereditário, e já foram descritas heranças autossômicas recessivas e autossômicas dominantes. A Ataxia-telangiectsia é uma imunodeficiência de herança autossômica, causada por mutações no gene da ATM, uma proteína com papel essencial na regulação e sobrevivência celular. As deficiências de células T ou combinadas, são doenças complexas e que possuem diversos mecanismos a serem entendidos, pois um paciente que possua deficiência de células T não realizará a resposta imune mediada por células e pode ter alterada também a resposta humoral. Já as deficiências nas células fagocitárias, podem ser causadas por diversos fatores, como defeitos na migração das células até o sítio da infecção, ou a deficiência na produção de espécies reativas de oxigênio que matam os microrganismos dentro do fagolisossoma. Dessa forma é importante entender os mecanismos, os aspectos clínicos e tratamentos para essas doenças, pois a vida do paciente depende de um tratamento rápido e eficaz.

Palavras chave: Imunodeficiências primárias, revisão, epidemiologia, diagnóstico, tratamento.

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ABSTRACT

Primary immunodeficiencies are diseases caused by failures in the individual's immune system. These failures may occur because of genetic problems that prevent the expression of crucial proteins for the cell’s development, receptors, and molecules involved in biochemical signaling pathways. Primary immunodeficiencies are diseases mainly underreported in developing countries such as Brazil and do not have notification system. Moreover, because they are diseases considered rare and not widespread, they do not raise suspicion in the medical community, often leading to death due to the lack of correct treatment. Epidemiological data from the French Center for the Study of Deficits (CEREDIH) shows a prevalence of 4.4 patients per 100,000 inhabitants. Data from the United States show a prevalence of 1 to 1,200 people, the highest prevalence worldwide. In Europe, 28,000 patients were identified in more than 125 medical centers. Data from the Latin American Society for Immunodeficiency (LASID) show that 7,506 patients were registered in April 2019 in the Latin American continent, with Brazil registering 1,528 patients on its database in the same period. From the primary immunodeficiencies, the most prevalent are antibody deficiencies, being the most common from IgA deficiency, followed by well-defined immunodeficiency syndromes, highlighting Ataxia-telangiectasia as the most prevalent. T cell deficiencies or combined ones, are the third most prevalent immunodeficiencies and are more commonly known as Severe Combined Immunodeficiency (SCIDs), and finally deficiencies in phagocytic cells, such as Chronic Granulomatous Disease, both with approximately the same prevalence. The selective deficiency of IgA, which is reported as the most frequent, may occurs in sporadically or familiar way, that is, with a hereditary gene, and have been already described as autosomal recessive and autosomal dominant inheritances. Ataxia-telangiectsia is an autosomal inherited immunodeficiency, caused by mutations in the ATM gene, a protein with a crucial role for regulating and surviving cells. T cell deficiencies or combined ones are complex diseases and have several mechanisms to be understood because a patient who has T cell deficiency will not perform the cell-mediated immune response and may also have altered the humoral response. The deficiencies in phagocytic cells can be caused by several factors, such as cell migration defects to the site of infection, or deficiency in the production of reactive oxygen species that kill the microorganisms within the phagolysosome. In this way, it is important to understand the mechanisms, clinical aspects and treatments for those diseases, since the patient's life depends on a fast and effective treatment.

Key words: Immunodeficiencies, primary immunodeficiencies, review, epidemiology, diagnosis, treatment

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ÍNDICE LISTA DE ABREVIATURAS 9 LISTA DE FIGURAS 11 LISTA DE TABELAS 12 1. INTRODUÇÃO 13 2. OBJETIVO 16 3. METODOLOGIA 16

4. HISTÓRIAS DAS IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 17

5. ASPECTOS EPIDEMIOLOGICOS DAS IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 19 6. PRINCIPAIS TIPOS DE IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 28

6.1 DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA 30

6.1.1 A IMUNOGLOBULINA A (IgA) 30

6.1.2 TROCA DE CLASSE PARA IgA 32

6.1.3 DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA 34

6.1.4 PATOGENESE DA DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA 36 6.1.5 CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DOS PACIENTES COM SIgAD: 38

6.1.6 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE SIgAD 39

6.2 ATAXIA-TELANGIECTASIA 41

6.2.1 TELANGIECTASIA EM PACIENTES COM AT 44

6.2.2 ATAXIA-TELANGIECTASIA E IMUNODEFICIÊNCIAS 45 6.2.3 ATAXIA-TELANGIECTSIA E COMPLICAÇÕES NEUROLÓGICAS: 46

6.2.4 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE AT 47

6.3 IMUNODEFICIÊNCIA QUE AFETAM A IMUNIDADE CELULAR E HUMORAL 48

6.3.1 SCID LIGADA AO X (XSCID) 52

6.3.2 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA SCID 54

6.4 DEFEITOS NAS CÉLULAS FAGOCITÁRIAS 56

6.4.1 OS FAGÓCITOS 56

6.4.2 TIPOS DE DEFEITOS NAS CÉLULAS FAGOCITÁRIAS 57 6.4.3 MECANISMOS MICROBICIDAS DOS FAGÓCITOS DEPENDENTES DO O2 59

6.4.4 DOENÇA GRANULOMATOSA CRÔNICA 62

6.4.5 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 65

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS 68

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LISTA DE ABREVIATURAS

AD Autossômica Dominante

AID Citidina desaminase induzida por ativação

AR Autossômica Recessiva AT Ataxia-telangiectasia doença

ATM Ataxia-telangiectasia gene mutado BCR Receptor de células B

BRAGID Grupo Brasileiro de Imunodeficiências

BTK Tirosina quinase de Bruton CDs Células dendríticas

CGD Doença Granulomatosa Crônica

CSR Troca de classe de imunoglobulina CVID Imunodeficiência variável comum

ESID European Society for Immunodeficiencies

GVHD Doença do enxerto versus hospedeiro HLA Antígenos leucocitários humanos

HSC Células-tronco hematopoiéticas IDP Imunodeficiência Primária

IDS Imunodeficiência secundária IFN-ɣ Interferon gama

IgA Imunoglobulina A IgD Imunoglobulina D

IgG Imunoglobulina G

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IL-2 Interleucina 2 IL-4 Interleucina 4 IL-7 Interleucina 7 IL-9 Interleucina 9 IL-15 Interleucina 15 IL-21 Interleucina 21

IUIS Especialistas em Imunodeficiências Primárias da União Internacional de Sociedade Imunológicas

LASID Latin American Society for Immunodeficiencies MHC Complexo principal de histocompatibilidade

ROS Espécies reativas de oxigênio SCID Imunodeficiência combinada grave

SIgAD Deficiência seletiva de IgA

TCR Receptor de células T

TLRs Receptores semelhantes ao Toll

XLA Agamaglobulinemia ligada ao X XR Recessiva ligada ao X

XR-CGD CGD ligada ao X XSCID SCID ligada ao X

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Diferenças entre imunidade inata e adaptativa... 13

Figura 2 Prevalência das imunodeficiências primárias na Europa... ... 20

Figura 3 Prevalência estimada das imunodeficiências primárias no mundo.. ... 23

Figura 4 Número de casos de IDPs registrados na plataforma LASID em abril e maio de 2019.. ... 24

Figura 5 Número de casos de IDP registrados por país da América Latina até maio de 2019.. ... 26

Figura 6 Estruturas da IgA.. ... 31

Figura 7 As várias funções da IgA de mucosa.. ... 32

Figura 8 Mecanismos indutores da produção de IgA... 34

Figura 9 Mapa demonstrativo da frequência de SIgAD em populações ao redor do mundo. ... 35

Figura 10 Telangiectasia oculocutânea.. ... 42

Figura 11 Cascata de reparo do dano ao DNA, em consequência de radiação ionizante. ... 43

Figura 12 “O garoto da bolha”...49

Figura 13 Defeitos no desenvolvimento dos LT e dos LB que causam imunodeficiências ... 50

Figura 14 Diagrama mostrando os possíveis fenótipos e defeitos genéticos que podem ocorrer nas SCIDs T-B+ e T-B-. ... 51

Figura 15 Imagem mostrando os receptores de IL-2, IL-4, IL-7 e IL-9... 53

Figura 16 Imagem de um neutrófilo em sangue periférico e de um macrófago tecidual.. ... 56

Figura 17 Imagem mostrando a migração do monócito para o tecido.. ... 58

Figura 18 Fagocitose de neutrófilos e processo microbicida. ... 60

Figura 19 Representação diagramática das formas em repouso e ativada da NADPH oxidase fagocítica.. ... 61

Figura 20 Imagem ilustrando o processo de ingestão de microrganismos e a formação do fagolisossomo. ... 62

Figura 21 Doença inflamatório do intestino, em paciente com DGC.. ... 64

Figura 22 Citometria de fluxo em pacientes normal e paciente com DGC.. ... 66

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Número de pacientes com IDP acompanhados pela Jeffrey Modell Foundation entre 2013 e 2018 e alteração percentual por regiões. ... 22 Tabela 2. Número de casos reportados por centro, destaque para o Centro de IDP do Rio Grande do Norte.. ... 26 Tabela 3. Número de casos de IDP de acordo com o tipo da doença. ... 30

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1. INTRODUÇÃO

O sistema imunológico é fisiologicamente responsável pela defesa do corpo contra os microrganismos infecciosos ou mesmo contra substâncias estranhas não infeciosas e produtos de células danificadas. Dessa forma, a resposta do corpo contra esses agentes é mediada por dois tipos básicos de resposta imunológica: a imunidade inata e a imunidade adaptativa. Assim, quando um antígeno estranho entra no corpo sinais de células da imunidade inata podem gerar uma resposta imunológica adaptativa e dessa forma, uma resposta imunológica geralmente não age de forma independente, mas sim de forma interligada entre a imunidade inata e a adaptativa (MURPHY; WEAVER, 2017).

A imunidade inata é a primeira linha de defesa do corpo, com suas barreiras epiteliais, suas células (ex. fagócitos, células dendríticas, células linfóides inatas, células NK, etc) e suas proteínas plasmáticas (ex. proteínas do sistema complemento, proteína C reativa, proteína ligadora de manose, etc.). Já a imunidade adaptativa é a imunidade mediada pelos linfócitos T e B e anticorpos e sendo responsável pela memória imunológica de longa duração (Figura 1). A ativação dos linfócitos T e B por um antígeno é o principal evento da resposta da imunidade adaptativa (ABBAS, LICHTMAN & PILLAI, 2019).

Figura 1. Diferenças entre imunidade inata e adaptativa. Como se vê na figura a imunidade inata é a primeira linha de defesa, representada na figura pelas barreiras epiteliais, fagócitos, células dendríticas, mastócitos, sistema complemento e células NK. É o primeiro componente do sistema imune a chegar no organismo, nas primeiras

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horas de infecção, já a imunidade adaptativa representada na figura pelos linfócitos T, B e anticorpos, é ativada alguns dias após a infecção, resultando também em uma memória imunológica. Fonte: Abbas, Lichtman, Pillai (2019).

O correto funcionamento tanto da imunidade inata quanto da imunidade adquirida é essencial para a defesa contra organismos infecciosos e para sobrevivência de todos os indivíduos. Defeitos em um ou mais componentes do sistema imunológico pode levar a sérios problemas de saúde, podendo algumas vezes ser fatais. Esses defeitos são chamados de imunodeficiências (MURPHY; WEAVER, 2017).

Existem dois grupos de imunodeficiências, as primárias ou congênitas e as imunodeficiências secundárias ou adquiridas. As imunodeficiências primárias são causadas por defeitos genéticos em componentes que fazem parte do sistema imunológico e são classificadas com base no componente defeituoso envolvido. Dessa forma pode-se ter imunodeficiências afetando os componentes da imunidade inata, assim como aquelas que afetam os componentes da imunidade adaptativa (MURPHY; WEAVER, 2017). É importante ressaltar que defeitos na imunidade inata podem levar a defeitos na imunidade adaptativa e vice-versa.

Os defeitos da imunidade inata podem resultar em infecções por diferentes categorias de microrganismos, dependendo da via ou do tipo celular afetado. Esses defeitos podem acometer componentes do sistema complemento, componentes dos fagócitos, vias de sinalização de receptores semelhantes ao Toll (TLRs) ou defeitos em outras moléculas como os receptores da família NOD e moléculas envolvidas na migração dos fagócitos. Os defeitos da imunidade adaptativa por sua vez incluem imunodeficiências que comprometem células T ou B, nesse último caso com deficiência de anticorpos, ou imunodeficiências combinadas que são aquelas que comprometem ambas as imunidades mediadas pelas células T e B (MURPHY; WEAVER, 2017). Defeitos na imunidade humoral normalmente resultam em infecções por bactérias encapsuladas piogênicas e alguns tipos de vírus, já defeitos na imunidade celular levam às infecções por vírus e outros microrganismos intracelulares como as micobactérias e reativação de infecções latentes. As imunodeficiências combinadas, por sua vez, tornam os indivíduos susceptíveis a todas as classes de microrganismos (ABBAS, LICHTMAN & PILLAI, 2019).

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A descrição de imunodeficiências primárias (IDP) aumentou significativamente com o avanço dos métodos de detecção laboratoriais (SCHMIDT, GRIMBACHER & WITTE, 2017). Atualmente estão listadas mais de 300 IDPs, e nos últimos anos novos defeitos genéticos e doenças vem sendo descritas, aumentando ainda mais esse número (GOUDOURIS et al., 2017; PICARD et al., 2018). As formas mais graves das IDPs se apresentam normalmente na infância com insuficiência de crescimento e infecções graves, que são geralmente fatais (THRASHER & WILLIAMS, 2017). Embora as IDPs sejam doenças raras, tem sido observado aumento na sua incidência (PICARD et al., 2018).

As imunodeficiências secundárias (IDS), também conhecidas como adquiridas, são mais comuns. Esses tipos de imunodeficiências, como o nome diz, são adquiridas devido a fatores externos, como desnutrição, infecções das células do sistema imunológico, como aquela causada pelo HIV, câncer disseminado, como as leucemias e tratamento com drogas imunossupressoras (ABBAS, LICHTMAN & PILLAI, 2019). A desnutrição afeta principalmente a imunidade mediada por células. Um reflexo disso é que pessoas desnutridas morrem principalmente por infecções oportunistas

(MURPHY; WEAVER, 2017).Uma das explicações para esse fato pode ser a relação existente entre o sistema endócrino e o sistema imune, já que os adipócitos (células que armazenam gordura) produzem um hormônio chamado leptina, cujos níveis são diretamente proporcionais aos níveis de gordura no corpo. A leptina, além de seus efeitos primários na regulação da energia, atua na inibição de ingesta de alimentos e aumentando o gasto energético, verificou-se também seu papel regulador no sistema imune inato e adaptativo (ABBELA et al., 2017). Em relação à imunidade inata, a leptina aumenta a citotoxicidade das células natural killer (NK), induz a ativação de granulócitos (neutrófilos, basófilos e eosinófilos), macrófagos e células dendríticas. Na imunidade adaptativa, a leptina atua na estimulação da proliferação de células T e B naives e estimula a maturação dos linfócitos nos seus órgãos geradores. A leptina atua também estimulando a diferenciação dos linfócitos TCD4+ para os perfis Th1, Th2 e Th17, ao passo que diminui a diferenciação das células T reguladoras (Treg) (PROCACCINI et al., 2016). Dessa forma, deficiência na nutrição, causa diminuição nesse hormônio e consequentemente alterações nas respostas imunológicas.

Além da desnutrição, outras doenças também são responsáveis pelas IDSs, como tumores da medula óssea, incluindo cânceres com metástases para medula óssea e as leucemias que se desenvolvem na medula e que podem comprometer o

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desenvolvimento das células de defesa nesse órgão. Além disso, os tumores também podem produzir substâncias que podem interferir com o desenvolvimento e as funções dos linfócitos, alterando assim o correto funcionamento do sistema imunológico (ABBAS, LICHTMAN & PILLAI, 2019).

Normalmente as imunodeficiências possuem características clínicas muito variáveis, mas possuem uma em comum que é a presença de infecções recorrentes. A depender do tipo de imunodeficiência e de qual componente do sistema imunológico está deficiente, infecções recorrentes podem aparecer em estágios diferentes da vida do indivíduo, na infância ou até mesmo na vida adulta. Além de infecções, complicações não infecciosas como alergias, neoplasias malignas e doenças autoimunes também podem acometer pacientes com imunodeficiências a depender do tipo de defeito encontrado (RAGE & DINAKAR, 2015).

2. OBJETIVO

Levando em consideração a importância do conhecimento envolvendo os aspectos epidemiológicos e clínicos das imunodeficiências, esse trabalho tem como objetivo central a elaboração de uma revisão bibliográfica para esclarecer e explicar as imunodeficiências primárias de maior frequência na população mundial e seus principais aspectos, trazendo suas etiologias e seus mecanismos, para que elas sejam melhor entendidas e compreendidas. Isso é importante pois quanto mais cedo o diagnóstico ocorrer, mais rápida será a aplicação da terapêutica e melhor poderá ser a resposta ao tratamento, o que pode reduzir as chances do paciente vir a óbito por infecções oportunistas. O retardo no diagnóstico das imunodeficiências ocorre, provavelmente, devido ao baixo índice de suspeita de médicos comunitários sobre essas doenças, por isso a importância de se esclarecer melhor sobre o assunto e difundi-lo na comunidade biomédica.

3. METODOLOGIA

Diante do exposto, para esta revisão foi utilizada a literatura disponível em diversos bancos de dados da literatura biomédica, como livros didáticos, MEDLINE, PubMed, SciELO, periódicos CAPES e Google. Para a realização desta revisão foram considerados materiais de língua portuguesa e inglesa. Para a realização das buscas nesses bancos de dados foram utilizadas as seguintes palavras chaves: “historical primary immunodeficiency”, “primary immunodeficiency”, “imunodeficiência primária”.

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4. HISTÓRIAS DAS IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS

Antes da Segunda Guerra Mundial, embora os conhecimentos não fossem suficientes para se chegar a um diagnóstico de imunodeficiência, houve alguns relatos descrevendo síndromes clínicas características que anos depois foram categorizadas como imunodeficiências primárias. Os primeiros relatos que remetem às imunodeficiências, foram os achados neurológicos associados à telangiectasia conjuntival, descritos por Syllaba & Henner em 1926, e que 15 anos depois foram descritos por Madame Louis-Bar como característica da ataxia telangiectasia (OCHS & HITZIG, 2012), hoje sabidamente uma imunodeficiência. Em 1937, o Dr. Alfred Wiskott, pediatra alemão, descreveu casos clínicos de três irmãos que apresentavam trombocitopenia, diarreia sanguinolenta, eczema e otites de repetição. Todos morreram nos primeiros anos de vida devido à hemorragia intestinal e septicemia. O Dr. Wiskott associou a disfunção plaquetária como causa da hemorragia e ainda observou que, numa mesma família, os três irmãos do sexo masculino eram afetados, mas, as quatro irmãs não, elaborando a hipótese que esta síndrome era uma trombocitopatia hereditária, mas, na época, sem associação a algum defeito no sistema imunológico (OCHS & HITZIG, 2012).

Em 1950, dois patologistas, Eduard Glanzmann e Paul Riniker, descreveram um caso de duas crianças aparentadas com uma linfopenia progressiva, que segundo eles era consequência direta de infecções graves por Candida albicans. Eles não conseguiram estabelecer uma conexão com a imunodeficiência (OCHS & HITZIG, 2012).

Após 17 anos da descoberta do Dr. Wiskott, em 1954, Dr. Robert Aldrich e colaboradores acompanharam seis gerações de uma mesma família e observaram que dezesseis dos 40 homens morreram de uma doença semelhante à descrita pelo Dr. Wiskott. Da mesma forma, nenhuma paciente do sexo feminino apresentou esta evolução, sugerindo, desta forma, uma herança ligada ao cromossomo X. Esta condição foi denominada síndrome de Wiskott-Aldrich (WAS) após a descrição feita pelos dois médicos (MASSAAD, RAMESH & GEHA, 2013).

No entanto, o grande marco para a história das imunodeficiências primárias veio da descoberta do pediatra americano Ogden Carr Bruton, chefe de pediatria no Walter Reed Army Hospital, que descreveu o primeiro caso de agamaglobulinemia em

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uma criança do sexo masculino com infecções pneumocócicas recorrentes, relatada em 1952. Até aquela época, uma completa ausência de gamaglobulina no soro humano (com proteína total normal) nunca havia sido relatado. E Bruton foi mais longe, mostrou que que a suscetibilidade às infecções poderia ser corrigida pela administração de gamaglobulinas humanas, o que de fato representou a primeira evidência de uma relação direta entre gamaglobulinas e proteção contra infecções (BURGIO et al., 1991).

Em 1954, o grupo do Dr. Charles Janeway descreveu numa reunião científica casos de crianças do sexo masculino com hipergamaglobulinemia associada a infecções crônicas graves não específicas (JANEWAY et al., 1954). O Dr. Robert Good, da Universidade de Minesota, estava presente naquela e também havia observado pacientes semelhantes em sua instituição. Diante das situações, ele se questionou se a hipergamaglobulinemia seria o resultado e não a causa das infecções observadas naqueles pacientes. Com isso em mente, ele testou sua hipótese e descobriu doença granulomatosa crônica fatal da infância (DGC), publicando sua hipótese em 1959 (BRIDGES et al., 1959).

Em 1958, oito anos depois das descobertas de Glanzmann e Riniker, em que estudaram duas crianças com linfopenia progressiva, dois grupos suíços descreveram casos de crianças que morreram de infecções fúngicas e bacterianas graves e as autópsias mostraram que esses pacientes, dois deles primos dos pacientes do estudo de 1950 de Glanzmann e Riniker (crianças com linfopenia progressiva), apresentaram atrofia ou ausência de órgãos linfoides e desenvolvimento anormal de plasmócitos e linfócitos. Devido aos achados a doença foi denominada deficiência celular-humoral combinada. Em 1970, a OMS denominou essa doença de Imunodeficiência Combinada Grave ou SCID (do inglês, Severe Combined Immunodeficiency) (OCHS & HITZIG, 2012).

Nos últimos 69 anos, o campo das IDPs avançou muito. Com o advento da tecnologia genética de ponta, mais de 320 defeitos genéticos associados à IDPs foram identificados e o número continua aumentando (PICARD et al., 2018).

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5. ASPECTOS EPIDEMIOLOGICOS DAS IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS

A importância de se entender as imunodeficiências primárias (IDPs) é que são doenças de difícil diagnóstico e reconhecimento, diminuindo assim sua estimativa de incidência real. A distribuição e prevalências das IDPs é bastante variada entre as populações. No mundo alguns países como Irã, Austrália, Estados Unidos, França e outros países da Europa e 12 países da América Latina criaram registros para identificação da doença. Como por exemplo, têm-se o CEREDIH (Le Centre de Référence Déficits Immunitaires Héréditaires), o centro de referência francês que registrou em 2014 uma prevalência de 4,4 casos por 100 mil habitantes, já dados dos EUA mostram uma prevalência de 1 para 1.200 pessoas, sendo a maior prevalência mundial. Por outro lado, na Europa, o ESID (European Society for Immunodeficiencies) registra que foram identificados 28 mil pacientes em mais de 125 centros médicos (considerando que a Europa possui 741,4 milhões de habitantes) sendo o centro que mais registrou pacientes no banco de dados do ESID, foi o centro francês CEREDIH, com 5.426 pacientes registrados até 2014 (AMAYA-URIBE et al., 2019). O ESID também traz dados da prevalência das IDPs por país a cada 100.00 habitantes (Figura 2), com destaque para a França, Espanha, Suíça, Países Baixos, que possuem as maiores prevalências do continente (European Society for Immunodeficiencies, 2019).

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Figura 2 Prevalência das imunodeficiências primárias na Europa. Prevalência/100 mil habitantes, mostrando uma maior prevalência em países como França, Espanha, Suiça e Países Baixos. Fonte: European Society for Immunodeficiencies, 2019.

Nos Estados Unidos, a Fundação Jeffrey Modell (JMF), a fim de aumentar a conscientização sobre imunodeficiências primárias e com o objetivo geral de reduzir a morbidade e mortalidade associadas a essas doenças, estabeleceu uma rede de centros especializados para identificar, diagnosticar, tratar e acompanhar melhor os pacientes com IDPs. Na última década, a Rede de Centros Jeffrey Modell (JMCN, do inglês Jeffrey Modell Centers Network) disponibilizou uma infraestrutura para aceitar referências, fornecer diagnósticos e oferecer tratamentos. Atualmente, a rede consiste de 792 especialistas médicos em 358 instituições, em 277 cidades do mundo e 86 países em 6 continentes. Para avaliar a prevalência geral de pacientes acompanhados

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e identificados com uma imunodeficiência específica na JMCN, a prevalência relatada por médicos entre os sites da Rede de 2013 foi comparada com a de 2018. De modo geral, o número de pacientes acompanhados nesse período, na JMCN, aumentou em 57% nos EUA e 35,4% no mundo.

Para identificar tendências regionais das IDPs, o número de pacientes seguidos pela JMCN nos últimos 5 anos (2013 a 2018) foi comparado em nove diferentes regiões do mundo. Dessa forma, quando se avalia o número de paciente acompanhados em 2013 e compara com 2018, observa-se que houve um aumento bastante significativo principalmente na Austrália (2,071.6%) e América Latina (132.2%), seguidos pelos Estados Unidos com 57% de aumento (Tabela 1, lado esquerdo). É interessante notar que na Ásia houve uma redução no percentual de pacientes acompanhados. O estudo não discute o dado, mas por se tratar de IDPs pode se relacionar à mortalidade dos pacientes e uma falta de procura de novos pacientes pelos centros de referência.

A tabela 1 também traz dados sobre o número de pacientes identificados com IDP específicas nos últimos 5 anos. Acompanhando os dados globais, na Austrália houve um aumento de quase 2 mil pontos percentuais de pacientes identificados com IDP específicas, na América Latina esse aumento foi de 64%, nos EUA houve aumento de 32,5%, no Oriente Médio de 29,6%, na Ásia e na África esse aumento foi de 27,9% e 25,5%, respectivamente (MODELL et al., 2018). De modo interessante houve uma redução no percentual de pacientes identificados com IDP específicas no Canadá e na Europa oriental. Da mesma forma, que nos dados globais, o estudo não detalha o possível motivo para essa ocorrência, mas como falado anteriormente, pode se relacionar à mortalidade dos pacientes e uma falta de procura de novos pacientes pelos centros de referência.

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Tabela 1. Número de pacientes com IDP acompanhados pela Jeffrey Modell Foundation entre 2013 e 2018 e alteração percentual por regiões.

OBS: À direita a tabela mostra a quantidade de pacientes identificados com IDP entre 2013 e 2018 e à esquerda são dados por IDP específicas (de acordo com o defeito que causa a IDP). Fonte: MODELL et al., (2018).

Dentre as IDPs, as que possuem maior número de notificações por órgãos de notificação são as Deficiências predominantemente de Anticorpos, as síndromes bem definidas com imunodeficiência, as imunodeficiências combinadas e os defeitos congênitos dos fagócitos, essas duas últimas apresentando a mesma incidência (Figura 3). Por serem as mais comuns, este trabalho irá focar as doenças mais prevalentes desses 4 tipos de IDPs.

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Figura 3 Prevalência estimada das imunodeficiências primárias no mundo. Gráfico mostrando a prevalência estimada das imunodeficiências primárias no mundo. Fonte: CONDINO-NETO et al., (2015).

Na América Latina existe a Sociedade Latinoamericana de Imunodeficiências (LASID), que relata 3.321 pacientes, destes 53,2% possuem deficiências de anticorpos (AMAYA-URIBE et al., 2019).

Em maio de 2019, o sistema da LASID registrou 7.559 casos de pacientes com IDPs (Figura 4) desde sua criação (dado atualizado até maio de 2019). Como comparativo, entre abril e maio de 2019, o LASID tinha 7504 casos registrados em abril, tendo um aumento 55 casos registrados em maio.

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Figura 4 . Número de casos de IDPs registrados na plataforma LASID em abril e maio de 2019. Fonte: LASID (Latin American Society for Immunodeficiencies) (2019), disponível em: https://lasid.org/homepage (opção PID registry).

Os países que estão registrados na plataforma são Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, República Dominicana, Equador, Guatemala, Honduras, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. Fazendo uma avaliação de como ocorre a distribuição das IDPs entre esses países, temos os dados apresentados na figura 5, mostrado que a Argentina (2.565 pacientes), o México (1.698 pacientes) e o Brasil (1.530 pacientes) são os países que apresentam os maiores números de pacientes registados na plataforma da LASID. Embora a população do Brasil seja maior que as da Argentina e do México somadas, e que teoricamente poderia ter bem mais pacientes com IDPs, não observamos essa relação. Isso pode ser devido a problemas no correto diagnóstico de IDPs ou uma subnotificação dessas doenças no nosso país, fato esse que precisa ser cuidadosamente avaliado pelas políticas públicas de saúde do governo brasileiro.

No Brasil, o Grupo Brasileiro de Imunodeficiência (BRAGID, do inglês Brazlian Group for Immunodeficiency), conseguiu que a “Consolidação do Registro Eletrônico para o Armazenamento de Fenótipos e Genótipos de Pacientes com Imunodeficiências Primárias na América Latina", fosse aprovado pelo Conselho Nacional de Saúde do Brasil, para início imediato do Registro Internacional de Imunodeficiências Primárias da América Latina, juntamente com o LASID

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NETO, 2008). Então, com esse registro temos dados importantes sobre o registro de IDPs no nosso país.

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Figura 5 Número de casos de IDP registrados por país da América Latina até maio de 2019. Gráfico mostrando o número de casos de IDP já registrados na plataforma do LASID, desde a sua criação, pelos países da América Latina, com destaque para o Brasil. Fonte: Fonte: LASID (Latin American Society for Immunodeficiencies) (2019), disponível em: https://lasid.org/homepage (opção PID registry).

De acordo com os dados da LASID (Tabela 2), no estado do Rio Grande do Norte, o Centro de Imunodeficiências Primárias (Centro de IDP), que funciona no Hospital Universitário Onofre Lopes, é responsável por lançar os dados na plataforma na qual há o registro de 16 pacientes até maio desse ano.

Tabela 2. Número de casos reportados por centro, destaque para o Centro de IDP do Rio Grande do Norte. Fonte: LASID (Latin American Society for Immunodeficiencies) (2019), disponível em: https://lasid.org/homepage (opção PID registry).

O centro do termo representa cada instituição (hospital, universidade) devidamente autorizada a participar do registro PID do LASID.

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A dificuldade de diagnóstico em países em desenvolvimento como o Brasil, que não possui um sistema próprio de notificação e difusão da doença, dificulta que os números reais de pacientes com IDPs sejam registrados, por isso a importância de se conhecer e difundir ainda mais os tipos de IDPs, na comunidade médica e biomédica.

Para maior esclarecimento da população, a Fundação Jeffrey Modell lançou junto com a Cruz Vermelha Americana os 10 sinais de alerta para IDPs em crianças, que foi adaptado para cada país de acordo com as doenças mais comuns, e eles são:

1. Duas ou mais Pneumonias no último ano; 2. Oito ou mais novas Otites no último ano;

3. Estomatites de repetição ou Monilíase por mais de dois meses; 4. Abscessos de repetição ou ectima;

5. Um episódio de infecção sistêmica grave (meningite, osteoartrite, septicemia); 6. Infecções intestinais de repetição / diarreia crônica;

7. Asma grave, Doença do colágeno ou Doença autoimune; 8. Efeito adverso ao BCG e/ou infecção por Micobactéria;

9. Fenótipo clínico sugestivo de síndrome associada a Imunodeficiência; 10. História familiar de imunodeficiência. Fonte: BRAGID (2019).

Além dos 10 sinais de alerta para IDP em crianças, foi lançado os 10 sinais de alerta para IDP em adultos, e eles são:

1. Duas ou mais Pneumonias no último ano; 2. Oito ou mais novas Otites no último ano;

3. Estomatites de repetição ou monilíase por mais de dois meses; 4. Abscessos de repetição ou ectima;

5. Um episódio de infecção sistêmica grave (meningite, osteoartrite, septicemia); 6. Infecções intestinais de repetição/diarréia crônica;

7. Asma grave, Doença do colágeno ou Doença autoimune; 8. Efeito adverso ao BCG e/ou infecção por Micobactéria;

9. Fenótipo clínico sugestivo de síndrome associada a Imunodeficiência; 10. História familiar de imunodeficiência.

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6. PRINCIPAIS TIPOS DE IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS

Um Comitê de Especialistas em Imunodeficiências Primárias da União Internacional das Sociedades Imunológicas (IUIS), se reuniu em fevereiro de 2017 para atualizar a classificação das IDPs (PICARD et al., 2018), que foram classificadas como segue:

1. As imunodeficiências que afetam a imunidade celular e humoral ou combinadas, ou sejam que afetam as células T e B e os anticorpos (Exemplos: T-B-SCID com ausência de linfócitos T e B, T-B+SCID com ausência de linfócitos T e presença de linfócitos B, Deficiências de RAG-1 ou de RAG-2 (enzimas que desempenham papel importante no rearranjo e recombinação dos genes das imunoglobulinas e do receptor de células T), Deficiência de CD40 ou de CD40L (ligantes importantes na sinalização entre linfócitos T e B); deficiência da cadeia c do receptor da IL-2, etc)

2. As imunodeficiências combinadas com características sindrômicas, também chamadas de síndromes bem definidas com imunodeficiência (Exs: Síndrome de Wiskott-Aldrich (doença decorrente de imunodeficiência do tipo hereditária, caracterizada pela produção anormal de anticorpos , células T anormais, por uma quantidade reduzida de plaquetas e por eczema.), Ataxia-telangiectaisa (caracterizada por problemas na marcha (ataxia), imunodeficiência variável,e outras características), Síndrome de DiGeorge (causada pela deleção de um pequeno pedaço do cromossomo 22, causando também imunodeficiência, devido à ausência de timo), etc;

3. As deficiências predominantemente de anticorpos (Ex: Agamaglobulinemia ligada ao X, Deficiência Imunológica variável Comum - CVID, Deficiência seletiva de IgA, Deficiência da enzima desaminase induzida por ativação - AID ou Síndrome da hiper IgM, etc);

4. As doenças de desregulação imune. Exs: Deficiência de FoxP3 (uma proteína reguladora do sistema imune, que em sua ausência causa o comprometimento no desenvolvimento de células T reguladoras), deficiência de CD25 (cadeia alfa do receptor de IL-2, molécula de expressão essencial para o desenvolvimento de linfócitos T), deficiência de CTLA-4 (proteína 4 associada a linfócitos T citotóxicos é um receptor proteico que funciona como checkpoint imunológico e regula negativamente as respostas imunes), etc;

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5. Defeitos de número ou função de fagócitos. Exs: deficiência de elastase (proteína liberada dos grânulos primários dos neutrófilos ajudando a matar os microrganismos), deficiência de adesão de leucócitos, fibrose cística, doença granulomatosa crônica, etc;

6. Defeitos na imunidade intrínseca e inata. Exs: deficiência da cadeia β1 dos receptores de IL-12 e IL-23 (essencial para a via de sinalização dessas citocinas), deficiência da subunidade p40 da IL-12 e IL-23, deficiência do receptor 1 ou do receptor 2 de IFN-ɣ, deficiência de STAT1, etc;

7. Doenças autoinflamatórias. São doenças que afetam molécula envolvidas na produção de citocinas inflamatórias, como os inflamossomas, ocorrendo mutações com ganho de função nessas moléculas e produção excessiva dessas citocinas. (Exs: Febre mediterrânea familiar, Síndrome de Blau, Síndrome de Muckle-Wells, Síndrome autoinflamatória de frio familiar 1, etc)

8. Deficiências de complemento. Exs: Deficiência de C1INH (atua como um regulador da ativação da via clássica do sistema de complemento), Deficiência de C8, Deficiência de CD59, etc;

9. Fenocópias de erros inatos da imunidade, que ocorrem quando um fenótipo, produzido pelo ambiente, simula o efeito de uma conhecida mutação. Exs: Síndrome linfoproliferativa autoimune, Criopirinopatia, Candidíase mucocutânea crônica, etc.

Dessa forma, é importante entender onde se encaixam as doenças que serão abordadas neste trabalho. Como mostrado na figura 2, as IDPs com maior prevalência na população são as imunodeficiências predominantemente de anticorpos, as síndromes bem definidas com imunodeficiência ou imunodeficiências combinadas com características sindrômicas, as deficiências de células T e B ou combinadas e as deficiências dos fagócitos. As deficiências predominantes de anticorpos são o tipo mais frequente de distúrbios de IDP, com mais de 13.000 pacientes sintomáticos registrados globalmente (aproximadamente 20% de todos os pacientes com IDP relatados até o momento) (BAGHERI et al., 2019). De acordo com os dados obtidos no site da LASID (Tabela 3), das imunodeficiências predominantemente de anticorpos, a que apresentou o maior número de casos registrado em maio de 2019 foi a deficiência seletiva de IgA. Sobre as imunodeficiências combinadas com características sindrômicas, a que apresentou o maior número de casos foi a ataxia-telangiectasia. Já nas deficiências de Células T e B ou combinadas, as que se

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destacaram foram as SCIDs T negativa, B negativa (T-B-SCID) com o defeito genético desconhecido e T negativa, B positiva (T-B+SCID) com o defeito genético desconhecido e aquelas cujo defeito é na cadeia  comum (c) compartilhada pelos receptores das interleucinas 2, 4, 7, 9 e 15. Por fim, a doença que teve maior registro de casos entre as deficiências dos fagócitos foi a Doença Granulomatosa Crônica (CGD, do inglês chronic granulomatous disease) com defeito genético desconhecido, seguida pela CGD ligada ao X (defeito na gp91phox).

Tabela 3. Número de casos de IDP de acordo com o tipo da doença. Fonte: LASID (Latin American Society for Immunodeficiencies) (2019), disponível em: https://lasid.org/homepage (opção PID registry).

6.1 DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA

6.1.1 A IMUNOGLOBULINA A (IgA)

A IgA é o segundo isotipo dominante na circulação sanguínea, depois da IgG e o predominante nas secreções mucosas. Esse anticorpo pode ser encontrado nas formas monomérica, dimérica e até trimérica e quadrimérica, que são mais raras (SCHROEDER & CAVACINI, 2010). A IgA da circulação sanguínea está na forma monomérica, enquanto a IgA dimérica está presente nas secreções mucosas. A estrutura da IgA monomérica apresenta 2 cadeias pesadas, cada uma consistindo de

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uma região variável e 3 regiões constantes, e 2 cadeias leves, cada uma composta por região uma variável e uma região constante (Figura 6A). A IgA dimérica é formada por dois monômeros de IgA unidos pela cadeia J através de ligações dissulfídricas (Figura 6B) (SCHROEDER & CAVACINI, 2010; MURPHY; WEAVER, 2017).

A B

Figura 6 Estruturas da IgA. Em A: IgA monomérica. Em B: IgA dimérica, formada pelo seus dois monômeros, unidos por pontes dissulfídricas com a cadeia J. Fonte: (MURPHY; WEAVER, 2017).

Em humanos existem duas subclasses de IgA: a IgA1 e a IgA2, cujas estruturas diferem principalmente em suas regiões de dobradiça. A IgA1 tem uma região de dobradiça mais longa com um trecho duplicado de aminoácidos que não existe na IgA2. Esta região de dobradiça alongada aumenta a sensibilidade da IgA1 às proteases bacterianas, apesar da proteção parcial fornecida pelos glicanos. Essa proteção aumentada contra a digestão de proteases pode explicar porque a IgA2 predomina nas muitas secreções mucosas, enquanto que mais de 90% da IgA sérica está na forma de IgA1 (SCHROEDER & CAVACINI, 2010). Dessa forma a razão de IgA1 para IgA2 no sangue e trato respiratório superior é de 10:1, no intestino delgado é de 3:2 e no cólon é de 2:3 (MURPHY; WEAVER, 2017).

A IgA é fundamental para proteger as superfícies das mucosas contra toxinas, vírus e bactérias por neutralização direta ou por impedir a ligação à superfície da mucosa (Figura 6, painel A). A IgA pode agir também durante seu transporte, neutralizando patógenos no endossomo (Figura 7, painel B). Pode ainda se ligar aos

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microrganismos ou suas toxinas na lâmina própria e transportá-los de volta ao lúmen da mucosa (Figura 7, painel C) e pode auxiliar na ativação das células dendríticas (Figura 7, painel D). Diariamente 3 a 4 g de IgA são secretadas nos tecidos mucosos, sendo a maior quantidade de imunoglobulinas produzidas no corpo. E essa grande quantidade de IgA é produzida mesmo na ausência de patógenos invasores, ocorrendo normalmente devido ao contato das células B com produtos da microbiota comensal (MURPHY; WEAVER, 2017).

Figura 7 As várias funções da IgA de mucosa. Painel A: neutralização de toxinas e patógenos na superfície das mucosas. Painel B: neutralização de antígenos internalizados nos endossomos durante seu transporte vesicular. Painel C: IgA pode ligar a patógenos e toxinas na lâmina própria e transportá-los ao lúmen da mucosa para sua eliminados. Painel D: IgA ligado a seu antígeno no lúmen, interage com dectina-1 e é transportada para a lâmina própria onde interage com as CDs. Fonte: (MURPHY; WEAVER, 2017).

6.1.2 TROCA DE CLASSE PARA IgA

Para que haja a produção de IgA é necessário o processo de troca de classe de anticorpos, produção e secreção de IgA, e sobrevivência a longo prazo de linfócitos B de memória e plasmócitos de vida longa. Essas etapas podem ser afetadas por

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defeitos genéticos, citocinas e seus receptores, e também pela microbiota intestinal (BAGHERI et al., 2019).

Como mostrado na figura 8, a troca de classe para IgA no intestino ocorre por duas vias: a via dependente de células T, que ocorre no centro germinativo das placas de Peyer (tecido linfoide secundário logo abaixo do epitélio intestinal) e necessita da interação de células B e T CD4+. Essa interação permite a ligação do CD40 presente nas células B e o CD40 ligante (CD40L) presente nas células T, que envia o sinal de troca de isotipos para as células B e TGF-β1 que sinaliza para troca de classe para IgA (BAGHERI et al., 2019; ABBAS, LICHTMAN & PILLAI, 2019). Já a via de troca de classe independente de célula T, ocorre por envolvimento de diferentes receptores, fatores de transcrição e moléculas como óxido nítrico, ácido retinóico (AR), IL-6, ativador transmembrana e modulador do cálcio interativo do ligante da ciclofilina (TACI, do inglês transmembrane activator and calcium-modulator and cyclophilin ligand interactor), Fator de ativação de células B (BAFF, do inglês B cell activating fator) e um ligante indutor de proliferação (APRIL, do inglês a proliferation-inducing ligand). Essas moléculas podem ser produzidas por células dendríticas e macrófagos, as quais podem promover sinais co-estimuladores e de sobrevivência para a ativação de células B e troca de classe para IgA. Após a mudança de classe, células dendríticas e células epiteliais secretam APRIL, BAFF e IL-10 que estimulam os plasmócitos a produzirem e secretarem a IgA secretora. O TGF-β1 desempenha o seu papel via os fatores de transcrição SMADs e RUNX3 para induzir a troca de classe para IgA (BAGHERI et al., 2019).

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Figura 8 Mecanismos indutores da produção de IgA: Círculo laranja: a via dependente de células T ocorre no centro germinativo e necessita da interação de células B e T CD4 através de CD40-CD40L e da produção TGF-β1. Círculo verde: na via T independente, a troca de isotipo para IgA ocorre por envolvimento de diferentes receptores, fatores de transcrição e moléculas como óxido nítrico, ácido retinóico, IL-6, TACI, BAFF, APRIL e TSLP na lâmina própria. O TGF-β1 desempenha o seu papel via SMADs, RUNX3, para induzir a troca para IgA. As DCs agem nas duas vias por captura de antígeno e apresentação ou secreção de citocinas. Após a mudança de classe, DCs e células epiteliais continuam produzindo APRIL, BAFF e IL-10 que induzem a diferenciação dos palsmócitos. Fonte: BAGHERI et al., 2019.

6.1.3 DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA

A deficiência seletiva de imunoglobulina A (SIgAD, do inglês Selective IgA deficiency), é a mais prevalente das IDPs, sendo caracterizada pela diminuição do

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nível sérico de IgA menor que 7 mg/dL (níveis normais 35 mg/dL) em indivíduos com mais de 4 anos, com níveis normais de IgM e IgG no soro e exclusão de outras causas de hipogamaglobulinemia (YEL, 2010). Porém, em pacientes com deficiência de IgA que desenvolvem infecções recorrentes, pode ser associada a um defeito na subclasse IgG2 também (MURPHY; WEAVER, 2017).

A incidência mundial da SIgAD varia dependendo da origem étnica (Figura 9), sendo 1:143 na Península Arábica, 1:163 na Espanha, 1: 252 na Nigéria, 1:875 na Inglaterra e 1:965 no Brasil. A incidência é menor entre as populações asiáticas, por exemplo, de 1: 2.600 para 1: 5.300 na China e de 1:14.840 a 1:18.500 no Japão. Em geral, a deficiência de IgA é mais comum em caucasianos. Nos EUA, a frequência é estimada de 1:223 a 1:1.000 em estudos comunitários e de 1:333 a 1:3.000 entre doadores de sangue saudáveis. (YAZDANI et al., 2017).

Figura 9 Mapa demonstrativo da frequência de SIgAD em populações ao redor do mundo. Países vermelho com uma frequência maior que 1:500. Países amarelos com uma frequência entre 1:1.000 e 1:500. Países verdes com uma frequência entre 1:10.000 e 1:1.000. Países azuis com uma frequência entre 1:20.000 e 1:10.000. Fonte: Yazdani et al. (2017).

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Esses relatos podem ser maiores, pois muitos indivíduos com SIgAD são assintomáticos e não há um programa de rastreamento de rotina estabelecido para a deficiência de IgA. Além disso, em países com altas taxas de casamentos consanguíneos, a taxa de casos múltiplos desse tipo de IDP em uma família é maior do que nos outros países (YEL, 2010; YAZDANI et al., 2017).

6.1.4 PATOGENESE DA DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA

Embora vários estudos venham sendo realizados no intuito de determinar a etiologia da SIgAD, a sua exata patogênese ainda não é totalmente conhecida. Uma vez que essa IDP tem uma natureza heterogênea, os achados sugerem que diferentes etiologias podem estar envolvidas no seu desenvolvimento. Dessa forma, a SIgAD tem sido associada a defeitos intrínsecos nas células B, a anormalidades nas células T e, mais recentemente, a alterações nas redes de citocinas envolvidas na troca de isotipos para IgA (YAZDANI et al., 2017).

A via de troca de classe de IgA dependente de células T só ocorre devido a interação de CD40 com CD40L e a presença de TGF-β1. A interação CD40L-CD40, induz a ativação do fator nuclear kappa da ativação (NF-κB) da célula B, que por sua vez ativa a expressão da enzima citidina desaminase induzida pela ativação (AID), uma enzima que age nos sítios de troca de isotipo de anticorpos. Porém, nessa interação dos LB com os LT, não basta a interação do CD40 com o CD40L para que a mudança de classe de anticorpos seja acionada, há necessidade também da ação de citocinas. No caso da IgA, essa citocina é TGF-β1, que é o sinalizador envolvido no processo troca para esse anticorpo (MURPHY; WEAVER, 2017).

O TGF-β1 tem um papel importante na indução da troca de isotipo para IgA por meio de diferentes fatores de transcrição, como SMADs, fator de transcrição 3 relacionado ao Runt (Runx3) e PU1 (BAGHERI et al., 2019). Para entender melhor o papel dos receptores de TGF-β1, estudos usaram modelos de camundongos com defeitos seletivos nos receptor I e II do TGF-β1 em células B. Camundongos com defeito no receptor II tinham uma maior deficiência de produção de IgA do que aqueles com defeito no receptor I (CAZAC & ROES, 2000; BORSUTZKY et al., 2004). Embora a diminuição da secreção de IgA no modelo de camundongos deficientes em receptor de TGF-β demonstre o possível papel dessa via na SIgAD humana, para esclarecer o

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real papel dessa citocina na patogênese da SIgAD, estudos adicionais são necessários.

Como já citado, as proteínas SMAD, atuam como fatores de transcrição da via TGF-β1. Nesse sentido, camundongos deficientes em SMAD2 especificamente em células B, apresentam uma redução nos níveis de IgA (KLEIN et al., 2006). Por outro lado, a perda de SMAD7 nas células B resultou num aumento na produção de IgA, que se correlacionou com o pico de fosforilação de SMAD2 após estimulação com TGF-β (LI et al., 2006). Outro dado aponta que a super expressão de SMAD3 e SMAD4 em células B esplênicas aumenta a expressão de IgA (PARK, LEE & KIM, 2001), mas camundongos deficientes em SMAD3 foram relatados como tendo produção normal de IgA (YANG et al., 1999), indicando que in vivo, SMAD2 e SMAD3 podem executar funções redundantes e/ou SMAD2 possa ser o ativador dominante na troca de classe para classe IgA. Além desses fatores, os linfócitos de camundongos com deficiência de Rel-A (subunidade de NF-kB, também conhecida como p65) apresentam um defeito seletivo na secreção de IgG1 e IgA, o que sugere um candidato para estudos futuros (DOI et al., 1997). Portanto, defeito nos receptores de TGF-β e fatores de transcrição podem ter um papel importante na patogênese da SIgAD (BAGHERI et al., 2019).

Por outro lado, como já mostrado anteriormente, produção de IgA independente de células T ocorre por meio do envolvimento de diferentes receptores, fatores de transcrição e citocinas, como receptor de óxido nítrico (NO), ácido retinóico (RA), IL-6, TACI, BAFF e APRIL (BAGHERI et al., 2019). TACI é uma proteína transmembrana da superfamília dos receptores do TNF, codificada pelo gene TNFRSF13B, tendo um papel importante nas respostas de anticorpo contra diferentes tipos de antígenos. Várias mutações polimórficas foram encontradas no gene TNFRSF13B em indivíduos com deficiência de IgA. Além disso, estudos têm mostrado que os camundongos nocautes de TACI têm baixos níveis séricos de imunoglobulinas, particularmente IgA e apresentam respostas imunes fracas a antígenos T independentes (VON BULOW et al., 2001; TSUJI et al., 2011). Outro estudo mostrou que a estimulação de células B murinas com APRIL in vitro via TACI estimulou a troca de isotipo para IgA, IgG e IgE nessas células, enquanto que células B deficientes para TACI não foram capazes de fazer troca de isotipo para IgA quando estimuladas por BAFF, outro ligante desse receptor, mas permaneceram com a capacidade de fazer a mudança de classe para IgG e IgE. Assim, esses dados sugerem que as interações dos ligantes ao receptor

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TACI são necessárias para a produção de IgA (MACPHERSON et al., 2008, CASTIGLI et al., 2005), podendo alterações em TACI ou em seus ligantes, estarem envolvidos na patogênese da SIgAD.

Outro estudo mostrou que a mudança de classe para IgA é prejudicada em camundongos deficientes da enzima sintetase de óxido nítrico induzível (NOSi). O óxido nítrico (NO) é produzido pelas células dendríticas. Ele é produzido e está envolvido na via de sinalização para troca de classe para IgA, ou seja, ele sinaliza para a célula B que ela precisa produzir IgA. A transferência de células dendríticas (CDs), que são as boas produtoras de óxido nítrico, do tipo selvagem para os camundongos nocautes da NOSi, resgatou a produção de IgA nesses animais. Assim, devido ao importante papel das CDs no processo de troca de classe, defeitos na sinalização da NOSi podem estar envolvidos na patogênese do SIgAD (TEZUKA et al., 2007); no entanto, mais estudos sobre moléculas e fatores acima mencionados são necessários em humanos.

Do ponto de vista genético, 3 cromossomos, o 18, 14 e 6, foram significativamente associados à deficiência de IgA. Certos haplótipos de antígenos leucocitários humanos (HLA), tem sido associado à SIgAD. O sistema HLA codifica proteínas de superfície que reconhecem e apresentam antígenos próprios ou externos para o sistema imune adaptativo, essas proteínas são os MHCs I ou II (molécula de histocompatibilidade), então essas proteínas são de extrema importância na apresentação do antígeno da célula B para as células T auxiliares, para ocorrer a produção de imunoglobulinas. Isso ajuda a garantir o estabelecimento de células B de memória de longa duração produtoras de IgA. E também genes não-HLA, como os genes que codificam JAK3 e RAG1, têm sido associados à deficiência de IgA (BAGHERI et al., 2019).

6.1.5 CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DOS PACIENTES COM SIgAD:

Apesar de a maioria dos pacientes com SIgAD permanecerem assintomáticos durante a vida, alguns podem apresentar infecções pulmonares recorrentes, alergias, doenças autoimunes, distúrbios gastrointestinais, alguns tipos de câncer, tais como carcinomas e linfomas, especialmente em pessoas idosas, entre outras complicações (RAWLA; JOSEPH, 2019). As manifestações mais comuns associadas à deficiência seletiva de IgA são as infecções pulmonares recorrentes causadas por bactérias

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encapsuladas extracelulares, como Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae. Também tem sido observada uma maior incidência de doenças autoimunes em pacientes com deficiência de IgA, como doença celiaca, lupus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide, colite ulcerativa e doença de Crohn (RAWLA; JOSEPH, 2019).

Estudos também mostram forte associação entre a deficiência de IgA e a alergia, uma vez que as doenças alérgicas podem ser a primeira e/ou única manifestação clínica em alguns pacientes com SIgAD. De fato, existe uma alta prevalência de doenças alérgicas em pacientes com SIgAD (AGHAMOHAMMADI et al., 2009; SHKALIM et al., 2010), uma vez que foi estimado que 25-50% dos pacientes com SIgAD são reconhecidos pela avaliação de doenças alérgicas que podem aumentar durante o curso da doença (CUNNINGHAM-RUNDLES, 2001). As doenças alérgicas mais comumente associadas à SIgAD são: conjuntivite alérgica, rinite, urticária, eczema, alergia alimentar e asma (YAZDANI et al, 2017). De fato, a IgA secretora ajuda a prevenir a absorção de alérgenos na corrente sanguínea, assim, a IgA nas barreiras mucosas desempenha um papel significativo na prevenção da alergia.

Em situações raras são observadas reações transfusionais anafilactóides graves em doentes com SIgAD, considera-se que estes indivíduos correm um maior risco de anafilaxia quando recebem produtos sanguíneos que contêm alguma IgA. Acredita-se que isso seja devido a anticorpos IgG IgA (ou possivelmente IgE anti-IgA), que podem ser encontrados em alguns indivíduos com deficiência de IgA (KUMAR, SHARMA & SETHI, 1993; WEI et al;, 1996). Uma vez que esses indivíduos não têm IgA, poderão fazer reação a esses anticorpos, logo quando recebem uma transfusão sanguínea com IgA podem se sensibilizar, e num segundo contato, pode haver a reação anafilactóide citada.

6.1.6 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE SIgAD

Como já citado, a percepção de que um indivíduo está com níveis baixos IgA ocorre muitas vezes de forma acidental, em exames laboratoriais de rotina. Para o diagnóstico de SIgAD foi criado um novo critério pela European Society for Immunodeficiencies (ESID), que incluem os seguintes pontos: (RAWLA; JOSEPH, 2019)

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● Níveis sérico de IgA indetectáveis (abaixo de 0,07 g/l, níveis normais seriam de 113-248 mg/dL), com níveis séricos normais de IgG (739-1475 mg/dL) e IgM (65-134 mg/dL) (avaliados por nefelometria pelo menos duas vezes);

● Maior suscetibilidade a infecções, especialmente respiratórias; ● Diagnóstico em uma idade maior que 4 anos;

● Doenças autoimunes concomitantes e/ou um membro da família com a doença; ● Causas secundárias de hipogamaglobulinemia excluídas;

● Resposta normal de anticorpo do tipo IgG a todas as vacinas; ● Exclusão de defeito de células T.

Formas graves e fenótipos clínicos de alergia tendem a se manifestar na infância, enquanto infecções leves e fenótipo de autoimunidade seriam diagnosticados na meia-idade. É possível que, durante a vida, a SIgAD assintomática possa desenvolver outros fenótipos sintomáticos, incluindo quadros infecciosos, alérgicos e autoimunes mais leves (YAZDANI et al., 2017).

Não existe um tratamento específico recomendado para pacientes com SIgAD, por isso os pacientes devem ser tratados individualmente. Existem também, casos de pacientes que mesmo sem o tratamento desenvolvem níveis normais de IgA (YAZDANI et al., 2017). Os cuidados com os pacientes incluem uma conscientização da condição, monitoramento periódico, tratamento de condições alérgicas ou doenças autoimunes associadas, antibioticoterapia prolongada ou mesmo profilática, administração de vacinas pneumocócicas polivalentes e terapia de reposição intravenosa ou subcutânea de imunoglobulinas (YAZDANI et al., 2017).

A conscientização do paciente é de extrema importância, para prevenir reações anafiláticas secundárias a transfusões sanguíneas (YAZDANI et al., 2017). Pois é indicado que pacientes com deficiência de IgA, sejam transfundidos com bolsas provenientes de doadores deficientes em IgA, pois esses pacientes podem ter reações imunes devido aos anticorpos que reagem com a IgA, como descrito previamente (KUMAR, SHARMA & SETHI, 1993; WEI et al;, 1996;). Nos pacientes com níveis indetectáveis de IgA sérica e também em pacientes com reações à transfusão de hemoderivados, recomenda-se realizar teste de triagem para anticorpos anti-IgA para avaliar melhor o risco dos pacientes para futuras reações à infusão de hemoderivados. Nestes doentes, todos os produtos sanguíneos devem ser administrados com

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cuidado, e a equipe deve estar preparada para tratar uma potencial reação anafilática (YAZDANI et al., 2017).

O tratamento dos casos de alergias associadas à SIgAD é semelhante ao tratamento de alergias em geral. A principal questão no tratamento das doenças autoimunes associadas ao SIgAD é o diagnóstico precoce, independente da detecção de anticorpos IgA, no entanto, independente disso, o tratamento desses distúrbios é semelhante ao autoimune em indivíduos saudáveis, ou seja, naqueles que não têm essa IDP (YAZDANI et al., 2017).

Pacientes com infecções das vias áereas recorrentes e crônicas, exige um tratamento agressivo com antibióticos para condições como rinite alérgica/asma, rinossinusite crônica, mas o uso de antibióticos profiláticos, particularmente nos meses de inverno, é indicado para esses pacientes, quando não estão apresentando quadro infeccioso. Idealmente, a terapia antibiótica deve ser direcionada ao organismo específico que causa a infecção. Infelizmente, nem sempre é possível isolar e identificar esses microrganismos e suas sensibilidades antibióticas com precisão, portanto, o uso de antibióticos de amplo espectro pode ser necessário (YAZDANI et al., 2017).

6.2 ATAXIA-TELANGIECTASIA

A ataxia-telangiectasia (AT) é uma desordem autossômica recessiva, caracterizada por macha anormal (ataxia), devido a um comprometimento do cerebelo, que é responsável pelo equilíbrio e coordenação, e malformações vasculares (telangiectaisas) (ABBAS, LICHTMAN & PILLAI, 2019). Os pacientes com AT apresentam diversas manifestações clínicas incluindo ataxia cerebelar progressiva, telangiectasia oculocutânea (Figura 10), de orelhas e cotovelos, imunodeficiência variável, sensibilidade a radiação ionizante, distúrbios metabólicos e maior susceptibilidade a câncer (leucemias e linfomas). Além de outras anormalidades como, falha de crescimento, desenvolvimento puberal ruim, diabetes resistente à insulina, atrofia gonodal doenças pulmonares, anormalidade cutânea e doenças cardiovasculares (TEIVE et al., 2015; NISSENKORN et al, 2016; ABBAS, LICHTMAN & PILLAI, 2019).

Referências

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