• Nenhum resultado encontrado

O setor de confecções é controvertido e difícil de ser analisado, em razão da sua informalidade e da enorme heterogeneidade de seus produtos. Segundo divisão feita pela ABRAVEST - Associação Brasileira do Vestuário, o setor de confecção possui 21 segmentos, incluindo artigos de cama, mesa e banho, os mais variados tipos de roupa e acessórios, entre outros. Esta heterogeneidade é ainda exacerbada, ao se levar em conta a fragmentação do mercado consumidor por classe de renda, sexo, idade etc.

Trata-se de um setor formado por numeroso grupo de pequenas e médias empresas, fruto da sua atratividade, e uma pequena parcela de confecções de grande porte, que representa pouco mais de 2,5% do total das indústrias e domina pouco menos de 40% do mercado. A maior parcela da produção provém das médias empresas, que respondem por 50% dos volumes produzidos (IEMI, 2003).

A atratividade do setor pode ser explicada pelas reduzidas barreiras tecnológicas à entrada de firmas no mercado, já que o equipamento básico utilizado é a máquina de costura, e a técnica é amplamente divulgada. Também por isso, os investimentos exigidos ao ingresso de uma unidade na indústria não são proibitivos, evidentemente em se tratando de empresas de menor porte.

Assim como em todos os países, no Brasil prevalecem as unidades de pequeno porte, sendo quase 70% do total de indústrias de confecção, de acordo com os dados publicados pelo IEMI (2003). A sobrevivência destas pequenas empresas, segundo o BNDES (2003), é viabilizada pelos aspectos estruturais, como: a

diversificação da demanda, que cria nichos de mercado antieconômicos para as maiores firmas, e a flexibilidade exigida pela indústria de vestuário, por estar submetida a executar um grande número de modelos durante todo ano em virtude do lançamento das coleções. Isto favorece as pequenas empresas por terem maior capacidade de ajuste e simplicidade administrativa. Além disso, a existência de unidades de menor porte é funcional para as maiores, pois estas amortecem as pressões de demanda, sendo as primeiras atingidas pelos choques.

No que diz respeito à situação tecnológica das empresas brasileiras de confecção, mais uma vez depara-se com uma grande diversidade. Poucas firmas são atualizadas tecnológica e organizacionalmente, mas ocupam posição de liderança em termos de vendas e normalmente se caracterizam por possuírem bons esquemas de comercialização, apresentando um coeficiente exportações/vendas totais acima da média. Por outro lado, existe uma grande parcela de empresas defasadas, competindo via custo de mão-de-obra ou via terceirização espúria, diferente da terceirização estratégica, e que no Brasil é confundida com redução de custos através da informalização.

Quanto à organização da produção, é necessário notar que este se setor caracteriza por sempre trabalhar com uma significativa divisão de trabalho, na qual participam produtores industriais, pequenas empresas faccionais — pequenas unidades afastadas do parque fabril da contratante — e trabalhadores em domicílios. Isto é, o setor de confecção tem uma tradicional tendência à desverticalização, caracterizada pela constituição de “unidades produtivas externas mais lucrativas” (as oficinas ou facções), as quais se baseiam o desempenho seja na ausência de encargos sociais, seja no nível de produtividade alcançado em razão da forma de pagamento adotada (por peça). Nessa vertente, a terceirização ganha papel absolutamente central na reestruturação do setor, conforme apontam diversas pesquisas recentes (ARAÚJO e AMORIM apud LEITE, 2004, p. 64). Para Amorim (2003, p. 88), “a terceirização foi aprofundada não só por ter se difundido entre empresas de diferentes tamanhos, mas por ter suas distintas modalidades de subcontratação resgatadas e generalizadas como sendo a melhor alternativa para se obter lucratividade em escala ampliada”.

Com relação ao trabalho na confecção, percebem-se as seguintes realidades: a primeira é o continuum de terceirização, que expulsa o trabalho das empresas confeccionistas, concentrando-o cada vez mais nas oficinas de costura, onde predomina o trabalho informal, mal pago, desqualificado, com altas taxas de doenças profissionais e, muitas vezes, em domicílio (LEITE, 2004); a segunda realidade diz respeito à dimensão do gênero, haja vista a enorme concentração de mulheres na categoria. Conforme adverte essa última autora,

Essas particularidades do trabalho de confecção, no contexto de um processo generalizado de terceirização das atividades do setor, acaba tendo como consequência a multiplicação do trabalho a domicílio, que só não é maior por causa da perda de controle direto sobre o uso da força de trabalho e a dificuldade de garantia da qualidade que ela acarreta, num quadro de acirramento da competição devido à baixa dinâmica dos mercados (LEITE, 2004, p. 67).

Outra realidade diz respeito à escolaridade, sendo o setor composto principalmente por trabalhadores com escolaridade básica (53% da mão-de-obra tinha até 7 anos de instrução formal). A baixa escolaridade concentra-se, entretanto, entre os trabalhadores por conta própria (80,5% com apenas a escolaridade básica) e os assalariados sem carteira (63,5%). Os assalariados com carteira se destacam por uma menor (48,7%) concentração de trabalhadores nesse nível de escolarização (LEITE, 2004).

Essa análise permite concluir-se que a indústria de confecção adota largamente o uso da mão-de-obra barata como estratégia de competitividade, preferindo utilizar trabalhadores que se concentram nas oficinas de costura e no trabalho em domicílio, predominando o trabalho sem carteira assinada e por conta própria. Entre eles, destaca-se um contingente mal remunerado, formado preferencialmente por mulheres, negros e trabalhadores com pouca instrução, que, como assinala a análise do DESEP (apud, LEITE, 2004, p. 71) ‘funcionou como o meio privilegiado de efetivação de uma competitividade ‘espúria’ que sustentou boa parte da indústria nos anos recentes’.

Ainda com respeito à produção, de acordo com o BNDES (2003), as regiões Sul e Sudeste concentram grande parte, respondendo por 87% dos confeccionados têxteis. Os Estados de São Paulo e Santa Catarina são os que mais se destacam, todavia, outros estados começam a apresentar um crescimento significativo, dos quais o mais expressivo é o Ceará, assunto a ser discutido no item seguinte.