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A LV é uma doença que se caracteriza pelo comprometimento do sistema retículo-endotelial (SRE), onde os parasitos permanecem, multiplicam-se e disseminam-se. Reagindo ao parasitismo, o SRE exibe hipertrofia e hiperplasia. Além da reatividade do SRE, o interstício dos diferentes órgãos também participa de maneira importante no processo, com modificações dos seus componentes celulares, fibrilares, da matriz extracelular, além do infiltrado inflamatório (linfócitos, plasmócitos) e reatividade vascular (BADARÓ; DUARTE, 2005).

O fígado encontra-se sempre aumentado de volume e, à microscopia, veem-se hipertrofia e hiperplasia das células de Kupffer, cujo citoplasma pode conter formas amastigotas do parasito. Observam-se também focos de infiltrado linfoplasmocitário intralobular com consequente aumento dos espaços periportais e preservação da arquitetura hepática. Os hepatócitos apresentam graus discretos a moderados de tumefação, esteatose macro e microgoticular com discreta atividade regenerativa (DUARTE; CORBETT, 1987; EL HAG et al., 1994; KHALDI et al., 1990). Os espaços de Disse estão aumentados de tamanho devido à exacerbacão da trama reticulínica e proliferação das fibras colágenas. Com doença de evolução mais prolongada pode ocorrer fibrose intralobular difusa isolando os hepatócitos e espaços de Disse, podendo evoluir com hipertensão porta e insuficiência hepática, que, entretanto, são reversíveis com o tratamento (CORBETT; DUARTE; BUSTAMANTE, 1993). Alguns pacientes persistem com hepatomegalia residual após tratamento, provavelmente secundária à manutenção da ativação das células de Kupffer e à fibrose peri-hepatócitos (DUARTE et al., 2009). O acometimento hepático grave na LV tem sido descrito (ASHKAN; RAHIM, 2008; BARANWAL; MANDAL; SINGH, 2007; KHALDI et al., 1990). A infecção hepática é usualmente auto-limitada com resposta inflamatória granulomatosa mediada pelo sistema fagocítico mononuclear envolvendo as células de Kuppfer, monócitos, CD4, CD8 e linfócitos T (EL HAG et al., 1994; KHALDI et al., 1990). Base genética tem sido proposta como explicação para o curso da doença (MALLA; MAHAJAN, 2006).

O baço apresenta parasitismo intenso com hipertrofia e hiperplasia das células do sistema fagocítico mononuclear. Os sinusoides esplênicos exibem intensa congestão e os cordões de Bilroth, plasmocitose importante. A polpa

branca sofre diminuição do número de linfócitos, principalmente nas áreas T- dependentes. O controle do crescimento das Leishmanias é perdido e evolução para patologia destrutiva é a norma. Focos de material amiloide podem ser ocasionalmente vistos nesses locais (KARP et al., 1993; MALLA; MAHAJAN, 2006; STANLEY; ENGWERDA, 2007; VERESS et al., 1977).

Sintomas pulmonares são frequentes, sendo observados em mais de 75% dos pacientes com LV e surgem no iníco da doença. Na primeira metade do século passado esses sintomas eram atribuídos a complicações bacterianas, compressão do nervo vago por esplenomegalia e pela hipoalbuminemia com leve edema pulmonar (ALENCAR, 1959; ANDRADE; CARVALHO, ROCHA, 1990; KADIVAR et al., 2000; PRATA, 1957), mas pneumonite intersticial foi reportada em autópsia de paciente com LV (ANDRADE, 1959). O acometimento pulmonar na LV foi registrado em estudos histopatológicos e ultraestruturais usando modelos animais, que informaram que as alterações pulmonares na LV ocorrem em três fases distintas caracterizadas como exsudativa, celular e fibrótica, envolvendo principalmente o septo interalveolar, com participação de células mononucleares intersticiais e inclusões lipídicas e com envolvimento mínimo dos brônquios e alvéolos (DUARTE et al., 1989). Macroscopicamente, os pulmões estão aumentados de volume e congestos. Os septos interalveolares estão espessados devido ao infiltrado inflamatório, constituído principalmente de linfócitos, macrófagos e plasmócitos. As células intersticiais estão aumentadas de tamanho devido à presença de vacúolos de gordura, existindo também discreto edema, com congestão dos capilares septais. As Leishmanias são visualizadas em somente 30% dos casos, entretanto, a imuno-histoquímica revela farta deposição de material antigênico do parasito no interstício septal e no citoplasma dos macrófagos (RASO; SIQUEIRA, 1964). Mais recentemente, estudo avaliando a resposta imune em necropsia de pacientes com LV, a pneumonite intersticial foi destacada como um processo inflamatório com padrão Th2 (TUON et al., 2009), o que aumenta a chance de infecção bacteriana secundária e é consistente com o acometimento de outros órgãos.

Alterações renais acometem significativa proporção dos pacientes, mas tendem a ser leves e reversíveis após o tratamento (DUTRA et al., 1985). Os rins apresentam nefrite intersticial com infiltrado inflamatório intersticial à custa de macrófagos e plasmócitos, principalmente ao redor dos pequenos vasos do córtex

renal (DAHER et al., 2008). As Leishmanias também são de visualização difícil, embora exista grande quantidade de material antigênico do parasito no interior dos macrófagos e na matriz extracelular do interstício. O comprometimento glomerular é menos intenso que o intersticial e mostra hipertrofia e hiperplasia das células mesangiais, com espessamento da matriz. A membrana basal glomerular geralmente está preservada (BRITO et al., 1975). Contudo, síndrome nefrítica aguda (SALGADO-FILHO; FERREIRA; COSTA, 2003) e insuficiência renal foram encontradas (CARAVACA et al., 1991).

As alterações identificadas no trato gastrintestinal são mais evidentes no intestino delgado, que apresenta importante comprometimento da mucosa jejunal, caracterizada por infiltrado inflamatório formado por macrófagos densamente parasitados, plasmócitos e linfócitos. Estão presentes também edema, alargamento das vilosidades e vasos linfáticos intestinais sem alteração da arquitetura do órgão (MUIGAI et al., 1983).

Em relação ao comprometimento cardíaco, existem raros trabalhos na literatura. Morais et al. (1988) estudaram os aspectos anatomopatológicos de 16 corações obtidos de necropsia de pacientes falecidos devido à LV. As alterações histológicas foram mais proeminentes no miocárdio, porém nunca em grau intenso, e consistiram de edema, infiltração linfocitária, necrose focal e proliferação dos miócitos de Anitschkow. Mais recentemente, em ensaio clínico realizado em Montes Claros com 168 crianças com leishmaniose visceral, 20,2% tinham derrame pericárdico ao diagnóstico da doença (CARVALHO, 2005).

Fagócitos mononucleares infectados são ainda encontrados na medula óssea, linfonodos, pele, intestino delgado e outros órgãos (WILSON et al., 2005). No interior das células, os amastigotas se replicam por divisão binária, eventualmente rompendo a célula hospedeira e disseminando-se para outras células.

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